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1.4 Características dos utilizadores de áreas naturais

As pessoas têm tendência a preferir ambientes naturais em detrimento dos construídos devido em parte à sua capacidade de reabilitação (restauration)6 (Herzog et al, 2003; Berg,

et al, 2003). Segundo Ulrich (1983 citado por Harting et al, 2003) certas qualidades numa

cena podem ajudar a recuperar psico-fisiologicamente do stress. A presença de elementos naturais, tais como água e vegetação, podem evocar emoções positivas, afastar pensamentos negativos e ajudar a recuperar da excitação (“autonomic arousal”). Ulrich (1983 citado por Harting et al, 2003) afirma que os humanos estão biologicamente preparados para responder positivamente aos elementos naturais.

Com o fenómeno da industrialização e urbanização verificou-se um crescimento da procura da natureza para o desenvolvimento de actividades de lazer e turismo (Valentine, 1992). Alguns autores têm vindo a tentar identificar as características das pessoas que procuram a natureza para desenvolver actividades de lazer, recreio e turismo. No início da década de noventa Poon (1993) afirmou que estava a surgir um novo tipo de turista. Para esta autora os turistas estavam cada vez mais experientes, independentes e evidenciavam uma grande sensibilidade para com o ambiente natural. Este “novo turista” teria uma maior predisposição para visitar locais com natureza selvagem. No entanto, não existem muitos estudos que avaliam o comportamento do visitante em áreas naturais (Newsome et al, 2002).

6 Segundo Han (2003) é um termo geralmente usado para descrever o impacte ambiental nos humanos. É “ a acção de reabilitar a saúde de uma pessoa ou a consciência; a recuperação da força física”. Portanto, a reabilitação (restauration) não é só um resultado mas também um processo, incluindo aspectos físicos e psicológicos.

Como a temática central deste trabalho se centra na procura da natureza para o desenvolvimento de actividades ligadas ao turismo, importa focar a reflexão nas motivações que levam o turista a visitar a natureza. Segundo Fennel (2002) para conhecermos os visitantes que se deslocam às áreas naturais é importante avaliar os seus valores, atitudes, motivações e características sócio-económicas. Whigt (2001) afirma que as pessoas que procuram a natureza apresentam características bastante heterogéneas. De vários estudos analisados destacam-se as seguintes motivações para visitar áreas naturais:

• Enfrentar o desafio físico que as áreas naturais representam (Higham, 1993 citado por Hall e Page, 1999)

• Tranquilidade (Valentine, 1994) • Solidão/ isolamento (Valentine, 1994) • Ouvir os sons da natureza (Burton, 1995)

• Desfrutar a natureza e apreciar a paisagem (Niefer et al, 2000) • Escapar à civilização, ao quotidiano (Harting, 1993)

• Realizar actividades desportivas (Niefer et al, 2000) • Experiência estética (Whigt, 2001)

• Experiência espiritual/ mítica/ religiosa (Harting, 1993)

Com base numa análise a vários estudos Harting (1993) conclui que os habitantes de centros urbanos que desenvolvem actividades de recreio na natureza indicaram como principal motivação o desejo de escapar à confusão quotidiana das cidades. Por outro lado, outras motivações que aparecem para além do desejo de escape são desfrutar de uma experiência estética e até espiritual/ religiosa, tranquilidade, solidão e apreciar a natureza. Highan (1997, citado por Hall e Page, 1999) investigou algumas motivações ligadas à natureza para identificar as qualidades de recreio que motivavam os turistas a frequentar trilhos pedestres nas áreas protegidas da Nova Zelândia. Este autor verificou que desfrutar a beleza natural e o cenário foram as primeiras motivações identificadas pelos visitantes internacionais. Este é um resultado que explica a grande popularidade dos Great Walks da Nova Zelândia. A reputação dos trilhos pedestres de Milford, Routeburn e Kepler devem- se em grande parte às oportunidades de desfrutar de uma paisagem alpina de elevada beleza. Mas neste estudo destacam-se outras motivações, nomeadamente, desfrutar de

natureza selvagem (intocada pelo homem), desfrutar dos sistemas naturais e da fauna e flora autóctones da Nova Zelândia e enfrentar o desafio físico que as áreas naturais representam. O desejo de solidão, uma das motivações bastante indicadas pela literatura ligada ao recreio na natureza, só se encontra situada no décimo primeiro lugar deste estudo (Hall e Page, 1999).

Estudos sobre as principais motivações que levam as pessoas a fazer turismo em lugares com atracções naturais nos E.U.A. (Wight, 1996), Canadá (Eagles, 1992) Reino Unido (Diamantis, 1998 citado por Wight, 2001), e no Brasil (Niefer et al, 2000) apontam para uma grande variedade de motivações, mas observar a natureza e apreciar a paisagem surgem como as principais.

StanKey (citado por McAndrew, 1993) desenvolveu em 1972 um esquema para classificar os utilizadores de áreas naturais designando-os como “puristas” e “não puristas”. Os “puristas” mostram um desejo forte por solidão e não gostam de sinais da intrusão de pessoas no meio ambiente ao contrário dos “não puristas”. Ciccheti (1972, citado por MacAndrew 1993) descobriu que os homens têm tendência a apresentar níveis de purismo mais elevados que as mulheres.

Existem alguns estudos que analisam a personalidade dos indivíduos que se deslocam para a natureza para desenvolver actividades de lazer e turismo (Ulehla, 1997; Driver e Knopf 1977, citados por MacAndrew, 1993). Mais recentemente, Lindberg (1991, citado por Hawkins, 1994) identificou quatro tipos de turistas que procuram a natureza:

“Hard-Core” - visitantes que procuram a natureza como o principal motivo da sua viagem. Destes destacam-se os investigadores científicos ou membros de viagens de educação ambiental.

“Dedicated” - pessoas que fazem viagens especificamente para visitar áreas protegidas, mas também revelam um forte desejo em conhecer a história e cultura do local.

“Mainstream” - pessoas que procuram a natureza simplesmente para fazerem uma viagem diferente do habitual.

“Casual” - pessoas para as quais o contacto com a natureza é ocasional, e ocorre no contexto de uma viagem mais abrangente.

Diferentes grupos de visitantes foram também detectados por MacNaghten e Urry (2000). Estes autores desenvolveram um estudo com nove “focus groups”. Observou-se que a preferência que as pessoas dão às florestas e paisagens com árvores é influenciada por factores tão variados como o ciclo de vida familiar ou pessoal, circunstâncias sócio- económicas e pela localização geográfica. Neste estudo os autores concluíram que as mães preferem locais seguros onde crianças e famílias possam brincar. As pessoas que têm filhos adolescentes preferem áreas que possuam infra-estruturas e paisagens magníficas onde se possam desenvolver actividades outdoor de aventura. Os reformados desejam locais com acessos fáceis que permitam caminhar com muitas surpresas e com alguns locais que não estejam ordenados. Os jovens com um carácter mais aventureiro procuram locais para desenvolver actividades arriscadas e para acampar “longe de tudo”. Os entusiastas de actividades desportivas preferem locais em que seja possível desenvolver as actividades em locais bem calmos sem o olhar de intrusos.

Segundo Urry (1992) em muitos casos a selecção dos visitantes é uma expressão do gosto social. Os grupos de visitantes diferem pela sua avaliação estética perante o ambiente. Por exemplo, os românticos (Philipsen, 1995) procuram ambientes naturais intocados pelo homem. Assim, quando encontram pessoas no ambiente natural associam esse facto a locais urbanos.

Como muitas pessoas procuram um certo isolamento na natureza (Valentine, 1994) a avaliação da capacidade de carga social é um elemento importante a ter em consideração pelas entidades competentes na gestão de espaços naturais. Citando um exemplo, a “Great

Barrier Reef Marine Autority (Valentine, 1986 citado por Valentine, 1994) modificou a

gestão de algumas zonas, integrando a classificação "natureza selvagem, com as respectivas condicionantes de utilização" (wilderness). Em algumas áreas permitiu-se, deste modo, que os visitantes desenvolvessem actividades e houvesse uma grande quantidade de pessoas, mas outras áreas ficaram condicionadas. Isto reflecte a crescente preocupação em gerir os conflitos entre os diferentes grupos e as diferentes reacções dos visitantes às infra-estruturas construídas nos corais. Também é importante referenciar que diferentes ambientes naturais têm diferentes capacidades de carga, numa perspectiva de conservação ambiental.

1.5- Percepção de qualidade ambiental e a experiência na natureza –