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Processo de interpretação: de símbolos a pressupostos

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Proposição 5 – Quanto ao Processo de Interpretação:

12 Análise do caso A

12.4 Relato do Caso A

12.4.4 Processo de interpretação: de símbolos a pressupostos

Auto-interpretação

Ao serem estimulados a falar sobre como é o representante típico da empresa (se existe), a maioria das respostas apresenta um conteúdo coerente com os valores e os símbolos. As auto-interpretações apresentam, de variadas formas, a percepção de si como inovadores. Optou-se por apresentar algumas falas ilustrativas, em virtude da espontaneidade de difícil sintetização.

Sobre seus principais atributos:

A gente não sabe se a gente é um pequeno gigante ou um grande anão.

É tipicamente uma pessoa com o espírito de 68, meio revolucionário... naquele momento havia uma esperança no mundo... uma pessoa com expertise em gestão e poder empresarial, com o coração em 68.

É um visionário, tem paixão, um bom humor incrível, com a crença de que faz acontecer. É um cara simples e de bom gosto, sem ostentação.

Jogar no gol, bater escanteio, tem várias possibilidades de atuar... ser flexível, dinâmico, não ficar esperando serviço.

(quando perguntado se o funcionário típico seria homem ou mulher) É um tipo moderno, para quem a questão de ser masculino ou feminino é irrelevante, com uma elegância não produzida, educado, tem sofisticação.

Prefere um quarteto de cordas a uma orquestra, algo mais essencial. São pessoas muito brilhantes, tem muita variedade, tem gente difícil. Há quem diga que é uma empresa de malucos, mas de qualquer forma o esporte aqui é coletivo.

Sobre o vínculo:

Aqui você aprende um estilo de vida, você pega os conceitos da cultura e leva para sua vida pessoal, como se fossem da sua personalidade.

Você sente que seu perfil se adequa à empresa, você se interessa pela história, a cultura, o modelo... Tudo te chama.

(se fosse comparar com um carro) Não faz sentido comparar com um carro. Um carro nasce e morre carro, a organização é viva. Primeiro, não queremos que morra. Segundo, durante sua vida ela se transforma, responde aos estímulos, evolui.

Há um sentimento das pessoas não serem apenas funcionários; há uma ligação emotiva entre colaboradores e empresa.

As pessoas se interessam umas pelas outras; este sentimento de pertencer... é forte.

Todos perseguem o sucesso da empresa, cooperando; não existem estrelas nem peões.

É uma preocupação constante em cultivar a próxima geração, a cultura, os valores, os sonhos, os projetos, porque esta geração vai comprar a empresa.

Em tudo que se faz existe esta preocupação de manter a cultura... pessoas-chave vão fazendo o papel de manter vivas estas coisas...

O que se rejeita:

Pensamento departamentalizado, ser individualista, não compartilhar informações.

Pessoas que não valorizam nossa cultura e se preocupam com a remuneração sob um aspecto imediatista.

Pessoas cínicas e céticas saem, a empresa repele as pessoas muito diferentes de seus valores.

Somos cruéis e intolerantes com incompetência, negligência, desinteresse.

Expressões recorrentes: são expressões características desta organização, presentes na maioria das falas, que adquirem relevância, pois parecem sustentar o significado coletivo que atribuem a si mesmos:

reinventar-se comunidade autocrítico flexibilidade independência estilo

funcionário-acionista românticos humor

sofisticação surfar a onda equipes

elegância discreta navegar igualitarismo

risco rigor liberdade

debate crítico heróis

a carta (de constituição da empresa)

perfeccionista brilhantes mutantes

Interpretação do ambiente

Acreditam que sua sobrevivência deveu-se, estes anos todos, à capacidade de atuar de forma ativa com relação ao ambiente, buscando identificar oportunidades ainda desconhecidas, conceituá-las, codificá-las num ato intencional e organizado, no que acabam por construir o ambiente onde querem atuar. Isso parece ter sido uma constante nesta organização, uma vez que, em sua história, ela migra para setores com modelos, tecnologias e conceitos diversos, o que está refletido nas ações do planejamento estratégico e nos grupos de trabalho, que estudam o ambiente com a antecipação de até dez anos.

Temos inovação em buscar um olhar para o que acontece no mundo externo, fazer diferente o que já se fazia... buscar permanentemente novos negócios.

O desafio atual é descobrir a estrela do momento; pode ser um novo negócio, uma nova parceria, uma nova tecnologia.

Interpretação de fracasso e erro

Percebe-se uma elaboração conceitual a respeito de um fracasso recente. Consideram que houve iniciativas mal-sucedidas ou porque estavam à frente do seu tempo, ou foram mal dimensionadas ou não maturadas. De qualquer forma, existe um discurso reflexivo sobre os eventos recentes, onde fica claro que geraram inovações ousadas, mas com alguns aspectos não alinhados com os pressupostos

da cultura. Ainda estão processando um aprendizado, ao mesmo tempo em que reconhecem alguns ganhos; há uma dubiedade, como se ainda estivessem aprendendo com a absorção dos fatos. Importante salientar que não há nenhuma acusação a pessoas.

Mesmo quando não deu certo, a gente acreditou em quem tomou a decisão; o risco faz parte do negócio.

A experiência de trazer pessoas estranhas à nossa cultura deu trabalho; eles não se encaixavam; acho que foi um aprendizado. A inovação tem que ser de acordo com os valores da casa; hoje isto é claro.

A tolerância ao erro aparece como um fator importante para não inibir o arrojo em inovar; são orientados pelo incentivo e não pela punição. O erro é aprendizagem e, quando ocorre, há muita discussão a respeito, no sentido de gerar lições aprendidas. Há método para análise, não há ”caça às bruxas”; o erro é coletivo e não personalizado, considerado inerente a uma cultura de inovação. Existem algumas posições de crítica a uma possível complacência frente ao erro.

O nosso maior sucesso em termos de empreendedorismo foi o projeto AA que tinha fracassado; tentamos novamente e foi um sucesso. Para ser inovador tem que experimentar, para experimentar tem que estar disposto a errar, para estar disposto a errar não pode ser punido.

Adição de pressupostos

A adição de pressupostos ocorre quando algum fator adentra a cultura e acaba por ser assimilado, adicionando pressupostos novos à cultura que acolhe, percebendo- se como resultante uma alteração no sistema de crenças e em alguns valores (vide seção 8.2).

Um novo negócio, com entrada de aspectos não condizentes aos pressupostos da cultura da comunidade, gerou conflito, sendo em parte rejeitado. Alguns símbolos exteriores à cultura não foram assimilados de imediato e ainda passam por um processo retrospectivo de resignificação. As frases abaixo denotam um processo de

assimilação e incorporação de valores a partir de uma experiência que inicialmente foi conflituosa.

Fizemos fusão com aquela moçada; era bicho para todo lado. Eles trouxeram uma leveza que não se perdeu. A gente conquistou uma nova mentalidade, desde os móveis, o visual, o “fun”. A gente trabalha pra caramba, mas tem que ter “fun”.

A empresa W criada mudou o paradigma. Éramos uma empresa formal, conservadora, cheia de padrões; teve uma criançada que entrou, teve conflito, teve ajustes...Acho que é um marco, tivemos que ficar mais ágeis.

Houve um choque cultural: a gente chegava de blazer e a moçada de bermuda e brinco; só faltava chamarem a gente de “tio”.

Acho que houve uma boa miscigenação; percebemos que não podíamos mais trabalhar no tempo (mais vagaroso) em que vínhamos trabalhando.