• Nenhum resultado encontrado

Avaliação da formação continuada no contexto da reforma educacional

1.3 A ênfase nos programas de formação docente e as complexidades envolvidas na

1.3.1 Avaliação da formação continuada no contexto da reforma educacional

Nos últimos 20 anos, têm proliferado estudos sobre a formação continuada ou formação em serviço dos professores como estratégia para desenvolvimento profissional, sua necessidade para a reforma educacional e seu papel na melhoria dos resultados escolares.

Diversos autores apontam que essas ações de formação e desenvolvimento profissional têm sido colocadas no cerne das reformas educacionais (Desimone, 2009; Gatti, 2008; Borko, 2004; Aguerrondo, 2002; Garet; Porter; Desimone et al., 2001; Guskey, 2001; Wilson; Berne, 1999; Guskey; Sparks, 1991, 1996, 2002).

Wilson e Berne (1999), por exemplo, exploraram a centralidade da formação docente nas reformas educacionais principalmente desde o início da década de 1990, em decorrência da profissionalização do magistério e das mudanças nos diversos tipos de avaliação e nos currículos escolares: “reformistas começaram a notar que um currículo mudado e testado não levaria diretamente a mudanças nas práticas de ensino. Novas medidas de desempenho dos alunos implicariam novos caminhos de ensinar. O desenvolvimento profissional foi apontado como bilhete para a reforma”28 (Wilson; Berne, 1999, p. 173, tradução nossa).

Garet et al. (2001) relacionaram a formação de professores à reforma educacional estadunidense mais recente, que focalizou a implementação de novas estruturas curriculares e a definição de expectativas mais elevadas de aprendizagens para os alunos, alinhadas aos conteúdos das avaliações estaduais ou nacionais. Segundo os autores, a partir da análise dos resultados obtidos pelos alunos nas avaliações, percebeu-se que muitos professores não estavam preparados para implementar as práticas pedagógicas delineadas pelo currículo e tampouco conseguiam preparar os estudantes para alcançar os altos padrões de aprendizagem esperados, sendo necessário o investimento em atividades de formação continuada. A formação de professores teria se tornado central não só na reforma educacional estadunidense, mas em nível mundial (Garet at al., 2001, p. 916).

28 “Reformers began to note that changed curriculum and testing would not directly lead to changed teaching

practices. New measures of student performance would entail new ways of teaching. Professional development was touted as the ticket to reform” (Wilson; Berne, 1999, p. 173).

Estudando o papel das atividades de formação continuada para a mudança dos professores no contexto da educação de adultos, Smith e Gillespie (2007) apontaram que a formação continuada se tornou central nas políticas educacionais a partir da comprovação, via pesquisa, de que os professores seriam o fator mais importante para o aumento do aprendizado dos estudantes nas escolas.

Hilda Borko (2004) argumenta que, apesar de o desenvolvimento profissional docente ser reconhecido e valorizado pela legislação estadunidense por meio do ato denominado Nenhuma Criança Deixada para Trás (No Child Left Behind), que assegurou a disponibilidade de educação continuada de alta qualidade para todos os professores, o marco legal é falho na definição dos parâmetros de qualidade de formação continuada ou de como se deveria tornar essa formação disponível para os professores. Em sua revisão das pesquisas sobre os programas de formação disponíveis, Borko concluiu que, a despeito dos vultuosos gastos com formação continuada para professores nas diversas instâncias administrativas, as ações resultam inadequadas, fragmentadas, intelectualmente superficiais e deixam de considerar o conhecimento já acumulado sobre como os professores aprendem (Borko, 2004, p. 4).

No Brasil, observa-se um impulso à educação continuada a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal n. 9.394/96), cujo Artigo 80o estipula que o poder público deve estimular o desenvolvimento e a veiculação de programas de educação continuada. Além disso, a partir da instituição do Fundef, em 1997, e do Fundeb, em 2007, verificou-se a operacionalização do marco legal presente na lei da educação nacional no que tange ao desenvolvimento profissional e à educação continuada (em serviço) dos professores pela vinculação de verbas públicas destinadas a sua concretização.

Gatti (2008) ressaltou que o tema da educação continuada adquiriu relevo no âmbito das políticas públicas em nível mundial na década de 1990, destacando documentos do Banco Mundial, do Programa de Promoção das Reformas Educativas na América Latina (Preal), da Unesco e do Fórum Mundial da Educação como importantes veiculadores da ideia de preparar melhor os professores.

De todo modo, a tendência a direcionar políticas públicas para a formação de professores aparece relacionada à possibilidade de melhoria da qualidade de ensino. Inclusive, trabalhos como os de Franco (2005) e Fuller e Clarke29 (1994, apud Brunner, 2003) exploram a formação do professor como definidora da qualidade do ensino oferecido.

29 FULLER, B.; CLARKE, P. Raising school effects while ignoring culture? Local conditions and the influence

Contudo, outros autores são mais resistentes, ao afirmar que há uma relação direta entre formação do professor e qualidade de ensino e mesmo aprendizado dos alunos, havendo muita controvérsia sobre a intensidade e o sentido da relação entre formação docente e aprendizagem discente. A pesquisa bibliográfica detectou poucas referências em que se estudassem mais profundamente as relações entre os resultados das avaliações e a elaboração de programas de formação.

Para Rosa Maria Torres (1998), o processo de ensino e aprendizagem não pode ser visto como uma relação de insumo-produto, na medida em que o aprimoramento de um fator não necessariamente leva ao do outro:

Não existe uma relação mecânica entre conhecimento do professor e aprendizagem do aluno ou entre capacitação do professor e rendimento escolar: não se pode esperar que cada ano de estudos, cada curso ou oficina de capacitação resulte imediata e necessariamente em quantidades mensuráveis de aprendizagem (melhorada) por parte do alunado. Essa visão corresponde a uma percepção da educação e da aprendizagem escolar que equipara escola e fábrica e vê o ensino e a aprendizagem à luz do modelo fabril insumo-produto (inputs-outputs) (Torres, 1998, p. 175).

Souza (2006) acredita que a formação de professores tem desconsiderado a escola e seus contextos sociais e institucionais, tomando os professores como elementos isolados, razão pela qual potencialmente essas atividades não incidem sobre a prática docente ou sobre a escola. Para a autora, é necessário tomar a escola como locus privilegiado da ação dos professores e as atividades propostas não podem desconsiderar os saberes já construídos por eles, concluindo que, enquanto não se romperem antigas concepções de formação continuada, pouco avançarão os resultados das escolas em função dela.

Há ainda os que se dedicam à problemática da avaliação docente baseada nos resultados dos alunos, tendência que vem sendo enfatizada juntamente com o desenvolvimento dos sistemas de avaliação.

Apesar da postura mais crítica de Torres (1998) e Souza (2006), a maioria das reformas educativas tem partido da premissa de que a educação continuada em serviço é boa por definição, pouco se questionando se as atividades de formação realmente fazem diferença. Seja como for, o processo de formação docente envolve diversas facetas, e a mudança pedagógica, quando existe, não é necessariamente imediata à participação do professor em atividades de formação. Mesmo assim, para Guskey (1991), nesse momento que ele denomina

age of accountability, deve-se compreender a relação entre as atividades de desenvolvimento

profissional e os resultados dos alunos e, para tanto, cumpre avaliar os programas de formação.

Assim, as demandas por accountability requerem que se pesquise se o investimento na formação dos professores enseja melhoria no aprendizado dos alunos. O autor argumenta que já não basta avaliar o programa de formação de professores em relação a seu atendimento, sua abrangência, sua proposta ou seus resultados sobre os participantes; antes é preciso avançar nessa avaliação, que, aliada à pesquisa, permite desvendar a “rede de fatores confluentes e que se interpenetram gerando uma rede de causas, fatos e efeitos” que interferem na realidade educacional e, portanto, na qualidade do ensino (Vianna, 2000, p. 23).

Todavia, essa tarefa não é simples. A maioria das avaliações, estudos avaliativos ou pesquisas sobre formação continuada de professores têm atentado para o papel da formação docente no âmbito das reformas (Aguerrondo, 2002; Fullan, 1993; Little, 1993) para a avaliação dos diversos tipos de atividade de formação contínua docente e de sua qualidade (Borko, 2004; Wilson; Berne, 1999), para a formação do professor e o processo de mudança (Gatti, 2003) ou para a avaliação dos efeitos do programa de formação nas práticas e concepções dos docentes (Desimone, 2009; André, 2008), sendo poucas ainda as que se preocupam de estudar os efeitos da formação sobre os resultados dos alunos (Wallace, 2009; Ingvarson; Meiers; Beavis, 2005; Supovitz, 2001). Os autores que se dedicam ao tema arrolam as dificuldades para que se façam mais avaliações de impacto de programas de educação continuada, de que se trata na próxima seção.

1.3.2 Dificuldades de avaliar impactos ou efeitos da formação continuada e dimensões

Outline

Documentos relacionados