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4.4 A LEi PENAL No ESPAÇo

No documento Livro Proprietario Estácio Direito Penal 1 (páginas 36-41)

O CP defi niu no art. 6º o lugar do crime, adotando a teoria da ubi- quidade ou mista, segundo a qual o crime se considera praticado tanto no lugar da conduta quanto naquele em que se produziu ou deveria pro- duzir-se o resultado. A preocupação do legislador foi estabelecer quais crimes podem ser considerados como ocorridos no Brasil e, por via de consequência, a quais delitos se aplica a lei penal brasileira.

A regra em estudo só terá relevância nos chamados crimes a dis- tância ou de espaço, que são aqueles cuja execução se inicia no território de um país e a consumação se dá ou deveria dar-se em outro. Imagine a hipótese de um agente iniciar a execução de um crime na Argentina, visando produzir o resultado no Brasil, ou o inverso. Em ambos os casos, os delitos serão considerados como ocorridos em território nacional, de modo que a lei penal brasileira a eles se aplicaria. Como dizia Hungria, basta que o crime tenha “tocado” o território nacional para que nossa lei seja aplicável.

4.4.1. Foro competente

Em se tratando de determinação de competência territorial (“foro competente”), deve-se observar a regra do art. 70 do CPP, que considera

Em se tratando de crime per- manente (aquele cuja consuma- ção se prolonga no tempo, como ocorre com o delito de extorsão mediante sequestro — art. 159 do CP), deve-se fazer uma ob- servação: mesmo tendo a ação ou omissão se iniciado antes da maioridade penal, se o agente a prolongou conscientemente ao período de sua imputabilidade penal, terá aplicação o CP.

Juízo, Direção de maria Au- gusta ramos, 2007. Da mes- ma diretora do documentário Justiça, Juízo retrata o julga- mento de ado- lescentes em confl ito com a lei.

CiNEmATECA

No Brasil a imputabilidade penal se dá aos 18 anos. Quando o indivíduo entre 12 e 17 anos co- meter uma das condutas descri- tas no Código Penal, aplicam-se as medidas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (são as medidas socioeducativas: ad- vertência; obrigação de reparar o dano; prestação de serviços à comunidade; liberdade assistida; inserção em regime de semi-liber- dade; internação em estabeleci- mento educacional).

ATENÇÃo ComENTário

Direito Penal

37 competente o foro do local em que o crime se consumou (ou, no caso de tentativa, o do local em que se deu o último ato executório).

4.4.2. Territorialidade da lei penal (CP, art. 5º)

Dá-se o fenômeno da territorialidade quando a lei penal se aplica ao fato cometido dentro do território nacional. Conforme dispõe o art. 5º do CP, a lei penal brasileira aplica-se em todo o território nacio- nal, ressalvado o disposto em tratados, convenções ou regras de direito internacional. Trata-se do princípio da territorialidade temperada ou mitigada.

Por território, no sentido jurídico, deve-se compreender todo o es- paço em que o Brasil exerce sua soberania, que abrange:

a) os limites compreendidos pelas fronteiras nacionais;

b) o mar territorial brasileiro (faixa que compreende o espaço de 12 milhas contadas da faixa litorânea média — art. 1º da Lei n. 8.617/93);

c) todo o espaço aéreo subjacente ao nosso território físico e ao mar territorial nacional (princípio da absoluta soberania do país subjacente — Código Brasileiro de Aeronáutica, art. 11, e Lei n. 8.617/93, art. 2º);

d) as aeronaves e embarcações:

— brasileiras privadas, em qualquer lugar que se encontrem, salvo em mar territorial estrangeiro ou sobrevoando território estrangeiro;

— brasileiras públicas, onde quer que se encontrem; — estrangeiras privadas, no mar territorial brasileiro.

Como se viu inicialmente, há crimes que, embora praticados den- tro do território nacional, não se sujeitam à lei brasileira (em função de ressalvas previstas em tratados ou convenções internacionais): isso se dá nos casos de imunidade diplomática. Note-se que a embaixada de um país no Brasil não é considerada território estrangeiro, de modo que, se um crime ali for praticado, a ele será aplicável a nossa lei, a não ser que ocorra um caso de imunidade diplomática.

4.4.3. Extraterritorialidade da lei penal (CP, art. 7º)

Extraterritorialidade é o fenômeno pelo qual a lei penal brasileira se aplica a fatos ocorridos fora do território nacional. Subdivide-se em extraterritorialidade condicionada ou incondicionada. Nesta, a lei bra- sileira aplicar-se-á ao crime praticado no exterior, independentemente do preenchimento de qualquer requisito ou condição (art. 7º, I e § 1º). Naquela, o fenômeno depende da conjugação de uma série de fatores (art. 7º, II e §§ 2º e 3º).

Fala-se em extraterritorialidade incondicionada nas seguintes hi- póteses:

a) crime contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; b) crime contra o patrimônio ou contra a fé pública da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios ou dos Territórios, ou suas

Uma das questões mais co- muns em provas e concursos é a que versa sobre a questão do tempo e lugar do crime e a te- oria adotada a respeito. Então, não se esqueça: a) TEMPO DO CRIME: ATIVIDADE; b) LUGAR DO CRIME: UBIQUIDADE; c) FORO COMPETENTE: RESULTADO.

ATENÇÃo

VoCABuLário

mitigada: diminuída; ameniza- da; atenuada.

O Brasil é signatário do Estatu- to de Roma do Tribunal Penal In- ternacional (Decreto n. 4.388, de 2002). O art. 1º do Estatuto dispõe: “(...) O Tribunal será uma institui- ção permanente, com jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional, de acordo com o presente Estatuto, e será complementar às jurisdi- ções penais nacionais”. Os crimes tutelados pelo TPI são: genocí- dio, crimes contra a humanida- de, crimes de guerra e crime de agressão (art. 5º).

Sede do Tribunal Penal Internacional - TPI, Haia, Holanda

autarquias, das empresas públicas, das sociedades de economia mista ou das fundações instituídas pelo Poder Público;

c) crime contra a administração pública brasileira por quem está a seu serviço;

d) crime de genocídio, se o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil.

A extraterritorialidade condicionada ocorre em relação às seguin- tes infrações:

a) crimes previstos em tratado ou convenção internacional que o Brasil se obrigou a reprimir;

b) crimes praticados por estrangeiro contra brasileiro, fora do nos- so território (se não foi pedida ou se foi negada a extradição e se houve requisição do Ministro da Justiça);

c) crimes praticados por brasileiro;

d) crimes praticados a bordo de navio ou aeronave brasileiros pri- vados, quando praticados no exterior e ali não forem julgados.

A doutrina costuma apontar uma série de princípios que inspira- ram o legislador a eleger os casos em que a lei de um país deve ser apli- cada a fatos que se deram no estrangeiro:

a) Princípio da justiça penal universal ou cosmopolita: refere-se a hipóteses em que a gravidade do crime ou a importância do bem jurídi- co violado justifi cam a punição do fato, independentemente do local em que praticado e da nacionalidade do agente. Foi adotado nas letras d da extraterritorialidade incondicionada e a, da condicionada.

b) Princípio real, da proteção ou da defesa: justifi ca a aplicação da lei penal brasileira sempre que no exterior se der a ofensa a um bem jurídico nacional de origem pública. Foi adotado nas letras a até c da extraterritorialidade incondicionada.

c) Princípio da personalidade ou nacionalidade ativa: como cada país tem interesse em punir seus nacionais, a lei pátria se aplica aos bra- sileiros, em qualquer lugar que o crime tenha sido praticado. Foi adota- do na letra b da extraterritorialidade condicionada.

d) Princípio da personalidade ou nacionalidade passiva: se a víti- ma for brasileira, nosso país terá interesse em punir o autor do crime. Foi adotado na letra b da extraterritorialidade condicionada (v. CP, art. 7º).

Obs.: ao contrário do que sustentam alguns autores, esse princípio não se confunde com o princípio da proteção, que se refere a bens pú- blicos, o que não ocorre aqui.

e) Princípio da representação ou da bandeira: a lei brasileira se aplica às embarcações ou aeronaves que carreguem nossa bandeira. Foi adotado na letra d da extraterritorialidade condicionada.

Direito Penal

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4.4.3.1 Condições aplicáveis aos casos de

extraterritorialidade condicionada

São as seguintes:

a) entrada do agente no território nacional (condição de procedi- bilidade);

b) ser o fato punível também no país em que cometido;

c) estar o crime entre aqueles a que a lei brasileira admite a extra- dição;

d) não ter sido o agente absolvido ou não ter cumprido pena no estrangeiro;

e) não ter sido perdoado e não se tiver extinguido sua punibilidade, segundo a lei mais favorável (condições objetivas de punibilidade).

4.4.3.2 Extraterritorialidade na Lei de Tortura

A Lei n. 9.455, de 1997, que tipifica o delito de tortura (“constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofri- mento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa”), estabelece que seus dispositivos se aplicam “ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira” (art. 2º). Cuida-se, portanto, de situação de extraterritorialidade prevista em lei especial.

4.4.3.3 Princípio do non bis in idem (CP, art. 8º)

Nas hipóteses de extraterritorialidade incondicionada é possível, em tese, que o agente responda por dois processos pelo mesmo fato, um no exterior, outro no Brasil, sobrevindo duas condenações. Se isso ocor- rer, aplicar-se-á o art. 8º, que se funda no princípio do non bis in idem (o qual proíbe seja alguém condenado duas vezes pelo mesmo fato). Sendo assim, a pena cumprida no estrangeiro: a) atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas; ou b) nela é computada, quando idênticas (detração).

Recentemente há casos cé- lebres de discussão de extradição no Brasil. Em 2015, foi aplicada a pena de morte a dois brasileiros condenados por tráfico de dro- gas na Indonésia, Rodrigo Gularte, de 42 anos, e Marco Moreira, 53 anos. O país negou a extradição. O Brasil também negou a extra- dição de Cesare Battisti, que foi condenado na Itália à prisão per- pétua por homicídio, quando in- tegrava o grupo Proletariados Ar- mados pelo Comunismo. Em 2004, fugiu para o Brasil. Foi preso em 2007. A Itália pediu a extradição, e o STF concordou, mas destacou que extradição é competência do presidente da República. Em 2010, o então presidente Luiz Iná- cio Lula da Silva considerou Bat- tisti alvo de perseguição e negou a extradição. O Supremo voltou a discutir o caso, mas considerou que a decisão do presidente tinha que ser respeitada. (Fonte: G1)

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