e) Líbano: Tribunal Especial para o Líbano ou “Tribunal Hariri”
2.5.1 Breve Histórico
Com o fim da Guerra Fria, as Nações Unidas já vinham considerando o estabelecimento de um tribunal penal internacional, tendo a Assembleia Geral requerido à Comissão de Direito Internacional a tarefa de realizar um estudo a respeito246. A Comissão
terminou seu trabalho em 1994247, apresentando um detalhado e abrangente relatório. A
Assembleia Geral criou em 1996 um Comitê Preparatório para o Estabelecimento de um Tribunal Penal Internacional (PrepCom), apresentando na “Conferência Diplomática de Plenipotenciários das Nações Unidas sobre a criação de um Tribunal Penal Internacional” de Roma, de 15 de junho a 17 de julho de 1998248, uma Proposta de Estatuto com sugestões
e opções de redações aos seus 116 artigos.
Depois de intensas negociações, finalmente o projeto com as emendas foi submetido à Comissão Plenária, que concentrava a principal missão de articular a redação e a coordenação dos grupos de trabalho. A Comissão de Redação era presidida por M. Cheriff BASSIOUNI, com destacado papel na coordenação e consistência dos encaminhamentos feitos ao projeto para a Comissão Plenária. Os Estados Unidos249 tentaram emendar o projeto
para que o Tribunal não pudesse julgar membros de suas forças armadas em operações militares em outros Estados, mas o assunto não entrou em discussão a pedido da Noruega. Os Estados Unidos pediram, então, que se votasse o projeto. O resultado foi a aprovação do Estatuto de Roma e do TPI, com 120 votos a favor, 21 abstenções e 7 votos contrários. Ainda que fosse secreta, Estados Unidos, Israel e China afirmaram que votaram contra.
246 Resolução da AG das Nações Unidas, 44/39 de 4 de dezembro de 1989.
247 Report of the International Law Commission, 46ª sessão, 2 de maio a 22 de julho de 1994.
248 O interesse que despertou a conferência se reflete na quantidade de participantes que acompanharam as sessões: 160 países e como observadores 20 organizações internacionais, 14 agências especializadas das Nações Unidas e uma coalizão formada por cerca de 200 organizações não-governamentais, além de 474 jornalistas credenciados. O papel das ONGs debatendo e criticando os documentos e fazendo pressão para um maior número de adesões foi apresentado em diversos artigos, como PACE, William; THEIROFF, Mark, “Participation of NGOs”. In: LEE, Roy. The International Criminal Court, the Making of the Rome Statute, Issues, Negotiations and Results. Haia: Kluwer Law International, 1999, pp. 391-398.
249 SEWALL, Sarah B.; KAYSEN, Carl (eds.), The United States and the ICC: National Security and
96 A Ata Final da Conferência250 ordenou a constituição de uma Comissão
Preparatória encarregada de elaborar os diversos documentos que complementariam o funcionamento do Tribunal, quais sejam: as regras para o procedimento e prova, os elementos dos crimes, um acordo entre a relação entre o Tribunal e a ONU, os princípios básicos do acordo relativos à sede do Tribunal, o regulamento financeiro, um acordo sobre privilégios e imunidades do Tribunal, um orçamento para o primeiro exercício financeiro e as regras para o funcionamento da Assembleia dos Estados Partes251.
Encerrava-se, com isso, um longo caminho iniciado no final do século XIX252 e
que inscreveu na história um arcabouço institucional único dentro do direito internacional dos direitos humanos, um dos mais importantes paradigmas para a proteção internacional dos direitos humanos desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Após mais de 50 anos da declaração das normas protetivas que modificou o repertório das relações internacionais desde então, o Tribunal Penal Internacional é saudado como um mecanismo de aplicação efetiva do direito nos casos das piores violações dos direitos humanos253.
Atualmente o TPI está investigando a situação de crimes contra o direito internacional de sua competência nos seguintes países:
a) Uganda: Casos contra Joseph Kony, Vincent Otti, Okot Odhiambo e Dominic
Ongwen254;
250 Doc. ONU A/CONF.183/10 de 17 de julho de 1998. 251 Idem, Resolução F.
252 Referência feita ao Projeto Moynier, de 1872.
253 Cf. URIOS MOLINER, Santiago. “Antecedentes históricos de la CPI”, in La Corte Penal Internacional –
un estudio interdisciplinar. Valência: Tirant lo Blanch, 2003, pp. 23-59. Para além dos objetivos enunciados no Tratado, JAPIASSÚ identifica o projeto do TPI com o projeto para a paz perpétua de Kant, animado pela expectativa de um direito cosmopolita que procurasse assegurar uma hospitalidade universal. JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. O Tribunal Penal Internacional – a internacionalização do direito penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, pp. 117 ss.
97 b) República Democrática do Congo: Casos contra Thomas Lubanga Dyilo255; Bosco Ntaganda256; Germain Katanga257; Mathieu Ngudjolo Chui258; Callixte Mbarushimana259 e Sylvestre Mudacumura260;
c) Darfur, Sudão: Casos contra Ahmad Muhammad Harun (”Ahmad Harun”) e Ali Muhammad Ali Abd-Al-Rahman (“Ali Kushayb”)261; Omar Hassan Ahmad Al Bashir262; Bahar Idriss Abu Garda263; Abdallah Banda Abakaer Nourain264 e Abdel Raheem Muhammad Hussein265;
d) República da África Central: Casos contra Jean-Pierre Bemba Gombo266, Aimé Kilolo Musamba, Jean-Jacques Mangenda Kabongo, Fidèle Babala Wandu e Narcisse Arido267;
e) República do Quênia: Casos contra William Samoei Ruto e Joshua Arap Sang268 e Uhuru Muigai Kenyatta269 e Walter Osapiri Barasa270;
f) Líbia: Casos contra Muammar Mohammed Abu Minyar Gaddafi, Saif Al-Islam
Gaddafi e Abdullah Al-Senussi271; e
g) Costa do Marfim: Casos contra Laurent Gbagbo272, Simone Gbagbo273 e Charles Blé Goundé274. 255 Caso ICC-01/04-01/06 256 Caso ICC-01/04-02/06 257 Caso ICC-01/04-01/07 258 Caso ICC-01/04-02/12 259 Caso ICC-01/04-01/10 260 Caso ICC-01/04-01/12 261 Caso ICC-02/05-01/07 262 Caso ICC-02/05-01/09 263 Caso ICC-02/05-02/09 264 Caso ICC-02/05-03/09 265 Caso ICC-02/05-01/12 266 Caso ICC-01/05 -01/08 267 Caso ICC-01/05-01/13 268 Caso ICC-01/09-01/11 269 Caso ICC-01/09-02/11 270 Caso ICC-01/09-01/13 271 Caso ICC-01/11-01/11 272 Caso ICC-02/11-01/11 273 Caso ICC-02/11-01/11 274 Caso ICC-02/11-02/11
98 A Procuradoria do TPI está realizando investigações preliminares em relação a diversas ocorrências reportadas ainda na República Central Africana, Mali, Afeganistão, Geórgia, Guiné, Colômbia, Honduras, Coreia e Nigéria.