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Comerciantes entrevistados no centro do Recife

Fonte: autor, 2011

Gráfico 3: Bens protegidos legalmente no centro do Recife segundo os comerciantes.

Quando questionados quais bens do centro da cidade deveriam ser reconhecidos como patrimônios, as respostas desse grupo foi semelhante ao grupo anterior com referências a proteção dos recursos hídricos, como pode ser visto no gráfico 4.

Segundo os relatos obtidos, o Rio Capibaribe merece ser reconhecido como um bem patrimonial por 41% dos entrevistados, pois ele “[...] já está aqui há muitos anos”, tendo presenciado diversos acontecimentos. Nesse sentido, os recursos hídricos da área central assumem um significado histórico, em função dos diversos processos ocorridos na área com influência direta deles.

Gráfico 4: Elementos patrimonializaveis do centro do Recife segundo os comerciantes.

Fonte: entrevistas orais realizadas pelo autor, 2011

Outra característica dos depoimentos dados para justificar a proteção do Rio Capibaribe foi a preservação de seus aspectos ambientais. Alguns comerciantes apontaram que o reconhecimento deste recurso como de interesse patrimonial, poderia contribuir para uma melhoria da qualidade ambiental. Segundo um vendedor de frutas, entrevistado no Mercado de São José:

“O rio tá muito sujo. Se fosse patrimônio talvez melhorasse, mas eu acho complicado. Ele é tão bom para a cidade, mas o povo joga lixo nele. Quando a maré tá baixando o pessoal se aproveita pra jogar cachorro morto, bicho morto, lixo de casa, porque ai a maré leva.”

Neste grupo as vinculações com os recursos hídricos não se mostraram positivas. Apesar de reconhecerem estes elementos como importante ao ponto de merecer

proteção específica, tanto o rio quanto o mar são sempre citados pelos entrevistados como “[...] muito sujos, cheio de lixo e esgoto” ou até mesmo “horrível”.

Os representantes do grupo responderam que não utilizavam desses recursos hídricos para nada além da observação. Contudo a atividade de contemplação está sempre associada a sentimentos de tristeza e repulsa. Segundo um comerciante localizado na Avenida Guararapes: “eu só olho o rio para ver as coisas ruins dali”, enquanto que outro relatou que contemplar o rio era na verdade uma obrigação, já que ele está no caminho diário: “tem que ver né? Agora dizer que é bonito isso eu não acho. Acho é muito sujo, uma porcaria”.

Em relação aos elementos que compõem a paisagem cultural do centro, apresentados no gráfico 5, nota-se que os elementos materiais foram mais destacados, sobretudo aqueles próximos aos recursos hídricos.

Novamente o espaço livre do Marco Zero parte integrante do conjunto arqueológico, urbanísticos e paisagístico do Bairro do Recife, teve grande destaque sendo citado em 47% das entrevistas. Relacionado às diversas festividades ocorridas ao longo do ano, o local de origem da cidade e marcante pela presença dos recursos hídricos, conforme visto anteriormente nas figuras 16 e 17, foi descrito como “[...] bom quando têm festas, ai é bom pra gente poder curtir e ouvir uma musica na faixa”.

As pontes, juntamente com o Rio Capibaribe, foram consideradas como os elementos que mais são “a cara do Recife”. Ambos os elementos receberem citações quantitativamente próximas (41% e 35%, respectivamente), apesar de significados diferentes. Mesmo sendo a cara do Recife, para alguns o conjunto pontes e rio é visto como algo esquecido “mal cuidado, muito sujo e perigoso”. As figuras 20 e 21 mostram os problemas relativos a sujeira relacionados com estes elementos.

Por outro lado, outros entrevistados preferiram fazer referências ao grupo pontes e rio como um local que tem a função de apresentar o Recife para pessoas de fora, mencionando também a tradicional relação da cidade com Veneza:

“Aqui é igual a Veneza. Dizem que é e eu acredito. Você não pensa no Recife sem essas pontes, e no rio também. Elas são os cartões postais daqui da cidade. Todo mundo vem de fora para ver o rio e essas pontes, eu sempre vejo turistas passando aqui e pelo Catamarã, batendo foto[...]”

Gráfico 5: Elementos da paisagem cultural do centro do Recife, segundo os comerciantes.

Fonte: entrevistas orais realizadas pelo autor, 2011 Figura 20: Galeria de esgoto abaixo da Ponte da

Boa Vista.

Fonte: autor, 2011

Figura 21: Lixo acumulado na base da Ponte da Boa

Vista.

Fonte: autor, 2011

Apenas um comerciante destacou o atributo arquitetônico da ponte da Boa Vista como algo significativo, considerando que ela representaria o centro do Recife por suas estruturas de ferro. Outra característica atribuída foi à sua função de conexão entre dois pontos comerciais importantes da cidade.

Nestes relatos pode ser observado que a vinculação entre ponte e rio ainda é algo marcante para a identidade da cidade, conforme foi apresentando no capítulo 3 e já

destacado em pesquisas de opiniões desenvolvidas em 2002 apontadas por Melo (2003) e Maciel (2005), já referenciadas na introdução.

Apesar da pouca representação quantitativa (11,76%), o elemento Porto do Recife apresentou um importante significado para os entrevistados. Segundo um comerciante, localizado na Rua da Moeda e frequentador do centro a 40 anos:

“recuperar o porto é a melhor coisa que podia ser feita para isso aqui voltar a ser como era antigamente. Isso aqui era lugar de boates, clubes, de pensão, hoje em dia quando dá 20h não tem mais ninguém. Ainda bem que os governos estão melhorando o porto, porque do jeito que está, tá complicado”

Neste relato, a leitura da paisagem se faz baseada na memória de alguém que viu outra época do “Recife Antigo”. O saudosismo se volta para um momento do passado, que dificilmente terá retorno, já que as obras de recuperação do porto do recife (FIGURA 22) não apontam para a valorização de clubes, boates e hospedagem de baixo custo, mas para a construção de outros tipos de equipamentos.

Por fim, é importante destacar os elementos imateriais presentes nos relatos de vários comerciantes. Os entrevistados na Rua da Moeda destacaram as expressões culturais como significativas para o centro. Segundo um vendedor de bebidas do local “[...] a cultura aqui é o que é mais importante”. Os blocos líricos do carnaval de Pernambuco foram descritos como “[...] uma das coisas mais bonitas que temos aqui”, assim como o Maracatu e o Frevo como “o que mais marca a cidade são o Maracatu e o Frevo, principalmente no carnaval”.

Expressões da cultura imaterial também foram consideradas atributos de elementos culturais. Foi o caso da Rua da Moeda, considerada significativa por ser local onde “[...] tem ensaios dos Maracatus, de bandas de frevo. Na sexta a noite tem show de Rock e Blues mais pra lá (na proximidade do Paço Alfândega)”.

Com esta leitura da paisagem, a Rua da Moeda ao ser associada diretamente aos aspectos imateriais, pode ser vista como tão representativa para o grupo dos comerciantes quanto o rio Capibaribe. Neste aspecto o principal atributo da rua está para além das qualidades arquitetônicas de seus casarios antigos, mas presente nas diversas manifestações culturais ocorridas ao longo da semana.

Figura 22: Obras da reforma do porto do Recife. Ao fundo Torre Malakoff.

Fonte: autor, 2011

4.1.3. Leituras dos visitantes

Contemplando um total de 26 entrevistas, este grupo foi formado pelas pessoas que frequentam o centro com objetivos diversos. Apesar de o grupo ser bastante heterogêneo, composto por turistas, funcionários de empresas localizadas na área central, usuários de bares e participantes de eventos diversos, a analise ocorre em conjunto para facilitar a interpretação da paisagem.

Foram selecionadas pessoas que estavam utilizando os espaços livres do centro para contemplação ou confraternização entre grupos, bem como aqueles que estavam de passagem pelas vias públicas. Dentre os locais onde foram realizadas as entrevistas, destacam-se as Praças da República, Arthur Oscar e Praça Tiradentes; o Marco Zero; a Rua da Moeda, da Aurora; e a Ponte Mauricio de Nassau (MAPA 5).

A leitura do centro por esse grupo apresenta uma paisagem constituída de significados contraditórios. Para alguns, o local remete as obrigações profissionais, para outros ele é relacionado com momentos de diversão. Da mesma forma, algumas pessoas entrevistadas relacionaram o território com satisfação e bem estar, enquanto outros com apreensão e repulsa frente aos problemas ambientais e de segurança.