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Caracterização, identificação e classificação do gênero discursivo artigo científico

para o pesquisador que se propõe a estudar a funcionalidade da linguagem, visto que o estudioso precisa conhecer o seu objeto de estudo para melhor compreendê-lo. A afirmação de Bakhtin (1997) de que uma concepção clara acerca da natureza dos diversos gêneros discursivos é indispensável para qualquer estudo, independentemente da sua orientação específica, alerta-nos que é importante compreender a natureza do gênero que nos propomos a estudar. Por essa razão, dedicamo-nos a caracterizar, identificar e classificar o gênero artigo científico para que possamos compreender melhor as suas especificidades.

Considerando que os estudos bakhtinianos constituem uma das pedras angulares no que se refere ao estudo dos gêneros24, buscamos em Bakhtin entender o que é um gênero: “[...] qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual, mas cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos de gêneros do discurso” (1997, p. 279, grifos do autor).

A terminologia “gêneros do discurso” (ou discursivos) é utilizada para referir-se aos enunciados que usamos cotidianamente com o intuito de interagir com os nossos pares, nas mais diversas situações, nos distintos contextos, para atender a variados objetivos. Esses gêneros podem se materializar tanto na escrita como na oralidade, ou em ambos, a depender da circunstância comunicativa. Essa situação também indica o nível de formalidade ou informalidade do gênero. São exemplos de gêneros: bate-papo, telefonema, palestra, carta, lista, notícia, artigo científico.

As características sociais, históricas e culturais intrínsecas dos gêneros fazem com que eles tenham essa relativa estabilidade, ressaltada por Bakhtin, pois, ao passo que a necessidade comunicativa muda, os gêneros se adaptam e se ampliam. “O gênero sempre é e não é o mesmo, sempre é novo e velho ao mesmo tempo. O gênero renasce e se renova em cada etapa do

24 As contribuições de Bakhtin acerca dos gêneros discursivos são referências importantes para os estudos da linguagem, pois, além de constituírem marco na linguística moderna, orientaram estudos relevantes no campo da enunciação.

desenvolvimento da literatura e em cada obra individual de um dado gênero. Nisso consiste a vida do gênero” (BAKHTIN, 2010, p. 121).

O estudioso estabelece um vínculo intenso entre a formação dos gêneros e a própria existência humana. Para Bakhtin (1997, p. 282): “a língua penetra na vida através dos enunciados concretos que a realizam, e é também através dos enunciados que a vida penetra na língua”. A relação da vida com enunciados é tão imbricada que “[...] a comunicação verbal só é possível por algum gênero textual” (MARCUSCHI, 2008, p. 154).

Assim como são infinitas as situações de uso da linguagem, são ilimitados os gêneros. A existência da heterogeneidade de gêneros, segundo Bakhtin (1997, p. 281), indica uma “ [...] dificuldade quando se trata de definir o caráter genérico do enunciado”. O estudioso destaca ser mais relevante considerar a diferença essencial entre gêneros primários e gêneros secundários. Os gêneros primários, que o autor chama de simples, são mais elementares, têm como base as situações de comunicação verbais mais naturais e espontâneas, que não necessitam de um planejamento mais detalhado, por isso são embrionários e constituem embasamento para os gêneros secundários.

Já os gêneros secundários, classificados pelo autor como complexos, surgem nas ocorrências das situações socioculturais mais desenvolvidas e evoluídas, sobretudo de forma escrita. Eles nascem a partir de absorções e transmutações dos gêneros primários, necessitando, assim, de um planejamento mais detalhado. Conforme Bakhtin (1997, p. 281), são exemplos desse grupo: “o romance, o teatro, o discurso científico, o discurso ideológico, etc.”. Nesse grupo, estaria, portanto, o gênero acadêmico artigo científico.

O filósofo da linguagem instituiu os critérios básicos para descrever um gênero discursivo. Para Bakhtin (1997, p. 279):

A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana. O enunciado reflete as condições específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operada nos recursos da língua – recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais –, mas também, e sobretudo, por sua construção composicional.

Quando ele aborda a questão dos gêneros, uma das ideias iniciais apresentadas é que os enunciados são frutos das ações humanas e que, por isso, presumem as condições, concepções e intenções das esferas de comunicação através do conteúdo, do estilo linguístico e da composição. Os critérios de Bakhtin (1997) acerca dos gêneros podem permitir definir com mais precisão o gênero artigo científico, objeto de estudo da nossa pesquisa. Antes de detalhar

os critérios descritivos bakhtinianos no gênero em estudo, faremos uma breve reflexão acerca do que é o gênero artigo científico.

O gênero discursivo artigo científico é um gênero de natureza acadêmica que tem o intuito de divulgar os conhecimentos produzidos em pesquisas desenvolvidas no âmbito dos laboratórios científicos e universidades. Esse gênero é produzido por pesquisadores e é destinado, comumente, para outros pesquisadores da mesma área ou para pessoas que apresentem interesse pela investigação divulgada.

Para definir o que é um artigo acadêmico, Motta-Roth e Hendges (2010, p. 65) afirmam que:

O artigo é um texto, de aproximadamente 10 mil palavras, produzido com o objetivo de publicar em periódicos especializados, os resultados de uma pesquisa desenvolvida sobre um tema específico. Esse gênero serve como uma via de comunicação entre pesquisadores, profissionais, professores e alunos de graduação e pós-graduação.

Este gênero é possuidor de uma estrutura textual relativamente adaptada e regulada pelo âmbito acadêmico. É por isso que Marconi e Lakatos afirmam que “o artigo científico tem a mesma estrutura orgânica exigida para trabalhos científicos” (2011, p. 84). Inclusive, vale ressaltar que esse gênero é normatizado pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), para trabalhos acadêmicos através da NBR 6022, de maio de 2003, que determina sobre artigo em publicação periódica. Para essa norma, o artigo científico é “Parte de uma publicação com autoria declarada, que apresenta e discute ideias, métodos, técnicas, processos e resultados nas diversas áreas do conhecimento” (ABNT, 2003, p. 2).

Xavier ressalva que o artigo científico “[...] é o mais legítimo dos documentos para anunciar resultados de estudos concluídos e a principal arena para contestações a teorias e conclusões de pesquisas propostas em outros trabalhos” (2012, p.104).

Os artigos científicos são produzidos para serem publicados em revistas e periódicos especializados, comumente editados em versões impressas ou digitais, direcionados por entidades científicas e acadêmicas. São essas publicações que geram circulação e divulgação das ideias apresentadas nos artigos, garantindo visibilidade das pesquisas por interessados na pesquisa e pela sociedade. Ainda conforme Xavier (2012, p. 104), “só depois de publicado em uma revista ou jornal científico de renome acadêmico é que o artigo sobre uma nova teoria ganha credibilidade dos pares e respeito da sociedade em geral”.

Para chegar a ser publicado em um periódico ou revista, o artigo científico passa por um rigoroso processo seletivo, no qual se submete a uma avaliação realizada por um conselho editorial da revista. Esse conselho é constituído por pesquisadores pareceristas, renomados na

área do trabalho avaliado. Esses pesquisadores elaboram um parecer favorável ou não ao aceite do trabalho para publicação. Para isso, analisam tanto a qualidade formal do texto quanto a importância do trabalho para o crescimento da área, entre outros critérios.

Em síntese, para situarmos o nosso objeto de análise, ou seja, o gênero artigo científico, podemos dizer que este constitui um gênero que se origina e circula no domínio discursivo acadêmico e científico; tem como propósito comunicativo publicar e divulgar resultados de ideias e pesquisas; direciona-se a um público específico, pesquisadores e interessados nas ideias das pesquisas; propicia o surgimento de novos gêneros no universo acadêmico e científico, como, por exemplo, a resenha e o resumo.

Feita uma breve exposição acerca do que é o artigo científico, passemos a observar como o conteúdo temático, o estilo verbal e a construção composicional – critérios básicos apresentados por Bakhtin para definir e descrever um gênero – apresentam-se no gênero em estudo.

O conteúdo temático é o primeiro aspecto abordado por Bakhtin (1997, p. 300); é ele que motiva “[...] o todo do enunciado: sua amplitude, suas fronteiras” , ou seja, delimita o que pode/deve e o que não pode/não deve ser contemplado no enunciado. Trata-se do “intuito discursivo” que será abordado, da informação que será veiculada, do “querer dizer” e da intencionalidade do locutor. Noutras palavras, é possível dizer que um gênero discursivo existe para veicular certos conteúdos, e a organização desses conteúdos está relacionada tanto ao estilo e à composição do próprio gênero quanto à intencionalidade do seu locutor.

O conteúdo temático do gênero acadêmico artigo científico, a depender da intencionalidade do locutor e da exigência comunicativa, pode ter várias funções e contemplar os mais variados aspectos, a saber: pode tratar de uma descoberta científica, abordar uma revisão de uma determinada literatura, divulgar resultados de pesquisas, descrever uma experiência realizada, abordar soluções para questões não resolvidas, problematizar situações cotidianas, dentre outros.

Para explicar o que é um artigo científico, Teixeira (2005, p. 42) diz: “os artigos científicos podem apresentar o resultado de uma pesquisa bibliográfica (Artigo de Revisão Teórica), o resultado de uma pesquisa de campo (Artigo de Resultado de Pesquisa) e podem ainda expressar a descrição de uma experiência vivida (Artigo de Relato de Experiência)” (Grifos do autor). Noutras palavras, num âmbito mais geral, esse querer dizer do locutor que se revela no conteúdo temático está relacionado à forma como o assunto será apresentado no texto, o que está interligado com as funções sociais, uma vez que a produção de um artigo científico tem papéis acadêmicos e sociais.

Para Markoni e Lakatos (2011, p. 86):

O conteúdo pode abranger os mais variados aspectos e, em geral, apresenta temas ou abordagens novas, atuais, diferentes. Pode:

a) Versar sobre um estudo pessoal, uma descoberta, ou dar um enfoque contrário ao já conhecido;

b) Oferecer soluções para questões controvertidas;

c) Levar ao conhecimento do público intelectual ou especializado no assunto ideias novas, para sondagem de opiniões ou atualização de informes;

d) Abordar aspectos secundários, levantados em alguma pesquisa, mas que não seriam utilizados na mesma.

Numa esfera mais particular, o conteúdo temático vai variar de acordo com a estrutura composicional, o que significa que cada elemento do gênero proporciona um tipo de conteúdo diferente. Tomando por molde o artigo científico, na introdução, por exemplo, o locutor do texto faz uma exposição mais geral do assunto, justificando o intuito da pesquisa, apresentando os objetivos e as hipóteses. No desenvolvimento, o intuito discursivo é fazer uma apresentação detalhada que contemple discussões teóricas, demonstrações, explicações e avaliações do material analisado.

Observe-se, como exemplo de conteúdo temático de uma introdução, a passagem a seguir, extraída de um artigo científico:

Exemplo 28:

Na atual conjuntura histórica, social, política e econômica dos países denominados “em desenvolvimento”, como é o caso, por exemplo, do Brasil, os temos “favelas” e “comunidades carentes” fazem parte do cotidiano e do vocabulário da maioria das pessoas. Isso ocorre porque, considerando-se as intensas questões sociais existentes em tais países, como grande desigualdade social, miséria, falta de condições mínimas para alguns seres humanos e uma minoria rica que concentra a maior parte da riqueza produzida em suas nações, parte considerável da população reside em locais definidos como “favelas” e constituem o que se convencionou chamar de “comunidades carentes”.

Especificamente no caso da sociedade brasileira, devido a tal realidade, os termos “favelas” e “comunidades” foram naturalizados e, dessa forma, quando referidos por alguém, não são questionados, como se a sua significação fosse absolutamente evidente. Sendo assim, parece que parte-se do pressuposto de que todos sabem do que se está falando.

No entanto, caso olhemos mais atentamente e criticamente para tal naturalização, perceberemos que a mesma esconde um “não querer saber” (denegação) sobre o que está em questão.

Em uma perspectiva oposta a essa, o nosso objetivo, com este artigo, é tentar compreender os significados e significações subjacentes a tais termos e fazer uma proposta de diferenciação entre eles – que são, no mais das vezes, tratados como sinônimos. Pois, em um país de dimensões continentais e perpassado por tantos problemas sociais e econômicos como o Brasil, não é possível supor que “favela” e “comunidade” sejam conceitos abstratos igualáveis, já que se referem, pelo contrário, a questões reais, concretas e tangíveis. (RIBEIRO; LARA JÚNIOR, 2011).

No exemplo 28, podemos perceber a presença do conteúdo temático na introdução do artigo, o qual é exposto pelo locutor de maneira que apresenta a contextualização da temática e o objetivo do artigo para situar o leitor acerca do intuito discursivo dos responsáveis pelo texto. Percebe-se que a temática “reflexão à luz da psicologia dos significados de comunidade e favela” vai se ajustando à composição do texto, de maneira que os locutores fazem uma contextualização da temática para, em seguida, expor o objetivo do artigo: “tentar compreender os significados e significações subjacentes a tais termos e fazer uma proposta de diferenciação entre eles – que são, no mais das vezes, tratados como sinônimos”.

É por isso que “[...] o intuito discursivo ou o querer dizer do locutor [determina] o todo do enunciado: sua amplitude, suas fronteiras” (BAKHTIN, 1997, p. 300, grifos do autor). E mais: “O querer dizer do locutor se realiza acima de tudo no gênero do discurso” (BAKHTIN, 1997, p. 301). Assim, o conteúdo implica a determinação da escolha do gênero que vamos utilizar, uma vez que o intuito discursivo também se adapta e se ajusta à composição do gênero. O estilo verbal, também chamado de linguístico ou funcional, segundo critério apontado por Bakhtin (1997, p. 283), “[...] nada mais é senão o estilo de um gênero peculiar a uma dada esfera da atividade e da comunicação humana”. Esse estilo está relacionado aos “recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais”, ou seja, aos recursos da língua (BAKHTIN, 1997, p. 279).

Dessa forma, é possível compreender o estilo como a escolha dos recursos da língua de um discurso, determinada pela seleção do gênero que compõe esse discurso. “Por servirem a propósitos comunicativos diferentes, o vocabulário, as expressões linguísticas, o nível de formalidade, a coordenação de frases e sentenças, tudo isso vai ser diferenciado de um gênero para outro” (NASCIMENTO, 2012, p. 24). É por essa razão que o estilo verbal de um artigo científico não corresponde, necessariamente, ao mesmo estilo de um resumo, muito embora estejamos tratando de gêneros acadêmicos. Isso acontece devido aos propósitos comunicativos de cada gênero, que seguem as necessidades das condições de produção e funcionalidade textuais.

De acordo com o manual científico de Markoni e Lakatos (2011, p. 88):

O estilo deve ser claro, conciso, objetivo; a linguagem correta, precisa, coerente e simples. Adjetivos supérfluos, rodeios e repetições ou explicações inúteis devem ser evitadas, assim como a forma excessivamente compacta, que pode prejudicar a compreensão do texto.

A clareza, a concisão e a objetividade aparecem no manual de redação como traços característicos, específicos desse gênero. Convém ressaltar, no entanto, que as noções de objetividade e de precisão não se sustentam, em uma perspectiva que considere a linguagem como forma de interação social, pois a escolha do tema e dos recursos linguísticos, considerando a existência de um destinatário, já demonstra a existência de um sujeito que revela o seu pensamento e assume posicionamentos considerando um interlocutor, por mais que se tente ocultá-los por trás de um disfarce de imparcialidade. Sobre o estilo denominado de “objetivo”, Bakhtin (1997, p. 324) afirma: “o estilo das exposições essencialmente concentradas no seu objeto e que, ao que parece, deveriam ignorar o outro, não deixa de implicar certa ideia do destinatário” (Grifos do autor). A partir do instante em que se considera a presença do outro, a expressividade/subjetividade não pode nem deve ser desconsiderada, já que qualquer expressão constitui resultado de um consenso.

A tentativa de objetividade, pregada pelos manuais de redação, apresenta uma visão reducionista da linguagem e da própria condição de uso social do gênero, principalmente se considerarmos que, ao produzir um artigo científico, o locutor deixa impressas no texto marcas enunciativas, ou seja, evidencia como quer que o seu enunciado seja lido e compreendido pelo seu interlocutor. Nesse sentido, também não nos parece suficiente uma concepção veritativa ou normativa da linguagem, uma vez que, se existe uma descrição da realidade, acontece em função da subjetividade e da intersubjetividade situadas no processo de interação verbal. De acordo com Ducrot (1988), se a língua descreve a realidade, isso acontece através dos aspectos objetivos e intersubjetivos, denominados de valor argumentativo. Para Coracini (1991, p. 89), “as formas canônicas do discurso científico, camufladoras da origem enunciativa, nada mais são do que instrumentos válidos, socialmente aceitos (e impostos pela comunidade científica), de persuasão, e nessa medida, índices de subjetividade”.

A escrita acadêmica é uma forma de enxergar fenômenos sociais, e não existe um pesquisador que registre acontecimentos de forma objetiva e imparcial. O locutor, pesquisador responsável pelo artigo científico, é um ser que assume posicionamentos e, para tal, pode escolher as estratégias argumentativas que definam o melhor ângulo para registrar suas ideias.

Nesse sentido, convém ainda ressaltar que não há discurso desprovido de subjetividades e sem um locutor responsável pelo enunciado, mesmo que esse se apresente sob a máscara da impessoalidade. Para Benveniste, a subjetividade é “[...] a capacidade do locutor em se propor como ‘sujeito’” (1995, p. 286). Por mais que a impessoalidade tente ficar evidente num enunciado, o que se observa é a presença do sujeito com um movimento argumentativo repleto de estratégias de distanciamento, entre tantas outras presentes nos gêneros do universo acadêmico.

Em investigações realizadas por Nascimento (2014), acerca da polifonia nos gêneros acadêmicos e formulaicos, o autor mostra que, nos gêneros acadêmicos e empresariais/oficiais, a impessoalidade (a presença do locutor narrador, em terceira pessoa, responsável por todo o discurso) no texto constitui uma característica do estilo linguístico e da estrutura composicional dos gêneros do âmbito acadêmico e empresarial/oficial. Vale ressaltar que essa característica linguística “tenta conferir um caráter de objetividade ao texto, no sentido de que o dito parece apresentar-se a si próprio” (NASCIMENTO, 2014, p. 9).

Com relação ao uso da linguagem científica, é importante assinalar ainda que o artigo científico, por se tratar de um gênero da esfera acadêmica, requer do locutor o emprego do vocabulário com termos técnicos e específicos da área a que está ligado. A utilização da terminologia característica de cada área é o que Xavier chama de “jargão profissional”.

Entre outras funções, o jargão serve para:

 Manifestar o nível de conhecimento dos conceitos utilizados pelo pesquisador e do domínio científico em que atua;

 Ratificar a identificação do pesquisador com os demais membros da comunidade acadêmica a qual pertence ou quer se integrar; e

 Abreviar explicações sobre conceitos e procedimentos longos, garantindo mais precisão ao significado de uma determinada palavra empregada com muita frequência entre os profissionais da área (XAVIER, 2011, p. 115).

A seguir, temos um exemplo. Trata-se de uma ilustração de termos técnicos recortados da introdução de um artigo científico.

Exemplo 29:

“Nos dias atuais, a obesidade vem se caracterizando como problema de saúde pública e tal fato está relacionado ao crescimento de sua prevalência, levando a doença à condição de epidemia global. É uma enfermidade plural e sua etiologia multifatorial, envolvendo aspectos biológicos, históricos, ecológicos, políticos, socioeconômicos, psicossociais e culturais” (FONSECA et. al., 2014, p. 1402).

Com relação aos aspectos da linguagem acadêmica e científica, por meio dos termos “epidemia global”, “enfermidade plural”, “etiologia multifatorial”, “aspectos biológicos”, pode-se notar que se trata de termos técnicos que se reportam à área da saúde. Esses jargões profissionais abrangem uma representação conceitual específica, vinculada a um saber técnico- científico, a uma linguagem especializada de uma determinada área.

Outro traço estilístico do gênero em estudo se refere à evocação do dizer do outro na constituição do discurso. Essa evocação faz parte da natureza do texto acadêmico e científico, porque o pesquisador, para organizar seu dizer, precisa embasar-se em outros dizeres que já passaram pelo crivo de juízos de valores. Esse ato de trazer à tona o discurso do outro é o que alguns manuais de redação científica chamam de citação. De acordo com a Norma 10520 (ABNT, 2002, p. 1), citação é “menção de uma informação extraída de outra fonte”.

Uma das finalidades do gênero acadêmico é estabelecer que as vozes do outro sejam incorporadas à escrita, como forma de validar a opinião do locutor a respeito do assunto