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5.2 Desvelando os efeitos argumentativos presentes nos artigos científicos

5.2.5 Evocação

Esse tipo de fenômeno é mais um tipo de polifonia de locutores, na qual o locutor responsável pelo artigo (L1) faz alusão a outros locutores, autoridades constituídas no assunto, para validar seu dizer. Nas análises desse fenômeno, verificamos que L1 se engajou com os demais locutores por ele evocados.

Vejamos o recorte a seguir: CSCA2T9

Sabe-se que a persuasão e a sedução na publicidade acontecem a partir da criação da realidade em uma atmosfera perfeita da identificação da marca com o mundo do consumidor. Nesse sentido é que retomamos os estudos de Casaqui (2004) sobre o ethos publicitário, em sua tese intitulada “Ethos publicitário: as estratégias comunicacionais do capital financeiro na negociação simbólica com seu público-alvo”(2004, Universidade de São Paulo).

Casaqui inaugura um estudo do ethos publicitário trazendo a noção do ethos trabalhada inicialmente por Aristóteles em seus estudos sobre a retórica, passando por sua acepção no campo da análise do discurso, para chegar ao seu entendimento como um elemento central na constituição do discurso

da publicidade. (TRINDADE; SOUZA, 2014)

O recorte CSCA2T9 faz parte de um artigo da área de Comunicação, que trata do ethos publicitário. Temos a presença do locutor 1 (L1), Trindade e Souza, responsável pelo artigo e por todo o trecho analisado;e a alusão a dois locutores, Casaqui (L2) e Aristóteles (L3). L1, para organizar o seu ponto de vista sobre ethos e validar o seu dizer cientificamente, faz alusão a duas autoridades constituídas no assunto: Casaqui, que é um precursor dos estudos sobre ethos publicitário, e Aristóteles, que foi o pioneiro a dar contribuições sobre a noção de ethos.

Assim, com a evocação às autoridades constituídas no assunto, o responsável pelo enunciado indica que o interlocutor deve compreender que a menção a uma autoridade faz referência a um discurso alheio, válido, que já foi estudado anteriormente e por essa razão tem credibilidade. Nesse caso, para falar de ethos, o autor mencionou dois grandes precursores, que são autoridades e têm seus conhecimentos validados no universo acadêmico. Além disso, L1, ao fazer alusão ao discurso dessas autoridades, faz uma demarcação teórica dos seus estudos, ou seja, marca um pertencimento a uma corrente teórica, delimitando que seu ponto de vista toma por base as autoridades que foram evocadas.

CEEA3T11

Este artigo apresenta o modelo de Epprecht et al. (2003) para gráficos de Shewhart adaptativos para atributos (gráficos de c, np, p e u) em que um, dois ou todos os parâmetros do gráfico variam entre

dois valores. (EPPRECHT; COSTA; MENDES, 2005)

O recorte CEEA3T11 pertence a um artigo da área de estatística, acerca de gráficos adaptativos de controle por atributos. Neste extrato, temos a presença de dois locutores: o locutor 1, constituído por Epprecht, Costa e Mendes, responsável pelo artigo e, consequentemente, por todo o trecho analisado – Este artigo apresenta o modelo de Epprecht et al. (2003) para gráficos de Shewhart adaptativos para atributos (gráficos de c, np, p e u) em que um, dois ou todos os parâmetros do gráfico variam entre dois valores – ; e o segundo locutor, constituído por Epprecht, Costa e Mendes, a voz autoridade evocada por L1.

No extrato analisado, o locutor responsável pelo enunciado (L1) faz alusão a uma autoridade já constituída na área, Epprecht, Costa e Mendes (L2), idealizadores de um método de destaque, reconhecido pelos pesquisadores desse campo de estudo. Assim, L1, para organizar o seu ponto de vista, menciona uma voz de prestígio instituída no assunto, para validar o seu dizer.

Convém ressaltar que a autoridade evocada é constituída pelo próprio L1 em outro instante de enunciação. Essa menção da autoridade é usada por L1 para confirmar a importância da criação de um novo método relevante, que só é possível ser comprovado se comparado a um modelo pré-estabelecido por uma autoridade já reconhecida no âmbito acadêmico.

Nesse caso, para falar de “gráficos adaptativos para atributos”, L1 faz alusão ao discurso da autoridade para dar suporte teórico a sua investigação, ou seja, marcar um pertencimento a uma corrente teórica, delimitando que seu ponto de vista toma por base as autoridades que

foram evocadas.Além dessa demarcação teórica, L1 assume posicionamentos semelhantes às

ideias das autoridades evocadas em seu dizer. Esses posicionamentos são atitudes do acordo de L1 com a voz evocada, ou seja, L1 evoca uma autoridade para dar sustentabilidade ao seu dizer, validando-o cientificamente.

O recorte seguinte ilustra mais um destaque de como esse fenômeno acontece. CSNA1T23

Pesquisas indicam que a melhora do perfil metabólico de pacientes obesos causa diminuição da resistência insulínica e do risco de eventos coronarianos ateroscleróticos e de doenças

cardiovasculares em geral, que podem influenciar negativamente o resultado perioperatório [ − ]∗. (SANTOS et al., 2014)

Nota de fim de texto:

35 (Pereira JS. Perfil glicêmico e lipídico pré e pós-cirurgia bariátrica [monografia]. Salvador: Faculdade de Medicina da Bahia; 2012), 36 (Monteiro Júnior FC, Silva Júnior WS, Salgado Filho N, Ferreira PAM, Araújo GF, Mandarino NR, Barbosa JB, Lages JS, Lima JRO, Monteiro CC. Efeito da perda ponderal induzida pela cirurgia bariá- trica sobre a prevalência de síndrome metabólica. Arq Bras Cardiol 2009; 92(6):452-456) e 37 (Auler Júnior JOC, Giannini CG, Saragiotto DF. Desafios no manuseio perioperatório de pacientes obesos mórbidos: como prevenir complicações. Rev Bras Anestesiol 2003; 53(2):227-236).

O extrato CSNA1T23 é parte de um artigo da área de nutrição sobre a evolução de pacientes candidatos à cirurgia bariátrica pelo Sistema Único de Saúde e pela Rede Suplementar de Saúde. Nele ocorre a presença de 4 locutores distintos. O primeiro locutor (L1) é instituído por Santos, Lima e Souza, responsável pelo artigo e, consequentemente, por todo o trecho analisado: Pesquisas indicam que a melhora do perfil metabólico de pacientes obesos causa diminuição da resistência insulínica e do risco de eventos coronarianos ateroscleróticos e de doenças cardiovasculares em geral, que podem influenciar negativamente o resultado perioperatório [35-37]26. segundo locutor (L2) é Pereira. O locutor 3 (L3) é Monteiro Jr, Silva Júnior, Salgado Filho, Ferreira, Araújo e Mandarino. O locutor 4 (L4) é Auler Júnior, Giannini e Saragiotto. Convém mencionar que o L1 identifica as autoridades evocadas através do sistema de numeração e indicação de notas ao final do artigo.

Neste caso, para argumentar que a melhora do perfil metabólico de pacientes obesos causa diminuição da resistência insulínica e do risco de eventos coronarianos ateroscleróticos e de doenças cardiovasculares em geral, que podem influenciar negativamente o resultado perioperatório, L1 evoca autoridades constituídas socialmente no assunto, como forma de validar o seu dizer e garantir um sustentáculo teórico para a sua investigação. Isso ocorre porque L1 se coloca como responsável pela informação, ao passo que mostra outros responsáveis, ou seja, L1 demarca seu ponto de vista adotando o mesmo ponto de vista que já foi assumido por outras autoridades, em pesquisas anteriores. Logo, a postura de L1 com relação às vozes evocadas é de responsabilidade pelos dizeres das autoridades.

Uma evidência de que L1 faz uso da evocação para não se responsabilizar sozinho pela informação encontra-se na forma como L1 introduz as vozes alheias. Os locutores 2, 3 e 4 são colocados em cena por L1 através do verbo dicendi modalizador quase-asseverativo “indicam”, como uma indicação, algo que pode ser sugerido porque já foi pesquisado.

26 Correspondente às referências 35 (PEREIRA, 2012), 36 (MONTEIRO JR. et. al., 2009) e 37 (AULER

O fenômeno da evocação às pesquisas anteriores assinaladas garante que o enunciado de L1 é passível de validade no meio científico, uma vez que já existem outros trabalhos que garantem asserções semelhantes e mostram para o interlocutor que o responsável pelo artigo não está pesquisando e asseverando sozinho.

O locutor responsável pelo enunciado faz questão de evocar outras vozes, para dar força ao seu enunciado, isto é, L1 faz uso da asserção dos locutores 2, 3 e 4 e serve-se dela para gerar mais força argumentativa ao seu enunciado. Se L1 apenas apresentasse a informação sem recorrer à estratégia de evocação das vozes das autoridades poderia enunciar o mesmo dizer, mas esse dizer não teria a mesma força argumentativa. Assim, L1 faz um acordo com as vozes evocadas tanto para fundamentar melhor os seus argumentos sob a forma de arrazoado por autoridade quanto para se mostrar atento às pesquisas acerca da temática que estuda, além de deixar evidente que suas asserções são dignas de crédito.

A seguir, temos fragmentos deste fenômeno que apresentam implicações de sentidos semelhantes a essas passagens acima descritas.

CHEA1T8

O mapa teórico e metodológico que construímos considerou uma conceitualização que emerge da perspectiva analítica arqueogenealógica de Foucault. (CARVALHO; BELARMINO; OLIVEIRA, 2014)

(CARVALHO et. al., 2014) CSNA1T16

Estudos realizados por Germano et al. [ ]∗ e por Santos et al. [ ]∗∗ com pacientes dos ambulatórios de dois hospitais universitários do nordeste encontraram resultados parecidos ao do presente estudo. (SANTOS et al., 2014)

Nota de fim de texto:

Germano ACPL, Camelo CMBM, Batista FM, Carvalho NMA, Liberali R, Coutinho VF. Perfil nutricional dos pacientes submetidos à cirurgia bariá- trica e dos critérios adotados para encaminhamento em um hospital de João Pessoa, PB. Ensaios e Ciência: Ciências Biológicas, Agrárias e da Saúde 2011; 14(2):43-59.

∗∗ Santos EMC, Burgos MGPA, Silva SA. Perda ponderal após cirurgia bariátrica de Fobi-Capella: realidade de um hospital universitário do nordeste brasileiro. Rev Bras Nutr Clin 2006; 21(3):188- 192.