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O Código Penal de 1940 continuou com a tradição de se dividir em duas partes: geral e especial. Na Parte Geral, manteve a definição de culpa conforme a proposta de Alcântara Machado, porém, retirou a expressão: “por inobservância de lei ou determinação da autoridade”:

305 MACHADO, Alcântara.

Nova redação do projeto de Codigo Criminal do Brasil. p. 100 a 104.

306 Após a entrega da primeira versão do projeto de Alcântara Machado em 1938, o Ministro Francisco Campos o submeteu à comissão revisora composta pelos “[...] ilustres magistrados Vieira Braga, Nélson Hungria e Narcélio de Queiroz e com um ilustre representante do Ministério Público, o Dr. Roberto Lira.” E, após reformulação daquele projeto inicial, Alcântara Machado submeteu a versão definitiva à mesma comissão e no reconhecimento ao seu trabalho, continua a exposição de motivos: “[...] Dos trabalhos da Comissão revisora resultou este projeto. Embora da revisão houvessem advindo modificações à estrutura e ao plano sistemático, não há dúvida que o projeto Alcântara Machado representou, em relação aos anteriores, um grande passo no sentido da reforma da nossa legislação penal. Cumpre-me deixar aqui consignado o nosso louvor à obra do eminente patrício, cujo valioso subsidio ao atual projeto nem eu, nem os ilustres membros da Comissão revisora deixamos de reconhecer.” PIERANGELI, José Henrique. Códigos Penais do Brasil. p. 406.

307 Na lição de Salgado Martins: “O eminente Alcântara Machado não pode esconder o seu profundo desgosto pelas alterações que a ilustre comissão revisora introduziu no anteprojeto.” E cita as palavras de Alcântara Machado: “Seja como for, o código aí está. É na substância e na forma, o projeto de minha autoria, amputado de vários dispositivos, transtornado parcialmente na ordenação de certos assuntos, modificado puerilmente na redação de muitos preceitos; mas, apesar dessas e outras manobras artificiosas, irrecusável e positivamente reconhecível. Tanto quanto é reconhecível no Código Civil o trabalho insigne de Clóvis Bevilaqua.” Para a história da reforma penal brasileira:

Revista Direito, vol. VIII, Março-abril de 1941, p. 41-42, apud MARTINS, Salgado. Sistema de Direito Penal Brasileiro. p. 104-105.

Art. 15. Diz-se o crime:

I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi- lo;

II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência, ou imperícia.

Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

Na Parte Especial, o CP de 1940 mudou o critério da objetividade jurídica, pois “distribui a matéria por onze títulos, englobando o primeiro as infrações contra a pessoa, em todos os aspectos da personalidade humana (vida, integridade corporal, honra, liberdade).”308 No ensinamento de Edgard Magalhães Noronha:

Afastou-se como se vê, de seus antecessores. Classificando os delitos por sua objetividade jurídica, começa por crimes contra bens individuais e termina pelos delitos contra a Administração Pública, ou seja, contra interesses do Estado.309

As tipificações dos delitos culposos atinentes ao nosso trabalho, até o início da vigência do atual Código de Trânsito Brasileiro, eram previstas nos artigos seguintes:

Art. 121. Matar alguém:

Pena – reclusão, de seis a vinte anos. § 3.º Se o homicídio é culposo: Pena - detenção, de um a três anos.

§ 4.º No homicídio culposo, a pena é aumentada de um terço, se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante.

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena – detenção de três meses a 1 ano.

§ 6.º Se a lesão é culposa:

Pena – detenção, de dois meses a um ano.

§ 7.º No caso de lesão culposa, aumenta-se a pena de um terço, se ocorre qualquer das hipóteses do art. 121, § 4 º.

As lesões corporais dolosas possuem diferentes penas em abstrato, porém, se forem culposas, conforme a lição de Heleno Cláudio Fragoso,

Não há distinção, para diverso tratamento, entre as leves ou graves e gravíssimas. A pena cominada, qualquer que seja a gravidade da lesão culposa, é a mesma. Isto não significa que a gravidade da lesão não deva ser considerada na medida da pena.310

Os tipos penais acima não definem o que seja crime culposo, sendo necessária a remissão à parte geral para realizar-se a tipificação penal. Outro ponto

308 FRAGOSO, Heleno Cláudio.

Lições de Direito Penal, parte especial, p. 7.

309 NORONHA, Edgard Magalhães.

Direito Penal, vol. 2. p. 9.

310 FRAGOSO, Heleno Cláudio.

relevante, se compararmos os tipos penais de 1940 com os tipos penais culposos do Código de 1890, foi o aumento da pena em abstrato, bem como a sua possível agravação, conforme previsão acima do § 4.º do art. 121 e § 7º do art. 129. Destaca- se também, a possibilidade da pena acessória de “incapacidade temporária para profissão ou atividade cujo exercício depende de licença, habilitação ou autorização do poder público”, conforme inciso IV, do art. 69, do CP de 1940.

A alteração citada no parágrafo anterior foi fundamentada conforme a justificativa contida no item 39 da Exposição de Motivos do Código de 1940:

Com estes dispositivos, o projeto visa, principalmente, a condução de automóveis, que constitui, na atualidade, devido a um generalizado descaso pelas cautelas técnicas (notadamente quanto à velocidade), uma causa freqüente de eventos lesivos contra a pessoa, agravando-se o mal com o procedimento post factum dos motoristas, que, tão-somente com o fim

egoístico de escapar à prisão em flagrante ou à ação da justiça penal, sistematicamente imprimem maior velocidade ao veículo, desinteressando- se por completo da vítima, ainda quando um socorro imediato talvez pudesse evitar-lhe a morte.

Portanto, com exceção da parte geral que foi alterada pela Reforma de 1984, conforme será comentado adiante, a parte especial do Código de 1940, continua sendo aplicada na prática de qualquer ato culposo que não tenha origem em acidente de trânsito veicular.