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Estrutura interna e funcionamento do programa Letra e Vida

2.2.1 Antecedentes, objetivos e abrangência

Implantado na rede estadual de ensino paulista a partir de 2003, o programa Letra e Vida derivou do Programa de Formação de Alfabetizadores (Profa), formulado e implantado no âmbito da Secretaria de Educação Fundamental (SEF) do MEC em 2001.

O PROFA havia nasciso no fim de outubro de 1999, e a ideia original, segundo documentação oficial, era produzir programas em vídeo a serem transmitidos pela TV Escola, acompanhados de um guia de orientações sobre como trabalhar os conteúdos veiculados (Brasil, 2002). Esse planejamento foi alterado e ampliado ao longo do ano 2000, culminando na decisão de produzir material escrito de suporte para cada unidade planejada anteriormente. Segundo a “Biografia do Programa”, incorporada na coletânea de textos do módulo 3 do Programa Letra e Vida, com o Profa, nasceu “oficialmente um projeto de formação de alfabetizadores de caráter nacional, com a tarefa de acelerar a revolução conceitual anunciada há cerca de vinte anos na alfabetização” (São Paulo, 2005b).

O Profa começou a ser implementado em janeiro de 2001, nas secretarias de educação e universidades que atendiam às condições necessárias ao seu desenvolvimento, e,

ao mesmo tempo, se produzia o material que seria usado nos módulos 2 e 3. No âmbito federal, o programa durou até o final de 2002, quando foi descontinuado.1

Ao ser incorporado pela SEE/SP, o Programa passou a chamar-se Programa de Formação de Professores Alfabetizadores Letra e Vida. Segundo a supervisora, a mudança se limitou ao nome, mantendo-se as características originais.

O Letra e Vida destinava-se a professores alfabetizadores tanto da Educação Infantil quando do Ensino Fundamental I, que lecionassem para crianças ou para adultos, mas professores de outras séries do nível I do Ensino Fundamental também poderiam participar do programa. A adesão ao curso era voluntária.

Além disso, também objetiva formar profissionais que atuassem como formadores de professores em nível local. Nas palavras de Gabriel Chalita, secretário de educação à época da implantação do Programa:

O programa Letra e Vida, de formação de professores alfabetizadores, representa um esforço de várias instituições educacionais federais, estaduais, municipais, públicas e particulares, no sentido de desenvolver, de forma contínua, mecanismo e ações eficazes para a capacitação de educadores que trabalham com a formação inicial do aprendiz (Chalita, 2003, s/p).

A análise da documentação2 do Programa permitiu observar que os princípios gerais que o haviam balizado durante a implantação pelo MEC foram assumidos em sua continuidade, na SEE/SP. Como explicou a consultora desta Secretaria, que supervisiona o Programa, não há diferenças significativas entre eles:

Consultora: Ele [o Letra e Vida] é o mesmo [Profa]. Só que acontece que

um governo não assina embaixo do que o outro governo fez. Então, eles mudam a capa e o nome. Agora, você abre [o material] e, desde a segunda página, que diz lá, ministro, presidente da República, tudo igual ao Profa. [...] Os pressupostos são os mesmos, mas os objetivos, não. O Profa e o Letra e Vida formam professores, o trabalho está voltado para a sala de aula. O material está todo centrado no que é possível fazer na sala de aula, como, porque [...] O Ler e Escrever tem mudanças.

1 Num texto de Telma Weisz veiculado no sítio da Cenp, uma nota de rodapé amplia os direitos sobre o material

produzido pelo programa: “Os direitos autorais do Profa pertencem ao Estado brasileiro e é vedada qualquer forma de comercialização destes”. Por essa afirmação, infere-se que o material pertenceria à educação pública e a seus atores. Possivelmente, é essa concepção que leva à divulgação parcial, em sítios, do material de apoio produzido para a continuidade do programa – o programa Ler e Escrever. No entanto, chama atenção que as coletâneas de textos e vídeos produzidos para os módulos ainda não estejam disponíveis para o público geral (Weisz, s/d, s/p).

2 Na etapa da pesquisa documental, foi uma constante a dificuldade de encontrar material oficial, sobretudo a

legislação de implantação do Letra e Vida. Mesmo a busca pelos atos normativos referentes ao programa no arquivo do Diário Oficial do Estado foi infecunda: a grande maioria dos atos encontrados referia-se a convocações da equipe e dos professores participantes do programa para reuniões ou ações de formação. Nesse sentido, a caracterização apresentada aqui baseia-se principalmente em material disponível no sítio da Secretaria de Educação entre 2006 e 2010, nas coletâneas de textos do programa e em depoimentos de sua supervisora e de sua coordenadora na FDE (Apêndices B e C).

Pesquisadora: Mas, da forma como os encontros de formação eram

conduzidos, houve alguma mudança pela experiência prévia do Profa ou ele continuou seguindo a mesma linha?

Consultora: É, a gente aprende um pouco no caminho. A gente deu mais

peso para umas coisas e rebaixou outras, deu menos peso; coisas que a gente foi vendo ao longo do tempo, mas em que você mexe só mesmo na execução do programa. Os conteúdos não mudaram, nada mudou – os vídeos não poderiam mudar, nem o material impresso; é tudo absolutamente idêntico.

Pesquisadora: Essas diferenças são mais na forma de execução do que no

material...

Consultora: Nem na forma, viu? São diferenças mais no peso que a gente

‘tava dando a certos aspectos e aumentando o peso em alguns aspectos. Nada que afetasse estruturalmente o programa (Consultora da SEE/SP, Apêndice B3).

De acordo com a apresentação do Letra e Vida, seus principais objetivos eram:

• Melhorar significativamente os resultados da alfabetização no sistema de ensino estadual, tanto quantitativa quanto qualitativamente.

• Contribuir para uma mudança de paradigma no que se refere tanto à didática da alfabetização quanto à metodologia de formação dos professores.

• Contribuir para que se formem, na base do sistema estadual de educação, quadros estáveis de profissionais capazes de desenvolver a formação continuada de professores alfabetizadores.

• Contribuir para que tanto as diretorias de ensino quanto as unidades escolares sintam-se responsáveis pela aprendizagem de todos os seus alunos.

• Favorecer a ampliação do universo cultural dos formadores e dos professores cursistas, principalmente no que se refere ao seu letramento (Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas, s/p).

Segundo dados da SEE, entre 2003 e 2006, o Letra e Vida abrangeu 73 núcleos de formação, atingindo 1.060 coordenadores de grupo da rede estadual e quatro coordenadores de grupo da rede municipal, que poderiam atuar como formadores de professores4. Quanto aos alfabetizadores, participaram do curso 50.367 da rede estadual e 11.785 da rede municipal5 (Programa Letra e Vida, 2007).

3 Todos os anexos e apêndices desse trabalho encontram-se no CDROM, em arquivo eletrônico.

4 Daqui em diante, os formadores de professores serão designados apenas “formadores”, e os professores

participantes, “cursistas”.

5 Nota veiculada em setembro de 2004, em comemoração ao Dia da Alfabetização, que permite inferir a

grandiosidade do projeto: “Desde abril de 2003, cerca de 20 mil professores de todo o Estado – o que equivale a 50% do corpo docente de 1ª a 4ª série – estão participando da capacitação. A meta é que 100% dos professores concluam o curso até dezembro de 2006. Os investimentos no Letra e Vida chegam a R$ 12 milhões e, com isso, 700 mil alunos já foram beneficiados” (Centro de Referência em Educação Mário Covas, 2004, s/p).

2.2.2 Estrutura e organização do curso

O curso teve três módulos, cada qual com um número variável de unidades, e todos terminaram com uma avaliação do cursista, individual ou em grupo. Os módulos deveriam ser cursados em quarenta e cinco semanas, que podiam ser estendidas, em caso de necessidade. A cada semana, previam-se encontros presenciais com duração de três horas, uma das quais se destinava ao que se chamou “trabalho pessoal” (Guaratinguetá, s/d).

Segundo a seção “Estrutura do Programa de Formação de Professores Alfabetizadores”, integrante do documento Programa Letra e Vida, a organização dos módulos era temática, com tópicos específicos inter-relacionados (Guaratinguetá, s/d).

O primeiro módulo estruturou-se sobre conteúdos de fundamentação teórica, focalizando processos de aprendizagem de leitura e escrita e didática da alfabetização. Segundo as concepções de ensino veiculadas nesse módulo, leitura e escrita são processos de reconstrução conceitual que ocorrem quando o aluno reflete sobre as características do sistema de escrita e seu funcionamento. Compõem a apostila exemplos de atividades produzidas por alunos em fase de alfabetização, reflexões de professores da rede e textos teóricos de fundamentação da prática, como se vê na reprodução do sumário feita no Quadro 1 (Anexo A). Coerentemente com a estrutura do módulo, o material distribuído aos participantes subdividia-se em onze unidades, e em todas se observou a preocupação em oferecer aos cursistas textos literários, além de teóricos.

O segundo módulo discutia questões ligadas à prática de sala de aula, favorecendo a reflexão do cursista sobre pressupostos e atividades de alfabetização na perspectiva de Emilia Ferreiro. Nas dez unidades que o compuseram, havia ainda considerações teóricas sobre o ensino de leitura e a organização e o gerenciamento da sala de aula, conforme listagem das atividades do Quadro 2 (Anexo A).

Finalmente, o módulo 3, com oito unidades, aprofundava os conteúdos discutidos no módulo anterior, ampliando-os para reflexões pertinentes à proposta de ensino centrada no desenvolvimento das estruturas textuais das produções infantis, bem como na tematização de aspectos formais relacionados ao uso da língua: ortografia e pontuação. O desenvolvimento de estratégias de leitura pelos alunos também continuava sendo tematizado, como se vê pelos conteúdos trabalhados, reproduzidos no Quadro 3 (Anexo A).

Independentemente da unidade ou do módulo a que pertenciam, os encontros tinham estrutura algo semelhantes. No documento de apresentação do Programa, está claro que, em cada encontro, haveria cinco atividades:

Três atividades são permanentes, ou seja, acontecem em todos os encontros: a Leitura Compartilhada de textos literários, realizada pelo professor formador para o grupo; a Rede de Ideias, que é um momento de os professores compartilharem suas ideias, opiniões e dúvidas a partir das propostas no Trabalho Pessoal; e o Trabalho Pessoal, que envolve situações de leitura e/ou escrita a serem realizadas fora do grupo, com o objetivo de complementar o que foi tratado no encontro. As demais atividades propostas variam, mas têm como orientação metodológica geral a tematização da prática dos professores, o planejamento e o desenvolvimento de propostas de ensino e aprendizagem, o intercâmbio a partir do conhecimento experiencial que possuem e a discussão das necessidades/dificuldades que enfrentam no trabalho pedagógico (Brasil, 2001, p. 20).

O material para divulgação do Letra e Vida aos professores permite inferir que a estrutura de atividades na versão paulista do programa permaneceu igual à descrita anteriormente: mantiveram-se a leitura compartilhada, a rede de ideias e o trabalho pessoal como atividades permanentes e se deixou espaço para duas atividades de teorização da prática, que podiam variar a cada encontro (Maduro, 2010).

Além disso, no Letra e Vida, definiu-se um conjunto de competências a serem desenvolvidas pelos participantes, distribuídas entre os módulos e denominadas “expectativas de aprendizagem”. No documento do módulo 1, apresentam-se dez competências básicas, detalhadas em habilidades mais específicas. Mais do que comunicar aos cursistas o que se esperava que construíssem ao final do trabalho, essas expectativas norteavam a avaliação realizada ao fim de cada módulo. São exemplos de expectativas de aprendizagem:

Reconhecer a importância de ler diariamente bons textos para os alunos, compreendendo que esse tipo de prática requer planejamento, critérios de qualidade e diversidade para a seleção dos textos e leitura prévia dos mesmos (Módulo 1).

Planejar intervenções pedagógicas adequadas (Módulo 1) (Brasil, 2003, s/p). Identificar as principais variáveis que interferem na aprendizagem e fazer

uso desse conhecimento para organizar o trabalho pedagógico (Módulo 2). Desenvolver procedimentos necessários para elaborar uma rotina de

trabalho pedagógico que responda às necessidades de aprendizagem dos alunos em relação ao processo de alfabetização e letramento (Módulo 2) (São Paulo, 2003a, s/p).

Organizar uma proposta de apoio pedagógico para os alunos com dificuldade na aprendizagem da leitura e escrita (Módulo 3).

Compreender algumas das principais questões que envolvem o aprendizado da gramática e compreender que é no interior da situação de produção de texto que os conhecimentos sobre os aspectos gramaticais ganham utilidade (Módulo 3) (São Paulo, 2005b, s/p).6

Nota-se que algumas expectativas são mais gerais e outras, mais específicas, relacionadas aos conteúdos abordados. Algumas se repetem nos três módulos, enquanto outras figuram em um e outro momento do curso. O módulo 1 traz vinte e seis expectativas, o módulo 2, dez específicas (e retoma 18 das expectativas do módulo 1), e o módulo 3, doze específicas (e também incorpora as gerais dos módulos anteriores).

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