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Autorreferência e formação

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3.3 O Neoxamanismo urbano como religiosidade autônoma

3.3.3 Autorreferência e formação

Portanto, pode-se afirmar que o Neoxamanismo urbano constituiu um campo referencial onde ele se orienta para poder desenvolver suas atividades, assim como um espaço metafórico icônico, que garante a produção de discursos, sejam eles imagens pictóricas e objetos de poder, sejam imagens visionárias. Essa nova possibilidade de auto-formação abre a possibilidade de criação de uma identidade religiosa (BURITY, 2013) nos grupos de Neoxamanismo urbano (VON STUCKRAD, 2005), assim como jovens e mesmo adultos, que buscam novos paradigmas religiosos, e encontram nessa nova modalidade religiosa um espaço para construção de novas identidades (LEANDRO, 20114).

Baseia-se, aqui, em alguns poucos exemplos, apenas em São Paulo, mas a lista é plural. Umas das lideranças citadas é o xamã urbano Leo Artese, que coordena o Kiva Urbana. Além de coordenar o Kiva Urbana, é também padrinho de uma Igreja de Daime, o Céu da Lua Cheia, em Itapecirica da Serra, e dono do portal xamanismo.com.br.

No modelo apresentado por Magnani a Kiva Urbana têm a função de base na cidade, enquanto o sítio de propriedade da Igreja é onde se realizam os retiros para os workshops e cerimônias. Leo Artese, por sua vez, não ―mistura‖ os discursos da Igreja, da doutrina do Daime, com o discurso do Neoxamanismo urbano e tradicional. Na verdade, ele propõe a união de ambos, a partir de uma visão universalista:

Atualmente o Xamanismo pode ser dividido em duas escolas. O Xamanismo tradicional que segue as tradições nativas e o Neoxamanismo que adapta a essência com práticas terapêuticas e de linhas diversas numa realidade urbana. O Xamanismo cobre práticas de cura de ancestrais primitivos e

44 O ―XamãsConet‖ é um bom exemplo da representatividade de lideranças do Neoxamanismo urbano, com mais

indígenas ao redor do mundo. Gosto de trabalhar num conceito de Xamanismo Universal, que une o Xamanismo tradicional e o Neoxamanismo num só movimento para uma "Nova Consciência", fazendo conexões entre os conhecimentos esotéricos do Oriente e do Ocidente, sem cair na xenofobia dos povos do passado e nem na banalização típica de muitos movimentos New Age. Atualmente muitos xamãs, inclusive no Peru, rezam para Cristo e aceitam que Jesus foi um Xamã Iluminado. [...] Isso torna muito desafiante a tarefa de separar o que é e o que não é Xamanismo, pois tudo está conectado! Quando percebemos a conexão Universal entre nós e todos os que viveram e que estamos todos ligados, conectados, compreendemos que todas as histórias fazem parte da nossa história. A consciência da conexão é vital ao aprendizado da convivência mútua. Ninguém vence sozinho. Todos temos a necessidade de nos conectar com algo fora de nós, com nossos companheiros de caminhada e com algo maior que nós todos. No Xamanismo, procuramos aprender com as vozes dos ancestrais, dos velhos, das tradições, das crenças. Esse aprendizado é básico para podermos traçar o mapa de nosso caminho de acordo com o livre arbítrio.45

A partir disso, podem-se traçar alguns paralelos, primeiramente, a proposta de ―Xamanismo universal‖ dialoga com a proposta de Michel Harner de Xamanismo Core46

, ou seja, o indivíduo absorve essência de cada xamanismo e cria um sistema próprio.

Na Kiva Urbana, Leo Artese mantem um grupo contínuo de formação de neoxamãs e curiosos, chamado grupo de estudos Voo da Águia. Nesses grupos, que semestralmente reúnem de 20 a 30 pessoas, Leo Artese passa os principais métodos e características do Xamanismo Universal. Destes, alguns podem se inscrever para participar da formação de Multiplicadores da Roda de Estudos Voo da Águia, onde participam de um Workshop no retiro em Itapecerica da Serra, por alguns dias, e recebem a outorga de iniciarem suas próprias Rodas de Estudo, como multiplicadores do Voo da Águia.

Nesse Workshop são passados os seguintes conteúdos:

Completando, agora em 2014, vinte e três (23) anos dirigindo grupos de estudos de Xamanismo para mais de 4.000 pessoas, senti em 2011 o chamado para compartilhar a metodologia com irmãos que estejam habilitados para conduzirem grupos de iniciantes em Xamanismo Universal e serem multiplicadores da Roda de Estudos de Xamanismo Voo da Águia nos vários bairros, cidades e estados do País e também em outros países. A partir dessa jornada de julho de 2011, formamos vinte multiplicadores da Roda Voo da Águia, sendo três da Itália, quatro de outros estados, quatro em outras cidades e oito na capital de São Paulo. Desta forma expandimos a

45 http://www.xamanismo.com.br/Universo/WebHome

Acesso em Ago 2016.

capacidade do Centro de Estudos de Xamanismo Voo da Águia trabalhar na ―Ressacralização da Consciência‖. Formamos irmãos e parceiros, um grupo amoroso e unido; e juntos compartilhamos ferramentas xamânicas, adaptadas ao mundo atual, a fim de enfrentar os males da alma humana, aumentar o poder pessoal integrar o homem à natureza e melhorar a qualidade de vida: Munir os facilitadores com metodologia para que os praticantes de seus grupos possam se reconectar com o Sagrado, buscando o ―Espírito Essencial‖ que está dentro deles, na natureza e em todos os seres.

Capacitar o facilitador xamânico a criar uma atmosfera sagrada, que permita ir além do racional, para que seu grupo possa obter maior equilíbrio físico, emocional, mental e espiritual.

Desenvolver o facilitador com técnicas para inspirar seu grupo a uma nova forma de viver, a compreender melhor a linguagem e a essência do Xamanismo e a estabelecer comunicação com outros níveis de realidade, para que possam obter conhecimento, poder pessoal, equilíbrio, saúde e encontrar a Medicina Pessoal. Aprofundar o estudo das diversas linhas (enteógenas, nativas, néos, doutrinárias, etc.) e conscientizar o multiplicador a trabalhar como canal de cura, ter o conhecimento do poder das plantas, pedras, espíritos dos animais e dos seres da natureza.

Inspirar a devoção à Criação: o Sol, a Lua, as Estrelas e o reconhecimento da presença de Deus em todas as manifestações do Universo.

Credenciar o facilitador numa teia de condutores da Roda de Estudos de Xamanismo Voo da Águia, através do Portal de Xamanismo, divulgações conjuntas, aulas presenciais, apoio de conteúdo e uso exclusivo da metodologia.47

Pode-se concluir que essa metodologia passa então a ser divulgada para diversas pessoas de diversas partes do país, além de outros países. A metodologia da roda de estudos passa pelo conteúdo aplicado atualmente nas diversas rodas de Neoxamanismo. Dividido em 16 módulos, um por semana, além de grupo de e-mail (conteúdo Web), desafios e vivências pessoais e convite para participar da cerimônia Voo da Águia. Tais encontros semanais e tarefas são denominados Rodas de Fogo, A Tribo Virtual, O Passo do Guerreio e o Voo da Águia (Opcional).48 Esses conteúdos são importantes para a formação do xamã urbano.

O caso do Aos Filhos da Terra é um pouco diferente, o líder Sthan Xannia tem uma preocupação de tratar sua formação a partir de um modelo mais próximo da tradicional, sempre com a presença de nativos nos trabalhos e conduzindo cerimônias, mas também oferece esporadicamente uma formação para neoxamãs. Não tem um espaço urbano, e apenas o ―Ecocentro multicultural‖, como chama a chácara onde ocorrem as atividades.

47

http://www.xamanismo.com.br/Voo/SubVoo1323113008 . Acesso em agosto/ 2016.

48

Uma das contribuições de Sthan ao Neoxamanismo no Brasil está na Busca da Visão49, cerimônia anual, a partir do modelo tradicional norte-americano, de meditação na montanha, em jejum, em busca de visões proféticas. Além da tenda do suor, ritual também norte-americano, do qual já se tem estudos a respeito (BRAGA, 2010).

Nesses dois casos (de Artese e de Sthan) observa-se a importante função de lideranças na formação de neoxamãs, que em muitos casos, devido à mobilidade e a facilidade de comunicação, podem estudar em diversos centros xamânicos, e ir fundamentando seu trabalho. Vale ressaltar, que ambos, Leo Artese e Sthan Xannia, tiverem trabalhos realizados junto à Carminha Levy, na Paz Géia no início dessa escola.

Também é possível citar o caso de outros espaços, como o Instituto Inatekié & Centro de Estudos Xamânicos50, coordenado por William Figueiredo, autor desta tese; o NeoXamanismo51, coordenado pelo neoxamã Alecs Auá; também a Aldeia de Shiva – Centro Espiritualista Entheogenista e onde o fundador, Akaiê Sramana, ensina o ―Xamanismo Ancestral‖, além de funcionar como Centro Espírita Indígena.52

A proposta desse espaço é muito interessante, pela introdução de ritos sincréticos com o Hinduísmo, Shivaísmo etc., formando neoxamãs que atuam nesse campo de referência religiosa. Todos oferecem cursos de formação em Neoxamanismo urbano. Há uma extensa lista de espaços já consagrados no roteiro do Neoxamanismo urbano, assim como milhares de espaços ―informais‖ que fazem a prática em um quarto de casa, no quintal etc.

Além dos exemplos relacionados acima, segue-se com a introdução de mais um elemento fundante do movimento, a literatura Neoxamânica, e seus principais autores que são como ―gurus‖ do movimento.

49

http://www.aosfilhosdaterra.com/vision-quest-2017 . Acesso em agosto/ 2016.

50 http://www.inatekie.com.br/ 51

http://www.neoxamanismo.com.br/

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