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2.3. Cidade Apropriada: mapa das intervenções artísticas

2.3.2. Coletivos e suas ações:

Dentro os vários Coletivos serão aprofundados os trabalhos de quatro deles: Coletivo Mapa Xilo- gráfico, Coletivo Bijari, que há mais dez anos atuam na cidade, o Coletivo PI com mais de seis anos de pesquisa e o Muda_Coletivo.

O Coletivo Mapa Xilográfico, liderado por Diga Rios e Milene Valentir, desenvolve ações artísticas permeadas por questões da urbanização das grandes cidades. Em cada novo projeto, o grupo faz uma espécie de residência artística em um bairro ou região, convidando seus moradores para experiências de troca sobre a urbanização do lugar. Durante essa residência, realizam filmagens de conversas para construção de registros audiovisuais; produzem xilogravuras, mapeando as árvores cortadas da região; e criam intervenções urbanas. Em cada local, o grupo coloca-se à deriva em busca de aproximações com a paisagem, ritmos, pessoas, histórias, propondo novos territórios para a construção de um processo criativo diverso, provocado pelas circunstâncias de cada lugar.

Um dos principais trabalhos do Mapa Xilográfico é o Projeto (À) Deriva Metrópole São Paulo, rea- lizado em 2011 e que gerou o documentário (À) Deriva, em 2012. Segundo o grupo, a proposta foi percorrer a cidade de São Paulo partindo do centro e ramificando para suas extremidades, lugares da fronteira, divisas com outras cidades. O percurso começou em Santa Cecília (centro-baixo de moradia dos integrantes), atravessando Jardim Pantanal (zona leste), Engenheiro Marsilac (zona sul), Perus (zona oeste) e terminou em Tremembé (zona norte).

Com os moradores da metrópole, eles buscavam, nessa perambulação, outro ritmo, capaz de gerar novas possibilidades de encontros, para além da correria cotidiana da cidade, e conseguir, através das trocas ao longo do projeto, fomentar momentos de criação com os praticantes da cidade, através da construção de mapas psicogeográficos das regiões habitadas.

O grupo, em seus projetos e registros, questiona a existência de uma arquitetura da exclusão na cidade de São Paulo, conforme diz Diga Rios no catálogo final do projeto em 2012: “gradativamente incorporamos a ética e a estética do mundo à venda, em uma espécie de embrutecimento sensorial, capaz de transformar a própria concepção de convivência em sociedade em espaço de serviços para a prática do consumo”.

O segundo coletivo é o Bijari, com uma prática mais voltada para interferências visuais no campo da arquitetura da cidade, criando ações que questionam a construção imaterial dos espaços. Um dos trabalhos recentes é a o projeto Praças (Im)possíveis, que gerou a exposição de mesmo nome na Galeria Choque Cultural. Este trabalho tem como mote a experiência cotidiana de transitar pela cidade de São Paulo, percebendo a grande carência de espaços públicos de descanso, como parques e praças. O grupo criou, assim, bicicletas adaptadas que cumprem a função de praças, criando a possibilidade de se transportar um espaço público afetivo para onde se julgue necessário. O terceiro núcleo é o Coletivo PI, fundado em 2009 por mim, Pâmella Cruz, e Priscilla Toscano. Du- rante seis anos, o coletivo realizou intervenções urbanas efêmeras utilizando diferentes linguagens,

como a perfomance, o teatro, a dança e as artes visuais, para compor suas criações. A pesquisa do grupo tem como base o diálogo entre o artista e o espaço, na construção de formas poéticas que representem e transformem um espaço (físico ou imaginário), resgatando sua memória, discutindo suas funções e propondo novas percepções.

Três projetos do núcleo são os que mais interessam para a pesquisa. O projeto Na Casa de Paulo foi realizado ao longo de 2012 em oito bairros da cidade de São Paulo, levando uma casa a céu aberto para as ruas, onde as artistas recebiam as pessoas, contando as memórias e histórias do bairro coletadas no ano anterior. O segundo trabalho é o experimento urbano O Retrato mais que

óbvio daquilo que não vemos, fruto da residência artística em 2013 e 2014 na Casa das Caldeiras, no baixo da Água Branca, sendo depois recriado em 2015, para a região do Baixo Centro de São Paulo. O experimento, misturando realidade e ficção, levava o público a um tour pelas ruas do bairro, por meio de uma linha dramatúrgica que consistia na venda de um inovador complexo habitacional. O projeto questionava os conceitos de vida em segurança nas grandes metrópoles, o discurso do medo, o crescimento vertical dos grandes condomínios e o abandono das áreas públicas. Por último, a perfomance urbana Entre Saltos, que consiste em um coro de pessoas vestidas em trajes femininos que percorrem as ruas da cidade em desequilíbrio, por estarem com um salto no pé e outro na mão. Muito semelhante às caminhadas de Flávio de Carvalho e Hélio Oiticica com os respectivos Traje

de Verão e Parangolé, a intervenção causa um estranhamento, uma ruptura no cotidiano, e aborda questões de gênero no espaço público, de convívio. Ao fim da ação, o grupo deixa uma instalação na cidade com os sapatos utilizados.

Um dos aspectos mais relevantes na produção do Coletivo PI é a discussão das ideias de afetividade, amabilidade e pertencimento aos espaços da cidade, construindo relações de proximidade, expe- riências de alteridade para pensar novas formas de convivência.

Por fim, o Muda-Coletivo criado pelas arquitetas Marcella Arruda e Naiara Abrahao, trabalha desde 2011 com as questões da cidade. Por meio de parcerias, como com o Coletivo Basurama da Espanha, cria intervenções que disparam novas formas de vivenciar a cidade e conviver no espaço público. Duas ações serão analisadas: a H(o)pe dentro da série A cidade é para brincar, na qual foram insta- lados balanços com materiais recicláveis em regiões do centro de São Paulo, surgindo a intervenção

Balançar eu adoro; e Bolha Imobiliária, um grande pula-pula inflável criado após a experiência de convívio das arquitetas em uma ocupação de um prédio pelo Movimento Sem Teto.

Os coletivos citados são agrupamentos que trabalham com a arte cotidiana, efêmera, e, conforme Visconti (2014), são proposições sem a preocupação central de criar um produto artístico, mas sim de criar vínculos entre as pessoas e o espaço que habitam. A postura errática assumida pelos coletivos e o trabalho no campo interdisciplinar apontam caminhos de aproximação com a Arquitetura e o Urbanismo, com a prática de quem pensa e planeja efetivamente as construções materiais da cidade. As práticas intervencionistas embaralham a ordem vigente e as práticas usuais nas ruas e são capazes de ressignificar as relações sensíveis entre sujeito e espaço público, provocando fissuras nos mode-

los comportamentais e proporcionando a construção de um saber relacional, que se faz no ato da experiência, e que não pode ser dissociado da memória pessoal e da afetividade.

Para pesquisa, os três Coletivos: Bijari, Mapa Xilográfico e Muda_Coletivo cederam seus materiais, registros fotográficos e responderam a uma entrevista com 5 questões sobre a prática artística, desde o processo, as táticas utilizadas até considerações sobre como reverberam nas pessoas e na cidade. As entrevistas completas seguem em anexo. No entanto, o material foi incorporado aos capítulos seguintes como citações ao longo da escrita.

1 O retrato mais que óbvio daquilo que não vemos. Coletivo PI, 2014.

Intervenção teatral partindo da Casa das Caldeiras e percorrendo a Av. Francisco Matarazzo e o entorno do Allianz Parque (Estádio de Futebol, antigo Palestra Itália).

2 Gatunos S.A. Mapa Xilográfico, 2014.

Intervenção no terreno de construção do empreendimento imobiliário Jardim das Perdizes.

3 Troco banana por Sampa. Mapa

Xilográfico, Carminda Mendes André. 2011. Intervenção que percorreu as ruas do Terminal Rodoviário Palmeiras-Barra Funda, até o Memorial da América Latina.

4 Na Casa de Paulo. Coletivo PI, 2011

e 2012. Praça Marechal Deodoro.

5 Bloco do Pipa. Mapa Xilográfico,

2011. Avenida São João (embaixo do Minhocão).

6 O retrato mais que óbvio daquilo que não vemos. Coletivo PI, 2015. Rua

Marquês de Itu.

7 Hope: A cidade é para brincar.

Basurama e Muda_Coletivo, 2013. Vale do Anhangabaú.

8 Equipamento Extraordinário.

Basurama, 2013. Praça do Patriarca.

9 Entre Saltos, Coletivo PI, 2016,