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REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

complexa 2.2 representação convencional de algo; emblema, insígnia 3 palavra ou imagem que designa outro objeto ou qualidade

8 Síntese simbólico-interpretativa

8.2 Aspectos de mudança e estabilidade

Inovações podem ser geradoras de mudanças, por terem algumas delas grande potencial transformador. Então, como se comporta a dinâmica da cultura frente a inovações? Pretende-se apresentar aqui algumas questões sobre os impactos das mudanças nas organizações e como estas podem influenciar os pressupostos.

O debate sobre se uma cultura muda ou não remonta à Antropologia e sua influência nos estudos de cultura organizacional (HATCH, 2004, p. 6). A questão da mudança e da estabilidade pode ser exemplificada na citação abaixo.

A mudança é uma constante na cultura humana. No entanto, deve sempre ser estudada tendo como seu pano de fundo a estabilidade cultural. Muito embora as mudanças pareçam ser muito abrangentes aos membros da sociedade onde ocorrem, raramente elas afetam mais do que uma parte relativamente pequena do arcabouço de costumes pelos quais um povo pauta sua vida. Os problemas da dinâmica cultural, portanto, tomam tanto um aspecto positivo quanto negativo. Isto é, a mudança deve sempre ser considerada em relação à resistência à mudança. (HERSKOVITS, 1948, p. 635).

Hatch aponta uma espécie de luto vivido por antropólogos em função das perdas de características de certas civilizações, suscitando indignação por parte de tais cientistas. Este mal-estar gerado na antropologia, ocorrido com maior freqüência na década de cinqüenta, acabou por influenciar os estudos de cultura organizacional que surgiram posteriormente.

Na década de oitenta o tema da cultura organizacional cresce, enquanto objeto de estudo, apresentando algumas vertentes. Para uma, a cultura é uma força de estabilidade, que pode mudar por intervenção gerencial. Para outra, o enfoque está na questão da resistência, do poder, da dominação e da alienação. Há também uma literatura interpretativa que tende a focar o significado e os aspectos simbólicos e estéticos (HATCH, 2004, p.2).

Para efeito deste trabalho, o foco teórico é em autores como Gagliardi (1986), Hatch (1993) e Czarniawska e Joerges (1998), para quem a cultura tem propriedades dinâmicas, sendo passível de mudança. Esses autores buscam explicar ambas, estabilidade e mudança, sob á ótica de processo, ressaltando o papel simbólico do líder (legitimação) e a origem interna ou externa da mudança, sem um julgamento de valor sobre o éthos, o qual seria imanente ao grupo (SMIRCICH, 1983a).

Gagliardi (1986), autor italiano, desenvolveu um modelo explicativo de como a cultura afeta a mudança e como esta afeta a cultura, partindo do modelo de Schein (seção 5.2). Vale lembrar que, para Schein, os pressupostos e valores são os fundamentos da cultura e a estratégia deveria ser projetada para proteger e manter estáveis estes pressupostos e valores. Gagliardi chama isso de ”círculo virtuoso” (sucesso - valores - coesão - exercício de competências). Quando as organizações não conseguem lidar com os problemas, as mudanças requeridas podem ser impedidas por esse círculo, que se torna então ”vicioso” porque a estratégia é embasada e limitada pelos pressupostos e valores. No entanto, o autor considera que estratégias com valores diferentes, mas não incompatíveis com a cultura, podem gerar mudanças bem sucedidas que incluem e adicionam novos pressupostos.

Gagliardi distingue três categorias de mudança (aparente, incremental e revolucionária), as quais inspiram alguns conceitos desenvolvidos mais adiante neste trabalho. O autor cria estas categorias pelo nível de impacto gerado pela mudança na organização, como pode ser visto no Quadro 5.

Quadro 5 – Tipologia mudanças de Gagliardi

Fonte: Hatch (2004, p. 51), baseado em Gagliardi (1986)

Incremental é o tipo de mudança que realmente transforma a organização, penetrando em seu nível mais profundo, os pressupostos. Quando a mudança é bem implementada, e com sucesso, gera uma re-significação do corpo de interpretações da organização, gerando adição aos pressupostos (vide Esquema 8).

Aparente é a mudança dentro dos limites aceitos e conhecidos, mas que em nada altera a realidade. A cultura muda superficialmente de forma a permanecer a mesma.

Ruptura é quando há uma imposição de valores, geralmente trazidos de fora, ocasionando um choque: a morte do velho com a entrada do novo.

Esquema 8 – Representação das mudanças aparente e incremental.

Fonte: Hatch (2003), correspondência particular, baseado em Gagliardi (1986).

Pressupostos Valores Artefatos Pressupostos Valores Artefatos Pressupostos Valores Artefatos Pressupostos Valores Artefatos Pressupostos Valores Artefatos Pressupostos Valores Artefatos Ruptura / Renova Sim Não Revolucion Profunda Sim Sim Incremental Superficial Não Sim Aparente Descri Gera Mudan Mant Estabilidade Tipo Ruptura / Renovação Sim Não Revolucionária Profunda Sim Sim Incremental Superficial Não Sim Aparente Descrição da Mudança Gera Mudança? Mantém Estabilidade? Tipo Ruptura / Renova Sim Não Revolucion Profunda Sim Sim Incremental Superficial Não Sim Aparente Descri Gera Mudan Mant Estabilidade Tipo Ruptura / Renovação Sim Não Revolucionária Profunda Sim Sim Incremental Superficial Não Sim Aparente Descrição da Mudança Gera Mudança? Mantém Estabilidade? Tipo

Seu modelo se caracteriza pela possibilidade de agregar deltas de aprendizagem, que ele define como inovações incrementais. Essas inovações advêm da necessidade estratégica de sobrevivência, que sustentam e mantêm a cultura, sem rompê-la.

Czarniawska e Joerges também descreve momentos em que as organizações enfrentam mudanças, havendo uma re-significação.

Os grandes eventos provocam enormes quantidades significação e conduzem à mudança. As perspectivas de tempo das pessoas e das organizações se invertem; o curso da ação não é (apenas) construído com base em eventos e experiências do passado que formaram as expectativas do que seja ‘normal’, legal ou repetitivo. Paradoxalmente, o sui generis, o improvável, o inédito e até o impossível acontecem – ou são previstos e começam a guiar a ação. Épocas são fechadas (e, portanto, definidas), outros futuros são abertos (e, portanto, definidos por tentativas) ao se redimirem com o passado. Este é o contexto para transformar idéias latentes em projetos, pois envolve uma ampla redefinição de situações, uma extraordinária mobilização de recursos e o descongelamento de alocações institucionalizadas de recursos. (CZARNIAWSKA; JOERGES, 1998, p. 57).

Segundo Hatch (2004; 1993), a mudança pode ser originada internamente ou externamente. As tentativas das lideranças em mudar as organizações podem ser descritas como parte dos processos da dinâmica da cultura. Essas tentativas de introduzir mudanças geralmente começam no domínio da realização e da simbolização, quando a liderança (ou contato com outra cultura) introduz a nova idéia que então pode ser simbolizada e interpretada por aqueles que vão levá-la adiante ou negá-la.

O modelo de dinâmica da cultura sugere que o poder da liderança reside no próprio significado simbólico do líder, ou seja, conforme é simbolizado e interpretado pelo grupo ao qual pertence. Hatch (2004) acrescenta que os lideres têm tremenda influência nas organizações, mas sua habilidade de usá-la depende de seu conhecimento e seu relacionamento com a cultura. Hatch (2004) conclui que, independente da intervenção da liderança, os processos dinâmicos da cultura produzem contínua estabilidade e mudança.

Enquanto isso, independentemente dos atos da liderança e das intervenções de mudança, os processos dinâmicos de cultura produzem contínua estabilidade e mudança. Isso ocorre porque os processos da cultura estão em movimento constante. Além disso, o que parece ser estabilidade e mudança é uma interpretação dada aos eventos a partir do fato, e tal propensão de assim interpretar e rotular precisa ser parte da teoria da dinâmica cultural. (HATCH, 2004, p. 40).

Concluindo esta seção, o modelo de dinâmica da cultura de Hatch representa um desenvolvimento dos modelos de Schein e de Gagliardi, pois tem outros aspectos que podem facilitar a compreensão de várias questões organizacionais, como mudança e estabilidade, e talvez ainda dominação, resistência, consenso, dissenso, legitimação etc., à luz da dinâmica dos processos da cultura. Primeiramente, o modelo inclui o símbolo e o processo de simbolização, enriquecendo a leitura da organização e trazendo outra perspectiva aos modelos anteriores. Em segundo lugar, por ser um modelo circular, oferece a vantagem de permitir ver os diversos processos, sua interação e relação de causa e conseqüência. Finalmente, quanto à liderança, retira-se o foco gerencial do papel do líder para incluir o líder como parte do processo como um todo.

PARTE III

METODOLOGIA

Ter sensibilidade significa ter insight e ser capaz de dar significado aos eventos e acontecimentos contidos nos dados. Significa conseguir ver abaixo do óbvio para descobrir o novo. Esta qualidade do pesquisador ocorre à medida que ele trabalha com os dados, fazendo comparações, formulando perguntas e indo a campo coletar mais dados. (STRAUSS; CORBIN, 1998, p. 46, tradução nossa).

Na Parte I, foi apresentada uma literatura sobre inovação, que apesar da variedade de conceitos e tipologias, com suas similitudes e diferenças, faz entrever uma lacuna interpretativa. Também foi apresentada uma literatura sobre ciência interpretativa e sua aplicação em Teoria das Organizações, que aponta para ausência de estudos sobre inovação.

Esta parte visa fazer uma associação dessas duas literaturas, tecendo as considerações preliminares para chegar às condições de contorno de inovação e definir a escolha do método conforme os objetivos da pesquisa. Essa associação significa inserir inovação apropriadamente em uma base interpretativa, para permitir um outro nível de compreensão.

A seção 9, “Considerações de partida da pesquisa”, estabelece as considerações de partida para a realização do trabalho de campo.

A seção 10, “Metodologia”, visa elucidar as questões de método impostas pelos objetivos da pesquisa.