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Breve escorço biográfico de Xavier Marques: jornalista e escritor, via de regra,

2. RASTROS DA VIDA INTELECTUAL NA BAHIA: A CAMPANHA

2.4 Breve escorço biográfico de Xavier Marques: jornalista e escritor, via de regra,

2.4 Breve escorço biográfico de Xavier Marques: jornalista e escritor, via de regra, abolicionista.

Francisco Xavier Ferreira Marques, nascido em Itaparica a 1861, primogênito entre os três filhos do casal Vicente Avelino Ferreira Marques e Florinda Agripina, foi um dos escritores baianos de seu tempo que mais gozou de prestígio nacional. Entre os seus contemporâneos e antecessores encontram-se à sua frente apenas três nomes em grau de popularidade: Castro Alves (1847-1871), Rui Barbosa (1849-1923) e Afrânio Peixoto (1876- 1947). Foi um artista pioneiro por trazer para a ficção brasileira a paisagem e os personagens característicos de Salvador, Itaparica e Recôncavo baiano, em contos e romances que compuseram a sua obra de ficção, cuja produção se manteve constante por um período de 50 anos34 (SALLES, 1969).

Xavier Marques nasceu em um lar de classe média baixa. Seu pai possuía um barco e fazia transporte de passageiros e de cargas entre Salvador e Itaparica; não possuía maiores recursos e terminou exercendo a atividade de comerciante em Itaparica. Marques perdeu a mãe aos seis anos de idade e, com os irmãos, foi criado por uma tia materna, D. Emília Joaquim Bernardes.

Ainda em Itaparica, cursou o primário com o professor Genuíno Imbirussu Camacã, egresso de uma família de latinistas. Este foi o seu único curso formal; porém, nas palavras de Salles (1977), "como autodidata, Marques chegou a ter educação a considerar de nível universitário em aspectos linguísticos e literários" (SALLES, 1977, p. 215).35 Ainda em Itaparica, durante a adolescência, fez a sua primeira incursão pelo jornalismo em um periódico de um palmo que se chamava Cosmos, quase homônimo da famosa publicação

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Sua primeira obra de ficção, Simples Histórias, foi publicada em 1886 pela tipografia do Jornal de Notícia; a sua última obra nesse gênero, Terras Mortas, é de 1936, o que perfaz 50 anos de produção. Seu último livro, publicado pela editora carioca José Olímpio, constitui uma obra de ocaso e foge da temática que caracteriza a prosa do autor (SALLES, 1977). Trata-se de um romance de caráter regionalista sobre a vida sertaneja e, provavelmente, representa uma "aventura" de Marques pela estética modernista de cunho sociológico, movida pelo êxito do romance nordestino a partir de 1928.

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Machado Neto (1973) destacou o autodidatismo como uma constante na formação dos intelectuais entre 1870- 1930. Apesar da maioria dos "informantes", compreendidos na amostra de 60 escritores, possuírem diploma de bacharel ou doutor, quase todos os escritores foram autodidatas nos campos de atuação nas letras, como jornalismo, literatura, etnografia, história e crítica literária, não tendo recebido formação acadêmica específica na área onde se tornaram reconhecidos.

carioca Revista Kósmos, onde se destacaram, por exemplo, as crônicas de Bilac representativas da vida na Belle Époque carioca. No periódico itaparicano, Marques fez às vezes de redator, sendo responsável pela composição dos artigos de fundo.

Em 1882 foi morar na capital baiana. Nesse ponto é interessante salientar a sua condição de primogênito, sendo esta um traço comum na biografia dos literatos do período (MICELI, 2001). A trajetória de Xavier Marques indica um investimento especial na sua formação, por parte da família, que subsidia suas primeiras letras e envia-o à capital assim que ele completa a maioridade. Aparentemente, a teia de relações e o pouco prestígio do qual dispõe o seu clã de origem não possibilitam que Marques venha a tornar-se bacharel ou doutor nos dois cursos universitários existentes no Nordeste, a Faculdade de Medicina da Bahia e a Faculdade de Direito de Recife. Através da amizade com o Cônego Francisco Bernardino de Souza, Marques inicia a vida profissional assim que aporta na capital, lecionando em escolas primárias, na instituição dirigida pelo próprio Cônego Francisco B. de Souza e na escola de Raimundo Bizarria. Ou seja: o magistério serviu-lhe como porta de entrada e sustentação do início da sua carreira como escritor, à semelhança de outros escritores do período, cujas trajetórias foram analisadas por Machado Neto (1973).

Por outro lado, o jornalismo era o seu intento. Já em 1885, depois de ter publicado o seu primeiro livro de versos, Temas e Variações, Xavier Marques ingressa no Jornal de Notícias36, iniciando uma carreira duradoura na imprensa diária que só iria deixar em 1919, quando já exercia o cargo de Deputado Estadual. A atividade como jornalista iniciada em 1885 fez parte do cotidiano do escritor por mais de trinta anos (SALLES, 1969).

Chegando a Salvador em 1882 aos 21 anos, buscando nas letras o caminho para a conquista de uma colocação social, adentrando logo no jornalismo em 1885 pelo Jornal de Notícias, sendo rapidamente alçado do posto de colaborador a redator, é natural que a questão da escravidão tenha perpassado a sua biografia. Xavier Marques foi também um abolicionista (Albuquerque, 2009), item que não podia faltar na trajetória desse intelectual que, segundo Eugênio Gomes (1969), definia o seu próprio papel com a seguinte assertiva: "o escritor é um homem público. Tem uma função e um dever social" (Gomes, 1969 p. 195). Esta frase soa como uma síntese do papel missionário que a intelectualidade brasileira outorgava a si (Pécaut, 1990). A afeição às pugnas na imprensa e às polêmicas literárias é um traço da

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X. Marques adentra o jornalismo através do prestígio adquirido com seus versos, que começam a ser publicados no Jornal de Notícias pela iniciativa de um dos seus redatores, João Augusto Neiva, que fez de Xavier Marques um colaborador efetivo do diário (Salles, 1969).

experiência dessa "mocidade do império", à qual pertenceu o próprio Xavier Marques, e da qual lembra com saudade ao confrontá-la com a juventude do período republicano, cooptada pelas seduções proporcionadas "pela política e a indústria como fatores do milhão" (MARQUES, 1928, p. 186).

Por fim, mesmo o autor do romance Dois metros e Cinco — obra hoje esquecida, mas de grande repercussão entre a juventude de Salvador em 1912 (Carvalho Filho apud Oliveira, 2007) — José Manuel de Oliveira Cardoso, que trilhou a formação de diplomata e que, por essa razão, não encontra diante de si a questão da abolição como parte de uma vivência na esfera pública urbana da qual era mister participar ao adentrar o círculo intelectual, flerta também com a causa. Nascido em Salvador em 1865, diplomou-se na Faculdade de Direito de Recife em 1885 e publicou no último ano do curso o poemeto "Os Precitos da Senzala", com o qual afirma pela primeira vez o seu pendor para as letras "desinteressadas", no dizer de Berbert de Castro37.