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2     DESIGN: AVENTURA PELO TEMPO

2.6     Character design e percepção visual

 

2.6    Character design e percepção visual 

 

As  práticas  do  design  fundamentam‐se  na  percepção  visual.  É  com  ela  que  o 

design se conecta para que obtenha sucesso em seus objetivos. Qualquer projeto gráfico – 

assim chamados os projetos que o designer gráfico vai desenvolver – obedece a um objetivo  específico.  E  quando  a  elaboração  visual  é  transporte  da  informação  a  ser  comunicada,  a  percepção  visual  norteia  toda  sua  estruturação.  No  livro  Sintaxe  da  linguagem  Visual  da  autora Donis A. Dondis, encontramos uma passagem que elucida a relação das atividades de 

design com a percepção visual: 

 

Na criação de mensagens visuais, o significado não se encontra apenas nos  efeitos  cumulativos  da  disposição  dos  elementos  básicos,  mas  também  no  mecanismo  perceptivo  universalmente  compartilhado  pelo  organismo  humano. Colocando em termos mais simples: criamos um design a partir de  inúmeras  cores  e  formas,  texturas,  tons  e  proporções  relativas;  relacionamos  interativamente  esses  elementos;  temos  em  vista  o  significado. O resultado é a composição, a intenção do artista, do fotógrafo  ou do designer. (DONDIS, 1997, p. 30) 

 

Dentro  das  práticas  do  character  design  não  é  diferente:  existe  um  objetivo  traçado  pelo  diretor  que  precisa  ser  atingido.  E  o  sucesso  em  atingir  esse  objetivo  está  diretamente  relacionado  às  técnicas,  conceitos  e  formas  a  serem  utilizadas  na  estrutura  visual. 

Relacionado  às  áreas  da  retórica  e  da  argumentação,  podemos  definir  como  parte do objetivo do orador‐diretor a construção dos ethe dos personagens. 

Ao se evidenciar a importância do design do personagem na construção do ethos,  faz‐se  necessário  que  entendamos  como  essas  estruturas  visuais  instauram  algum  sentido.  Para  isso,  é  importante  que  se  entenda  como  as  linguagens  visuais  atuam  e  como  os  elementos visuais funcionam como texto. 

Cavalcante (2012, p. 20) assim define texto como sendo um evento comunicativo  em que estão presentes os elementos linguísticos, visuais e sonoros; um evento de interação  entre o locutor e o interlocutor, que se encontram em um contínuo diálogo. 

No  caso  específico  do  design  de  personagens  (character  design),  é  o  texto  não  verbal  que  será  analisado.  Entende‐se  como  texto  não  verbal,  o  texto  que  provém  de  qualquer outra natureza que seja a verbal, textual ‐ escritos ou falados ‐ pertencentes a um  vernáculo. Sons, imagens, odores, texturas, sensações que, utilizadas como instrumento de  comunicação  e  linguagem,  produzem  sentido.  Sendo  mais específico  ainda,  ao  se  tratar  de 

character design, serão analisadas as composições visuais dos personagens. 

Assim como o texto verbal, o texto visual também produz sentidos; porém devem  ser  analisados  por  outro  viés.  Sendo  composições  imagéticas  a  serem  analisadas,  precisaremos  de  teorias  provindas  da  percepção  visual  para  fundamentar  o  uso  das  linguagens visuais e como elas são interpretadas. 

Para  as  teorias  de  percepção  visual,  evocaremos  Rudolf  Arnheim  (1904‐2007),  psicólogo, nascido em Berlim, grande nome da pesquisa em percepção visual: 

 

Entre sua extensa produção acadêmica, destaca‐se a obra Arte e Percepção  Visual: uma Psicologia da Visão Criadora, publicada em 1954 e desde então  traduzida para inúmeros países. Para Arnheim, a experiência da apreciação  artística  resulta  de  uma  capacidade  inata  dos  seres  humanos  de  entender  por  meio  de  imagens.  Esse  "pensamento  visual",  que  não  pode  ser  encerrado  ou  traduzido  em  linguagem  verbal,  é  ao  mesmo  tempo  intelectual  e  intuitivo,  pois,  em  seu  entender,  o  intelecto  não  é  apenas  o  pensamento lógico, mas a análise linear sequencial, e a intuição não é uma  dádiva  de  inspiração,  e  sim  a  síntese  da  estrutura  como  um  todo.8  (ARNHEIM, 1904‐2007) 

 

Para que não seja uma teoria densa e demasiada vaga, os conceitos de percepção  visual  serão  aplicados  juntamente  aos  aspectos  de  character  design,  vistos  no  tópico  anterior. Pode‐se estabelecer a conexão entre a primeira lei da percepção visual juntamente  com  a  primeira  rotina  de  character  design:  criação  das  formas  básicas.  A  primeira  lei  da  percepção  visual  diz  “qualquer  padrão  de  estímulo  tende  a  ser  visto  de  tal  modo  que  a  estrutura resultante é tão simples quando as condições dadas permitem”. (ARNHEIM, 2011,  p.  47)  Ou  seja,  as  configurações  visuais,  os  textos  visuais  utilizados  na  criação  dos  personagens  tendem  a  ser  interpretados  da  forma  mais  simples  possível.  Logo  a  primeira 

       

8  GESTALT.  In:  ENCICLOPÉDIA  Itaú  Cultural  de  Arte  e  Cultura  Brasileiras.  São  Paulo:  Itaú  Cultural,  2019.  Disponível  em:  <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo9443/gestalt>.  Acesso  em:  20  de  fev.  2019.  Verbete da Enciclopédia. 

prática  do  character  design  é  projetar  formas básicas.  Assim,  todo  e  qualquer  personagem  parte da premissa de uma forma geométrica simples e primária.    Figura 5 – Prática inicial de character design. Formas geométricas iniciais    Fonte: BANCROFT, 2006, l. 445.   

A  partir  desse  ponto  inicial,  é  que  o  designer  lança  mão  dos  conceitos  de  percepção  visual  para  construir  o  design  do  personagem  e  consequentemente  sua  personalidade.  Lembrando  que  toda  a  construção  visual  elaborada  nessa  prática  obedece  aos objetivos especificados anteriormente pelo orador‐diretor do filme de animação. 

Retomando  o  conceito  de  simplicidade  proposto  pelas  leis  da  percepção  visual,  Arnheim (2011) assim a define:  

 

O  que  se  entende  por  simplicidade?  Primeiro,  pode‐se  defini‐la  como  a  experiência  subjetiva  e  julgamento  de  um  observador  que  não  sente  nenhuma dificuldade em entender o que se lhe apresenta. Pode‐se aplicar à  simplicidade o que Spinoza disse sobre a ordem. Segundo uma passagem da  Ética, acreditamos firmemente que existe ordem nas próprias coisas mesmo  que não saibamos nada a respeito delas ou de sua natureza. “Pois, quando  as  coisas  se  dispõem  de  tal  modo  que  ao  nos  serem  apresentadas  pelos  sentidos  podemos  facilmente  imaginá‐las  e,  em  consequência,  com  facilidade recordá‐las, as chamamos bem ordenadas e, no caso oposto, mal  ordenadas ou confusas”. (ARNHEIM, 2011, p. 47) 

 

Ao  continuar  a  construção  da  estrutura  visual  do  personagem,  seu  design,  a  prática continua aplicando formas básicas e definindo, o que na percepção visual se chama 

forma.  Para  definir  esse  aspecto,  pensemos  na  forma  como  a  aparência,  como  uma 

disposição espacial específica. Nesse sentido, Arnhein (2011) corrobora:   

“Forma é a configuração visível do conteúdo” escreveu o pintor Ben Shahn,  e  esta  é  uma  fórmula  tão  boa  quanto  qualquer  outra  para  mostrar  a 

distinção  entre  “shape”  (configuração,  figura,  aspecto,  forma)  e  “form”  (forma)  que  estou  considerando  nestes  capítulos.  Sob  o  título  “Configuração” examinei alguns dos princípios pelos quais o material visual  que  os  olhos  recebem  se  organiza  de  modo  que  a  mente  humana  possa  captá‐lo. [...] 

De  um  modo  mais  prático,  a  configuração  serve,  antes  de  tudo,  para  nos  informar  sobre  a  natureza  das  coisas  através  de  sua  aparência  externa.  (ARNHEIM, 2011, p. 89)    Figura 6 – Continuação do processo de character design, definição da forma    Fonte: BANCROFT, 2006, l. 445.   

Como  já  visto  anteriormente,  Bancroft  (2006)  apontou  que  o  design  do  personagem já comunica antes mesmo que o personagem fale ou faça algo. Isto é, a forma  empregada no design do personagem já começa a construir seu ethos antes mesmo que o  próprio  personagem  se  manifeste.  Com  essa  afirmação,  subentende‐se  que  formas  diferentes  evocam  sentidos  diferentes.  Dondis  (1997,  p.  58)  assevera  que:  “cada  uma  das  formas  básicas  tem  suas  características  específicas,  e  a  cada  uma  se  atribui  uma  grande  quantidade de significados, alguns por associação, outros por vinculação arbitrária, e outros,  ainda, através de nossas próprias percepções psicológicas e fisiológicas”.  

Pode‐se  perceber  o  sentido  da  asserção  de  Dondis  nas  palavras  de  Bancroft,  ainda de maneira mais específica: “These basic shapes will give you the visual cues you need 

traits and overall attitudes9”. Assim disse Bancroft (2016, l. 489). E continua “Circles ‐ evoke  appealing,  good  characters  and  are  typically  used  to  connote  cute,  cuddly,  friendly  types.  Consider Santa Claus, or endearing, fuzzy animals10”. Bancroft (2016, l. 489)  

Portanto,  se  o  personagem  possui  em  seu  design  formas  circulares,  existe  uma  grande  probabilidade  que  seja  interpretado  como  sendo  uma  figura  de  boa  índole  e  amigável.  Nessa  perspectiva,  pode‐se  citar  como  exemplo  o  personagem  Baymax,  um  dos  protagonistas do filme de animação Operação Big Hero (Big Hero 6, 2014), que é um robô  inflável  de  fala  mansa  e  tranquila,  criado  para  cuidar  de  pessoas  e  possui  kit  de  primeiros  socorros, escâneres para ferimentos, etc.    Figura 7 – Baymax, robô protagonista da animação Operação Big Hero (Big Hero 6, 2014)    Fonte: Disponível em: <http://disney.wikia.com/wiki/Baymax>. Acesso em: 10 ago. de 2018.   

Se  repararmos  nas  formas  empregadas  no  design  de  Baymax,  perceberemos  muitas formas circulares e arredondadas. A percepção visual, por meio da forma, explica o  motivo  pelo  qual  esse  sentido  de  tranquilidade  é  obtido.  A  simplicidade  da  forma  circular  garante essa característica: “o mesmo princípio também dá prioridade visual à forma circular.  O círculo que, com sua simetria central não particulariza nenhuma direção, é o padrão visual  mais simples”. (ARNHEIM, 2011, p. 165) 

Dondis (1997) também certifica a estabilidade da forma circular: 

 

O  círculo  é  um  bom  exemplo.  Parece  o  mesmo,  seja  como  for  que  o  olhemos (fig. 8.A), mas, no ato de ver, lhe conferimos estabilidade impondo‐ lhe  o  eixo  vertical  que  analisa  e  determina  seu  equilíbrio  enquanto  forma 

       

9As formas básicas lhe darão as dicas visuais que você precisa para descrever seus personagens. Eles se tornam  a  base  para  os  traços  de  personalidade  e  as  atitudes  gerais  de  seus  personagens.  (BANCROFT,  2016,  l.  489,  tradução nossa) 

10 Círculos ‐ evocam personagens carismáticos, bons e são normalmente usados para conotar tipos amigáveis,  fofinhos e simpáticos. Considere Papai Noel ou animais fofinhos. (BANCROFT, 2016, l. 489, tradução nossa) 

(fig.  8.B),  e  acrescentando  em  seguida  (fig.  8.C)  a  base  horizontal  como  referência que completa a sensação de estabilidade. (DONDIS, 1997, p. 34)      Figura 8 – Forma circular como forma estável e equilibrada    Fonte: (DONDIS, 1997).     

Tendo  em  vista  esse  pensamento,  Dondis  (1997,  p.  58)  também  afirma  que  ao  círculo se associa à infinitude, à calidez e à proteção.  

Levantadas  todas  essas  informações,  pode‐se  entender  o  motivo  pelo  qual  o  círculo  é  tido  como  uma  forma  que  cria  sentido  de  calma,  tranquilidade  e  é  pouco  provocativa. Sua estrutura equilibrada e simples não guarda espaços para linhas agressivas e  provocativas. 

Seguindo  a  explanação  das  significações  das  diferentes  formas  e  seus  diversos  sentidos evocados, objetivemos as formas quadrangulares. Na opinião de Bancroft (2006, l.  507), quadrados “usually depict characters who are dependable or solid, or play the heavy. 

Next  time  you’re  out  at  a  club,  check  out  the  bouncer,  one  big  old  square.  The  design  of  superheroes often relies on square shapes”11

Formas  quadradas  são  formas  regulares  constituídas  por  quatro  pontos  ligados  por  linhas  que  não  se  cruzam, elas se  continuam  ponta  a ponta.  São  quatro  cantos  que  se  alinham e se equilibram tencionando, cobrindo uma certa área de maneira sóbria e estável  formando um sistema de equilíbrio, como se quatro forças puxassem com a mesma força em          11 Geralmente retratam personagens que são confiáveis ou sólidos, ou ainda pesados. Da próxima vez que você  estiver em um clube, confira o segurança, um grande e velho quadrado. O design de super‐heróis muitas vezes  usa formas quadradas. (BANCROFT, 2006, l. 507, tradução nossa)

quatro direções de pares opostos em eixos X e Y. Conforme afirmado por Arnheim (2011, p.  6),  no  centro  do  quadrado  todas  as  forças  se  equilibram  e,  por  isso,  produzem  repouso.  Diferentemente  do  círculo  que  se  contém  sem  favorecer  nenhuma  direção,  o  quadrado  tenciona  e  expande  em  quatro  direções,  cobrindo  mais  área  proporcionalmente  que  um  círculo; por isso as noções de falta de mobilidade, estabilidade e peso que são garantidas por  essa  forma.  Dondis  (1997,  p.  58)  corrobora  ao  afirmar  que  “ao  quadrado  se  associam  o  enfado, a honestidade, a retidão e o esmero”. 

Pode‐se perceber o uso da forma quadrada no personagem Ralph (Figura 9), do filme  de  animação  Detona  Ralph  (Wreck  it  Ralph,  2013).  Suas  mãos,  além  de  uma  figuração  hiperbólica, são quadradas. Reforçam seu papel no filme, um personagem que quebra coisas  com as mãos. Além das mãos, o design do seu corpo também remete ao quadrado.    Figura 9 – Ralph, protagonista do filme de animação Detona Ralph (2012)    Fonte: Disponível em:  <https://vignette.wikia.nocookie.net/disney/images/d/da/Wreck_it_Ralph_pose_transparent.png/revision/late st?cb=20151202214156>. Acesso em: 25 set. de 2018.    Seguindo com a utilização de formas básicas regulares, temos o triângulo ou as  formas triangulares.  Para Bancroft (2006, l. 513), “Triangles ‐ easily lend themselves to more sinister,  suspicious types and usually represent the bad guy or villain in character designs”12. Formas  triangulares são formas que derivam em sua maioria de linhas diagonais e possuem o caráter  da obliquidade. Arnheim (2011, p. 177) nos esclarece que a obliquidade é sempre percebida          12Triângulos ‐ facilmente se prestam a tipos mais sinistros e suspeitos e geralmente representam o malvado ou  o vilão nos projetos de personagens. (BANCROFT, 2006, l. 513, tradução nossa) 

como  um  desvio,  daí  seu  caráter  dinâmico,  podendo  ser  também  um  diferencial  vital  em  relação  a  composições  estáticas.  Ele  se  refere  às  linhas  diagonais  em  detrimento  às  linhas  horizontais e verticais, que denotariam um desvio de caminho entre um ponto vertical e um  horizontal.  Nesse  viés,  Dondis  (1997,  p.  58)  associa  os  triângulos  à  ação,  ao  conflito  e  à  tensão,  motivos  pelo  qual  essa  forma  pode  ser  associada  aos  vilões,  como,  por  exemplo,  Hades (Figura 10), personagem do filme de animação Hércules (Hercules, 1997), produção da  Disney. Hades possui várias formas triangulares: seu nariz, formato do rosto, dentes, orelhas  e pontas dos dedos, vejamos:    Figura 10 ‐ Hades, vilão do filme de animação Hércules (1997) da Disney    Fonte: Disponível em: < https://www.bustle.com/articles/165405‐hades‐is‐the‐real‐hero‐of‐hercules‐if‐you‐ really‐think‐about‐it>. Acesso em: ago. de 2018.   

Aproveitando  o  caminho  de  análise  das  formas  básicas,  podemos  investigar  a  maneira  como  as  propriedades  são  empregadas.  Ou  seja,  as  formas  são  utilizadas  para  produzir  determinados  sentidos,  porém  vamos  verificar  como  alguns  aspectos  influenciam  nesse  processo,  e  como  as  propriedades  podem  contribuir  na  construção  de  sentido  na  percepção visual.  

Sendo assim, comecemos pela propriedade escala, que dizem respeito às formas,  que, quando comparadas a outras, estabelecem uma relação de tamanho. Essa relação pode  ser determinada pela escala em que estão sendo apresentadas. Para Bancroft (2006, l. 528),  “Interesting size relationships between shapes make for a stronger design with more visual 

interest”13. A percepção visual nos aclara sobre o funcionamento da propriedade escala com  o  Princípio  da  diferenciação.  Nesse  sentido,  explica  Arnheim  (2011,  p.  169)  que  “em  sua  forma mais elementar, este princípio indica que o desenvolvimento orgânico sempre procede  do  mais  simples  para  o  mais  complexo.  [...]  a  diferenciação  implica  também  num  desenvolvimento partindo do indefinido para o definido, da confusão para a ordem”. Assim  colocado, não se podem definir relações de escala sem a relação comparativa.  Inicialmente  uma  forma  por  si  só  pode  não  aparentar  ser  grande,  nem  pequena.  Essa  definição  só  acontece  se  houver  mais  alguma  referência  visual  para  que  a  comparação  se  estabeleça.  Como no exemplo a seguir, que apresenta um círculo básico (Figura 11 A) com o qual se pode  fazer  qualquer  coisa;  a  partir  dele,  construamos  um  boneco  de  neve  (Figura  11  B);  e,  em  seguida, mudemos as proporções (Figura 11 C).    Figura 11 ‐ Estruturação de um boneco de neve através de círculos e a relação de escala entre as formas  empregadas    Fonte: Compilação do autor.    No primeiro momento da figura anterior, temos um círculo que inicialmente não  possui  relação  alguma  a  não  ser  com  o  espaço  em  que  se  encontra.  Só  que  isso  não  é  o  suficiente para determinar nenhuma relação de dimensão ou escala. No segundo momento  da figura, já se pode relacionar que o círculo, anteriormente sozinho, é maior que os outros  dois colocados. E, no terceiro momento, existe uma troca entre a relação de dimensões, com  a alteração da posição entre os dois círculos de cima. Conclui‐se que a propriedade da escala 

       

13  Relações  interessantes  de  escala  entre  as  formas  criam  um  design  mais  forte,  com  mais  apelo  visual.  (tradução nossa) 

só  pode  ser  empregada  se  houver  alguma  relação  comparativa  entre  formas  já  existentes.  Pois que, declarado por Dondis (1997):  

 

[...]  o  grande  não  pode  existir  sem  o  pequeno.  Porém,  mesmo  quando  se  estabelece o grande através do pequeno, a escala toda pode ser modificada  pela introdução de outra modificação visual. A escala pode ser estabelecida  não  só  através  do  tamanho  relativo  das  pistas  visuais,  mas  também  das  relações com o campo ou com o ambiente. (DONDIS, 1997, p. 72) 

 

Observe  o  exemplo  a  seguir:  o  que  inicialmente  era  tido  como  maior  objeto  (Figura 12 A) acaba por se tornar não tão grande assim, ou ainda, perde seu posto de maior  forma básica, em relação à forma (Figura 12 D) inserida.    Figura 12 ‐ Relação entre escalas das formas e o teor comparativo    Fonte: Elaboração do autor.    

Detalhando mais  a  relação  entre  escalas,  além de  ser  relativa  e  dependente  de  outras formas, a escala pode ser usada para garantir certo dinamismo e maior apelo visual.  No caso da figura 12 B, existe um padrão crescente entre as formas, do menor para o maior.  Já na Figura 12 C, essa ordem foi quebrada na tentativa de promover uma configuração mais  interessante e menos monótona que a anterior, fugindo do convencional.   A segunda propriedade a ser vista é a da variação. “Variance refers to the spacing  and variety of sizes and shapes in your design. Creating more variety in your design will give 

it vitality and a push that will turn a good design into a great one!”14. (BANCROFT, 2006, l.  566) Não se trata somente do uso das formas em uma única estrutura, em um único design,  pode  também  ser  verificada  em  comparação  a  outros  designs.  Para  isso,  também  se  usa  o 

princípio da diferenciação, que diz respeito ao uso de uma forma com o mesmo significado 

para  caracterizar  diferentes  personagens.  Afinal,  é  natural  que  os  filmes  de  animação  possuam vários personagens que precisam ser distinguidos entre si.   Figura 13 ‐ As hienas Shenzi, Banzai e Ed do filme O Rei Leão (The Lion King, 1994)    Fonte: Disponível em: < http://2.bp.blogspot.com/‐ xUPznUzNIrA/T9q7l4qObQI/AAAAAAAAAEU/v1emHMaSt5g/s1600/473005_1277217578441_full.jpg>. Acesso  em: 10 out. de 2018.   

Como  exemplo  (Figura  13),  temos  Shenzi,  Banzai  e  Ed,  personagens  do  longa  animado O Rei Leão (The Lion King, 1994). Por mais que observemos e percebamos que são  três hienas, são três hienas diferentes. Todas possuem a mesma configuração: dois olhos, um  focinho, uma boca e quatro patas, são peludas, da mesma cor, possuem manchas em suas  costas e presas. Mas o que as diferencia tanto senão, justamente, a diferenciação do uso das  formas  básicas  em  suas  configurações?  Seus  olhos  são  da  mesma  cor  e  usam  formas  arredondadas,  porém  são  localizados  em  proporções  e  lugares  diferentes  em  cada  rosto.  Suas  orelhas  são  da  mesma  cor,  entretanto  possuem  comportamentos  diferentes:  em  uma         

14  Variação  refere‐se  ao  espaçamento  e  variedade  de  tamanhos  e  formas  em  seu  design.  Criando  mais  variedade em seu design lhe dará vitalidade e um impulso que vai transformar um bom design em um ótimo  design! (BANCROFT, 2006, l. 566, tradução nossa) 

hiena  ficam  caídas  e  danificadas,  em  outra  hiena  são  atentas  e  eretas.  Esse  exemplo  foi  tomado  por  serem  personagens  do  mesmo  filme  de  animação  e  mesmo  estilo  artístico.  Assim, por uma certa lógica, deveriam ser retratadas com as mesmas formas. Contudo, ainda  são  personagens  distintos  com  ethe  e  papéis  diferentes.  Para  cada  personagem,  o  orador‐ diretor  intencionou  uma  característica  peculiar,  e  essa  propriedade  de  variação  também  pode ser utilizada para garantir a particularidade em um elenco todo. Assim como na Figura  14, que registra personagens diferentes de uma mesma animação.    Figura 14 ‐ Personagens do filme Hotel Transilvânia (Hotel Transylvania, 2012)    Fonte: Disponível em: < Https://media.wired.com/photos/5932a1419be5e55af6c2640e/master/pass/hotel‐ transylvania‐3d‐1680x1050.jpg> Acesso em: 10 out. de 2018.   

Com  as  considerações  acerca  das  formas  básicas,  suas  propriedades  e  como  influenciam  na  atuação  do  character  design,  chega‐se  ao  conceito  de  totalidade  nas  construções  visuais.  As  formas  básicas  ‐  círculo,  quadrado  e  triângulo  –  fundem‐se  e  compõem uma estrutura maior. A essa configuração, dá‐se o nome de esqueleto estrutural.  A que Arnheim (2011) explica: 

 

Embora a configuração visual de um objeto se determine em grande parte  por  seus  contornos  externos,  não  se  pode  dizer  que  eles  constituam  a  forma. [...] 

Delacroix  disse  que,  ao  desenhar  um  objeto,  a  primeira  coisa  que  dele  se  deve  captar  é  o  contraste  de  suas  linhas  principais.  [...]  Durante  todo  o  trabalho,  o  artista  deve  ter  em  mente  o  esqueleto  estrutural  que  está  configurado,  enquanto,  ao  mesmo  tempo,  deve  prestara  atenção  aos  contornos,  superfícies,  volumes  completamente  diferentes  que  está  realmente fazendo. (ARNHEIM, 2011, p. 83‐84) 

E  este  conceito  de  forma  geral  que  o  esqueleto  estrutural  traz  consigo,  mesmo  que de maneira indireta, leva‐nos a outro aspecto do character design, a silhueta. Bancroft  (2006, l. 584‐587) define: “The spaces or gaps between the shapes you are creating, will help 

to define your character visually. Also, the variety of negative shapes and their interplay with  one  another,  as  well  as  with  the  positive  shapes,  makes  for  stronger,  more  interesting  silhouettes.15.  Como  amparado  pelo  autor  Bancroft,  uma  boa  configuração  do  esqueleto