• Nenhum resultado encontrado

CIRCULANDO SENTIDOS NO PISA: ANÁLISE DE DISCURSOS SOBRE CIÊNCIAS E TECNOLOGIAS

Hab Literária dos professores Pré-Escolar

CIRCULANDO SENTIDOS NO PISA: ANÁLISE DE DISCURSOS SOBRE CIÊNCIAS E TECNOLOGIAS

José Pedro Simas Filho Suzani Cassiani

Introdução

Neste trabalho são apresentados e discutidos parte dos resultados de uma pesquisa envolvendo aspectos do funcionamento da leitura em sala de aula de ciências, a partir de textos do campo da leitura e das ciências naturais, veiculados pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes – PISA (SIMAS FILHO, 2012). Originalmente a pesquisa teve como objetivos: compreender que sentidos sobre ciências e tecnologias (C&T) são produzidos por estudantes do nono ano do Ensino Fundamental; analisar as condições de produção da leitura e dos discursos envolvendo esses textos, em situações de sala de aula, na disciplina de ciências, em uma escola fundamental. Aqui faremos um recorte com o intuito de compreender que sentidos sobre C&T circulam em textos do PISA. Para tanto analisamos discursos de C&T presentes em um texto da prova do ano 2000, intitulado ―A tecnologia cria a necessidade de novas regras‖ (PISA 2000:97).

Considerando esse contexto, assinalamos que Almeida (2004), em estudos sobre a ciência e a linguagem, enfatiza o papel da C&T como entidades sociais. Nesse sentido, traz questões epistemológicas importantes para a compreensão da C&T, explorando especificamente aspectos como a ideologia e as leituras possíveis envolvendo esses campos de conhecimento. A autora, tendo como suporte a Análise de Discurso (AD) de linha francesa, aponta possibilidades para a leitura escolar dos discursos sobre C&T, visando analisar as condições de produção desses discursos. Nesse aspecto, a autora assume que:

a linguagem, além de ser suporte do pensamento e instrumento para a transmissão de informação, ou seja, meio de comunicação, é, essencialmente, produto do trabalho dos homens, num processo de interação social e, portanto, histórico. (ALMEIDA, 2004:33)

Partindo desse pensamento, realizamos um estudo qualitativo, tendo como aporte teórico- metodológico a AD de linha francesa com foco para as questões que envolvem a não transparência da linguagem e a não neutralidade dos discursos sobre C&T que circulam na prova do PISA e na sociedade. Pontuamos que os critérios para a escolha do texto focaram nos aspectos das relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) em uma perspectiva latino-americana (LINSINGEN, 2007; THOMAS, 2008; DAGNINO, 2008; LINSINGEN e CASSIANI, 2010). Sendo assim, nessa perspectiva, a educação CTS se filia aos diversos aspectos das relações sociais e econômicas regionais que envolvem o campo das políticas públicas de C&T e tem por objetivo ―restabelecer o elo entre ciência e sociedade no ensino de ciências e tecnologias na America Latina, por meio de sua natureza social, cultural, política e econômica‖ (LINSINGEN, 2007:2). Portanto, nesse viés, o ensino de ciências pautado na educação CTS em uma linha latino-americana, tem como pressuposto abordagens educacionais contextualizadas, socialmente referenciadas e comprometidas em termos curriculares (LINSINGEN, 2007). Nesse sentido, concordamos com Linsingen (2007), que um ensino de ciências desenvolvido sob o enfoque CTS possibilita ―maior inserção social das pessoas no sentido de se tornarem aptas a participarem dos processos de tomadas de decisões conscientes e negociadas em assuntos que envolvam ciência e tecnologia‖ (Idem:13)

164 Aspectos teóricos-metodológicos

Partindo do princípio de que não há pesquisa ateórica, portanto, nem metodologia ateórica (Perroni, 1996:17) a opção e compreensão dos aportes teóricos e metodológicos utilizados na análise do corpus influenciaram substancialmente este trabalho, especialmente porque o mesmo insere-se no campo da linguagem com interfaces no ensino de ciências. Dessa forma, ao optarmos pela AD de linha francesa como referencial teórico e analítico, concebemos o discurso como parte da natureza humana, ou seja, como uma realização do sujeito, sendo por isso um ―objeto‖ sócio-histórico e ideológico que torna possível a transformação do homem e da sua realidade. Para a AD o discurso é definido como efeito de sentidos entre interlocutores (PÊCHEUX, 1995), os quais são entendidos aqui como sujeitos do discurso. Para esse referencial, o sujeito está submetido à linguagem e se constitui quando o indivíduo é interpelado pela ideologia (ORLANDI, 2009).

Nessa perspectiva discursiva, o ―dado empírico‖ é caracterizado pela incompletude, já que a linguagem é tomada como não transparente. Esse aspecto é questionado pela AD ao interrogar, por exemplo, a existência de um único sentido para um texto ou imagem, isto é, para um ―dado‖ de linguagem. Os sentidos sempre podem ser outros. Logo, segundo Silva, Baena & Baena (2006), o problema da transparência da linguagem na pesquisa na área da educação científica ―pode aparecer de diferentes maneiras, na maioria das vezes implícito, quando trabalhamos com a análise de ‗dados‘ de linguagem‖ (Idem: 349).

Dentre essas maneiras, os autores destacam que o problema da transparência da linguagem pode surgir quando se considera, por exemplo, que não haveria mediação teórica nos sentidos que são ―captados‖ pelo pesquisador com base nesses ―dados‖ e quando eles refletem a realidade, ou melhor, deixam-na visível como se ela própria, a linguagem, não existisse, e pudéssemos encontrar o mundo, o sentido, o conteúdo por meio dela, sendo apenas uma constatação de evidências. Nessa dimensão, quando a linguagem é tratada como transparente, considera-se que a forma é separada do conteúdo, ou seja, o como se diz do que se diz (SILVA, BAENA e BAENA, 2006).

Ao considerarmos a não transparência da linguagem, pensamos que as leituras dos textos do PISA vão além da mera decodificação de palavras, frases e imagens. Eles são objetos discursivos que possibilitam a articulação das questões do discurso da/sobre C&T aquelas do sujeito e da ideologia. Textos esses passíveis também de leituras polissêmicas sobre C&T. Nesse contexto, visando estabelecer relações menos ingênuas e menos naturalizadas sobre a forma como C&T podem ser entendidas e mediadas constitutivamente pela linguagem em sala de aula de ciências, nosso olhar se volta para as relações entre ciência, tecnologia e sociedade (CTS). Numa perspectiva CTS a educação científica deve considerar aspectos sócio-políticos, econômicos e culturais. Sendo assim, os alunos devem ter a possibilidade de refletir sobre a ação humana e os reflexos da C&T sobre o ambiente e a sociedade, deixando de lado o discurso ingênuo de proteção à natureza, mas discutindo sobre as questões sociais relacionadas à produção, consumo e desigualdade social (KARAT, CUNHA e SIMAS FILHO, 2011).

Nesse sentido, Linsingen (2007, p. 13) considera que:

Educar, numa perspectiva CTS [...] é favorecer um ensino de/sobre ciência e tecnologia que vise à formação de indivíduos com a perspectiva de se tornarem cônscios de seus papéis como participantes ativos da transformação da sociedade em que vivem.

Assim, levando em conta esses aportes, abordaremos na sequência algumas análises. Reforçamos que para a AD todo discurso se estabelece na relação entre interlocutores e, portanto, não há discurso pronto e acabado, pois um discurso remete a outro(s). Dessa forma,

165

Cada material de análise exige que seu analista, de acordo com a questão que formula, mobilize conceitos que outro analista não mobilizaria, [...]. Uma análise não é igual a outra porque mobiliza conceitos diferentes e isso tem resultados cruciais na descrição dos materiais. (ORLANDI, 2009:27)

Circulação de Discursos e Sentidos sobre Ciências e Tecnologias presentes no PISA

No presente estudo, o texto que é foco de análise com base na AD têm origem na leitura das provas do PISA. O PISA é um sistema de avaliação internacional focado nas áreas de leitura, matemática e ciências e aplicado ciclicamente (a cada três anos) a estudantes de quinze anos dos países membros da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e de outros países ―convidados‖. O Brasil, por exemplo, tem participado do programa como convidado desde sua primeira aplicação, no ano 2000.

Como o PISA busca articular seu conteúdo a realidade dos estudantes é comum, dentre as situações discursivas serem explicitadas questões legais e éticas que afetam a C&T. Sendo assim, o corpus de análise nesse trabalho constitui-se do texto ―A tecnologia cria a necessidade de novas regras‖, item veiculado ao PISA 2000, pertencente a um gênero jornalístico do tipo editorial, cuja autoria não foi revelada na prova. O texto tem como objetivo debater e formar opinião sobre questões jurídicas e éticas envolvendo o destino de dois embriões congelados deixados por um casal de australianos mortos em um acidente aéreo.

Partindo de um olhar de que não há neutralidade nos discurso de/sobre C&T na sociedade, e de que esses discursos e a linguagem não são transparentes, passamos a considerar e levantar alguns questionamentos: Que possíveis discursos de C&T estão presentes no texto analisado? O que esses discursos poderiam estar silenciando? Que sentidos de C&T esses discursos materializam? Em síntese: Que possíveis discursos de/sobre ciências e tecnologias podem estar circulando nos textos do PISA? Considerando esse contexto, inferimos que os textos veiculados no PISA trazem em si uma discursividade, isto é, uma possível multiplicidade de discursos sobre C&T. Sendo assim, apontamos que o discurso só se materializa porque há uma interlocução entre sujeitos, os quais se constituem na relação do simbólico com a história e a ideologia (ORLANDI, 2009).

Nesse aspecto, é possível perceber no texto analisado vestígios de um discurso que remete a possibilidade de que as ciências e as tecnologias são processos unívocos. Desta forma, observamos que o título do texto ―A tecnologia cria a necessidade de novas regras‖ (PISA 2000:97, grifo nosso), poderia ser interpretado como ―A ciência cria a necessidade de novas regras‖ (grifo nosso). Embora esse título remeta para um discurso relacionado às tecnologias, o texto inicia dessa forma: ―A CIÊNCIA, tem a tendência de andar adiante [..]‖ (PISA 2000:97, grifo nosso) leva a um efeito de sentido que a CIÊNCIA (escrita em letra maiúscula) é responsável pela necessidade da criação de novas regras. Além disso, essa parte inicial do texto nos dá também indícios de sentido que remete a um discurso inaugural da ciência sobre o desenvolvimento humano, como pode ser visto num outro recorte do texto: ―A CIÊNCIA tem tendência de andar adiante da lei e da ética. Isso se comprovou, [...] com as técnicas para superar a infertilidade humana‖ (PISA 2000:97, grifo nosso).

Considerando esse recorte também percebemos marcas de um discurso em que as tecnologias são consideradas unicamente como a técnicas. Logo, pensemos que nesse texto as tecnologias são concebidas como um conjunto de habilidades empíricas (DAGNINO, 2008), portanto, de caráter procedimental (LINSINGEN, 2007). Dessa forma, concordamos com Linsingen (2007) quando menciona que em se tratando de ensino de ciências e tecnologia é necessário uma mudança de olhar, no sentido ―em que a atividade tecnocientífica, pensada como atividade meio, passaria a ser orientada por uma lógica distinta da que hoje à estrutura, orientada para a técnica como meio e não um fim em si mesma‖ (Idem:3). Assim,

166

em termos de processo de ensino-aprendizagem acreditamos que essa mudança de olhar pode propiciar um movimento pedagógico que amplie a visão sobre as tecnologias correntes no cotidiano dos alunos.

Outro aspecto a ser analisado é que podemos perceber indícios no texto de um discurso determinista sobre C&T, pois observamos um possível sentido de que quanto mais as ciências progridem, mais as tecnologias avançam e mais a sociedade se desenvolve. Desse modo, observamos marcas de um determinismo das ciências sobre as tecnologias.

A CIÊNCIA tem tendência de andar adiante da lei e da ética. Isso se comprovou, de forma dramática, em 1945, no plano de destruição da vida, com a bomba atômica, e está acontecendo, agora, no lado criativo da vida com as técnicas para superar a infertilidade humana. (PISA 2000:97, Grifo nosso)

A partir desse excerto, podemos evidenciar que os avanços das ciências são responsáveis pelo desenvolvimento das tecnologias, ou seja, os ―avanços das técnicas para superar a infertilidade humana‖ são determinados pelo desenvolvimento das ciências no campo da pesquisa em reprodução humana. Assim, concordamos com Thomas (2008:218) que é impossível e inconveniente realizar a priori distinções entre ―o científico‖, ―o tecnológico‖, bem como ―o social‖. O referido autor utiliza-se da metáfora do ―tecido sem costura‖ para caracterizar as relações CTS numa abordagem sociotécnica, onde o argumento central é que C&T são socialmente construídas e a sociedade é cientifica e tecnologicamente construída. Logo, concordamos com Thomas (idem) quando diz que somente a partir de uma abordagem sociotécnica para CTS poderemos superar as limitações dos determinismos científicos, tecnológico e social.

Outro ponto aqui a ser analisado é que e que o texto está relacionado à divulgação científica e por isso, consideramos uma ilusão acreditar na neutralidade da mídia impressa e eletrônica. Nessa ótica, salientamos que os textos veiculados pelo PISA não são instrumentos neutros, pois foram produzidos sob determinado contexto socio-histórico, político e ideológico. Dessa forma, ao colocar nas avaliações determinados tipos de textos e temáticas em detrimento de outros, o PISA, garante a hegemonia de um conhecimento eurocêntrico e assegura o status quo dominante sobre os países participantes. Sendo assim, pensamos que o discurso de/sobre C&T que o PISA se filia segue a visão de um conhecimento mono cultural equivocadamente universal, numa perspectiva de perpetuar um modelo de C&T, que se filia a neutralidade da produção do conhecimento científico e tecnológico, bem como a uma visão empirico- indutivista, a-histórico e dogmático desses conhecimentos. Logo, um conhecimento que serve como

instrumento de regulação econômica e que promove a ideologia fatalista que anima o discurso neoliberal da globalização (FREIRE, 2009).

Considerando a historicidade do texto e os processos de construção dos efeitos de sentido, passamos a elencar o que ele possivelmente silencia. Pontuamos que o não-dito em um texto é significante, tem história, não é apenas um complemento da linguagem (ORLANDI, 2007; ALMEIDA, 2004). Portanto, o silêncio produz efeitos de sentido. Podemos observar tais efeitos quando é apresentado no texto a ideia de que ―A CIÊNCIA tem a tendência a andar adiante da lei e da ética‖. Essa frase pode remeter a um não- dito que considera a ciência como uma entidade superior e envolta em verdades absolutas. Nesse caso, o conhecimento científico é visto como rígido, absoluto, neutro e infalível, já que não é posto em dúvida. Outro efeito de sentido relacionado ao silêncio possivelmente está na forma escrita da expressão ―A CIÊNCIA‖, destacada no texto em letras maiúsculas e logo no início da frase. Essa expressão pode marcar um discurso imperativo e autoritário para a ciência. Então, apesar de se tratar de um texto polêmico e atual, trazendo uma controvérsia sobre de embriões humanos, ao observarmos o seu funcionamento pensando o ensino de ciências, podemos inferir que o texto não garante um contraponto à interpretações do ensino tradicional, onde o professor assume um discurso de C&Ts como verdadeiro, desconsiderando os sentidos produzidos pelos alunos em suas vivências, nem mesmo trabalhando com uma ideia de C&Ts mais críticas.

167

Por fim, pontuamos que nos discursos que envolvem a ciência, a voz do cientista, representa uma voz coesa e unívoca do conhecimento científico, respaldando a autoridade científica. É por isso que é possível perceber marca de um locutor-enunciador universal que garante a verdade, própria do conhecimento científico e o consenso das notícias veiculadas (ORLANDI; GUIMARÃES e TARALLO, 1989). Nesse aspecto, com base no texto, pensamos que a ciência pode expressar um sentido vinculado à verdade, o que remete a um discurso livre de controvérsias.Decorrente disso, acreditamos que as C&Ts estão longe de ser consenso na sociedade, embora comumente sejam vistas dessa forma. Pensamos que tais empreendimentos humanos são elementos de disputa na sociedade, e, portanto, não neutros, já que estão envolvidos em interesses tanto de cunho econômico quanto político.

Algumas considerações

Dependendo dos interlocutores envolvidos no discurso, determinados sentidos de/sobre C&T podem ser produzidos, pois em todo discurso existe o já dito, a memória, o interdiscurso que está além dos sujeitos, atravessa as posições assumidas pelos sujeitos nos discursos. Portanto, é possível realizar leituras parafrásticas (o mesmo, o já lá no texto) de/sobre C&T, pois em todo dizer há sempre algo que se mantém, isto é, que permanece. Porém, por outro lado, múltiplos sentidos, não infinitos, podem ser produzidos em cada contexto, abrindo-se para leituras polissêmicas (o a se dizer, o diferente), numa ruptura de processos de significação, onde acontecem deslocamentos de sentidos sobre C&T (ORLANDI, 2000, ORLANDI, 2009). Logo, embora seja difícil traçar limites definidos entre a paráfrase e a polissemia, pois existe uma articulação entre essas formas de leitura, devemos considerar que a linguagem funciona na tensão entre o mesmo e o diferente, ou seja, entre a leitura parafrástica e a leitura polissêmica dos discursos de C&T (ORLANDI, 2000).

Pensando nesses aspectos e considerando a realidade do ensino de ciências no Brasil, percebemos uma contradição ao se trabalhar com os discursos de/sobre C&T em aulas de ciências. Sendo assim, o que nos parece ser mais frequente é uma prática discursiva com fortes tendências a processos parafrásticos, já que normalmente são priorizadas formas de leitura e de escrita vinculadas ao livro didático, onde o foco é a repetição, a homogeneização, a busca de uma interpretação única e a sedimentação de sentidos dominantes de sobre C&T, ou seja, a busca de um ―sentido verdadeiro‖ sobre C&T. Assim, uma prática focada somente em leituras parafrásticas pode resultar num fazer pedagógico que considera as C&Ts como absolutas, neutras, ahistóricas e universais.

Para Orlandi, (2000; 2009) quando pensamos discursivamente a linguagem, num movimento entre o já dito e o a se dizer, estamos produzindo mudanças na rede de filiação de sentidos, e é nesse jogo entre a paráfrase e a polissemia que os sujeitos e os sentidos fazem suas trajetórias, se significam. Portanto, acreditamos que o processo de ensino aprendizagem assentado na tensão entre essas duas ―forças‖ (paráfrase e polissemia) viabiliza novas perspectivas para a educação, especialmente a educação científica e tecnológica, pois possibilita a abertura de espaço para o movimento, a construção de outros sentidos, o ―novo‖, tendo como decorrência a superação de um modelo hegemônico de transmissão de conhecimentos e de assimilação de sentidos sedimentados. Assim, de acordo com o campo de conhecimento da AD, é necessário, possível e real

problematizar as maneiras de ler, levar o sujeito falante ou o leitor a se colocarem questões sobre o que produzem e o que ouvem nas diferentes manifestações da linguagem. Perceber que não podemos não estar sujeitos à linguagem, a seus equívocos, sua opacidade. Saber que não há neutralidade nem mesmo no uso mais aparentemente cotidiano dos signos. (...) estamos comprometidos com os sentidos e o político. Não temos como não interpretar. (ORLANDI, 2009:9)

168

Diante dessas reflexões, consideramos que as leituras sobre a AD de linha francesa foram fundamentais na definição do objeto simbólico deste estudo, no caso o texto do PISA selecionado para análise de discursos sobre C&T. Assim, partindo da leitura e estudos sobre esse referencial, consideramos o textos como objeto discursivo, objeto esse que possibilita a articulação das questões do discurso da/sobre C&T aquelas do sujeito e da ideologia. Logo, texto esse passível de leituras polissêmicas, onde não há interpretações homogêneas, sentidos únicos e ―verdadeiros‖ (SIMAS FILHO, 2012).

Nesse contexto, pensamos que ao considerarmos que as C&Ts possuem um sentido verdadeiro para explicar o mundo corremos o risco de percebê-las como sendo universais, objetivas, superiores e neutras. Um olhar como se as C&T não fossem empreendimentos humanos e, portanto, um discurso isento de fazeres persuasivos, ou seja, sem interesses ideológicos, políticos e econômicos sobre as C&Ts (SIMAS FILHO, 2012).

Ao analisarmos os possíveis discursos de/sobre C&T que estão circulando nos textos do PISA, também produzimos reflexões sobre as condições de produção desse sistema de avaliação. Desse modo, ao levarmos em conta o potencial discursivo de/sobre C&T presente em tais textos, consideramos que a educação formal, especialmente o ensino de ciências, tem um papel essencial na construção de sentidos de/sobre C&T pelos estudantes. Sentidos esses que considerem as especificidades e articulações destas práticas sociais. Ademais, não podemos desconsiderar conforme apontam Furlan & Megid (2009) que, apesar de a ciência ser pouco questionada, lhe é posta um papel de legitimação social, pois, ―A ciência, por sua vez, é também vista pela sociedade como um lugar de poder e legitimação de dizeres.‖ (Idem:12). No contexto de ensino a legitimação é reforçada por concepções pontuais de avaliação cujos critérios orientam-se a partir de intencionalidades nem sempre comprometidas com o processo de ensino- aprendizagem. Sendo assim, se partimos do fato de que sistemas internacionais de avaliação do ensino têm sua origem nas ações econômicas empreendidas por organizações criadas pelos países do chamado primeiro mundo (OCDE, por exemplo), observamos que atualmente o PISA tem estado presente nas falas dos seus gestores para ser justificado como um meio de produzir melhorias na qualidade da educação nas escolas e sistemas de ensino. Assim, as classificações ou rankings da qualidade da educação estabelecidas

Outline

Documentos relacionados