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Causas dependentes e independentes Determinados fatores podem interpor-se no nexo de causalidade

No documento Livro Proprietario Estácio Direito Penal 1 (páginas 69-73)

6.4 rELAÇÃo DE CAuSALiDADE

6.4.1. Causas dependentes e independentes Determinados fatores podem interpor-se no nexo de causalidade

entre a conduta e o resultado, de modo a influenciar no liame causal. Tais fatores são chamados de “concausas” ou simplesmente “causas”, como prefere atualmente a maioria dos autores.

Dividem-se em causas dependentes e independentes. Aquelas são as que se originam na conduta do agente e se inserem dentro da sua linha de desdobramento causal natural, esperado. Trata-se daquilo que normalmente acontece (quod plerumque accidit), constituindo, assim,

VoCABuLário

ad infinitum: é uma expressão

em latim que significa “até o in- finito”, “sem limite ou sem fim”, para indicar um processo ou operação que continua indefi- nidamente.

decorrências corriqueiras da conduta (ex.: a morte por choque hemor- rágico subsequente a um ferimento perfuroinciso profundo confi gura evento esperado; para a jurisprudência, a morte em virtude de infecção hospitalar é considerada decorrência esperada de uma internação). As independentes, de sua parte, são as que, originando-se ou não da condu- ta, produzem por si sós o resultado e confi guram algo que normalmente não acontece. São eventos inusitados, inesperados (ex.: uma pequena ferida incisa, normalmente, não é capaz de levar à morte, mas isso pode ocorrer se a vítima for hemofílica).

Em se tratando de causas dependentes, o agente responderá por todos os seus desdobramentos.

Quanto às causas independentes, é preciso distinguir entre as cau- sas absoluta e as relativamente independentes da conduta do agente.

1) Causas absolutamente independentes: são as que produzem por si sós o resultado e não têm qualquer origem ou relação com a conduta praticada pelo sujeito. Como nesse caso o resultado ocorreria de qual- quer maneira, com ou sem o comportamento realizado, fi ca totalmente afastado o nexo de causalidade, motivo por que o agente não responderá pelo resultado.

Subdividem-se em preexistentes (se anteriores à conduta do agen- te), concomitantes (quando ocorrem ao mesmo tempo) ou superve- nientes (se posteriores).

Exemplos:

a) efetuar disparos de arma de fogo, com intenção homicida, em pessoa que falecera minutos antes (causa preexistente);

b) atirar em pessoa que, no exato momento do tiro, sofre ataque cardíaco fulminante que não guarda relação alguma com o disparo (causa concomitante);

c) ministrar veneno na comida da vítima, que, antes que a peçonha faça efeito, vem a ser atropelada (causa superveniente; nesse caso, o agen- te só responde pelos atos praticados, ou seja, por tentativa de homicídio). Lembre-se de que em todas as causas absolutamente independentes fi cará afastada a relação de causalidade entre a conduta do sujeito e o resultado produzido, razão pela qual o sujeito apenas responderá pelos atos praticados, não sendo possível imputar-lhe o resultado fi nal (nos exemplos acima: a morte da vítima).

2) Causas relativamente independentes: são as que, somadas à con- duta do agente, produzem o resultado. De regra, não se exclui o nexo de causalidade, de forma que o resultado poderá ser atribuído ao agente, que por ele responderá.

Também se subdividem em preexistentes, concomitantes ou super- venientes.

Exemplos de causas relativamente independentes: a) Efetuar feri- mento leve, com instrumento cortante, num hemofílico, que sangra até a morte (a hemofi lia é a causa preexistente que, somada à conduta do agente, produziu a morte). Note que nesse exemplo se pressupõe que o

a) as causas absolutamente independentes sempre rompem o nexo causal, de modo que o agente nunca responderá pelo resultado; somente pelos atos praticados; b) as causas relativa- mente independentes não rom- pem o nexo causal, motivo por que o agente, se a conhecia ou se, embora não a conhecendo, podia prevê-la, responde pelo resultado (salvo na causa super- veniente).

Direito Penal

71 sujeito tenha efetuado um golpe leve no ofendido, que não produziria a morte de uma pessoa saudável.

b) Efetuar disparo contra a vítima que, ao ser atingida pelo projétil, sofre ataque cardíaco, vindo a morrer, apurando-se que a soma desses fatores produziu a morte (considere, nesse caso, que o disparo, isolada- mente, não teria o condão de matá-la, o mesmo ocorrendo com relação ao ataque do coração — causa concomitante).

c) Após um atropelamento, a vítima é socorrida com algumas lesões ao hospital; no caminho, a ambulância explode, ocorrendo a morte (a explosão da ambulância é a causa superveniente que, aliada ao atropela- mento, deu causa à morte do ofendido).

Nestes três últimos exemplos, há nexo causal entre a conduta e o resultado. O agente, contudo, só responderá pelo resultado se a causa preexistente ou concomitante for conhecida (o que conduz à responsa- bilização a título de dolo) ou, ao menos, previsível (indicativo de culpa). Nas concausas relativamente independentes supervenientes não há, por força de lei, nexo causal (CP, art. 13, § 1º). Trata-se de uma exceção le- gal à teoria da equivalência dos antecedentes. Isso se aplica ao exemplo da explosão da ambulância. Seria, efetivamente, um exagero imputar ao sujeito culpado pelo atropelamento a morte da vítima, que ocorreu em razão da explosão.

6.5

TiPo PENAL, TiPiCiDADE E ADEQuAÇÃo TíPiCA

6.5.1. Conceito

Tipicidade é a relação de subsunção entre um fato concreto e um tipo penal previsto abstratamente na lei. Trata-se de uma relação de en- caixe, de enquadramento. É o adjetivo que pode ou não ser dado a um fato, conforme ele se enquadre ou não na lei penal.

O conceito de tipicidade, como se concebe modernamente, pas- sou a ser estruturado a partir das lições de Beling (1906), cujo maior mérito foi distingui-la da antijuridicidade e da culpabilidade. Seus ensinamentos, entretanto, foram aperfeiçoados até que se chegasse à concepção vigente.

Jiménez de Asúa sistematizou essa evolução, dividindo-a em três fases:

1ª) Fase da independência (Beling — 1906): a tipicidade possuía função meramente descritiva, completamente separada da ilicitude e da culpabilidade (entre elas não haveria nenhuma relação). Trata-se de ele- mento valorativamente neutro. Sua concepção não admitia o reconheci- mento de elementos normativos ou subjetivos do tipo.

subsunção: é a ação ou efeito de subsumir, isto é, incluir (al- guma coisa) em algo maior. Como definição jurídica, confi- gura-se a subsunção quando o caso concreto se enquadra à norma legal em abstrato.

2ª) Fase do caráter indiciário da ilicitude ou da ratio cognoscendi (Mayer — 1915): a tipicidade deixa de ter função meramente descriti- va, representando um indício da antijuridicidade. Embora se mantenha, admite-se ser uma indício da outra. Pela teoria de Mayer, praticando-se um fato típico, ele se presume ilícito. Essa presunção, contudo, é relativa, pois admite prova em contrário. Além disso, a tipicidade não é valorati- vamente neutra ou descritiva, de modo que se torna admissível o reco- nhecimento de elementos normativos e subjetivos do tipo penal.

3ª) Fase da ratio essendi da ilicitude (Mezger — 1931): Mezger atri- bui ao tipo função constitutiva da ilicitude, de tal forma que, se o fato for lícito, será atípico. A ilicitude faz parte da tipicidade. O tipo penal do homicídio não seria matar alguém, mas matar alguém fora das hipóteses de legítima defesa, estado de necessidade etc.

Concepção dominante: a de Mayer.

6.5.2. Adequação típica

É o mesmo que tipicidade, ou seja, a relação de subsunção entre o fato e a norma penal. Há quem pense de modo diverso, afi rmando que tipicidade seria a mera correspondência formal entre o fato e a norma, enquanto a adequação típica, a correspondência que levaria em conta não apenas uma relação formal de justaposição, mas a consideração de outros requisitos, como o dolo ou a culpa.

Há duas modalidades de adequação típica:

1ª) Adequação típica por subordinação imediata ou direta: dá-se quando a adequação entre o fato e a norma penal incriminadora é ime- diata, direta; não é preciso que se recorra a nenhuma norma de extensão do tipo. Exemplo: alguém efetua dolosamente vários disparos contra a vítima — esse fato se amolda diretamente ao tipo penal incriminador do art. 121 do CP.

2ª) Adequação típica por subordinação mediata ou indireta: o en- quadramento fato/norma não ocorre diretamente, exigindo-se o recurso a uma norma de extensão para haver subsunção total entre fato concreto e lei penal. Exemplo: se alguém, com intenção homicida, efetua vários disparos de arma de fogo contra outrem e foge, sendo a vítima socorrida e salva a tempo, esse fato não se amolda ao tipo penal do art. 121 (não houve morte). Também não se enquadra no art. 129 (lesões corporais) porque o sujeito agiu com animus necandi (o art. 129 pressupõe animus

laedendi). Seria o fato atípico? Não. Para que ocorra o perfeito enqua-

dramento da conduta com a norma, contudo, será preciso recorrer a uma norma de extensão; no caso, o art. 14, II, que descreve a tentativa. O mesmo se verifi ca quando alguém empresta arma de fogo a um ho- micida, que a utiliza posteriormente para cometer o crime. Sua conduta não encontra correspondência direta com o art. 121 do CP. Novamente é preciso, então, socorrer-se de uma norma de extensão; nesse caso, o art.

conduta (ação ou omissão) FATo TíPiCo Nexo causal Tipici- dade Resul- tado ATENÇÃo

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73 29, caput, que pune a participação1.

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