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CAPÍTULO 4 – A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOS DOCENTES NO

4.4. Como é que se avalia o desempenho docente a nível pedagógico?

Ory (2000) refere que, nos últimos 30 anos, a avaliação pedagógico-didática dos docentes (teaching evaluation) no ensino superior mudou consideravelmente, nomeadamente a nível do propósito da mesma e da metodologia seguida. Depois de traçar o percurso da avaliação pedagógico-didática dos docentes nos E.U.A. sintetiza desta forma essa evolução:

Teaching evaluation in higher education has evolved from a primary reliance on a chair’s assessment to a formal, systematic, and multiple approach, including a variety of methods like students’ ratings, peer reviews, peer visits, self-evaluation, document reviews, and evidence of achievement. As new purposes and new audiences were added, so too were new evaluation methods or new ways of using old methods (p. 14).

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Parece haver unanimidade na literatura relativamente à complexidade do processo de ensino-aprendizagem e, consequentemente, à necessidade de recorrer a múltiplas fontes de informação e múltiplos métodos de avaliação (Ory, 2000; Fink, 2002, Braskamp, 2000). Aliás, Braskamp (2000) refere que quanto mais nos concentramos numa única estratégia de avaliação para melhorar a qualidade do que está a ser avaliado, mais provável é que a qualidade diminua ao invés de aumentar.

Por outro lado, “Teachers are engaged in vital teaching functions, most of which are too complex and too unobservable for others, and sometimes for themselves, to know” (Stake, 1998, p.5), pelo que fará sentido a afirmação de Lynton (citado por Ory, 2000) segundo a qual os docentes, num processo de avaliação, deveriam ter a oportunidade de descrever o pensamento que se encontra por trás do seu trabalho, ou nas palavras de Zabalza (2007) o paradigma de pensamento do docente. Parece-nos que vai também nesta mesma linha a afirmação de Ory (2000), ao referir que a avaliação do desempenho pedagógico não busca a verdade absoluta, como se de um processo científico se tratasse mas “as a form of argument where the faculty use their data to make a case for their teaching. (…) It touches on self-reflection, dialogue, and discussion. It is learning, developing, and building” (p. 17).

Fink (2002) defende que o ensino deve ser visto como um processo interativo que ocorre em diversos contextos, os quais podem influenciar o sucesso dessa interação. Propõe assim quatro dimensões para a avaliação do ensino: input, processo, produto e contexto, que parecem corresponder ao modelo CIPP preconizado por Stufflebeam (2003).

Relativamente ao input, o autor refere dois factores — as características dos estudantes e as características dos professores. Se os alunos variam em termos de conhecimentos prévios, na forma como constroem o conhecimento, nos valores e nas crenças e na personalidade, também os professores variam em aspetos como a sua disponibilidade para ensinar uma determinada unidade curricular, quer seja por questões relacionadas com a motivação, quer pelo conhecimento de base que possuem sobre a referida unidade. Também a preparação que possuem para lidar com diferentes

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situações de ensino é diferente. Há professores que se sentem mais preparados para trabalhar com estudantes pós-graduados do que com alunos em formação inicial, outros estão mais à vontade a trabalhar com grupos pequenos do que com grupos grandes. Fink (2002) refere então que “Teachers who are up-to-date in their fields and have undertaken the necessary research and preparation for a class provide the input essential for significant learning” (p. 50).

No que concerne ao processo, um dos elementos referidos na proposta de Fink (2002), são também dois os factores invocados: decisões relativas à unidade curricular e comportamento em sala de aula. Previamente ao trabalho em sala de aula, existe um conjunto de decisões que ocorrem, nomeadamente a abrangência dos conteúdos abordados e as estratégias de ensino. Também parte do processo, mas de natureza diferente, é o que o docente faz na sala de aula, a forma como motiva os alunos, como coloca questões, as competências que tem a nível de relação e comunicação, etc., nas palavras de Arreola, Aleamoni e Theall (2001) os “instructional design and instructional delivery skills”. Por produto entende-se o tipo e a “quantidade” de aprendizagem que ocorreu. “In good courses, a large percentage of the students learn a lot, and they learn things that are significant rather than trite” (Fink, 2002, p. 50). Por exemplo, o facto de os alunos saberem enunciar o conceito de desenvolvimento proximal de Vygotsky não significa que como futuros professores saibam usar o conceito nas suas próprias aulas para promover melhor aprendizagem nos seus alunos. Por outro lado, o interesse do aluno em estudar e investigar mais sobre determinado assunto é fundamental. Se o conhecimento adquirido pelo estudante é unicamente informativo e se o processo de aprendizagem não gera no estudante a motivação para continuar a aprender, é de muito curto alcance o impacto dessa informação.

Finalmente, o contexto pode também influenciar a qualidade do ensino e este aspeto pode passar por factores físicos (ex: características físicas da sala), sociais (ex: o nível socioeconómico dos estudantes) e pessoais (ex: acontecimentos da vida pessoal do docente).

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Stake e Cisneros-Cohernour (2000) corroboram a perspetiva acima descrita defendendo que a avaliação do ensino é uma tarefa complexa e que deve envolver o estudo das metas institucionalizadas, do ambiente da sala de aula, da organização administrativa e do seu funcionamento, do conteúdo curricular, do desempenho dos estudantes, e do impacto dos programas na sociedade. Para eles “The current state of the art of formal evaluation of college teaching is simplistic and inconsequential. Faculty work is a complex enterprise, but most assessment procedures are insensitive to its broad responsibility and situationality” (p. 51).

A panóplia de métodos utilizada na avaliação dos professores inclui aspetos tão diversos como questionários aos alunos, observação de aulas por colegas (diretamente ou a partir da análise de uma gravação em vídeo), análise dos documentos produzidos pelo docente (programa da disciplina, textos produzidos, testes), evidências da aprendizagem dos alunos (trabalhos ou testes que reproduzem a qualidade da aprendizagem). Dentro destes métodos merece alguma atenção a estratégia de autoavaliação que recorre a questionários semelhantes aos utilizados com os estudantes em que o docente se avalia face a um conjunto de itens pré-definidos que constituirão os critérios, as normas ou os padrões (Betoret & Tomás, 2003), a relatórios de atividade, observação de aulas de colegas, visionamento das suas próprias aulas e o portefólio (Seldin, 2004).

Pelo próprio elenco de métodos é possível vislumbrar algumas das múltiplas fontes de informação. As mais evidentes são os estudantes e os outros professores, mas a literatura refere que a administração é também uma fonte importante de informação e que esta deverá explicitar o que é que a instituição considera serem os padrões de qualidade (Ory, 2000, p. 16).

Retomando as palavras de Stake e Cisneros-Cohernour (2000) que há pouco citámos importa, apesar da complexidade e da natureza do não-observável, confinado ao espaço de sala de aula, os docentes ganhariam com a partilha das suas boas práticas, bem como a reflexão conjunta desenvolvida sobre elas. Mais, segundo Zabalza (2007), não só a implementação ocorrida em sala de aula mas também o planeamento e a

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avaliação posterior, geralmente feita em solidão, terá efeitos benéficos se discutida em grupo e revisitada por teorias que a sustentaram, mas que poderão vir a ser ou revitalizadas ou contrariadas como consequência das inovações da prática. Daí decorre que a avaliação do desempenho docente a nível pedagógico se torna mais produtiva com

outcomes reconhecidos e guindados ao nível da investigação. A pedagogia e a didática

do ensino superior vão, deste modo, ganhando estatuto de maioridade.

4.5. Resistência ao processo de avaliação do desempenho