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O MODELO DOS ESTATUTOS DE IDENTIDADE

IV CRÍTICAS AO MODELO DOS ESTATUTOS DE

2. Categorias estáticas

O modelo tem também sido criticado porque é referido muitas vezes como uma tipologia, como um modelo categorial (Bosma, 1985; Cote & Levine, 1988 a) que nos fornece apenas produtos mais ou menos permanentes ou fixos e não momentos ou níveis de um processo de desenvolvimento. Mareia (1980) é claro quando refere que os estatutos de identidade são estilos que o indivíduo utiliza para estabelecer, manter e, se necessário, rever o seu sentido de identidade. O indivíduo pode usar ao mesmo tempo mais do que um estilo de acordo com o

alterar os seus estilos em função de circunstâncias da vida. É de referir, como complemento, que a grande maioria dos estudos que têm como objectivo estudar o desenvolvimento de identidade têm analisado as entrevistas por área, o que permite ter um perfil de progressão de formação da identidade em diferentes domínios. Mareia (1988) refere que na estratégia de avaliação global da entrevista o que está implícito é que a identidade é uma estrutura e a cotação por áreas indica a probabilidade dessa estrutura.

De qualquer forma, independentemente do critério utilizado, os estatutos não são produtos estáticos, mas estão em contínua mudança, o que aliás tem sido demonstrado em diferentes estudos já realizados.

Que os estatutos definem um contínuo em que o esta- tuto de Identity Achievement seria o ponto mais alto e, por- tanto, o ideal, tem sido também questionado. De facto a questão é complexa na medida em que Mareia nos primeiros escritos, (1964, 1966, 1967) se referia a essa continuidade, mas deixou de o fazer mais recentemente. Quando Mareia refere, em dife- rentes artigos e comunicações, que não podemos considerar que ser Achiever é melhor do que ser Foreclosure, mas que podemos apenas dizer que são formas, estilos diferentes de lidar com a identidade, parece claro que não considera os estatutos de identidade como um contínuo do mais fraco ao mais forte.

Se de um contínuo ou de um processo linear se tratasse não seria possível a passagem do estatuto de Identity

Achievement a Moratorium sem que isto fosse considerado

um regressão. Recentemente Mareia (1988 c) refere mesmo que um indivíduo pode passar do estatuto de Identity Achievement a Diffusion desenvolvimental, por estratégia e não por regressão. É de salientar, no entanto, que Mareia nunca explicitou a existência de mudança no seu ponto de vista; mas ela está patente quer nos seus estudos quer nos de outros autores que o seguiram. A título de exemplo podemos dizer que só recentemente o ciclo Moratorium-Achiever-Moratorium-

Achiever (MAMA) vem referido como símbolo de um processo

de desenvolvimento em espiral .

A tendência simplista de considerar o estatuto de

Identity Achievement como a saída "melhor" "mais desen-

volvida" "mais saudável" leva a interpretações erradas de que só uma minoria pode atingir esse nível. Por um lado, e como refere Waterman (1988 b), se analisarmos os estatutos de identidade por área verificamos que a percentagem de sujeitos que recorre ao estatuto de Achiever aumenta significativa- mente. Por outro não podemos considerar que uma teoria é elitista (Cote & Levine, 1988 a) só pelo facto de uma percen- tagem mais pequena de sujeitos se situar num determinado padrão. Neste caso, a maioria das teorias do desenvolvimento seriam elitistas; por exemplo, quantos sujeitos adultos se situam no estado de integridade do desenvolvimento do ego , segundo Loevinger?

O problema parece colocar-se mais em perceber o porquê de uma percentagem relativamente pequena de

vez mais nos leva à necessidade de análise dos contextos em que o indivíduo está inserido para melhor percebermos as suas repercussões ao nível do desenvolvimento da identidade.

3. Infiel à teoria de Erikson

Cote & Levine (1988 a), ao analisarem o modelo dos estatutos de identidade à luz da teoria de Erikson, referem que não conceptualiza nem operacionaliza correctamente a teoria do desenvolvimento de identidade tal como foi formulada por este autor. Mais, este modelo não só não é representativo da teoria de Erikson, como ainda utiliza erradamente a sua terminologia e introduz conceitos não existentes nela.

De facto, o modelo dos estatutos de identidade não tem como objectivo cobrir toda a matriz teórica de Erikson, mas elaborar apenas um modelo que operacionalize o conceito de identidade e permita o seu estudo empírico.

Para alguns críticos, Erikson nunca usou o termo

Identity Achievement, na medida em que a identidade nunca

está estabelecida como algo de estático e imutável. Efectiva- mente a terminologia escolhida por Mareia poderá não ser a ideal, mas o mais importante é o que esse conceito significa e, neste caso concreto, a definição do estatuto de Identity Achie-

vement está perfeitamente de acordo com a perspectiva de

Erikson: flexibilidade, construção, mudança, factores sociais que interferem no processo, são elementos presentes na definição de Mareia.

Em relação ao Moratorium, igual a exploração (crise), os autores referem que Mareia valoriza fundamentalmente o

enquanto Erikson valoriza quer o polo social quer o psicológico; por isso, distingue os conceitos de crise e Moratorium psicos- social e institucionalizada. A Moratorium institucionalizada refere-se a contextos socialmente estruturados fornecidos aos indivíduos durante o período de Moratorium psicossocial. A

Moratorium psicossocial não é um subestádio do estádio da

identidade, nem é sinónimo de crise, é um período de tempo durante o qual o sujeito está livre para participar em contextos de socialização (Moratória institucionalizadas) que fornecem oportunidades para a experimentação de papéis, necessários à resolução adequada da identidade. Em resumo, Erikson define

Moratorium social/contextual como um período no qual o

indivíduo está mais ou menos livre para a experimentação de papéis. Isto não parece estar em desacordo com a definição de Mareia em que os indivíduos neste estatuto de identidade procuram alternativas e experimentam papéis para tomar decisões.

Em relação ao estatuto de Foreclosure, Cote & Levine (1988 a) consideram que o termo é empregue no modelo de Mareia não só pejorativamente como incorrectamente: pejorati- vamente, porque descreve uma posição menos desenvolvida da identidade; incorrectamente, porque, quando Erikson usa o termo, não é apenas para referir a ausência de crise, mas para descrever uma condição mais ou menos indesejável em que a

Moratorium psicossocial foi prematuramente terminada.

Mais uma vez o sentido entre ambas as terminologias nos parecem semelhante; no entanto Erikson refere-se a contextos e situações Foreclosure, enquanto Mareia se refere a

indivíduos fruto dessas situações. Quanto ao facto de ser pejo- rativo, como já foi referido anteriormente, em determinados contextos ser Foreclosure pode ser mais "saudável" do que ser

Achiever (1988 b).

O termo Diffusion foi nos últimos tempos abandonado por Erikson e substituído por Confusion; no entanto, o seu significado mantém-se, o que aliás está de acordo com a definição de Mareia. Cote & Levine referem que o estatuto de

Diffusion tem criado dificuldades de definição e, por isso,

diferentes tipos tem sido referidos. Se é verdade que a maioria dos estudos têm constatado a existência de diferentes Diffusion, não é pela falta de concordância na sua definição.

Em relação às dimensões que definem os estatutos de identidade, isto é, crise e investimento, também são conceitos que segundo os autores não são usados no mesmo sentido de Erikson. Em relação à crise, Erikson define-a como sendo um fenómeno que pode variar ao longo de diferentes dimensões, que não é necessariamente um processo consciente e delibe- rado do eu e que factores sociais e culturais podem afectar o grau de severidade dessa crise. A questão fundamental reside no facto de que para Erikson a crise psicossocial passa-se não só ao nível consciente como ao nivel inconsciente e de facto Mareia, ainda que reconhecendo a importância dos aspectos inconscientes, focaliza-se, fundamentalmente, nas componentes conscientes e intelectuais e contextuais da crise de identidade.

Em relação ao investimento, Erikson refere-se a um indicador de que o estádio da identidade foi adequadamente resolvido e que estes investimentos em planos profissionais e numa rede de valores podem ser apenas manifestações tempo-

e rejeitados, enquanto que, os investimentos para Mareia são, segundo Cote & Levine, mais ou menos permanentes ou fixos e necessários para a entrada no mundo adulto. De facto, as duas perspectivas não nos parecem contraditórias, pois Mareia reconhece a possibilidade de alteração e rejeição de investi- mentos existentes e a sua redefinição (o ciclo M-A-M-A parece ser elucidativo disto). No entanto, a experimentação de papéis para Mareia não é um investimento mas faz parte de um período de exploração o que aliás está de acordo com Erikson, quando refere que essa experimentação ocorre numa Mora- torium institucionalizada. O que nos parece é que enquanto para Mareia o investimento é ou não o produto de uma exploração para Erikson o investimento pode existir na própria exploração.

De uma forma geral parece-nos que o pressuposto inicial de Cote & Levine (1988 a e b) ao elaborarem as suas críticas ao modelo de Mareia é querer comparar à partida coisas que nunca foram consideradas iguais, o que, portanto, leva a conclusões erróneas. De facto, o modelo de Mareia não é nem a continuação nem a sobreposição da teoria de Erikson: esta serve de base para a elaboração do modelo dos estatutos de identidade. De qualquer forma, podemos dizer que as suas semelhanças parecem maiores do que as suas diferenças, ainda que estas existam.

Em conclusão, podemos dizer que efectivamente o modelo de Mareia poderá não ser o ideal e tem sofrido sucessivas alterações que o têm enriquecido. As inúmeras

sua validade como as suas fraquezas. No entanto, é necessário alargar as suas áreas de investigação para a melhor compreensão do processo e da estrutura da identidade.

METODOLOGIA DA AVALIAÇÃO DOS