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COMO ESTÃO CONFIGURADAS ATUALMENTE AS LICENCIATURAS NO

As licenciaturas no Brasil são ofertadas em locais de diferentes organizações acadêmicas, categorias administrativas e em modalidades. De acordo com os dados do Censo da Educação Superior (2016), o Brasil tem 7.356 cursos de licenciaturas no país, ofertados por Universidades, Faculdades, Centros Universitários e Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IF) em diferentes esferas administrativas, ou seja, tanto em instituições públicas (aqui consideradas a rede federal, estadual e municipal)18 como em privadas (aqui consideradas físicas ou jurídicas de direito privado, com ou sem finalidade de lucro).

Neste trabalho, entendemos que a configuração da formação de professores refere-se aos dados dos concluintes nos cursos de licenciatura por esfera administrativa e modalidade. O gráfico abaixo, para além de mostrar o número de concluintes nos cursos de licenciatura, revela onde estão sendo formados os professores do país.

Gráfico 1 – Número de concluintes nas licenciaturas

Fonte: Adaptado pela pesquisadora do Censo da Educação Superior, 2016

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Segundo dados do Censo da Educação Superior, sistematizados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), por meio de seus ―resumos técnicos‖ 2016.

A partir dos dados do Censo da Educação Superior 2016, é possível afirmar que os professores estão sendo formados presencialmente em instituições de iniciativa privada19. Tal constatação também já havia sido percebida em estudo anterior (LUZ, 2009), no qual verificamos, não só o crescimento de instituições privadas, como o aumento de matrículas nessas instituições em detrimento das instituições públicas.

Contudo, os dados do Censo da Educação Superior 2016 também nos revelam que um número muito alto de professores está sendo formado na modalidade à distância em instituições privadas, em um contexto de hegemonia da chamada educação mercantil e empresarial, conforme análise de Diniz-Pereira (2015). São cursos noturnos, com mensalidades baixas, que visam principalmente trabalhadores das classes B, C e D. São cursos realizados em sua grande maioria em prédios sem infraestrutura de laboratórios específicos, sem pesquisa e extensão. Os professores desses cursos não têm dedicação exclusiva (em sua grande maioria são horistas), o que rebaixa a qualidade dos cursos, pois os professores não conseguem desenvolver outras atividades com os discentes para além das desenvolvidas em sala de aula. Ademais, o fato dos estudantes da modalidade à distância não terem convívio com as diversas vivências que a vida universitária oferece contribui para a defasagem na sua formação (GATTI, 2013-2014; DINIZ- PEREIRA, 2015). Por essas razões, tais instituições são caracterizadas como ―universidades-empresas de formação docente‖20

, conforme Diniz-Pereira (2015), por visarem o lucro em detrimento da qualidade do curso ofertado.

No livro intitulado ―Escola, Estado e Sociedade‖, Freitag (1986) vai apontar que, devido às instituições diferenciarem-se na proposição da formação, a autora afirma que na essência isso serve é para estabelecer um ensino dual entre as classes. Outros estudos, como Scheibe (2010) e Diniz-Pereira e Marques (2002), também levam críticas a este local de formação de professores, reafirmando a baixa qualidade das licenciaturas em função do pouco investimento dado pelas instituições privadas.

Para além dessas críticas, é inaceitável que a grande maioria dos professores esteja sendo formada em instituições privadas, se as dez melhores universidades do

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Como pano de fundo dessas discussões está o enviesamento da educação como bem público para objeto mercadológico.

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Recomendamos a leitura de Diniz-Pereira (2015) para aprofundamento da análise das lógicas de funcionamento das ―universidades-empresas‖ de formação docente.

Brasil, segundo avaliação do próprio Ministério da Educação (MEC), são universidades públicas e gratuitas. Entre as 50 melhores, apenas 4 são privadas, conforme notícia divulgada no site Carta Campinas21.

O ranking é feito com o cálculo do Índice Geral de Cursos Avaliados (IGC) do Ministério da Educação (MEC). O cálculo do IGC leva em conta resultados de três anos de avaliações da instituição, considerando a média do Conceito Preliminar de Curso (CPC), um indicador de qualidade da graduação, ponderada pelo número de matrículas em cada um dos cursos computados; a média dos conceitos de avaliação dos programas de pós-graduação stricto sensu atribuídos pela CAPES e a distribuição dos estudantes entre os diferentes níveis de ensino. São consideradas ainda as condições de ensino, corpo docente, instalações físicas, projeto pedagógico dos cursos e o resultado dos alunos no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade).

Contudo, é importante pontuar que, para as instituições públicas, outros desafios estão postos quanto à formação de professores: a elaboração de um projeto institucional que integre e articule os diferentes cursos ofertados focando na construção da identidade docente; o aprofundamento da articulação universidade x escola e, principalmente, que as instituições públicas comprometam-se com a formação de professores, reconhecendo e valorizando esses cursos dentro da instituição, revertendo a condição de curso de menor prestígio, de menor status acadêmico, que, por vezes, são tomadas as licenciaturas no campo universitário, conforme analisa Diniz-Pereira (2000a, 2011).

Velloso (2012) também aponta alguns desafios postos para as instituições públicas quanto à formação de professores:

Não obstantes as demandas manifestas no tocante às licenciaturas, fazem- se presentes os riscos da expansão inconsequente da oferta de ensino, se levada a efeito de afogadilho; as ameaças de estrangulamento do currículo, resultantes da inadequada apropriação das Diretrizes Curriculares e, por fim, o risco da precarização e do aligeiramento dessa formação, na esteira da incorporação das tecnologias da informação e da comunicação (TIC) em processos de ensino a distância (VELLOSO, 2012, p. 429).

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As 10 melhores universidades do Brasil são públicas e gratuitas revela índice do MEC. Notícia publicada em 27 de novembro de 2017. Disponível em: http://cartacampinas.com.br/2017/11/as-10- melhores-universidades-do-brasil-sao-publicas-e-gratuitas-revela-indice-do-mec/. Acesso em 10 dez. 2017

Se os dados e as análises acima indicam onde estão sendo formados os professores no Brasil, as próximas análises procuram apresentar como estão sendo formados esses profissionais. A partir da análise da literatura, baseada em pesquisas empíricas, constata-se que os cursos de licenciaturas do país acentuam uma formação do bacharel em detrimento da formação de professores. Esse modelo de formação é característico dos anos de 1930, com o surgimento das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras, pautado numa racionalidade técnica instrumental. Desse modo, a formação de professores atualmente ainda está fortemente marcada por um modelo de formação ultrapassado e incompatível com a contemporaneidade.

Entretanto, desde 2002, a formação de professores no Brasil é regulamentada por Diretrizes Curriculares Nacionais. Atualmente, está em vigência a Resolução CNE/CP nº 2/2015, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de segunda licenciatura) e para a formação continuada e o Parecer CNE/CP nº 02/2015.

Pesquisas como Terrazan et. al. (2008), Biasus (2006), Luz (2009), Garcia, M. (2010,2012) confirmam que os cursos cumpriram a normativa legal e readequaram os currículos dos cursos de licenciaturas22 no que se refere à Resolução CNE/CP nº 1/2002 e ao Parecer CNE/CP nº 09/2001. Entretanto, não realizaram a mudança paradigmática de concepção de formação. A mudança curricular não garante a mudança paradigmática (CARVALHO, 1992; KRAHE, 2007). Por isso, a defesa, além de uma reformulação curricular nos cursos de formação de professores, torna- se necessária para uma mudança na concepção da formação.

Krahe (2007) aponta que alguns elementos contribuem para a manutenção da racionalidade técnica instrumental nos cursos:

[...] é possível concluir que o sistema atual de estrutura da maioria das Universidades brasileiras, divididas em departamentos, continua fomentando a fragmentação e o isolamento das disciplinas e dos professores, criando barreiras à integração, consequentemente fortalecendo currículos técnico/instrumentais (KRAHE, 2007, p.34).

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Estudos como Biasus (2006), Garcia (2010), Tomazetti, Biasus (2004), Krahe (2007), ao analisarem os movimentos institucionais de reformulação dos currículos dos cursos de licenciatura em virtude do ordenamento legal que são as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores, Resolução CNE/CP 1/2002, apontam que foram movimentos de embates e resistências, de disputas e confrontos.

O fato é que esse modelo de formação traz sérias implicações para a formação, visto que os cursos de licenciaturas não se reconhecem como cursos em que se formam professores. Nos currículos pautados por esse modelo prevalecem os conhecimentos específicos das áreas em detrimento da formação pedagógica23. Pesquisas como Gatti (1996) Diniz-Pereira (2011) Gatti e Nunes (2009), que analisaram os currículos dos cursos de licenciaturas de diferentes áreas, confirmam o predomínio da formação específica em detrimento da formação pedagógica.

Outro problema que ocorre nos cursos de formação de professores é a falta de integração entre os conhecimentos específicos da área e os conhecimentos pedagógicos, incidindo numa formação fragmentada que impacta na criação de uma identidade docente (GATTI, 1996, 2010; DINIZ-PEREIRA, 2011, TERRAZAN et al, 2008).

Com as características ora apontadas, com vasto rol de disciplinas e com a ausência de um eixo formativo claro para a docência, presume-se pulverização na formação dos licenciados, o que indica frágil preparação para o exercício do magistério na educação básica (GATTI, 2010, p.1374).

Somam-se a essas evidências as constatações proporcionadas pelos estudos de Gatti e Nunes (2009); Gatti e Barreto (2009); Gatti, Barreto, André (2011), Diniz- Pereira (2000a), em que apontam outros problemas na formação de professores do país: a dissociação entre teoria e prática; a dissonância entre os projetos pedagógicos e a realidade do curso e a forte carga normativa para as configurações formativas dos docentes, o que confirmam o caráter regulador das políticas para formação de professores.

Essas evidências sinalizam constatações importantes sobre a formação de professores no país, sobre os cursos e a formação realizada nesses cursos. As pesquisas sobre as licenciaturas revelam exaustivamente uma série de problemas e desafios para esses cursos.

Diante de todo esse cenário apresentado das licenciaturas disciplinares em componentes específicos, ficamos a nos perguntar: no cenário nacional, diante de tantos cursos para formar professores, de tantos níveis para formar professores, de tantos locais de diferente organização acadêmica, de diferentes categorias

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A formação pedagógica consiste aqui em conhecimentos relativos aos fundamentos teóricos da educação, aos sistemas educacionais, aos níveis de ensino, dentre outros. Ver: Mizukami (2004); Schulman (2005)

administrativas, de diferentes modalidades para formar professores, caberia mais um curso para formar professores? As Licenciaturas Interdisciplinares, que despontam no cenário nacional, estão conseguindo superar todos os problemas levantados nas licenciaturas?

2.4 A FORMAÇÃO INTERDISCIPLINAR DE PROFESSORES: CONSTRUINDO