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CAPÍTULO VI: OS EFEITOS POSSÍVEIS DA UNIFICAÇÃO DA MOEDA

3. MERCADO FINANCEIRO E DE CAPITAIS

Nos mercados financeiros e de capitais, a adoção da moeda única tem reflexos, em linhas gerais, em duas frentes: na contratação de operações de câmbio e na busca de mecanismos protetores do valor da moeda.

O comércio internacional entre os países não integrantes da unificação monetária depende, hoje, da conversão de uma moeda em outra, efetuada por intermédio de uma instituição financeira. Assim, o exportador brasileiro, ao receber do importador estrangeiro o pagamento pela mercadoria exportada, deverá buscar o auxílio de uma instituição financeira para converter em Reais a moeda estrangeira que passou a deter.

O mesmo se dá quanto às importações efetuadas pelo comprador brasileiro, que, para enviar os recursos para o exportador estrangeiro em pagamento à mercadoria ou serviço adquirido, necessariamente o fará com a interferência de uma instituição financeira.

As operações de câmbio consistem, pois, na conversão da moeda de um país pela de outro. Eduardo Fortuna135 assim as classifica, em relação ao estabelecimento operador:

a) compra: recebimento de moeda estrangeira contra entrega de moeda nacional;

b) venda: entrega de moeda estrangeira contra o recebimento de moeda nacional; e

c) arbitragem: entrega de moeda estrangeira contra o recebimento de outra moeda estrangeira.

Destaca, ainda, o autor136:

“A necessidade destas conversões podem surgir em função de:

Exportação: venda ao exterior de mercadorias e serviços com preço ajustado para pagamento em moeda estrangeira;

Importação: compra de mercadorias e serviços com preço ajustado para pagamento em moeda estrangeira;

Transferências: movimentação financeira de capitais de entrada ou saída do País.

Assim, em função das características das operações, elas se dividem, basicamente, em operações comerciais e operações financeiras.”

Ressalta, também, que “o contrato de câmbio visa à prestação

de um serviço por um banco ao seu cliente”, ponderando que, “quando este

cliente for um exportador, o serviço bancário será a cobrança, no exterior, de

cambiais sacadas pelo exportador nacional contra o importador residente em

outro país.” De outra parte, quando o cliente for um importador, “o serviço

bancário prestado será o recebimento, em moeda local, com o respectivo

pagamento, ao fornecedor no exterior, do valor referente à mercadoria

importada.” 137

A prestação do serviço, porém, aí não se esgota. É que, em razão destas operações internacionais, além do contrato de câmbio em si, a instituição financeira pode oferecer ao seu cliente outras utilidades, tais como, no Brasil, o adiantamento sobre o contrato de câmbio, que consiste na antecipação, para o exportador brasileiro, da quantia em Reais que receberá por conta do câmbio futuro equivalente ao pagamento pela mercadoria ou serviço exportado, diminuída de deságio que, ao ser calculado, toma em conta a expectativa de evolução da cotação da moeda envolvida.

Muito embora esteja ínsita a captação de recursos para a produção da mercadoria exportada, não se descarta a existência de outra finalidade, pois “a utilização de um ACC muitas vezes é motivada pela

oportunidade de obter reais imediatamente, de forma a obter vantagens na

aplicação financeira sobre a desvalorização cambial.” 138

Assim, ausente a duplicidade (ou multiplicidade) de moedas, desnecessária se fará a contratação do câmbio e do respectivo adiantamento sobre o contrato de câmbio. O que poderá persistir, nessa medida, é a antecipação, pela instituição financeira, do valor a receber pelo exportador, em moeda do seu país, ainda com deságio, mas em negócio que mais se assemelha à compra do crédito pela instituição financeira, como o que já hoje existe com relação aos negócios pactuados no território nacional.

Também nos parece que será desnecessária a busca por mecanismos de proteção do valor da moeda hoje oferecidos nos mercados financeiros nacionais e internacionais.

Deveras, a busca por operações de hedge nacionais e internacionais139 é intensa, na medida em que as partes envolvidas nas operações têm interesse em proteger seus ativos e conter seus passivos contra a oscilação de valor das moedas estrangeiras e buscam limitar os efeitos de

138 Eduardo Fortuna. Mercado financeiro..., p. 260.

139 Hedge. Cobrir, defender, safar, garantir, proteger, travar. Estratégia pela qual investidores com intenções definidas procuram cobrir-se do risco de variação de preços, desvantajosas para seus propósitos. Um produtor de commodities que, na época da colheita, planeja vender sua produção, pode garantir o preço de venda no futuro, fazendo hedge de venda em Bolsa. Normalmente, a posição contrária é assumida em bolsa por outro

hedger (o comprador futuro dessa mesma commodity), ou por um especulador, que aceita o risco em troca da perspectiva de lucro a curto prazo. O administrador de um fundo de investimentos, com perspectivas de captação positiva no futuro próximo, pode antecipar a formação de preços de sua carteira, comprando o Índice de bolsa no mercado futuro. A operação de hedge não significa que o risco da operação foi eliminado totalmente. Exemplo: ao vender soja a futuro, o produtor elimina o risco de preço, mas passa a correr o risco de base (diferença entre o preço futuro e o preço à vista).

Hedge cambial. Hedge em operação de compra e venda de moeda estrangeira. Técnicas especiais podem combinar o hedge cambial com o hedge de taxa de juros interna. (Luiz Fernando Rudge. Dicionário de

sua cotação a determinados patamares em sua moeda nacional, adquirindo variados produtos financeiros que produzam o resultado pretendido.

Da mesma forma, aqueles que possuem direitos de crédito em moeda estrangeira tendem a potencializar seu valor em moeda nacional, buscando mecanismos que permitam a eles atribuir o maior valor possível.

A busca por esses instrumentos de proteção da cotação da moeda não se dá, porém, apenas nas hipóteses em que há relação negocial subjacente, qual seja, o comércio de produtos ou serviços. É motivada, também, pelo espírito especulativo de investidores que pretendem tão- somente obter ganhos nos mercados financeiros e de capitais, “apostando” na evolução da cotação das moedas. É dizer, tais investidores não possuem ativos ou passivos relacionados a operações de comércio internacional de produtos ou serviços a proteger, mas apenas objetivam ganho financeiro oriundo de variações na cotação de moedas.

Nesta medida, a adoção da moeda única elimina esse tipo de operação financeira, esmoecendo a oferta de tais produtos ou serviços pelas instituições financeiras.

George K. Zestos fez interessante análise específica da variação da taxa nominal de câmbio dólar-euro, nos primeiros anos de vida da moeda única140, de que denota a evolução de seu comportamento e transparece a sua suscetibilidade:

... a desvalorização inicial de dois anos do euro contra o dólar americano será descrita pela primeira vez. Isto será seguido por uma discussão da valorização do euro que ocorreu aproximadamente após um ano de relativa estabilidade. Alguns economistas sugeriram que a taxa nominal de câmbio dólar-euro introdutória, combinada pelos países da área do Euro (Eurozona), foi muito mais alta do que eles perceberam ser seu valor de equilíbrio de longo prazo (long-run). Portanto, foi inevitável que o euro eventualmente se desvalorizasse. Não se acredita mais nesta interpretação já que, após seis anos, o euro tem se valorizado além do seu valor de introdução inicial.

Uma outra explicação para a contínua desvalorização do euro versus o dólar americano e outras moedas foi uma visão extrema de que o euro não tinha chance de sobreviver como uma moeda (Feldstein, 1977). A razão por trás desta visão pessimista foi a de que o euro se tornou a moeda legal de 12 estados independentes que não formavam uma Área de Moeda Favorável. (OCA). Outros autores também acreditavam que o projeto sem precedentes do euro tinha um futuro incerto e estava destinado a falhar. Tal visão do euro não é mais convincente após sua

140 European monetary..., p. 131-132. O autor ilustra, ainda, a interferência de vários fatores na taxa de câmbio: “Taxas de câmbio são difíceis de entender porque elas são afetadas por muitas variáveis. Taxas de

câmbio, por exemplo, são influenciadas por numerosas decisões microeconômicas. Estas decisões podem envolver indivíduos que podem ter escolhido visitar um país estrangeiro ou uma empresa de negócios que decidiu investir, comprar ou vender mercadorias (commodities) e serviços para, ou de outro país. Similarmente, investidores financeiros que decidem investir em um país estrangeiro comprando ativos financeiros afetam taxas de câmbio. Políticas macroeconômicas influenciam taxas de câmbio. Quando os governos formulam e exercitam políticas monetárias e fiscais, eles afetam os níveis de preços, déficits nacionais, dívidas nacionais, taxas de juros e taxas de crescimento do país. Mudanças nestas variáveis quase sempre têm impacto na taxa de câmbio de um país.”

valorização, começando em 2002, e seu sucesso como a principal moeda mundial contra o dólar americano.

Nem todos os países candidatos membros da EU constituíam uma OCA antes de se juntarem à UEM; porém, todos os membros da UEM aderiram à rigorosa disciplina monetária e fiscal para alcançarem o critério de convergência de Maastrich. Como resultado, todos os países da Área do Euro alcançaram a estabilidade do preço e adotaram as políticas apropriadas para tornarem-se uma região mais integrada.

4. ATUAÇÃO DOS ÓRGÃOS QUE COMPÕEM O SISTEMA