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Casas e jardins – a tutela da Light para com seus funcionários

Além da divisão funcional e social do espaço, outros elementos de controle do operariado frequentes em vilas operárias estavam presentes na Vila Light. Segundo a historiadora Telma Correia, era comum que a vegetação externa dos núcleos fabris de zonas rurais contrastasse com a vegetação doméstica de seu interior. Frequentemente, projetos de

111. MORAES, Wellington. Entrevista concedida a Gabriel Santos. Santos, 04/04/2015. Suporte: Arquivo de áudio.

jardinagem estavam presentes nesses locais, provavelmente como elementos oriundos de lógicas higienistas112.

No que diz respeito à Vila Light, a presença dos serviços de jardinagem, em conjunto com diversos outros serviços de manutenção das casas e da vila fornecidos pela própria São Paulo Light, foi um fenômeno correntemente lembrado pelos depoentes. Em linhas gerais, as memórias referentes aos serviços de jardinagem despontaram em dois momentos distintos em diversas entrevistas. O primeiro deles foi quando se comentava sobre a vegetação do local, questão que fazia parte do questionário que serviu de base para as entrevistas. O segundo, quando os depoentes abordavam a estrutura da vila e os serviços de manutenção fornecidos pela São Paulo Light.

Ao comparar a situação atual da Vila Light com a forma como ele dela se recordava em sua infância, o Sr. Idílio abordou as mudanças verificadas na vegetação do local, a pedido meu. Disse ele que a vegetação, assim como boa parte da vila, havia mudado

Muito também! Tinha uma vegetação... vamos chamar aí "exuberante"!

[...] tinha (...) as árvores da Serra do Mar, né, que eram muito mais. E o povo naquela época cultivava, vamos dizer assim, todo mundo tinha a sua horta. Os jardins de lá eram tudo bem cuidado, (...) então tinha bastante pinheiros pelas avenidas. Era muito, muito bom. Muita vegetação.

Embora seja possível reconhecer duas categorias distintas de vegetação – a não domesticada, que não crescia segundo a ordenação humana, e a domesticada, que era definida a partir de critérios higienistas ou estéticos – é importante considerar que, no caso da Vila Light, as duas categorias foram classificadas pelos depoentes a partir de rótulos de beleza, ordem e/ou limpeza. No depoimento do Sr. Idílio, por exemplo, a mata atlântica foi classificada como “exuberante”; a vegetação doméstica, por sua vez, foi classificada como “bem cuidada” e “cultivada”. Ambas convergem no sentido de uma representação positiva da vila enquanto um lugar de vida aprazível.

Outro ponto que chama atenção no trecho da entrevista concedida pelo Sr. Idílio é a apresentação de dois cenários distintos de vegetação domesticada. O primeiro cenário diz respeito aos serviços de jardinagem oferecidos pela própria Light, com destaque para os pinheiros que adornavam as ruas. O segundo, à prática de cultivo de hortas por parte dos moradores da vila. Tanto os jardins quanto as hortas foram tratados pelo depoente como elementos de uma paisagem bucólica, desempenhando, nas memórias de Idílio, um papel importante na construção de um local tratado com zelo. Nesse sentido, as hortas, que

provavelmente configuravam uma atividade de subsistência complementar ao salário e aos benefícios recebidos em troca do trabalho na usina, foram tratadas a partir do filtro moral do cuidado.

As considerações da Sra. Odette sobre a vegetação apresentam uma expressiva aproximação com as do Sr. Idílio. Nascida na Vila Light em 1938, filha de um trabalhador do setor da construção civil da Companhia, Odette viveu no local até os 17 anos, quando seu pai, próximo de se aposentar, fez um acordo com a empresa para encerrar seu vínculo empregatício. Quando perguntada sobre a vegetação do local, a Sra. Odette disse:

Ah, a mata é aquela mata atlântica, né? Mais pro lado ali... você sabe onde tem as casas bonitas, que você vai descendo? [...] [Lá] não tem mais aqueles pinheiros, aqueles ciprestes não tem mais, cortaram tudo. Casa daqui, casa daqui [gesticulando, mostrando visualmente a disposição das casas]. Mas pro lado de cá, mas pra trás das casas, tinha bastante vegetação. Árvore, quaresmeira... ninguém nunca tinha derrubado aquelas matas.

[...] Tinha um lugar pra baixo, perto do que eles chamavam de Ponte Vermelha (...). Todo mundo tinha horta ali. [...] Tinha horta, tinha chiqueiro de porco, criavam porco. (...) Horta tinha bastante (...) A gente tinha uma horta logo atrás de casa. Perto, né? Bem pertinho. Mas lá [na Ponte Vermelha], meu pai tinha outra. Então é onde ele plantava mais coisa, tinha porco... então ele ia levar comida pros porcos, ele descia lá de bota. Eu não descia lá.

Eu, se tinha que levar alguma coisa, levava. Mas eu ficava lá de cima. Se tivesse que jogar, eu jogava. Mas descer lá eu não descia. Um barro danado! 113

As três categorias identificadas na narrativa do Sr. Idílio estão também presentes no depoimento da Sra. Odette. A depoente iniciou sua fala comentando a presença da mata atlântica. Em seguida, mencionou os pinheiros que adornavam a Rua Principal, mantidos pelo serviço de jardinagem da São Paulo Light. Enfim, retomou a mata atlântica como um pano de fundo para o cenário bucólico da vila, estando ela “pra trás das casas”.

Odette comentou, então, o cultivo de hortas por parte dos moradores da vila, dando maior atenção a esse fenômeno. Em seu relato, o papel de subsistência das hortas foi evidenciado, tendo em vista sua associação com a criação de porcos. Embora, em linhas gerais, a narrativa de Odette tenha elaborado uma paisagem bucólica semelhante à descrita por Idílio, as hortas foram menos romantizadas em seu depoimento que no de seu marido. Chama também atenção a distribuição geográfica das hortas, que não se limitavam ao terreno da residência. A Ponte Vermelha, segundo a depoente, agruparia hortas de diversos moradores da Vila Light.

113. SOUZA, Odette Carlos de. Entrevista concedida a Gabriel Santos. Santos, 06/03/2015. Suporte: Arquivo de áudio

O depoimento da Sra. Vera também abordou a vegetação da Vila Light, conforme solicitado por mim. Ao ser perguntada sobre a relação dos moradores da Vila Light com o ambiente próximo, considerando a Serra do Mar e as cachoeiras nela presentes, Vera respondeu que

Olha, até (...) essa época de [19]50, 50 e pouco, aí eu já tava maiorzinha, era tudo bem natural! Sabe? Aquela água limpinha, escorrendo de tudo quanto era morro, tinha aquelas nascentizinhas no fundo do quintal, sabe? Que saia, assim, bem clarinha. Tinha aqueles pezinhos de amora cheio de amora, em baixo do morro, do quintal. Então era tudo bem limpo (...). Tinha aquela nevoazinha, assim, de quando começa frio, outono, assim, agosto, setembro. Era tudo bem natureza, bem limpinho mesmo! Antes das indústrias chegarem, dava pra sentir, sabe, a natureza purinha ali. A água pura na folhagem, nas plantas. Tudo limpinho!

A fala da Sra. Vera marcou a vila como um local limpo, estando o contato com a natureza diretamente ligado a esse fator. Seu depoimento converge com o do Sr. Idílio, que categorizou a paisagem sob os signos do cuidado e do cultivo a partir da vegetação que a compunha. Outra convergência identificada é em relação à fala da Sra. Odette. Tanto Vera quanto Odette associaram a vegetação ao espaço do quintal de suas casas. No caso de Odette, o quintal era o espaço de cultivo da horta de seu pai; no caso de Vera, o quintal era marcado pela presença de amoreiras.

O que verifiquei nos depoimentos de Idílio, Odette e Vera é que a vegetação, embora possa ser organizada em três categorias distintas – mata, jardins e hortas – compõe um conjunto harmonioso no momento em que a paisagem da Vila Light é elaborada nas memórias de seus ex-moradores. Seja pela marca da limpeza, do cuidado ou da beleza, a vegetação presente no Complexo Hidroelétrico Henry Borden foi articulada nos depoimentos orais dos ex-moradores da Vila Light de forma a compor uma paisagem marcada pela exuberância da natureza e pela vida pacata, bucólica e ordenada.

A já citada consideração de Telma Correia do contraste da vegetação externa com a vegetação interna das vilas operárias e núcleos fabris auxilia na compreensão do caso da Vila Light, tendo em vista que há um evidente contraste entre a vegetação ordenada no interior da vila, oriunda tanto de uma política oficial da Companhia quanto de uma prática de seus trabalhadores, e a vegetação não ordenada da mata atlântica, encontrada nas encostas da Serra do Mar que cercavam parte da vila. No caso da Vila Light, no entanto, o contraste é minimizado nas memórias de seus ex-moradores. Em seus relatos, os diferentes tipos de vegetação foram aproximados na construção de uma imagem para a vila que a associa às ideias de ordem, beleza e limpeza.

A imagem da ordem e da limpeza, presente especialmente nos depoimentos de Vera e Idílio, é possivelmente fruto de uma real preocupação da administração do Complexo Henry

Borden. Os jardins da Vila Light, tal como ocorrido em outras vilas operárias e núcleos fabris, estavam subordinados à ordenação e ao controle do espaço por parte da Companhia e demonstravam a tutela da empresa em relação a seus empregados. Os jardins seguiam a lógica de organização das vilas operárias e núcleos fabris, que visavam a adequar os trabalhadores para a atividade fabril. A vida, em todas as suas dimensões, deveria ser ordenada segundo princípios de produtividade e de acordo com a hierarquia fabril.

Essa relação é bastante evidente na imagem que abre este capítulo (Figura 22). Tomando como base a “Planta do Acampamento Permanente das Usinas Hidrelétricas de Cubatão” (Figura 3), produzida por Maria de Lourdes Radesca em 1963, e os depoimentos orais coletados ao longo desta pesquisa, podemos reconhecer que o foco da fotografia é a distribuição do Acampamento D no conjunto da vila operária. Além desse acampamento, situado no lado esquerdo superior da fotografia, podem ser identificadas a Casa de Visitas – a maior casa, situada sobre uma pequena elevação do terreno – e partes de outros dois conjuntos de casas: as da Rua Rio Grande do Sul, localizadas no canto inferior direito da imagem, e as da Rua Principal, localizadas ao longo da rua adornada com pinheiros.

Um primeiro elemento que se destaca nessa imagem é a massiva presença da vegetação da mata atlântica, recobrindo os morros que enquadram as casas desse conjunto de residências. Em termos estéticos, a mata atlântica forma uma massa escura que recobre o fundo da fotografia, contrastando com a claridade do céu, que ocupa a faixa superior da fotografia, e com os tons mais claros da vila e de sua vegetação, que ocupam a faixa inferior da fotografia. O contraste se verifica também entre a composição da vegetação dos morros, como mata fechada, e as árvores distribuídas no território da vila, domesticadas.

As árvores da vila retratadas na imagem se apresentam, fundamentalmente, em dois estágios de crescimento. À frente do Acampamento D é visto um conjunto de árvores bastante jovens, que se distribui a partir de uma pequena elevação no terreno e se direciona para o lado direito da fotografia, passando por trás da Casa de Visitas. Ao contrário das demais árvores retratadas na fotografia, essas árvores não estavam ainda totalmente crescidas, sendo, por isso, bastante baixas. O contraste entre as árvores mais jovens, plantadas em uma faixa anterior à Casa de Visitas, e as árvores já crescidas, plantadas na faixa posterior à Casa de Visitas, deriva, muito provavelmente, do fato de o Acampamento D ter sido construído posteriormente ao restante da vila, conforme indicado nos depoimentos de alguns ex-moradores.

As árvores da vila apresentadas na fotografia possuem também distinções quanto a sua distribuição. Se as árvores plantadas à frente do Acampamento D se organizam em pequenas fileiras, distribuídas de forma aparentemente aleatória, as árvores das casas da Rua Rio

Grande do Sul marcam a presença da vegetação nos quintais das casas. Embora somente se possam ver duas casas dessa rua (além do telhado de uma terceira), é possível reconhecer que, ao lado direito da fachada traseira de cada casa há uma árvore alta, que ultrapassa a altura dos telhados. No fundo de cada quintal, posicionadas de maneira semelhante, há também algumas árvores arbustivas. As árvores das casas da Rua Rio Grande do Sul, assim, distribuem-se de modo a padronizar os quintais das residências e possibilitam que os moradores estabeleçam uma associação mais direta entre os quintais de suas casas e a vegetação da vila. Diferentemente, as árvores posicionadas à frente do Acampamento D funcionam no sentido de situar a presença de um novo conjunto de residências e de demarcar seus limites em relação às casas mais antigas.

O contraste de distribuição da vegetação interna à vila que mais chama atenção, no entanto, é o das árvores Rua Principal com as demais. Na fotografia em questão, a Rua Principal é adornada, em cada um de seus lados, por uma longa fileira de pinheiros. Destaca- se o fato de que a maioria das árvores possui a mesma altura e que todas elas estão meticulosamente dispostas ao longo da rua. Essa composição foi recorrentemente recordada pelos ex-moradores da vila: a Sra. Odette, por exemplo, mencionou essa rua como o local “onde tem as casas bonitas, (...) [com] aqueles pinheiros, aqueles ciprestes”; o Sr. Idílio, de forma um pouco mais genérica, comentou que “tinha bastante pinheiros pelas avenidas”; a Sra. Ivone, por sua vez, ao ser questionada sobre os acampamentos que existiam na vila, afirmou que

Tinha esse (...) acampamento, aquele primeiro que eu falei, né, que chama “Ilha”. É... encostado no canal. E depois tinha outro acampamento, onde passava (...) a Rua Principal (...), onde passava quem tinha carro. Poucas pessoas tinham, né? E do outro lado tinha outra fileira de casinhas, todas elas assim, grudadinha uma na outra. E depois tinha os outros que vinham pra cima, né?

E tinha também (...) a Rua Principal, que ainda, até hoje, chama-se Rua Principal, porque ali morava a chefia, né? Aquelas casas bonitas, grandes, que a gente vê ali, que tem aquelas árvores, aquela coisa toda. Ali morava a chefia. (...) A rua mais bonita, né? Calçado... apesar que tudo era bonito ali na Light, né? Lá era muito bonito. Então, a chefia morava ali.

A fala de dona Ivone nos permite perceber que a vegetação, associada às ideias de beleza e de ordem, possuía um papel de grande importância na construção das relações de poder da Vila Light. Como discuti na Introdução desta dissertação, em relação às figuras 7, 8, 9 e 10, havia na vila uma tendência de que as casas maiores, destinadas aos funcionários que ocupavam cargos mais altos na hierarquia empresarial, fossem acompanhadas de vegetação mais ordenada e robusta. As casas destinadas a moradores que ocupavam cargos mais baixos, diferentemente, tendiam a apresentar vegetação pouco ordenada, em sua maioria em estado

selvagem, o que indicava uma menor dedicação dos serviços de jardinagem da Companhia a essas casas e, consequentemente, um menor prestígio dos moradores dessas casas na vida na vila e perante a São Paulo Light. A Rua Principal se constituía também segundo essa lógica: sendo ela o local em que moravam os funcionários que ocupavam os mais altos cargos da Companhia, possuía as maiores casas e a vegetação com o mais elevado grau de organização.

A vegetação da rua principal, nesse sentido, robustecia as lógicas de controle e demarcava visualmente as relações de poder existentes na vila e na empresa. Ao se estruturar como a rua com maior grau de ordenação, a Rua Principal reforçava seu papel de centralizar o poder da hierarquia trabalhista. Além disso, a disposição dos pinheiros ao longo da rua fazia com que ela fosse vista como a mais bela. Os rótulos de beleza e ordem, que guiaram parte das memórias dos ex-moradores sobre a Vila Light, encontravam sua expressão máxima no local em que se concentrava o poder.

Apesar da forte dimensão de controle associada aos jardins, estes foram apropriados nas memórias dos ex-trabalhadores como elementos de constituição de um local paradisíaco. A ordem imposta pela elite empresarial, um instrumento de controle da vida operária, foi ressignificada nas memórias dos antigos moradores da Vila Light, tomando um sentido positivo. Importante notar nesse sentido que, como defendido por Correia,

As baixas densidades, as pequenas dimensões e a forte presença de vegetação foram elementos fundamentais na construção da imagem dos núcleos fabris como lugares amenos – calmos e agradáveis –, testemunhos de uma boa qualidade de vida, imagem que parecia procurar apagar a representação extremamente negativa que se tinha do trabalhador fabril e do cotidiano operário. 114

As considerações sobre a vegetação e sobre a natureza como um todo presentes nos depoimentos orais dos ex-moradores da Vila Light destacam-se, ainda, por trazerem novamente a oposição entre um presente decadente e um passado áureo. No caso do depoimento do Sr. Idílio, o foco foi na grande mudança enfrentada pela vegetação da vila e de seu entorno. O depoente afirmou que a vegetação mudou muito. Afirmou que as árvores da serra eram exuberantes e em quantidade muito maior, destacou a presença de hortas cultivadas pelos moradores da vila e rotulou os jardins como “bem cuidados”. Considerou que a grande quantidade de vegetação que antes ali havia tornava o local “muito bom”. Embora não tenha descrito a situação da vegetação no presente, o que marca o comentário do

114. CORREIA. op. cit. pp.110-1. Importante reconhecer a distinção entre núcleos fabris e vilas operárias proposta pela autora, que associou os primeiros a contextos rurais e os últimos a contextos urbanizados. Embora a reflexão citada se refira aos núcleos fabris, ela pode ser aplicada ao caso da Vila Light, em especial ao se considerar que a maior parte dos entrevistados lá viveu antes de Cubatão se tornar efetivamente uma cidade industrial.

Sr. Idílio é a construção de um passado paradisíaco para a vila, balizado pela exuberância da vegetação e pelos cuidados da empresa e dos trabalhadores para com o local de moradia.

A fala de dona Vera se assemelhou à do senhor Idílio ao descrever a vila, no passado, como um local ordenado e ligado à natureza, em contraste com a decadência presente. Chama atenção o trecho em que a depoente afirmou que “Antes das indústrias chegarem, dava pra sentir (...) a natureza purinha ali”. Considerando que Vera viveu na Vila Light entre 1943 e 1966 – desde seu nascimento até o ano em que se casou –, é importante reconhecer que suas memórias de vida na vila dizem respeito fundamentalmente a sua infância e juventude. Dizem respeito também a três das várias ondas industriais que se estabeleceram em Cubatão: a primeira, a instalação das indústrias pioneiras, já comentada nesta dissertação; a segunda, a instalação do polo petroquímico a partir da instalação da refinaria de petróleo da Petrobrás; a terceira, a instalação da Cosipa e de algumas companhias a ela associadas.

A chegada das indústrias mencionada por dona Vera se refere ao processo de formação de um polo industrial em Cubatão, estabelecido a partir da instalação da refinaria da Petrobrás no município na década de 1950. A Usina de Cubatão e as indústrias pioneiras não foram consideradas indústrias nesse trecho de seu depoimento. A vida de Vera na Vila Light foi por ela associada à ideia de limpeza, em oposição à poluição que afetou Cubatão a partir de sua acelerada industrialização. Como no caso de Vera, a experiência de vida na vila e o próprio contato com a natureza, fosse ele orientado ou não pelas lógicas da exploração do trabalho industrial, ocupam um papel mais importante que o próprio trabalho industrial nas memórias de alguns dos ex-moradores da Vila Light.

A fala de dona Odette, embora tenha se afastado da imagem de limpeza elaborada por dona Vera ao associar as hortas aos chiqueiros lamacentos, convergiu com os demais depoimentos na criação de um contraste entre o presente e o passado. Odette lamentou as mudanças ocorridas na vegetação da vila, criticando o corte de árvores – tanto as da mata atlântica quanto aquelas plantadas pelo serviço de jardinagem da vila.

Em dado momento da entrevista, questionei à depoente se a vila era hoje muito distinta da época em que ela lá vivera. Odette respondeu comentando sobre as conversas que havia tido com seu cunhado, Irineu de Souza, sobre essas mudanças: