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Como esses Movimentos Colaborativos se articulam com o Cinema e com Dispositivos de Criação de Imagens?

Começo num ponto qualquer, porque não sei por onde começar. Encontro uma possibilidade de pensar, melhor dito, penso sobre possibilidades e com elas, para poder aproximar-me dessa vida que cria e que só a arte, os loucos ou as crianças atingem e penetram. Onde a minha alma e o meu corpo são apenas um (à maneira de Espinosa). (GODINHO,

2013, p. 131).

Como dito anteriormente, sobre a noção de dispositivo de criação de imagens, a ideia não é impor regras, mas trazer as linhas de controle de uma situação para outra. É que a regra, por si só, não gera criação, não faz coisas variarem. Uma linha de controle é como uma onda: resultado de várias condições, de um conjunto de forças. Quando a percebemos existindo em determinada situação e a transpomos para outra, ela pode atuar entre as forças desta outra conjuntura, fazendo-a balançar, desacomodando. Mas, para quê isso?

Já estamos inseridos num conjunto de agenciamentos, se nos “liberamos” para “fazer o que quisermos”, podemos acabar surfando nas linhas sugeridas pela mídia, por exemplo, achando que estamos sendo levados pela liberdade, pelas nossas próprias escolhas. Talvez entremos na repetição, na reprodução, no decalque, sem variação (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p. 19). As forças provocadas pela sociedade disciplinar e de controle criam várias linhas que vão moldando um indivíduo “normal e médio”, uma fabricação. Esse controle e disciplinamento é configurado por muitas instituições e práticas em nossa sociedade.

Por exemplo, no campo da Educação, esse controle e disciplina seria aquilo que Sílvio Gallo denomina Educação Maior:

As políticas, os parâmetros, as diretrizes da educação maior estão sempre a nos dizer o que ensinar, como ensinar, para quem ensinar, porque ensinar. A educação maior procura construir-se como uma imensa máquina de controle, uma máquina de subjetivação, de produção de indivíduos em série. Não consigo aqui me livrar das fortes imagens do filme The Wall, de Alan Parker, quando sob os sons de Another brick in the wall, do Pink Floyd, a escola inglesa é mostrada como uma imensa máquina que transforma crianças em bonecos sem face e que pouco a pouco são triturados num imenso moedor de carne. Cada estudante é, nada mais, nada menos, do

que um outro tijolo no muro; ou uma outra engrenagem na máquina. (GALLO, 2002, p. 174).

Neste contexto, os dispositivos desafiam a presença das imagens disciplinadas e controladas no ambiente escolar, provocando atritos que permitem operar na transversalidade: ou seja, considerar um plano em que a realidade toda se comunica. A cartografia acompanha o traçado desse plano, como afirmam Passos e Barros:

[...] A natureza política do método cartográfico diz respeito ao modo como se intervém sobre a operação de organização da realidade a partir dos eixos horizontal e vertical. Grosso modo, podemos dizer que a operação de organização hegemônica / majoritária do socius se dá na forma da conexão entre variáveis menores em oposição às variáveis maiores. Por outro lado, há outra operação, dita operação transversal, que conecta devires minoritários. Esses dois modos de operar (majoritário e minoritário) podem ser pensados a partir da distinção entre um sistema de coordenadas que organizam a realidade segundo um metro-padrão e uma operação de transversalidade que cria a diferenciação do socius (PASSOS; BARROS, 2009, p.28, grifo nosso).

Essa oposição entre eixos vertical e horizontal realiza um sistema de rebatimento e superposição das variáveis maiores para a constituição de um padrão que equalize a realidade. Pode-se fazer o exercício de pensar a escola de Educação Básica segundo esta sistematização. Na escola, há uma equivalência funcional entre hierarquia, competição, repetição, pensamento lógico-discursivo, rotina, certezas, nivelamento, constituindo as variáveis maiores (elementos do eixo vertical) que se rebatem umas sobre as outras, gerando uma existência ideal em oposição à qual se definem autonomia, colaboração, criação, pensamento intuitivo, eventualidade, o acidental, que constituem as variáveis menores (elementos do eixo horizontal).

Mas a ideia, aqui, não é propriamente se opor às coordenadas dos dois eixos (embora apostemos mais na colaboração que na competição). Mas percebê-las e atuar nelas para atualizar possíveis. Essa atualização é um processo de diferenciação e de criação, “é sempre criar linhas divergentes que correspondam, sem semelhança, à multiplicidade virtual” (DELEUZE, 1988).

A educação trabalha com a mobilidade do pensamento, independentemente disso envolver a apreensão de conteúdos ou não. Partindo daí, se não

estremecermos as linhas, será que haverá criação? Será que se não forçarmos o pensamento, ele existirá, mesmo assim?

Canteiro de obras

De dentro de um .blend, é possível ter contato com o “canteiro de obras” de um autor, percebendo o conjunto de forças que atravessam o universo 3D do projeto e as possíveis trajetórias de movimento de seus elementos; tudo isso antes dele ser renderizado para virar vídeo. Ao termos acesso a esse canteiro, nos deparamos com uma porção de coisas aparentemente sem significado - para qualquer pessoa além do próprio autor, ou, em alguma medida, para ele também - que podem ser “qualquer coisa e nada”, um amontoado de polígonos “soltos no cosmos”, tudo um tanto fragmentado.

Nunca fiz uma viagem extraterrestre, mas sei que uma coisa é conhecer um planeta através de fotos (imagens renderizadas), outra coisa é estar lá (projeto .blend), ao enfrentar o inesperado que pode surgir de se tentar respirar, andar, entender e lidar com os seres e fenômenos de sua natureza. Somos habituados a

assistir obras culturais prontas, sem ter a permissão de (e/ou, talvez, nem interesse

por) acessar a conjuntura atuante no universo (que também é uma criação, em si) a partir do qual elas surgiram. A Figura 1 mostra a tela (print screen) do meu computador com um projeto .blend aberto, o que aparece dentro do retângulo tracejado em vermelho é o que uma das câmeras simuladas pelo Blender vê. Um de seus objetos está selecionado em “modo de edição” (Edit Mode), por isso apresenta muitos de seus vértices em estado passível de alteração. A alteração no “modo de edição” é estrutural, tem a ver com a forma da malha de vértices do objeto. É como se este modo dissesse que o objeto tem “três pernas”, embora não saiba se essas pernas chutaram e se isso aconteceu ontem, agora ou amanhã. Já o “modo de pose” (Pose Mode) mostraria a deformação dessa estrutura (sua expressão, sua pose) executada em determinado instante (em tal frame) na linha de tempo. Ambos os modos atuam no mesmo frame, só que cada um mostra coisas distintas que atravessam um mesmo objeto em cena.

Já a Figura 2 mostra uma renderização deste mesmo frame, mantendo-se a posição de câmera, a mesma disposição dos objetos, tudo. A única diferença entre as duas situações é que a da Figura 2 é o resultado de se apertar o botão “render”:

ela apresenta o mapa de pixels (imagem digital) que foi gerado a partir do cruzamento de todos os cálculos previstos (quanto às configurações de luz, câmera, lentes, textura, efeitos, comportamento das superfícies de cada sólido perante a luz, deformações de pose no tempo, etc). Optei por mostrar somente o “modo de edição” justamente porque o “modo de pose” é um pouco mais próximo (mas bem pouco) do que aparece na imagem renderizada.

Figura 2: Renderização executada em minha casa

Ainda sobre o “canteiro de obras”, Migliorin destaca a importância de se entrar no processo de criação dos filmes que vemos: É preciso entrar no processo do cineasta dos filmes que vemos. Imaginar junto a ele, se colocar em seu lugar e como diz Alain Bergala, retroceder ao momento em que as escolhas estavam abertas. Ver o cinema entre dois momentos, entre o que está na tela e foi decidido e o momento anterior à decisão, em que o cineasta ainda precisava escolher se a personagem seria vista de frente ou de costas, se seu cabelo estaria preso ou solto, se a gola de sua blusa estaria engomada ou não, se ouviríamos o que ela diz ou não. Experimentar o cinema imaginando a criação do outro e se colocando nesse lugar do criador. (MIGLIORIN, 2015, p.190, grifo nosso).

Com a cultura do movimento software livre atuando cada vez mais em iniciativas de computação gráfica, vamos nos tornando mais próximos, tanto dos autores, quanto de suas obras e, principalmente, de seus canteiros. Assim, cada vez mais autores disponibilizam projetos em formato de edição que serão estudados por outros, potencializando a invenção de novas animações. Embora todos os programas dedicados à criação de modelagens e animações 3D tenham, cada um, seu formato nativo de edição, é muito mais frequente vermos projetos .blend sendo compartilhados na internet. Isto acontece por boa parte dos usuários do Blender serem entusiastas das potencialidades estéticas decorrentes da recombinação de cultura livre, a partir dos laços de colaboração voluntária que se cruzam em rede.

Ter acesso a esses “códigos-fonte” de obras culturais e/ou artísticas, pode ser muito interessante para a experimentação em ambiente escolar. Os estudantes, ao compor seus projetos desafiados por linhas de controle e linhas de abertura de dispositivos de criação de imagens - ao passo que exploram acervos de plataformas colaborativas como a Blend Swap, por exemplo - podem se deparar com e/ou inventar maneiras inusitadas de vivenciar e alterar um mesmo projeto. Quanto mais entramos em contato com forças e trajetórias que os projetos em formato de edição permitem ver, mais é possível perceber diferente o que já existe no espaço, além de “deixar-se tropeçar” nos inúmeros desdobramentos de interação possíveis pré- renderização. Desdobramentos estes que estão, a cada instante, tanto sendo colocados em pauta, quanto sendo questionados; muitas vezes, surgindo num mesmo projeto em que várias pessoas estão alterando simultaneamente.

Acaso

Tenho me perguntado se seria possível deixar o acaso acontecer na computação gráfica. Este ambiente de simulações nos dá a impressão de extremo controle, pois nenhum "cubo" ou linha de código aparece lá "por acaso", tudo parece ter sido pensado antes. Ademais, além de ser posicionado num lugar bem determinado dentro do espaço, o cubo entra e sai de cena por quantos frames forem definidos pelo autor, na escala cronológica. Ou seja, sempre se está indicando que algo está em tal lugar (espaço) e em tal instante (tempo), que são dois dados no gráfico. Assim, como escapar? Como provocar fissuras? Este tipo de controle permeia a computação, mas podemos observar algo semelhante tanto entre dinâmicas da indústria cinematográfica quanto entre práticas relacionadas à produção de conhecimento em muitas escolas. Cinemas que funcionam como linhas de produção industrial, em que se planeja e administra um roteiro fechado e bem direcionado. Um esquema que centraliza e rege a ação de seus participantes para atingir objetivos claros, havendo pouca abertura para imprevistos. Neste contexto, um diretor já tem definido as imagens que deseja captar e os caminhos para obtê-las. Ele seria equivalente àquele professor que tem a aula bem planejada, no sentido de aplicar o conteúdo e a metodologia do livro didático, por exemplo, bem como de cumprir a política pedagógica presente nos currículos oficiais do Estado. Este professor sabe muito bem o que pretende ensinar, sua didática está bem traçada e não há espaço para incorporar possíveis desvios e mudanças de rota. Ele não se deixa contaminar pelas situações inusitadas que poderiam ocorrer em sala de aula. Em ambas situações, parece que tanto o diretor quanto o professor, filma ou dá aula sobre aquilo que acredita já saber, selecionando no mundo, portanto, o que poderia comprovar isso. Esta pesquisa, se serviu do método cartografico para tentar se envolver com as trajetórias não previstas que se atualizariam naquele lugar em negociação (a escola). Bem como, apostou nos dispositivos, para tentar agenciar outros modos de habitar - em termos de imagem - tanto a computação gráfica, quanto a escola. Migliorin aponta o potencial dos dispositivos em lidar com o acaso, no cinema, como

uma alternativa destoante de um fazer cinematográfico centralizado no extremo controle por parte de um autor (seja individual ou coletivo):

[...] um inventor de formas de se ausentar, de estar presente, mas sempre de saída, quase do lado de fora da obra, permitindo que o acaso, o espectador, o real atravessasse a obra. [...] partiam de uma forte confiança do artista em suas possibilidades de criar pequenas perturbações no estado das coisas, mas também de uma grande confiança no fato de que a realidade está sempre se reorganizando de maneira a incorporar diferenças e novos modos de vida. Em resumo, quando 'estou de saída', criar não é organizar o mundo à

feição do criador, mas criar aberturas para que o mundo entre com suas forças e formas, surpreendendo o próprio artista. A

abertura para o descontrole que, por exemplo, o cinema direto, o

cinema verdade ou uma boa parte do cinema novo trouxe não é a

ausência de um indivíduo que enuncia, mas o deslocamento deste indivíduo para fora do centro. Deslocado e sem o privilégio da centralidade, trata-se de entrar em relação com o outro, com tudo que pode surgir de indeterminado neste deslocamento, com o que pode ser criado nos encontros. Fundamentalmente, me perguntava o que significa continuar criando arte e falando sobre o mundo sem esse lugar privilegiado, sem centralidade, sem clareza dos fins e sem palavras de ordem. (MIGLIORIN, 2015, p. 16, grifo nosso).

Emergência do que está em processo

No Capítulo 1, mencionei o filme Acidente, como sendo um exemplo de obra que resultou da submissão de sua equipe de filmagem às linhas de controle e de

abertura de um dispositivo de criação de imagens (que a fazia ter que se relacionar

com vários lugares). Oliveira Jr. (2015) percebeu a dissolução da narrativa em filmes como esse, que apostam em modos de fazer cinema onde emergem “potências espaciais”. A partir de Dorren Massey (2008), seria pensar o espaço não como uma superfície, mas como “a esfera da coexistência de uma multiplicidade de trajetórias” (p. 100) humanas e inumanas, que “envolve contato e alguma negociação social” (p. 143). Este fazer-cinema, opera estratégias que lidam com o lugar priorizando perceber o que já está lá, ao invés de adaptá-lo para fazê-lo funcionar como um dos elementos de cena a ser “visitado” pelas demandas de um roteiro narrativo ou texto, por exemplo. Portanto, ele provoca a emergência do que está em processo, sem- nome, que pode aparecer ao acaso.

Comparado ao caráter "cristalizado" de uma obra renderizada, num projeto

.blend várias de suas possibilidades ainda estão em aberto. Além disso, a partir

o olho de um personagem pode parecer um elemento cheio detalhes indiscutíveis (dos quais, provavelmente, ninguém “duvidaria” sobre significarem “um olho”), mas, dependendo do ponto de vista em que observemos o conjunto de polígonos que o originou - dentro do .blend - pode não só parecer uma meia esfera, uma montanha, uma bunda e muitas outras coisas, como pode vir a ser cada uma delas. Quando lançamos um começo de criação para ser editada colaborativamente em plano aberto, livre no ciberespaço, estamos lidando com a ideia de que isso tem a potencialidade de ser o embrião de qualquer coisa, algo que pode vir a ser um devir absolutamente imprevisível; o projeto da obra a coloca em negociação. Ter esse contato “à queima roupa” com elementos originários desconhecidos, pode gerar vislumbres de outros possíveis. Para exemplificar o que seria esse “lá dentro”, lhe convido a pensar no seguinte:

Após fazer download de um filme feito em live-action (filmado com atores humanos, de “carne e osso”), como o "O Desprezo", de Godard (escolhi esse filme por ser considerado um clássico da história do cinema, mas poderia ser qualquer outro), posso editar este arquivo de vídeo com qualquer software que possa cortar, colar e reposicionar/afastar cenas numa linha de tempo, ou seja, fazer montagem não-linear. Também posso fazer diversas interferências nos pixels de cada frame do vídeo: como alterar suas cores, escrever algo por cima, os sobrepor com pixels de outras imagens, etc. No entanto, não posso fazer a Brigitte Bardot (atriz que trabalhou nesse filme) pular em vez de andar, numa cena. Não posso redirigir esta atriz dentro da criação de uma cena deste mesmo filme, pois esse tempo passou; o Godard já fez todas as escolhas de direção daquele momento e dele captou a cena com a câmera. Eu só posso alterar os conjuntos de pixels resultantes dessa captação, que, por sua vez, são versões digitais/binárias correspondentes aos grãos de prata de uma película fílmica que já foi queimada. Estou chamando este tipo de edição - limitada a um rearranjo do resultado – de "alteração de fora". Se eu pudesse revisitar a locação onde foi filmada esta cena, levar a Brigitte Bardot novamente para lá e reposicionar todos os elementos para recriar a situação (inclusive a posição do sol, se foi uma filmagem em locação externa), alterando somente uma parte da mise-en-scene, ou seja, solicitando que a atriz pulasse em vez de andar, seria uma "alteração de dentro". Aí, esta nova cena seria recaptada,

por uma outra câmera (claro que eu poderia procurar o mesmo modelo usado por Godard na época, também) e isso geraria outro arquivo de vídeo que poderia ser editado/montado por alguém num software.

Geralmente nos cabe a posição de espectadores, ou, no máximo, de "editores de fora" dos arquivos dos filmes (que, frequentemente, são “piratas”, ou seja, cópias não autorizadas). Mas mesmo que tivéssemos dinheiro para bancar os gastos de produção de uma refilmagem do filme do Godard, a Brigitte envelheceu, não é a mesma, é difícil (na verdade, é impossível mesmo) ter acesso a todos os elementos da realidade que fizeram parte daquela cena naquela época. Além disso, existem direitos reservados sobre o filme "O Desprezo", para autorizar uma refilmagem que altere parte da sua mise-en-scene. Para refilmar e distribuir um "O Desprezo versão Katharine", ou mesmo um outro filme que tenha muitos elementos parecidíssimos com os existentes neste filme, provavelmente eu teria que pagar copyright a quem detêm os direitos sobre os filmes do Godard (talvez nem ele detenha os direitos patrimoniais da obra, talvez os tenha vendido a um terceiro, lhe restando somente os direitos morais98).

No caso de trabalhar com simulações, a coisa muda, pois além de ser possível ter acesso às locações (elas fazem parte de uma realidade que existe no mundo da simulação) do filme Shrek (que, aqui, também é só um exemplo), de seus personagens (que seriam a simulação dos corpos dos atores) e dos demais elementos de cena, como o sol (ou qualquer outra lâmpada simulada) temos total controle por eles, eles não envelhecem. Isso acontece porque, ao criarmos um personagem 3D que será animado dentro de um filme que é uma simulação, estamos pagando por duas coisas: não só pelo trabalho de quem articula a expressão do corpo do modelo 3D e de quem faz a dublagem de sua fala para aquele filme específico (as duas funções são de interpretação, que seria o equivalente ao cachê pago à Brigitte Bardot para atuar durante a filmagem do filme "O Desprezo"), mas paga-se também pela criação inteira do personagem, para que ele passe a existir, como a modelagem de seu corpo (junto à aparência de suas superfícies, que inclui seus índices de refração quanto à luz, a textura de sua pele

98 Mais informações sobre a diferença entre direitos patrimoniais e morais sobre obras artísticas em: <https://www.abramus.org.br/artigos/12659/o-autor-pode-transferir-seus-direitos-para-outra-

pessoa/7/>. Vale salientar que essas indicações da ABRAMUS versam sobre a realidade brasileira, sobre a qual acho mais útil pautar aqui que a do Godard (que é só um exemplo). Acesso: 07/02/2018.

enrugada, etc.) e a configuração de tudo que faz parte desse corpo, como o conjunto de ossos que articularão seus movimentos, por exemplo. No caso da Brigitte Bardot, o Godard não pagou por isso, ele não precisou gerar a Brigitte “do zero”, ela já existia, ele "tomou emprestado" para o filme, pagando somente por sua interpretação em dias específicos de filmagem. Ou seja, a criação da Brigitte foi paga por ela mesma e/ou por quem a sustentou.

Então, há uma desvantagem aí, não é? Enquanto no live-action se paga por uma coisa, no mundo das simulações se paga por duas. A questão é que, tendo sido pago esse custo para a criação de modelos “do zero”, é possível sim ter controle sobre o envelhecimento dos personagens, é possível controlar o sol, é possível ter acesso a uma locação usada a 30 anos atrás, sem ela ter sido alterada por