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ATUAÇÃO DOS ÓRGÃOS QUE COMPÕEM O SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL E NACIONAL

CAPÍTULO VI: OS EFEITOS POSSÍVEIS DA UNIFICAÇÃO DA MOEDA

4. ATUAÇÃO DOS ÓRGÃOS QUE COMPÕEM O SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL E NACIONAL

A atuação dos órgãos que compõem o Sistema Financeiro Internacional parece transpor a esfera da avaliação do cumprimento dos requisitos para a adoção da moeda unificada, para incidir eminentemente sobre a formulação de políticas monetárias que busquem a preservação de seu valor e viabilizem a proteção pretendida pelo bloco econômico.

Deveras, num primeiro momento faz-se necessário coletar e analisar dados de cada um dos países aspirantes à adoção da moeda comum, aferindo o cumprimento dos requisitos para tanto estabelecidos (os critérios de convergência), relacionados à conjuntura econômica de cada qual. 141

141 Fase que, especificamente em relação à adoção do EURO, impôs a adoção, pelos países integrantes da Comunidade Econômica Européia, de medidas impopulares, conforme linhas atrás já se ressaltou.

Ultrapassada, porém, essa fase, parece-nos que a atuação dos referidos órgãos poderá voltar-se mais à formulação de diretrizes a serem seguidas pelos Bancos Centrais dos países cursores da moeda comum, e à criação de mecanismos de controle e preservação de seu valor.

O Sistema Financeiro Nacional, por sua vez, passará a implementar a política monetária estabelecida pelos órgãos do Sistema Financeiro Internacional, deixando, precipuamente, de lançar mão de estratégias que visem a garantir as taxas de câmbio, já que estas, num cenário da moeda única, deixam de existir sempre que os negócios são pactuados entre os países membros do bloco econômico.

Em outras palavras, além de a autoridade monetária basilar todas as suas ações e atuações nos parâmetros exigidos para a participação no sistema de moeda comum, perde relevância a sua atuação no sentido da formulação de políticas cambiais, em relação às moedas dos países integrantes da união monetária. Isso porque essas políticas baseiam-se fundamentalmente na administração da taxa (ou taxas) de câmbio e no controle de operações cambiais, atuando diretamente sobre todas as variáveis relacionadas às transações econômicas com o exterior que possam interferir

na política monetária, que afetam, v.g., a taxa de juros. Eduardo Fortuna ilustra, em relação ao cenário brasileiro142:

“Um desempenho muito forte das exportações pode ter grande impacto

monetário à medida que o ingresso de divisas significa conversão para reais e expansão da emissão da moeda que tem enorme efeito inflacionário futuro. Estes recursos entram através do câmbio comercial.

Idêntica expansão acontece quando cresce o volume de recursos captados pela emissão de títulos no exterior, seja através de bônus ou

comercial papers, ou pela entrada de recursos para aplicação em bolsas

de valores. No conjunto, representam o volume de fechamento de câmbio referente às chamadas compras financeiras.

Assim, o aumento na pressão da oferta monetária via câmbio (compras financeiras e exportações) prejudica o controle dos juros, aumentando inclusive o custo do Governo, que é obrigado a aumentar a dívida pública mobiliária (em títulos) para enxugar a moeda que entra em circulação pela troca de dólar por reais

Tal fato faz crescer o volume de reservas em dólar no BC cuja remuneração no exterior é menor do que o custo do carregamento interno da correspondente dívida em títulos. A perda quantitativa resultante deve ser constantemente analisada vis-à-vis os ganhos

qualitativos e de credibilidade no exterior.

A menos que o BC decida deixar circulando na economia os reais que correspondem à entrada de dólares ou, a menos que o real se torne uma moeda com plena conversibilidade (com as pessoas, as empresas e instituições nacionais, incluindo o Tesouro Nacional, sendo autorizadas a manter contas em dólares no País), não há como evitar o aumento do endividamento interno quando os dólares são internalizados no País.

142 Mercado financeiro..., p. 59 (grifos do autor), em análise que, embora relacionada à política cambial brasileira, é, em nosso sentir, apta para ilustrar o esforço de atuação dos órgãos monetários de qualquer país.

Em resumo, para o Brasil uma boa política cambial deverá permitir um elevado volume de fluxo de moeda com o exterior nos dois sentidos (exportação, importação, compras e vendas financeiras), garantindo que os eventuais déficits em transações correntes sejam garantidos pelo conjunto de financiamentos externos quer seja na forma de investimentos diretos nas privatizações, nas multinacionais, colocação de bônus, linhas de crédito de exportação-importação ou crédito de fornecedores.”

A formulação de política cambial e monetária143 será, portanto, desnecessária no que respeita à moeda dos países participantes, a partir do momento em que eles ingressem no sistema de moeda unificada. Continuará, porém, ao encargo dos órgãos responsáveis a formulação e/ou execução da política cambial em relação aos países não aderentes da moeda unificada, bem como, num primeiro momento144, da política fiscal145 e da política de rendas146, todas com objetivos fundamentais relacionados com a política econômica global do governo, que, nas palavras de Eduardo Fortuna147,

“... consiste, em síntese, em promover o desenvolvimento econômico,

garantir o pleno emprego e sua estabilidade, equilibrar o volume financeiro das transações econômicas com o exterior, garantir a estabilidade de preço e o controle da inflação e, promover a distribuição da riqueza e das rendas.”

143 Controle da oferta da moeda e das taxas de juros que garantam a liquidez ideal de cada momento econômico. (Eduardo Fortuna, Mercado financeiro..., p. 4).

144 Porque, com a evolução do processo de integração tais políticas caminham para a unificação.

145 Política de receitas e despesas do governo, que envolve a definição e a aplicação da carga tributária exercida sobre os agentes econômicos e a definição dos gastos do governo, com base nos tributos arrecadados. (Eduardo Fortuna, Mercado financeiro..., p. 56).

146 Aquela que o governo exerce estabelecendo controles diretos sobre a remuneração dos fatores diretos de produção envolvidos na economia, tais como salários, depreciações, lucros dividendos e preços dos produtos intermediários e finais. (Eduardo Fortuna, Mercado Financeiro..., p. 62).

Muitas das ações inerentes a tais políticas, porém, já terão sido, conforme visto, afetadas pela determinação de critérios de convergência, pré- requisito para a adoção da moeda unificada, e continuarão a ser influenciadas pelos respectivos mecanismos de controle.

Abordando a construção do Espaço Financeiro Europeu, que precedeu a implantação do EURO, a doutrina aponta:

“No plano macroeconómico, o EFE significa ainda a redefinição das

regras comunitárias de concorrência bancária e a perda pelos Estados membros de certos instrumentos de política monetária, como o enquadramento do crédito e o controlo dos câmbios.” 148

Já sobre a União Econômica Monetária os autores assim se manifestaram149:

“É, porém, com o TUE que a situação se irá alterar profundamente. A entrada em vigor, em 1997 ou mais provavelmente em 1999, da terceira fase da UEM implicará a fixação irreversível das taxas de câmbio, a criação de um SEBC seguida da construção de uma moeda única e a condução das políticas monetária e cambial como políticas exclusivas da CE/EU. A segunda fase, ora em curso, é uma fase de preparação para a moeda única. Nela as políticas monetárias e cambiais nacionais são condicionadas pela supervisão multilateral das respectivas políticas

econômicas, pelo respeito dos critérios de convergência nominal e pela coordenação monetária e supervisão do SME efectuada pelo IME.”

É digna de nota, por fim, a ponderação de Pedro Valls Feu Rosa acerca relação entre a União Econômica Monetária e as políticas econômicas nacionais150:

“Dir-se-ia, e aí vai um argumento que tem, evidentemente, um forte

tempero de nacionalismo, que os Estados-Membro perderiam o direito de determinar suas próprias políticas econômicas.

Isto não deixa de ser verdade, porém apenas até um certo ponto. Isto porque os Estados-Membro, se de um lado abririam mão de um poder de gerência de suas atividades econômicas, de outro passariam a deter um imenso conjunto de vantagens e garantias. Imagine-se, e apenas para exemplo, a resistência que teria uma moeda única às pressões exercidas pelos especuladores – as desvalorizações súbitas, depreende-se, não serão mais que reminiscência histórica. Desapareceriam, igualmente, as incertezas quanto às taxas de longo prazo. Aliás, a referência mais clara a este quadro ouvi de um Professor francês, o Dr. Ami Barav, segundo quem fala-se muito do Marco Alemão, do Iene e da Libra Esterlina, mas todos os dirigentes da União Européia, pelas manhãs, ‘e antes mesmo de escovarem os dentes’, correm a conferir as cotações e flutuações do dólar, ‘a verdadeira moeda mundial’, no seu dizer. Mas... que dizer de um meio circulante amparado em uma Comunidade de 350 milhões de pessoas? Muito embora manifestando incerteza, concluiu ser a única possibilidade de reação da Europa, frente ao poderio da moeda norte- americana.

De qualquer maneira, e em homenagem à ponderação, cumpre digamos que os Bancos Centrais nacionais dos Estados-Membro participantes do

149 Direito econômico, p. 480 (grifos dos autores). 150 Direito comunitário... , p. 108-109.

sistema de moeda única conservarão seus poderes, continuando a exercer as atividades que lhes são próprias: distribuição do crédito, captação de recursos, gestão dos meios de pagamento etc.”