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Por uma percepção lúdica: novas extensões do espaço vivido

A intervenção aqui analisada foi realizada em 2013 durante a Virada Cultural, no Festival Baixo Centro, através da parceria entre o Coletivo Basurama com Marcella Arruda e Naiara Abrahao, então estu- dantes de Arquitetura em São Paulo e que formaram o Muda_Coletivo. O projeto foi criar um parque com balanços e brinquedos na região do Centro de São Paulo, ocupando o Vale do Anhangabaú e o Minhocão (Elevado Presidente João Goulart), por meio de reuso de materiais recicláveis. A série foi denominada A Cidade é para Brincar, e explorava o lúdico, a capacidade inventiva das pessoas para as áreas públicas e questionava quais eram condições ofertadas na cidade para as crianças brincarem.

Do meu ponto de vista, a potência da arte no espaço público está justamente em ser um ele- mento disparador de outros comportamentos e relações: um convite, uma provocação para que as pessoas possam também exercer sua biopotência, sua expressão criativa. A arte cria uma ruptura no status quo, no comportamento hegemônico, esperado, controlado – e propi- cia a emergência do espontâneo, do indeterminado. (ARRUDA, entrevista para pesquisa, 2017)

O Coletivo Basurama é um grupo formado em 2001, em Madrid, por arquitetos e artistas, com ações interdisciplinares que reutilizam materiais recicláveis, questionando o excesso de consumo e de produção de lixo. Os trabalhos estão em várias cidades do mundo, por meio de parcerias locais, criando arquiteturas permanentes e, por vezes, artefatos transitórios para os espaços públicos e áreas de moradia. Uma das vertentes é desenvolver oficinas com os colaboradores, criando espaços lúdicos. Para a série A Cidade é para Brincar, com diversas intervenções temporárias, o núcleo, em seu site afirma:

Que seria da cidade sem brinquedos, sem balanços, sem árvores e sem pessoas desfrutando de tudo isso? Vãos vazios sob viadutos cheios de carros, sobre rios enterrados.

A Cidade é para Brincar transforma na Virada Cultural de São Paulo o Viaduto do Chá, no Vale

de Anhangabaú e o Minhocão (elevado Costa e Silva) em parques de brinquedos pra crianças de 0 a 99 anos. O objetivo: a ativação desses espaços para fazer o que mais gostamos quando somos crianças: brincar e balançar.

O projeto para Virada Cultural 2013 é mais uma intervenção no espaço público de São Paulo que da continuidade ao trabalho desenvolvido por basurama no Brasil desde 2007 com projetos como Bras-Madri, Parque de Diversões Minhocão (com MUDA_coletivo e Sociedade Anônima) e O Lixo não Existe. Na realização da intervenção foram utilizados materiais descartados como banner publicitário, pneus, e vãos de viaduto. (BASURAMA)

Figura 41: A cidade é para brincar.

Basurama e Muda_Coletivo, Vale do Anhangabaú, São Paulo, 2013.

Refletindo sobre essa intervenção, percebe-se como um espaço pode ser ressignificado, ganhando novos sentidos a partir de uma proposição distinta e despretensiosa de se estar na área pública, uma proposta de uma experiência que insere o corpo em outro estado de relação com a cidade e seus suportes físicos.

No caso do Balançar eu adoro, partimos do próprio caráter do espaço: um viaduto, infraestru- tura símbolo do urbanismo rodoviarista que pautou e continua pautando o desenvolvimento urbano de muitas cidades brasileiras, que pode ser apropriado e ressignificado. Parque de Diversões Minhocão: o maior parque da America Latina. Porque não? Para tangibilizar e dis- cutir essa utopia, usamos da infraestrutura, e do espaço vazio que ela cria, para transformar seu uso para criar uma apropriação por parte de seus usuários: os balanços são dispositivos que convidam as pessoas a ativá-los, criando assim um lugar praticado (Michel de Certeau: A

Invenção do Cotidiano). Para, além disso, a intervenção cria uma disputa simbólica e instiga outro imaginário de cidade possível. (ARRUDA, entrevista para pesquisa, 2017)

Portanto, é atribuída ao espaço debaixo do Viaduto uma qualidade outra, que ativa zonas de memória coletiva, criando narrativas possíveis, transformando o território em um enorme playground, aberto às novas e surpreendentes conexões entre usuário e cidade.

Ao se observar mais de perto a história crítica do urbanismo, a história marginal, é possível se perceber outro caminho, que critica a espetacularização desde seus primórdios. Nesta pista, as principais questões são as diferentes formas de ação e participação na cidade, mas também as relações corporais, através das experiências efetivas dos espaços urbanos. As relações senso- riais com a cidade que passam pelas experiências corporais destes espaços, em suas diferen- tes temporalidades, seriam o oposto da imagem da cidade-logotipo. Os cenários ou espaços espetacularizados, desencarnados, seriam propícios somente para os simples espectadores. (AMARAL,2013, p.3630)

Figura 42: A Cidade é para brincar.

O Coletivo Basurama também realizou a intervenção urbana Equipamento Extraordinário em 2014 durante a Virada Cultural, um final de semana inteiro de atividades culturais e apresentações artísticas que ocupam as ruas, espaços públicos e culturais da cidade. O trabalho, de forma muito simples, cria áreas de descanso e permanência por meio de materiais recicláveis. Aqui, a intervenção foi feita na Praça do Patriarca no centro de São Paulo, uma região com muito fluxo de pessoas durante o dia devido aos serviços de comércio e aos órgãos públicos como o prédio da Prefeitura.

Observa-se que o intuito do trabalho é promover pausas na rotina das pessoas e com um mobiliário provisório tornar o espaço da praça mais amável, convidativo à permanência, ao descanso. O próprio nome da intervenção brinca com essa capacidade de tornar as áreas públicas mais acolhedoras, per- mitindo que o cidadão não apenas passe por ali e sim que desfrute do local. O nome “Equipamento Extraordinário” remete a essa capacidade de transformação, ou seja, simples objetos de descarte que tornam o espaço agradável. O “extraordinário” que a arte provoca, para além do ordinário, do corriqueiro, mas dentro da própria dinâmica do cotidiano.

Figura 43: A Cidade é para brincar.

Figura 44: Equipamento Extraordinário, Praça

do Patriarca – São Paulo, 2014.

Fonte: http://www.archdaily.com.br/br/611142/

equipamento-extraordinario-basurama

Figura 46: Equipamento Extraordinário,

Praça do Patriarca – São Paulo, 2014.

Figura 45: Praça do Patriarca, São Paulo, 2009. Fonte: http://pranchetadearquiteto.blogspot.

com.br/2009/12/embelezamento-urbano-praca- do-patriarca.html

A intervenção abre uma fenda dentro da lógica local e atualiza o próprio projeto urbano, indicando outros usos para o espaço projetado. A ação artística denuncia a falta de áreas de descanso e mos- tra o desejo dos praticantes da cidade por espaços mais amáveis. O Coletivo Basurama evidencia com seus trabalhos as vontades daqueles que andam pela cidade, o homem comum, o ser humano ordinário. Ao contrário da visão do “alto” do urbanismo, que cria estratégias na definição dos espa- ços, o Coletivo cria táticas, ações micro para os praticantes da cidade, trazendo elementos lúdicos e acolhedores às áreas públicas.

As práticas cotidianas dos praticantes ordinários, como as dos errantes, são do tipo tática – estão diretamente relacionadas com a experiência urbana do ‘embaixo’, com o ‘corpo a corpo amo- roso’ – enquanto as estratégias “escondem sob cálculos objetivos a sua relação com o poder” que sustenta os espaços. São duas lógicas de apreensão da cidade, da experiência urbana, que coexistem: a estratégica, do urbanismo e planejamento hegemônico – hoje também chamado, não por acaso, de planejamento estratégico -, daqueles que produzem os espaços a partir da vista aérea, dos cálculos objetivos e do poder que os sustenta; e a tática, astúcia daqueles que cotidianamente praticam o espaço, usando-o, desviando-se, profanando-o, subvertendo-o, jogam com o espaço dado. (JACQUES, 2014, p.276)

Conforme fala Jacques, em referência a De Certeau, os praticantes ordinários se relacionam com a cidade nesse “corpo a corpo amoroso”. A intervenção faz suscitar essa forma de relação, que quebra com a funcionalidade do corpo-mercadoria-máquina. O simples deitar em uma teia na praça amplia a percepção, aguça os sentidos, traz a memória que o espaço comum, da vida coletiva é de todos, é sempre um desenho aberto, uma possibilidade de invenção.

Seguindo na mesma linha de convidar as pessoas para brincarem em meio à rotina da cidade, o Muda_Coletivo instalou um grande pula-pula inflável em uma das ruas do Centro de São Paulo, denominando a intervenção de Bolha Imobiliária. O trabalho surgiu após a experiência das arquite- tas do grupo com moradores que ocupavam um prédio abandonado no Centro de São Paulo pelo Movimento dos Sem Tetos em 2012.

A ideia foi criar um dispositivo que chamasse atenção de quem ali passava para a problemática da moradia em São Paulo, principalmente com o número elevado de edifícios sem uso na região central. A partir do grande brinquedo instalado na rua as pessoas eram estimuladas a entrarem e também conviverem com crianças e moradores do prédio ocupado.

Percebe-se que a intervenção despertando o universo lúdico, propõe uma aproximação entre cida- dãos e abre caminho para diálogo de uma questão problemática das grandes metrópoles: o processo de gentrificação, o domínio de empreendimentos imobiliários de alto padrão nas áreas centrais.

Quando levamos a Bolha Imobiliária para o Minhocão, em sua primeira ativação (durante o Festival colaborativo Preliminares, em 2013), a instalamos em cima do elevado, dentro do con- texto do festival – com shows ao redor, outras atividades paralelas. As crianças entravam logo na Bolha, e se relacionavam com a estrutura de uma maneira extremamente livre. No entanto, em um momento, estava fora da instalação, próxima a porta, e uma moça me pergunta: tem que pagar pra entrar? Para mim, esse foi um momento que evidenciou nossa relação com a cidade: uma cidade exclusiva, à qual somente alguns tem direito; um espaço público que é privatizado (não inclusivo e acessível); da qual somos todos consumidores... Busco desde então tensionar essa ideia, criar ações que incluam, que convidem, que envolvam as pessoas a participar, a se sentir parte. (ARRUDA, entrevista para pesquisa, 2017).

Depois desta ação, a intervenção percorreu alguns pontos do Centro de São Paulo, entre eles o Mi- nhocão (imagem). A intervenção, conforme descreve Marcella Arruda abre fenda no planejamento urbano local e cria outras narrativas, reforçam a relevância da dimensão participativa e da resistência.

Para criar as intervenções artísticas da Bolha imobiliária e do Balançar eu adoro (série Cidade

é para brincar) partimos dos recursos de cada local: espaciais, materiais, humanos. Como rearranjá-los de maneira a criar outras narrativas (o capitulo da Kristine Samson no livro

Situated Design fala um pouco desse método).

No caso da Bolha Imobiliária, combinamos os recursos locais criando uma assemblage: um espaço que estava no limiar de valorizar (sofrendo os primeiros efeitos da especulação imo-

Figura 47: Bolha Imobiliária, Elevado Presidente João Goulart (Minhocão) - São Paulo, 2013. Fonte: http://soulart.org/artes/coletivo-basurama-voce-e-o-que-voce-joga-fora/4

biliária), os sacos plásticos da cooperativa de catadores do Glicério, o ringue da Academia do JB (vizinha), as crianças que estavam no farol ao lado pedindo dinheiro – criando então outras possibilidades de relação e de existência destes “elementos” separadamente. Depois disso, este dispositivo entra em circulação no próprio território, evidenciando espaços na cidade que passam por este processo de especulação e ativando-os de forma lúdica e poé- tica – como o próprio Minhocão. (ARRUDA, entrevista para pesquisa, 2017).

Figura 48: Bolha Imobiliária, São Paulo, 2013 Fonte: https://basurama.org/pt-br/projetos/bolha-imobiliaria/

As intervenções evidenciam como ações temporárias na contramão da espetacularização são capazes de criar fissuras no cotidiano, interpelando o sujeito pelo estranhamento. No entanto, é um estranhamento que convida para aproximação. É um choque convidativo, e quando o sujeito se permite interagir com a proposição ocorre a partilha do sensível, o campo da experiência estética/politica é ativado.

As intervenções atuam a partir do inesperado, da quebra de expectativa: da criação de uma paisagem quase utópica. A tática do estranhamente familiar: que brinca com o limiar do desconhecido e do conhecido; manipula o elemento conhecido e o recompõe, atraindo as pessoas pela curiosidade, mas despertando reflexões a partir do discurso colocado (ma- terial, simbólico, escrito...). Por exemplo, o balanço é algo comum, que muitos têm na sua memória afetiva da infância (algo quase universal), mas que quando utilizado e combinado

com uma infraestrutura planejada para a cidade utilitarista, funcional, há uma quebra – uma recomposição, um desvio que tem desdobramentos significativos no que condiz a cidade que podemos viver. Trabalha-se com o lúdico, que é estético, mas quando colocado em tais contextos, é também político (uma vez que os modos de articulação entre formas de ação, produção, percepção e pensamento são outros). (ARRUDA, entrevista para pesquisa, 2017).

U

m dos espaços da cidade na região Centro- Barra Funda de São Paulo que merece destaque enquanto local das ocorrências de práticas informais/intervenções artísticas é o Elevado Pre- sidente João Goulart (popular Minhocão). O elevado tem sido foco de debate coletivo quanto às questões do espaço público e um novo projeto urbano para ele.

Figura 49: Elevado João Goulart, popular Minhocão, São Paulo, 2015. Fonte: https://catracalivre.com.br/sp/agenda/indicacao/virada-cultural-

2015-minhocao-recebe-rica-programacao/

O Minhocão, antigo Elevado Costa e Silva, foi inaugurado em 1971 anunciado como uma das maiores obras de concreto da América Latina. Sendo projetado para desafogar o trânsito de uma São Paulo que crescia e ocupava as ruas com automóveis. O que não foi considerado é o prejuízo a toda po- pulação que morava na região do elevado. Dessa forma, os ruídos e a poluição invadiam as janelas dos apartamentos, com poucos metros de distância da pista de carros.

Uma nova configuração no território também se forma na parte debaixo do elevado, que fica com as vias cortadas pela grande minhoca de concreto, gerando um novo desenho na paisagem, criando nichos abaixo do grande teto de concreto.

Figura 50: A construção do elevado em abril de 1970. Arquivo/Estadão Fonte: http://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,como-era-sao-paulo-sem-o-minhocao,9070,0.htm

Figura 51: Convite para

inauguração do Elevado em 1971.

Fonte: http://www.saopauloantiga.

com.br/propagandas-do-minhocao/

Figura 52: Minhocão no início dos anos 70. Fonte: http://www.saopauloantiga.com.br/

propagandas-do-minhocao/

Legenda

O Elevado tem uma extensão de 2,8 km, atravessando os bairros da Barra Funda, Consolação, Santa Cecília e República. Segundo o IBGE de 2010 afeta diretamente 232 mil pessoas. Sua largura varia de 15,5 a 23 metros, a uma altura de 5,5 metros acima da via que a sobrepõe. Chega a passar a uma distância de apenas 5 metros das janelas dos apartamentos que se encontram ao longo do caminho. Seu traçado, partindo da Praça Roosevelt, vai pela Rua Amaral Gurgel, Av. São João, Praça Marechal Deodoro, Av General Olímpio da Silveira até o Largo Padre Péricles.

Desde 1976, o tráfego de veículos é proibido das 21h30 às 6h30. Atualmente, além desses horários o Minhocão fica fechado para carros de sábado após as 15h e domingo o dia todo, funcionando como espaço de lazer e convivência de muitos paulistanos, que se apropriaram informal e espontanea- mente desse lugar.

Figura 53: Mapa feito pela Organização Parque Minhocão. Fonte: http://minhocao.org/mapa-2/

Considerado uma “cicatriz urbana”, o Minhocão causou a desvalorização dos imóveis e a degradação da região. Portanto, seu destino tem sido tema coletivo na cidade: se é possível sua demolição; se o mantém ainda para tráfego de carros ou se definitivamente é transformado em uma área de lazer e convivência, se tornando um parque.

A desativação do Minhocão para carros foi prevista no Plano Diretor de 2014 durante a gestão do prefeito Fernando Haddad. E em 2016 foi sancionada a lei para criação do Parque Minhocão. Entre- tanto, o futuro do elevado ainda está em aberto. O que vale enfatizar é que é que a apropriação do Minhocão foi se dando e reverberando de forma espontânea e informal por moradores e artistas que enxergavam outros usos para o espaço. E assim ocupavam o concreto armado durante o período noturno (21h30 as 06h) apesar das cancelas que inibiam a circulação.

Intervenções Artísticas

Figura 54: Esparrama pela Janela.

Grupo Esparrama, 2014-2016.

Figura 55: Piscina. Luana Geiger, 2014. Figura 56: Praças (Im)possíveis. Bijari, 2015. Figura 57: Sala de Estar. Felipe Morozini, 2015.

Esse território tão emblemático de São Paulo deflagra o sentimento de urgência em relação à cidade que estamos vivendo. As intervenções artísticas realizadas e toda a organização da sociedade civil para redefinir o uso do elevado revelam a emergência de pensar os processos que regem o espaço urbano, isto é, quem constrói nossas cidades, para quê e para quem.

Os ecos trazidos pelas intervenções e os movimentos de liderança provocam questionamentos e convocam a participação da sociedade civil na produção da cidade, propondo novas formas de usar e ressignificar os lugares. Assim, alimentando o imaginário da cidade que queremos e apontando para um novo urbanismo.

Um novo urbanismo cidadão procurará, mediante diversas estratégias de base estética, uma nova ética de convivência, através da ampliação do âmbito público e de um renovado urbanismo, que pretende trocar a própria forma do urbanismo arquitetônico, e onde tudo não está à vista e nem à venda. Um novo urbanismo cidadão deverá ir exigindo que novos fenômenos sociais se materializem em outras construções e outras materializações de seus entornos. Esse é o valor do estudo dos imaginários urbanos como representação do futuro. Esse é, talvez, a dimensão política desejada de um projeto pensando, em rigor, como fato estético. (SILVA, 2014, p.165)

Portanto, as intervenções aqui analisadas dão visibilidade aos desejos coletivos e compartilham dos imaginários urbanos. Veremos a seguir como essas ações poéticas trabalham com processos para uma nova ética de convivência, conforme diz Armando Silva no trecho citado. São ativadores de amabilidades, do exercício do convívio em um local aparentemente do medo e da transitoriedade. O Minhocão nada mais que é uma via de concreto suspensa na região, não apresenta um mobiliário, uma vegetação que acolha as pessoas como em um parque. Na verdade, ele é um grande calçadão rodeado de prédios, alguns degradados. O que se observa é o desejo de ocupar a cidade, de estar nas ruas e seguindo um fluxo muito característico de São Paulo, que é o caminhar, andar, estar sempre em movimento.

Dessa forma, um movimento que se inicia com artistas e jovens articulados em iniciativas informais evidencia a urgência de ter mais vida nas ruas, mais gente e menos carro, principalmente no centro de SP. É no caminhar do pedestre que a cidade dá o seu recado, gravando na memória.

As intervenções efêmeras partem das possibilidades do próprio espaço, incentivando a proximidade entre desconhecidos e subvertendo o limite entre domínio público-privado. As quatro ações reali- zadas no Minhocão desmontam a lógica de esperar o poder público atuar no espaço, são iniciativas de baixo para cima. Os quatro trabalhos tem em seus processos artísticos a questão do exercício da alteridade, ativando a amabilidade urbana.

Os projetos artísticos mostram a paixão pelo espaço público como um campo experimental, reme- tendo aos situacionistas, são errâncias que colaboram para o resgate da experiência corporal do espaço público. As intervenções rasgam o cotidiano, abrem tempo para lentidão, para o jogo com o espaço e seus habitantes.

Figura 58: Domingo de ocupação no Minhocão, São Paulo, 2016. Fonte: http://ciclovivo.com.br/noticia/criacao-de-parque-

suspenso-no-minhocao-divide-opinioes/

Figura 59: Desenho do artista Paulo von Poser, integrante da Associação Parque Minhocão. Fonte: http://portal.aprendiz.uol.com.br/arquivo/2014/03/17/minhocao-pode-ser-vanguarda-da-

Em 2015, o artista plástico Felipe Morozini, diretor da Associação Parque Minhocão, criou com ami- gos - engajados na transformação do elevado em um parque - a intervenção Sala de Estar. Foram criados ambientes aconchegantes (espaços de intimidade privada) no elevado. Assim, chamando a atenção das pessoas que paravam para interagir com a instalação. O trabalho é um convite à pausa, a lentidão, a uma nova percepção, bem como é uma maneira de atrair as pessoas para pensar e discutir o destino do Minhocão e as ideias da associação para que ele se torne um parque.

Figuras 60 e 61: Sala de Estar, Felipe Morozini, Minhocão – São Paulo, 2015 Fonte: http://revistacasaejardim.globo.com/CasaJardim/Decoracao/Moveis/

noticia/2015/09/artista-monta-salas-de-estar-e-jantar-no-minhocao.html

A Associação Parque Minhocão, criada em 2013, tem lutado para que o Elevado não seja demolido e sim desativado para uso de veículos, ganhando uma nova configuração como parque, requalificando