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4.11 ACORDO E CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO 123

4.11.1 Conceito de convenção coletiva de trabalho 125

A convenção coletiva de trabalho é um instrumento normativo resultante de uma bem-sucedida negociação coletiva que objetivou estabelecer melhores condições de trabalho para os integrantes da categoria profissional representada pelo respectivo sindicato na formalização do instrumento.

Nesse sentido, Arnaldo Süssekind, para quem a convenção coletiva é um ato legislativo elaborado por entidades sindicais e por via convencional, visando regular e estipular as condições para as relações individuais de trabalho189.

É importante observar que da definição acima se extrai uma visão que se coaduna com a teoria pluralista do direito, na medida em que se equipara a elaboração da convenção coletiva de trabalho como exercício da autonomia privada coletiva enquanto centro produtor de normas jurídicas, atribuindo a essa autonomia coletiva o mesmo papel ou, melhor, a mesma competência dispensada ao processo legislativo.

Já, para Evaristo de Moraes Filho, a convenção coletiva de trabalho é o instrumento mais dúctil e plástico para a regulação das condições de trabalho das diferentes categorias econômicas e profissionais existentes na sociedade, sendo o resultado concreto da autonomia privada coletiva190.

Verifica-se na definição acima uma subversão, na medida em que confunde- se ou despreza-se a negociação coletiva, pois os instrumentos normativos são, apenas e tão-somente, produto da negociação coletiva de trabalho, e esse processo não é explicado a partir daqueles que em verdade são o resultado deste. Significa afirmar, portanto, que, diferentemente da afirmação aposta no parágrafo anterior, o meio mais dúctil e plástico para a regulação das condições de trabalho é a negociação coletiva de trabalho e não a convenção ou acordo coletivo de trabalho, pelo simples fato de que estes são o produto da negociação coletiva que logrou êxito.

189 SÜSSEKIND, Arnaldo. et alli. Instituições de direito do trabalho. 19. ed. vol. 2. São Paulo: LTr,

2000, p. 1177.

190 MORAES FILHO, Evaristo de. Tendências do direito coletivo do trabalho. In: Relações coletivas

de trabalho: estudos em homenagem ao Ministro Arnaldo Süssekind. TEIXEIRA FILHO, João de

Ademais, saliente-se a negociação coletiva de trabalho não necessariamente põe fim aos conflitos de interesses entre classe econômica e profissional, conforme analisado acima, sendo mais prudente considerar-se que a negociação coletiva bem-sucedida, ou seja, aquela que originou uma convenção (ou acordo) coletiva de trabalho, em verdade harmoniza transitoriamente esse conflito, ao estipular melhores condições de trabalho.

Essa eloqüência pela solução dos conflitos coletivos de trabalho por meio da convenção coletiva, e que sugere uma solução definitiva, é encontrada na definição de Délio Maranhão, onde a convenção coletiva é a solução, por via de acordo, dos conflitos de interesses coletivos de grupos ou categorias, por meio do estabelecimento de normas e condições de trabalho reguladoras, durante o prazo da respectiva vigência, das relações individuais entre os integrantes das categorias ou grupos convenentes191.

Como advertido, a definição acima caracteriza-se por tentar atribuir um caráter de perenidade à convenção coletiva de trabalho, na medida em que uma solução dos conflitos coletivos de trabalho implicaria a desnecessidade de realização de subseqüentes negociações e convenções coletivas de trabalho. Por isso mesmo, na presente obra, optou-se por imputar à negociação coletiva e, consequentemente, à própria convenção coletiva, o aspecto de fugacidade, tendo em vista que ela visa à solução transitória dos conflitos coletivos de trabalho.

Segundo José Cairo Júnior, a convenção coletiva de trabalho consiste em um instrumento normativo derivado da negociação coletiva havida entre o sindicato da categoria profissional e o respectivo sindicato da categoria econômica, tendo como objetivo a fixação de novas condições de trabalho.192

Percebe-se que o autor indica o caráter normativo da convenção coletiva de trabalho, além de frisar o objetivo de fixação de novas condições de trabalho. Dessa afirmação se extrai duas situações distintas. A primeira está ligada ao fato de o autor não impor “melhores” condições de trabalho, mas apenas “novas”, podendo sugerir que, por meio da convenção coletiva de trabalho, possa se estabelecer piores condições de trabalho, o que de fato é possível, conforme estudado acima, quando

191 MARANHÃO, Délio. Direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1993,

p. 330.

192 CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho: direito individual e direito coletivo de

da negociação coletiva in pejus, porém, essa é a exceção, uma situação extraordinária e não a regra.

Com efeito, não está totalmente errado o autor, uma vez que a própria Constituição da república Federativa do Brasil apresenta hipótese de retrogradação das condições de trabalho, quando permite expressamente a possibilidade de redução do salário por meio da convenção coletiva de trabalho.

A segunda situação diz respeito ao fato de que não necessariamente uma convenção coletiva tem que trazer “novas” condições de trabalho. Tendo em vista que a eficácia da convenção coletiva de trabalho está limitada no tempo, por um período máximo de dois anos193, uma convenção coletiva de trabalho posterior

poderá apenas manter as condições previamente estabelecidas por convenção coletiva de trabalho anterior, sem que com isso seja estipulada uma novel condição.

193 Ressalte-se que, não obstante a CLT, em seu art. 614, § 3º, limitar a vigência das convenções e

acordos coletivos de trabalho no prazo máximo de dois anos, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho vem decidindo em favor de estipulação dos instrumentos coletivos em prazo superior a dois anos, quando apresentarem condições de trabalho mais benéficas aos trabalhadores. Nesse sentido a seguinte decisão:

ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. PRAZO DE VIGÊNCIA. CINCO ANOS. VALIDADE. GARANTIA DE EMPREGO. NORMA BENÉFICA. SUPREMACIA DO PRINCÍPIO TUITIVO DO DIREITO DO TRABALHO. NÃO-INCIDÊNCIA DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 322 DA SBDI-I DO TST. Acordo coletivo de trabalho por meio do qual o sindicato da categoria profissional

firma com a empresa garantia de emprego para os seus empregados, com prazo de vigência de cinco anos em troca de vantagens salariais, reveste-se de validade, ante o que dispõe o artigo 7º, XXVI, da Constituição da República, que consagra o direito dos trabalhadores ao reconhecimento das convenções e dos acordos coletivos de trabalho. A norma constitucional nada disciplina acerca de prazo de vigência dos instrumentos coletivos, de forma que não existe nenhuma incompatibilidade vertical do seu regramento com o disposto no § 3º do artigo 614 da CLT, no sentido de não se permitir estipular duração de convenção ou acordo coletivo de trabalho por prazo superior a dois anos. Interpretação literal do preceito consolidado levará à conclusão de ser vedado, em qualquer circunstância, firmar norma convencional com prazo de vigência superior a dois anos. Procedendo- se, todavia, à interpretação da norma pelo método lógico-sistemático, considerada no conjunto da legislação do trabalho (v.g. artigos 9º e 468 da CLT), de natureza protecionista, infere-se do disposto no artigo 614, § 3º, da CLT que a restrição para a avença de instrumento normativo com prazo de duração superior a dois anos é imperativa somente quando resultar em prejuízo ao trabalhador, ante a supremacia do princípio tutelar orientador do Direito do Trabalho sobre preceito legal isoladamente considerado. Não se olvide, ainda, que o juiz aplicará a lei atendendo aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum (artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil). Ao aplicador da lei, portanto, cabe lançar mão do método interpretativo lógico-sistemático e teleológico, para encontrar o sentido da norma que realize os fins sociais por ela objetivados. Na hipótese vertente, não incide o disposto na Orientação Jurisprudencial nº 322 da SBDI-1 do TST, na medida em que tal jurisprudência assenta-se em precedentes que enfrentam o exame de hipóteses nas quais os prazos de vigência das normas coletivas foram prorrogados por tempo indeterminado, de forma prejudicial aos obreiros, razão pela qual foram tidas como inválidas em face do preceito contido no artigo 614, § 3º, da CLT e do ordenamento jurídico juslaboral. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 124800-45.2002.5.12.0043; 1ª Turma; Min. Rel. Lelio Bentes Correia; Acórdão publicado no Diário da Justiça em 30/11/2007).

Contudo, acerta o autor na hipótese de se estar tratando de uma primeira ou inédita convenção coletiva de trabalho, pois aí sim haverá uma situação na qual a convenção coletiva de trabalho estará trazendo “novas” condições de trabalho.

Já, Orlando Gomes entende a convenção coletiva de trabalho como uma regulamentação prévia de condições de trabalho, estabelecida, por acordo, entre entidades organizadas de empregados e empregadores194. Aqui verifica-se uma definição, à primeira vista simples, porém capaz de abarcar corretamente os institutos que circundam toda a elaboração da convenção coletiva, principalmente a negociação.

No mesmo sentido, Octavio Bueno Magano, para quem a convenção coletiva de trabalho é o negócio jurídico através do qual sindicatos ou outros sujeitos devidamente legitimados, estipulam condições de trabalho195.

Verifica-se, nas duas definições supra que sobressai-se eminentemente o aspecto obrigacional da convenção coletiva de trabalho, sendo considerado, por esses autores, inequivocamente como um negócio jurídico.

Para Amauri Mascaro Nascimento as convenções coletivas de trabalho têm como escopo constituir condições aplicáveis a terceiros, ou seja, a instituição de normas de conduta que serão aplicadas às relações individuais e obrigações entre os sujeitos coletivos estipulantes196.

Pela definição desse autor, percebe-se, desde já, a coexistência de conteúdo normativo e obrigacional naquele instrumento.

Vale destacar a doutrina de Mauricio Godinho Delgado acerca da convenção coletiva de trabalho, quando afirma que as convenções coletivas de trabalho, embora de origem privada, criam regras jurídicas de caráter geral e abstrato, destinadas a normatizar situações ad futurum. Correspondem, consequentemente, à noção de lei em sentido material. São, desse modo, do ponto de vista de seu

194 GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 14. ed. Rio de Janeiro:

Forense, 1996, p. 46.

195 MAGANO, Octavio Bueno. Manual de direito do trabalho: direito coletivo do trabalho. volume 3.

São Paulo: LTr, 1980, p. 139.

196 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Compêndio de direito sindical. 2. Ed. São Paulo: LTr, 2000, p.

conteúdo, diplomas desveladores de inquestionáveis regras jurídicas, embora existam também no seu interior cláusulas contratuais.197

Note-se que o autor, na própria definição, já revela seu posicionamento acerca da natureza jurídica da convenção coletiva de trabalho, compreendendo-a como lei em sentido material, ainda que existam cláusulas de caráter contratual no seu interior.

A Consolidação das Leis do Trabalho também definiu a convenção coletiva do trabalho em seu art. 611, in verbis:

Art. 611 – Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais Sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais do trabalho.

Percebe-se que a CLT define a convenção coletiva de trabalho como acordo de caráter normativo, apresentando uma característica híbrida, por um lado obrigacional, contratualista, do direito civil, e por outro lado um aspecto normativo, no sentido de lei, por ter efeitos prospectivos e terceiros não participantes da estipulação.

Essa característica, à primeira vista híbrida, também aparece nas principais definições apresentadas, o que revela a necessidade de se discutir, ainda que de forma perfunctória, a natureza jurídica da convenção coletiva de trabalho.