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Propostas de Interven¸c˜ao Social no Combate `a Discrimina¸c˜ao

e Xenofobia nos Servi¸cos P´ublicos: Media¸c˜ao Preventiva,

Media¸c˜ao Passiva e Media¸c˜ao Ativa

Media¸c˜ao Preventiva

A media¸c˜ao s´ociocultural preventiva tem um conjunto de medidas para evi- tar o aparecimento de conflitos. Uma delas ´e criar la¸cos de confian¸ca com os familiares que tˆem a crian¸ca internada no Hospital D. Estefˆania, de maneira que se for necess´ario passar para a media¸c˜ao ativa, exista um maior sucesso na resolu¸c˜ao dos conflitos. Por exemplo: falar com os familiares apresentando-me como mediador cigano, falando com eles no nosso dialeto.

Media¸c˜ao Passiva

A media¸c˜ao s´ociocultural passiva existe quando o mediador est´a num lugar estrat´egico a desempenhar fun¸c˜oes com os utentes onde quase de certeza ir´a interagir com pessoas de etnia cigana facilitando a comunica¸c˜ao e a assimila¸c˜ao das regras do servi¸co hospitalar. Por exemplo: na consulta externa e no controlo de visitas.

A media¸c˜ao s´ociocultural ativa, define-se quando o mediador ´e chamado aos servi¸cos onde j´a existam conflitos entre os utentes e os profissionais ou quando solicitado pelos utentes de etnia cigana. Neste caso, o mediador ´e um facilitador de comunica¸c˜ao fazendo um filtro entre utentes e profissionais passando toda a informa¸c˜ao por ele, podendo at´e fornecer algumas estrat´egias de resolu¸c˜ao. `As vezes, o mediador faz a ponte entre os utentes e o seu l´ıder espiritual.

Como mediador cultural pertencendo `a etnia cigana, julgo que o combate `a exclus˜ao social e o acesso aos servi¸cos p´ublicos s´o se resolve quando o ACIDI trabalhar no terreno junto das institui¸c˜oes p´ublicas como observadores inde- pendentes e efetuarem relat´orios para averiguar se as institui¸c˜oes p´ublicas tˆem efetivamente meios que protejam os utentes da discrimina¸c˜ao e da xenofobia e se esses meios s˜ao eficientes na prote¸c˜ao contra a discrimina¸c˜ao.

Na minha perspetiva e de acordo com a minha experiˆencia de trabalho, o ACIDI deve propor uma forma¸c˜ao obrigat´oria que deve dar aos t´ecnicos que trabalham com a popula¸c˜ao cigana, nomeadamente no que se refere `a im- portˆancia do dialogo intercultural e da compreens˜ao da cultura cigana. Esta forma¸c˜ao deveria ser anual nos hospitais e noutras estruturas de sa´ude que tˆem utentes de origem cigana.

Outro aspeto que gostava de salientar ´e sobre a necessidade de nos servi¸cos de atendimento serem facultados impressos pr´oprios aos utentes de etnia cigana que se sintam discriminados para serem mais tarde observados e examinados por algu´em do ACIDI, a fim de se concluir se existiu efetivamente discrimina¸c˜ao ou n˜ao. Para fazer este trabalho de acompanhamento deveria ser criado um Observat´orio das pr´aticas dos profissionais de sa´ude.

O Mediador Cultural ´e ´util? SIM, muito. Mas o Mediador Cultural s´o existe porque a institui¸c˜ao assim o quer, podendo dispens´a-lo quando quiser. Por isso mesmo, um observador independente e competente nesta ´area tem, a meu ver, mais peso no combate `a discrimina¸c˜ao e xenofobia contra os utentes ciganos do que s´o o Mediador Cultural.

Nem tudo ´e dinheiro! `As vezes ´e preciso ter boa vontade e trabalho.

O que me preocupa n˜ao ´e o grito dos maus.

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E o silˆencio dos bons.



Sim. . . mas n˜ao `a nossa porta!



C´eu Neves

N˜ao sou cientista, t´ecnica, autoridade, dirigente pol´ıtica ou associativa. Sou uma jornalista que observa a realidade com a inten¸c˜ao de a descrever a um p´ublico o mais alargado poss´ıvel, amplificando muitas das situa¸c˜oes, dos pro- blemas, dos projetos, das iniciativas e das hist´orias de vida da popula¸c˜ao, no- meadamente das comunidades ciganas. ´E este o contributo que pretendo trazer a este painel.

Estima-se que sejam 50 mil os ciganos portugueses, mas poder˜ao ser cem mil ou at´e mais. A imprecis˜ao dos n´umeros ´e propositada, porque significa que n˜ao se conhece a real dimens˜ao de uma comunidade que faz parte de Portugal h´a mais de 500 anos, embora muitas vezes surja associada ao tema da imigra¸c˜ao. A que se junta mais dois temas (ou subtemas): racismo e discrimina¸c˜ao. Os estudos cient´ıficos demonstram que a etnia cigana ´e das mais discriminadas, cidad˜aos considerados pela popula¸c˜ao como parasitas, que n˜ao pagam im-

postos e que s˜ao os grandes benefici´arios do Rendimento Social de Inser¸c˜ao. Os coment´arios aos trabalhos jornal´ısticos sobre os ciganos (muitos deles an´onimos, ´e verdade) s˜ao, tamb´em, elucidativos dessa discrimina¸c˜ao.

A discrimina¸c˜ao ´e real em Portugal, mas tamb´em na Uni˜ao Europeia, o que ´e reconhecido pelo Conselho Europeu ao instigar os governos a redefinir as es- trat´egias nacionais para a integra¸c˜ao dos ciganos. Eis os objetivos a alcan¸car at´e 2020: garantir que as crian¸cas ciganas completem pelo menos o 1o ciclo; permitir o acesso `a forma¸c˜ao profissional e ao mercado de trabalho; reduzir a desigualdade de acesso aos cuidados de sa´ude, aos cuidados preventivos e aos servi¸cos sociais; reduzir a desigualdade em mat´eria de acesso `a habita¸c˜ao.

Grande rep´orter do Di´ario de Not´ıcias.

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E no acesso `a habita¸c˜ao que as pol´ıticas nacionais mais tˆem falhado. ´E esse, ali´as, um dos principais motivos que leva Portugal a ter nota negativa e a sentar- se no banco dos r´eus no que diz respeito `a integra¸c˜ao de algumas comunidades, tanto por parte da Agˆencia Europeia para os Direitos Fundamentais (FRA), como do Centro Europeu dos Direitos dos Ciganos e da Amnistia Internacional.

Promover um acesso n˜ao discriminat´orio `a habita¸c˜ao, nomeadamente `a ha-

bita¸c˜ao social e a servi¸cos p´ublicos essenciais (´agua, eletricidade e g´as), tendo tamb´em em conta as necessidades dos ciganos n˜ao sedent´arios, recomendou o

Comit´e das Regi˜oes da Uni˜ao Europeia, numa reuni˜ao realizada em Bruxelas em Dezembro de 2011.

Eu diria que n˜ao basta ter uma casa, ´agua e luz. ´E preciso que os ciganos te- nham um real acesso aos espa¸cos p´ublicos, ou melhor, que partilhem os espa¸cos p´ublicos, as vias p´ublicas, os bairros e zonas residenciais como os outros ci- dad˜aos. Obviamente, respeitando-os e participando na melhoria desses mesmos espa¸cos, sujeitando-se `as regras exigidas a todos os cidad˜aos. E, em Portugal, estamos sobretudo a falar de ciganos sedent´arios, o que representa mais de 90% da comunidade.

Estive em acampamentos e bairros sociais de ciganos para uma reportagem que realizei com o fotojornalista Rodrigo Cabrita sobre as condi¸c˜oes de ha- bita¸c˜ao desta comunidade que public´amos no Di´ario de Not´ıcias em Novembro de 2010.

Os ciganos vivem na periferia das cidades, das aldeias e das localidades, em terrenos sem rentabilidade, junto a zonas industriais e de dif´ıcil acesso, a paredes-meias com lixeiras e animais, acantonados. Est˜ao retirados da restante popula¸c˜ao, dos equipamentos p´ublicos, nomeadamente de escolas e dos centros de sa´ude, e que constituem mais um desincentivo `a escolaridade e aos cuidados m´edicos.

Pretendo mostrar alguns exemplos (cinco negativos e um positivo) e que provam que a integra¸c˜ao ´e poss´ıvel, se as medidas para o acesso `a habita¸c˜ao tiverem em conta as pessoas em vez das etnias e dos grupos.