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REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

5 Cultura e teoria das organizações

5.1 Cultura organizacional

A Encyclopaedia Britannica registra como a mais antiga definição de cultura a do antropólogo inglês Edward Burnett Tylor, em 1871:

Cultura [...] é aquele todo complexo que inclui conhecimento, crença, arte, moral, leis, costumes e quaisquer outras capacidades e hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade.(THE NEW Encyclopaedia Britannica, v. 16, p. 874, tradução nossa).

O conceito de Cultura começou a tomar forma a partir do avanço das ciências humanas, particularmente da Antropologia e da Sociologia, há mais de um século, e estabeleceu-se dentro de uma vasta literatura. A noção de cultura foi proposta originalmente de forma muito genérica, como uma forma de responder à questão ”o que nos diferencia como humanos?”, no interesse de estabelecer as características de similaridade. A evolução da pesquisa de campo fez o conceito se alterar, em vista

do interesse se concentrar não mais nas similitudes, mas nas diferenças entre os grupos humanos como culturas próprias (HATCH, 1997, p.202-203).

Para efeito deste trabalho, pode-se escolher no dicionário de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1999, p. 591) duas definições de cultura, entre várias.

[...] Conjunto de características humanas que não são inatas, e se criam e se preservam ou aprimoram através da comunicação e cooperação entre indivíduos em sociedade”. [...] nas ciências humanas ... está associada a uma capacidade de simbolização considerada própria da vida coletiva e que é a das interações sociais]”. [...]

[...] Antrop. O conjunto complexo dos códigos e padrões que regulam a ação humana individual e coletiva, tal como se desenvolvem em uma sociedade ou grupo específico, e que se manifestam em praticamente todos os aspectos da vida: modos de sobrevivência, norma de comportamento, crenças, instituições, valores espirituais, criações materiais etc. [...] cultura pode ser tomada como patrimônio próprio e distintivo de um grupo ou sociedade especifica[...]

Este foco em ”grupo social“ abre as portas para o estudo da cultura organizacional, pois as organizações são grupos sociais. Entretanto, a cultura organizacional é provavelmente um dos mais difíceis conceitos organizacionais a definir. Nas décadas de 1940 e 1950, surgem estudos que abordam a natureza cultural dos costumes e tradições do trabalho organizado. No entanto, estudos mais robustos sobre cultura organizacional começam a aparecer na década de setenta com alguns trabalhos, onde se destaca Pettigrew, publicado em 1979 continuando na década de oitenta com um novo grupo de teóricos das organizações, onde se destaca Edgar Schein (HATCH, 1993, p. 657).

Freitas, em seu livro Cultura Organizacional (1991, p. xxii), rastreia o tema de cultura organizacional em publicações e eventos nos Estados Unidos entre 1913 e 1988, demonstrando que, particularmente na década de oitenta, o assunto entra maciçamente na área de estudos da teoria das organizações. Freitas desenvolve um estudo sobre a função de controle exercida pela cultura organizacional.

A esta altura, é necessário esclarecer que existem duas grandes linhas de abordagem nos estudos sobre cultura organizacional, de acordo com a postura

epistemológica adotada. Uma delas é a ”organização tem uma cultura”, portanto a cultura é uma variável da organização. A outra é a ”organização é uma cultura”, ou seja, a organização é vista como uma cultura (MOTTA; VASCONCELOS, 2002).

Quando se adota a premissa ”a organização tem uma cultura”, esta é observada e estudada como uma variável organizacional, um subsistema dentro do sistema maior, ou seja, assume-se como premissa que existe uma realidade passível de ser observada de fora, onde a cultura se insere como um elemento. Esta abordagem é característica dos objetivistas, predominantemente descritiva, pragmática, funcional, que privilegia métodos quantitativos, buscando o rigor de análise para tratamento universal e possibilidade de replicação (MOTTA; VASCONCELOS, 2002; MORGAN, 1996).

Não cabe nesta tese uma extensa revisão bibliográfica a respeito de cultura organizacional. No entanto, é necessário mencionar o reconhecido artigo de Smircich (1983b) na Administrative Science Quarterly, que colocou em ordem as questões de conceituação e metodologia para o estudo da cultura na teoria das organizações, o que antes estava difusamente distribuído na área da Antropologia. Comentando as metáforas que serviram para conceituar organizações, a autora esclarece que a inserção de cultura como metáfora (metáfora porque a palavra advém de “cultivo” na agricultura) representa um salto sobre a visão instrumental derivada da organização como ”máquina” e da visão adaptativa derivada da organização como ”organismo”. Afirma, ainda, que alguns autores deixaram para trás a visão de que a organização “tem uma cultura, em favor de que é uma cultura” (SMIRCICH, 1983b).

A cultura, como uma metáfora de raiz, promove uma visão das organizações como formas e manifestações expressivas da consciência humana. As organizações são entendidas e analisadas não de modo precípuo em termos econômicos e materiais, mas em termos de seus aspectos expressivos, ideacionais e simbólicos. (SMIRCICH, 1983b, p. 347, tradução nossa).

No mesmo artigo, Smircich expõe a correspondência entre os conceitos de cultura nas diversas correntes antropológicas e os conceitos de organização na teoria das organizações, conforme Quadro 2.

Quadro 2 – Intersecções entre Teoria da Cultura e Teoria das Organizações Fonte: Smircich (1983b, p. 342)

Para este trabalho, seria impossível não adotar a premissa ”a organização é uma cultura”, em vista do posicionamento teórico aqui definido, de base simbólico- interpretativa, que corresponde no Quadro 2 ao ”simbolismo organizacional”. As seções que seguem fundamentam essa postura.

As formas e práticas organizacionais são as manifestações de processos inconscientes.

Por ex:a teoria organizacional transformacional

Processos e Organização Inconscientes A cultura é uma projeção da

infra-estrutura inconsciente da mente.

Por ex: o estruturalismo de Levi- Strauss

Organizações são padrões do discurso simbólico. Uma “organização” é mantida por modos simbólicos , como a linguagem, que facilita os significados compartilhados e as realidades compartilhadas. Por ex: a teoria organizacional simbólica Simbolismo Organizacional A cultura é um sistema de símbolos e significados compartilhados. A ação simbólica precisa ser

interpretada, lida ou decifrada para ser compreendida. Por ex: a antropologia simbólica de Geertz

Organizações são sistemas de conhecimento. A “organização” se apóia em uma rede de interações de significados subjetivos, compartilhados pelos membros da organização em graus diferentes, que parecem funcionar como regras. Por ex: teoria organizacional cognitiva

Cognição Organizacional A cultura é um sistema de

cognições compartilhadas. A mente humana gera cultura por meio de um número finito de regras. Por ex: a etnociência de

Goodenough

Organizações são organismos adaptativos que existem por processos de troca com o ambiente. Por ex: teoria do contingenciamento Cultura

Corporativa A cultura funciona como um

mecanismo adaptativo-regulador. Une os indivíduos em estruturas sociais.

Por ex: o funcionalismo estrutural de Radcliffe-Brown

Organizações são instrumentos sociais para realização de tarefas. Por ex: teoria do gerenciamento clássico

Intercultural ou Gerenciamento

Comparativo A cultura é um instrumento a serviço

das necessidades humanas, biológicas e psicológicas. Por ex. o funcionalismo de Malinowski

CONCEITOS DE ‘ORGANIZAÇÃO’ EM TEORIA DAS ORGANIZAÇÕES

Temas de Pesquisa sobre Organização e Gerenciamento CONCEITOS DE ‘CULTURA’ EM ANTROPOLOGIA As formas e práticas organizacionais são as manifestações de processos inconscientes.

Por ex:a teoria organizacional transformacional

Processos e Organização Inconscientes A cultura é uma projeção da

infra-estrutura inconsciente da mente.

Por ex: o estruturalismo de Levi- Strauss

Organizações são padrões do discurso simbólico. Uma “organização” é mantida por modos simbólicos , como a linguagem, que facilita os significados compartilhados e as realidades compartilhadas. Por ex: a teoria organizacional simbólica Simbolismo Organizacional A cultura é um sistema de símbolos e significados compartilhados. A ação simbólica precisa ser

interpretada, lida ou decifrada para ser compreendida. Por ex: a antropologia simbólica de Geertz

Organizações são sistemas de conhecimento. A “organização” se apóia em uma rede de interações de significados subjetivos, compartilhados pelos membros da organização em graus diferentes, que parecem funcionar como regras. Por ex: teoria organizacional cognitiva

Cognição Organizacional A cultura é um sistema de

cognições compartilhadas. A mente humana gera cultura por meio de um número finito de regras. Por ex: a etnociência de

Goodenough

Organizações são organismos adaptativos que existem por processos de troca com o ambiente. Por ex: teoria do contingenciamento Cultura

Corporativa A cultura funciona como um

mecanismo adaptativo-regulador. Une os indivíduos em estruturas sociais.

Por ex: o funcionalismo estrutural de Radcliffe-Brown

Organizações são instrumentos sociais para realização de tarefas. Por ex: teoria do gerenciamento clássico

Intercultural ou Gerenciamento

Comparativo A cultura é um instrumento a serviço

das necessidades humanas, biológicas e psicológicas. Por ex. o funcionalismo de Malinowski

CONCEITOS DE ‘ORGANIZAÇÃO’ EM TEORIA DAS ORGANIZAÇÕES

Temas de Pesquisa sobre Organização e Gerenciamento

CONCEITOS DE ‘CULTURA’ EM ANTROPOLOGIA