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2.4 PROCESSO DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL

2.4.1 Conceito de participação social

A participação social pode ser entendida como a influência exercida pelos indivíduos para a organização da sociedade, sendo essencial na construção de um processo de mudança em benefício de todos os grupos que compõe a estrutura social. É através dela que se iniciam os processos de mudança e de controle público.

Desse modo, a participação pode compreender a dimensão pedagógica, por exemplo, segundo os princípios de uma educação crítica para a emancipação política como defendido por Freire (1996), em contraponto com o denominado por ele „método bancário‟, que modela criaturas passivas que devem observar os acontecimentos apenas como espectadores e não como cidadãos ativos (FREIRE, 1996; RUBIO, 1997).

Quanto ao método bancário, conforme Freire (1967), é aquele que modela o aluno como pessoa resignada, que aceita decisões políticas sem questionar. Na verdade, molda as pessoas para que fiquem à margem das decisões e que aceitem o desconhecimento, devendo apenas receber informações e ordens sobre o que fazer, sem maiores questionamentos:

Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunicados” e depósitos que os educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los. Margem para serem colecionadores ou fichadores das coisas que arquivam. No fundo, porém, os grandes arquivados são os homens, nesta (na melhor das hipóteses) equivocada concepção “bancária” da educação. Arquivados, porque, fora da busca, fora da práxis, os homens não podem ser. Educador e educandos se arquivam na medida em que, nesta destorcida visão da educação, não há criatividade, não há transformação, não há saber..[...] (FREIRE, 1967, n.p.).

Na sua dimensão simbólica, a participação contribui na quebra deste paradigma e na construção de uma identidade coletiva para a criação de controle social da gestão das políticas públicas, além da importância pedagógica de uma educação para a emancipação política (MILANI 2008). Deste modo, é legítimo considerar que a participação social concebe a construção de uma cidadania ativa.

Por outro lado, a participação social consiste em canais institucionais de participação na gestão governamental, com a construção de processos decisórios coletivos por consenso, não se confundindo com os movimentos sociais que permanecem autônomos em relação ao Estado (ASSIS; VILLA, 2003).

O princípio participativo é apoiado por instituições diversas, por vezes opostas, desde o Banco Mundial (BM) - cujo foco é o desenvolvimento da economia - até organizações não

governamentais e integrantes do Fórum Social Mundial (FSM) - cuja preocupação é socioambiental -, o que causa questionamentos críticos acerca do significado e do fundamento destas participações nos diferentes contextos (ROJO; MILANI; ARTURI, 2004; MILANI; KERAGHEL, 2005; MILANI, 2008).

Milani (2008) recorda que “fomentar a participação dos diferentes atores políticos e criar uma rede que informe, elabore, implemente e avalie as políticas públicas são, hoje, peças essenciais nos discursos de qualquer política pública (auto) considerada progressista” (MILANI, 2008, p. 552).

Para Modesto (1999) participar significa interferir no processo decisório e, na esfera da administração pública, corresponde às formas de influência externa na concretização do papel administrativo do Estado. Ainda, “a ordem jurídica brasileira não é carente de instrumentos normativos para operacionalização da participação popular na administração pública. Mas a participação permanece escassa” (MODESTO, 1999, p. 07).

Teixeira (1997) define a participação cidadã como um processo de disputa entre sociedade civil, Estado e o mercado, em que as funções são redefinidas através do fortalecimento da sociedade civil por meio da ação organizada individual, de grupos ou de associações.

Nesta perspectiva, tenta-se construir o conceito de participação cidadã, considerando a especificidade e complexidade do fenômeno, como se manifesta na atualidade, seja em termos de práticas em países democráticos, seja no debate teórico, como alternativas às formas existentes (TEIXEIRA, 1997).

O autor acredita que há maneiras de conciliar a participação cidadã e a democracia parlamentar representativa, ressaltando:

[...] o papel de controle do Estado e da economia, pela sociedade civil, tendo como referências duas funções básicas: a prestação de contas dos governantes e consequente transparência dos seus atos para avaliação pelos cidadãos, através de mecanismos permanentes e a responsabilização dos agentes do poder público em relação aos aspectos éticos, de oportunidade e eficácia das decisões (TEIXEIRA, 1997, p. 182).

Reed (2008, p. 2326, tradução nossa) acredita que o “sucesso a longo prazo dos processos participativos pode depender da inclusão institucional da participação das partes interessadas”, pelo que inclui:

[...] os requisitos dos processos participativos estão em desacordo com muitas das estruturas institucionais das organizações encarregadas de implementar essas políticas. Muitas das limitações experimentadas nos processos participativos têm

suas raízes nas culturas organizacionais daqueles que patrocinam ou participam delas (REED, 2008, p. 2426, tradução nossa).

Para este autor, os tomadores de decisão podem se sentir desconfortáveis em acatar decisões de um processo participativo. Em muitos casos, fazê-lo “[...] representaria uma mudança radical na cultura organizacional de agências governamentais e outras instituições” (REED, 2008, p. 2426, tradução nossa).

Neste sentido, Teixeira (1997) alerta para a diferença entre poder político e autoridade:

Na caracterização da participação política o elemento – poder político – não se confunde com autoridade, nem com o Estado, mas supõe uma relação em que atores, usando recursos que são disponíveis no espaço público, fazem valer seus interesses, aspirações e valores, construindo suas identidades, afirmando-se como sujeitos de direitos e obrigações (TEIXEIRA, 1997, p. 184).

Ainda o mesmo autor, referindo-se ao controle do poder do Estado pela sociedade, argumenta:

Seu exercício requer a organização da sociedade civil, sua estruturação e capacitação para esse fim, de forma permanente, em múltiplos espaços públicos, antes e durante a implementação das políticas, tendo como parâmetros não apenas variáveis técnicas, mas também exigências de equidade social e aspectos normativos (TEIXEIRA, 1997, p. 203).

Hernandez (2017, p. 23, tradução nossa) acredita que a modernização do Estado exige o desenvolvimento de uma sociedade civil participante, na qual “os cidadãos tenham direitos e exercitem capacidades de envolvimento e interferência real em assuntos públicos e privados que os preocupam”. No entendimento do autor:

A participação do cidadão é o mecanismo democrático moderno que finalmente concede legitimidade social a qualquer projeto que intervenha em um território e afeta a vida de uma comunidade humana, como geralmente acontece. A participação cidadã deve ser incluída no processo de planejamento, em todas as etapas. Atualmente, a participação tem grande legitimidade na sociedade, porque é uma forma de construir uma cidade e sociedade, para se desenvolver com uma concepção e perspectiva de inclusão social (HERNANDEZ, 2017, p. 35, tradução nossa). Segundo Reed (2008, p. 2427, tradução nossa) “[...] há evidências de que a participação dos interessados pode levar a decisões mais eficazes e duradouras”, no entanto, assevera a pouca evidência de que decisões provenientes de processos participativos são percebidas como mais holísticas e representativas de diversos valores e necessidades e se possuem capacidade para aumentar a confiança pública no processo de tomada de decisão.