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A partir de validações realizadas com a rendeira que produziu a Bandeira do Brasil na oficina, foi identificado que o desenho não estava adequado aos padrões tradicionais do desenho e da produção da renda e que, apesar de ter sido produzido várias vezes após a oficina, sob encomenda, exigia maior trabalho das artesãs que as demais peças tradicionais, causando ainda desconforto nas mãos e braços durante sua confecção, como relatado por elas próprias:

[...] Tem coisas que não vale a pena a gente parar pra fazer, tipo uma

bandeira dessa. Quem vê, diz que é fácil, porque é pequena, mas dá muito trabalho, é melhor fazer uma peça bem grande que você demora a fazer, mas todo mundo vê o trabalho que deu pra fazer... Ela (se referindo a

rendeira que fazia as bandeiras) passou a tarde toda ontem e não fez quase

nada [...] [sic] (RN4 – Rendeira do Núcleo, 59 anos – GF1).

Os principais problemas do desenho estavam relacionados às dimensões, ao sentido das linhas e aos pontos utilizados, uma vez que não existia a traça (característica marcante da renda de bilro), e as tranças e o pano estavam distribuídos de forma disforme.

Esse primeiro desenho foi criado para realização da oficina, momento em que o conhecimento aprofundado do método de desenhar e rendar ainda não existia por parte do designer/ mestrando. A figura 6-66 mostra a primeira versão do desenho da Bandeira do Brasil e indica os principais problemas encontrados.

Declarações das rendeiras sobre o desenho antigo (figura 6-69), aliadas às observações e análises da oficina, nortearam o desenvolvimento de um novo modelo para a Bandeira do Brasil (Figura 6-67), de modo semelhante aos desenhos tradicionais da renda, com os elementos (traça, trança e pano) inseridos e bem distribuídos. O novo desenho foi criado um ano após a oficina, no momento em que existia um conhecimento mais arraigado das técnicas de renda e desenho por parte do designer.

A confecção em renda do novo desenho foi realizada em três etapas: 1) confecção do retângulo verde; 2) confecção do losango amarelo; e 3) confecção do círculo azul e branco – que foram unidos posteriormente através de costura manual.

A tabela 6-9 sistematiza o processo de produção desse novo produto, indicando as características produtivas de cada parte da bandeira.

Inserção de “traças” e diminuição das áreas de “pano”.

Dimensão total ampliada para facilitar o rendar (19 x 13 cm)

Sentido das linhas diagonal, semelhante aos desenhos tradicionais

Figura 6-67 – 2º desenho da Bandeira do Brasil Figura 6-66 – 1º desenho da Bandeira do Brasil

Tranças e pano em demasia

Ausência de traças (ponto característico)

Sentido das linhas contrário ao sentido diagonal utilizados nos desenhos tradicionais

Tabela 6-9 – Sistematização dos dados da produção da nova Bandeira do Brasil RETÂNGULO VERDE LOSANGO AMARELO CÍRCULO AZUL e BRANCO Dimensão 13 x 19 cm 9,5 x 14 cm 5 cm (diâmetro) Número de horas de

trabalho 4 horas 3 horas 1,5 horas

Número de bilros 32 bilros 28 bilros 44 bilros

Número de “traças” 84 traças 0 traças 30 traças

Área de “pano” (cm2) 0 6 cm2 (área total) 0,03 cm2

Desenho

Imagem do produto

Tempo de montagem e

costura 30 minutos (etapa realizada em máquina de costura industrial)

Conforme a sistematização dos dados, observamos que o retângulo verde trata-se da peça de maior dimensão, que consome mais horas de trabalho, possui o maior número de traças e o segundo maior número de bilros, características que sugeririam um maior trabalho. No entanto, relatos da rendeira que o produziu atestam-no como a peça mais “agradável de ser feita”, mais prazerosa e menos trabalhosa.

O losango amarelo, embora necessitando do menor número de bilros e possuindo dimensões inferiores ao retângulo verde, foi tido como a mais cansativa e trabalhosa das três peças por ser feita inteiramente de “pano”. Além disso, acrescenta-se outra dificuldade: a figura geométrica (losango) não facilita o ritmo da atividade; a melhor figura geométrica para rendar é o retângulo ou quadrado.

O círculo azul e branco é a menor peça e a que consome menor número de horas, mas também a que necessita de uma maior quantidade de bilros, o que a torna mais trabalhosa em termos de movimentações das mãos, exigindo também maior atenção e concentração da rendeira. Em relação ao losango amarelo, é melhor de ser confeccionado segundo relato da rendeira que o produziu. A figura 6-68 mostra as etapas de produção da bandeira do desenho à renda finalizada.

Quando comparamos o primeiro desenho com o segundo (Figura 6-69), percebemos que o último se apresenta bem mais apropriado e adequado aos padrões estéticos tradicionais da renda, principalmente por conter a presença das traças. O relato a seguir ilustra a percepção da rendeira em relação aos dois desenhos:

Esse desenho novo nem se compara com o outro, é muito melhor de fazer e muito mais rápido, num instante eu fiz as três partes (RN4 – Rendeira do Núcleo, 59 anos – GF1).

Figura 6-68 – Esquema de produção do novo desenho da Bandeira do Brasil

Rendas confeccionadas a partir dos desenhos

Desenho produzido em computador em novo formato e padrão estético

Figura 6-70 – Comparação entre as camisetas com rendas da Bandeira do Brasil.

Na comparação entre as camisetas finalizadas, também fica evidente a diferença entre as duas, estando a segunda com um nível de acabamento e caracterização da renda de bilro bem mais acentuado. Ressaltamos contudo, que, embora a primeira camiseta, quando comprada à segunda, se apresente com menor atratividade, esta também foi validada e aprovada pelo público, em especial nas comemorações dos Jogos Panamericanos do Brasil em 2007, na cidade do Rio de Janeiro. (Figura 6-70).

Duas camisetas com as novas bandeiras aplicadas foram levadas à feira Brasil mostra Brasil de 2008, para fins de teste de mercado, despertando o interesse no público. Foram vendidas no segundo dia de exposição, provocando também na rendeira, de imediato, a iniciativa de confeccionar outras. Durante a própria feira, a rendeira passou a produzir bandeiras por iniciativa própria, o que indica a possibilidade de incorporação do produto à rotina de trabalho da artesã.