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Conceituação da participação de menor importância

Apesar de ser um tema atual e de constante preocupação no Direito Penal, verifica-se que o instituto da participação de menor importância não recebe o tratamento adequado. Alguns doutrinadores se abstêm de comentar o assunto esquecendo-se da relevância que este tem na fixação da pena e conseqüentemente, na aplicação da justiça ao caso concreto, diante do princípio de individualização da pena.

O instituto da participação de menor importância está positivado no artigo 29, § 1º, do Código Penal que prevê uma causa geral de diminuição da pena (de um sexto

220 SANTOS JÚNIOR, Carlos Rafael. O concurso de pessoas e a sua quesitação no Júri. RT-700, pg 291.

a um terço), para as hipóteses de participação de menor importância. Aludido conceito não está expresso, ficando a cargo da doutrina e jurisprudência tratar da matéria.

O Código Penal, para Antonio José ROSA inovou quando no §1º do art. 29, permitiu a diminuição da pena quando a participação do agente no crime “for de menor importância”, e no §2º suscitou a peculiaridade de algum dos concorrentes “ter desejado participar de crime menos grave”.Procedia-se essa distinção na graduação da pena, por via jurisprudencial, mas mesmo assim eram cometidas muitas injustiças quando a lei era aplicada ao caso concreto. Por exemplo: num assalto a banco, a atuação do motorista de táxi, que conduziu os bandidos é diferente da atuação dos comparsas que entraram no estabelecimento e, à mão armada, renderam funcionários e clientes, carregaram o dinheiro e até praticaram crimes de morte e lesões corporais. Estes últimos demonstraram muito maior periculosidade. 221

Para Ariosvaldo de Campos PIRES, não é fácil conceituar-se a participação de menor importância, pois à parte as inúmeras interpretações que suscita, entende que: “se dá a causa em exame quando a contribuição ao evento é de pouco relevo, quase dele podendo prescindir o resultado, o que traz como conseqüência uma censurabilidade menor”. Este autor comenta que Álvaro Mayrink da Costa sustenta, porém, tratar-se “de diferenciação quanto ao injusto e não referencial da culpabilidade”.222

Paulo José da COSTA JÚNIOR esclarece que a antiga atenuante genérica prevista no art. 48, inciso II do Código Penal de 1890 (“ter sido de somenos importância sua cooperação no crime”), transformou-se no §1º do art. 29 do Código Penal de 1940 e afirma que os cúmplices poderão ter sua pena abrandada, de um sexto a um terço, conforme a cooperação emprestada ao evento ou poderão ser enquadrados no art. 62, incisos I a IV do referido ordenamento, ou seja, circunstâncias agravantes se a participação do cúmplice for de especial relevo.223

Miguel REALE JÚNIOR ensina que na participação de menor importância:224

221

ROSA, op. cit., p.255.

222 PIRES, Ariosvaldo de Campos. Compêndio de Direito Penal, Parte Geral. V.1. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.212

223 COSTA JÚNIOR, op. cit., p. 114.

224 REALE JÚNIOR, Miguel. Instituições de Direito Penal, Parte Geral. Vol. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

O legislador, por outro lado, cedeu passo à admissão da culpabilidade ao transformar a circunstância atenuante prevista no art. 48, II do Código Penal, relativa à participação de somenos importância, em causa de diminuição de pena, constante no §1º do art. 29 do Código Penal, cominando, portanto, à cumplicidade pena inferior ao mínimo legal, podendo ser reduzida de um sexto a um terço.

Segundo Heleno FRAGOSO, a participação de menor importância, que o CP de 1940, em sua formulação original referia como cooperação de “somenos importância”, se refere à atuação de cúmplices e corresponde a situações de participação, em que se revele evidentemente culpabilidade menor. Será o caso de quem contribui de forma insignificante ou mínima para a realização do fato punível o que influenciará na fixação da pena, quanto maior a cooperação, maior a fração e quanto menor, menor a fração a ser aplicada na redução da pena.225

Para Rogério GRECO, o parágrafo 1º do art. 29 do CP somente terá aplicação nos casos de participação (instigação e cumplicidade), não se aplicando às hipóteses de co-autoria. Não se pode falar em co-autoria de menor participação com o intuito de reduzir a pena de um dos co-autores, pois segundo posição adotada pela teoria do domínio funcional do fato e observando-se a distribuição de tarefas entre os agentes, co-autor é aquele que tem o domínio funcional do fato que lhe fora atribuído pelo grupo e sua atuação é relevante para o sucesso do crime. Conclui o prestigiado doutrinador que dessa forma, toda atuação daquele que é considerado co-autor é importante para a prática da infração penal, não se podendo, portanto, falar em “participação de menor importância”.226

Verifica-se que estas características da participação enunciadas por Damásio de JESUS (a conduta não se amolda ao núcleo do tipo, o partícipe não tem nenhum poder diretivo sobre o crime) estão presentes também na participação de menor importância.227

Para Cezar Roberto BITENCOURT: 228

Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço (art. 29, §1º, do CP).

225 FRAGOSO, op. cit., p.321. 226 GRECO, op. cit., p. 507.

227 JESUS, Damásio E. de. Código Penal Anotado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 139.

228 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, Parte Geral, V.1, 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p.455.

A participação aqui referida diz respeito exclusivamente ao partícipe e não ao co-autor. Ainda que a participação do co-autor tenha sido pequena, terá ele contribuído diretamente na execução propriamente do crime. A sua culpabilidade, naturalmente superior à de um simples partícipe, será avaliada nos termos do art. 29, caput, do Código Penal, e a pena a ser fixada obedecerá aos limites abstratos previstos pelo tipo penal infringido. Já o partícipe que houver tido “participação de menor importância” poderá ter sua pena reduzida de um sexto a um terço, podendo ficar aquém do limite mínimo cominado, nos termos do art. 29, §1º.

Andre ESTEFAM adverte que o dispositivo só se aplica aos partícipes, não aos co-autores e cita o seguinte exemplo: o agente que, ciente da intenção homicida de alguém, limita-se lhe indicar o local para a aquisição de uma arma, pratica conduta que, embora tenha alguma relevância causal, pode ser considerada como participação de menor importância.229

No livro Curso de Direito Penal de William Wanderley JORGE, o autor informa que a participação de menor importância é caso de menor culpabilidade ou cooperação de somenos importância, do partícipe não do co-autor, a ser aferida pelo juiz no caso concreto. Os agentes que concorrem para o delito estão sujeitos a uma mesma pena, mas “na medida de sua culpabilidade”, ou seja, o crime é um só para todos, mas as penas serão individualizadas a fim de que a culpabilidade de cada um dite a sua pena.230

PIERANGELLI tem um entendimento similar, pois para ele a participação de menor importância só pode ser cumplicidade simples ou secundária, perfeitamente dispensável e que, se não prestada, não impediria a realização do delito. Entende ainda que tal solução possa ser considerada como um critério geral para identificação deste instituto.231

No Código Penal Interpretado de MIRABETE encontra-se o seguinte julgado com uma explicação sobre o instituto da participação de menor importância:232

TACRSP: A participação de menor importância, que permite a redução da pena, só pode ser a cumplicidade simples, ou secundária, perfeitamente dispensável e que, se não

229 ESTEFAM, Andre. Direito Penal 1, Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2005, (Coleção Curso & concurso/coordenador Edílson Mougenot Bonfim) p.143.

230 JORGE, William Wanderley. Curso de Direito Penal – Parte Geral, V.1, 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.353.

231 PIERANGELLI, José Henrique. O concurso de pessoas e o Novo Código Penal (capítulo do livro Escritos Jurídicos Penais). São Paulo: Revista dos Tribunais, Ano 80, Novembro de 1991, volume 673. pg. 279- 280.

prestada, não impediria a realização do crime (RJDTACRIM 20/133-4). No mesmo sentido, TACRSP: JTACRIM 90/34).

Outro julgado que trata do tema e pode ser localizado na mesma doutrina é o seguinte:

A participação de menor importância depende do agir do acusado não ter influenciado no êxito do desiderato, do contrário caracteriza-se a co-autoria, indicando que o agente atuou de forma direta e ativa na empreitada criminosa. Esta circunstância se caracteriza no agente que aguarda na direção do veículo para garantir a fuga dos demais meliantes após a prática ilícita" (Apelação Criminal n. 2005.030834-1, de Criciúma. Relator: Des. Solon d'Ea Neves. j. em 22.11.2005).

Segundo este julgado, o que caracteriza a participação de menor importância é o fato das ações do acusado não influenciarem no êxito do crime, entretanto, pode-se afirmar que o exemplo não foi de todo feliz, pois ao aguardar na direção de um veículo, o agente facilita a fuga dos demais agentes.

No Código Penal Comentado de Celso DELMANTO, Roberto DELMANTO JUNIOR e Fabio Machado de Almeida DELMANTO encontra-se a seguinte explicação acerca da participação de menor importância: 233

Este §1º do art. 29 estabelece causa especial de diminuição de pena para o partícipe que teve cooperação de menor importância para o crime. É a hipótese do participante cuja contribuição, moral ou material, foi de pouca importância na infração penal. Caso a participação não seja de menor importância, não haverá a redução da pena deste §1º, devendo o partícipe responder pelo crime “na medida de sua culpabilidade”, nos termos do caput.

Magalhães NORONHA faz quatro observações sobre a participação de somenos importância: 234

a) Aplica-se somente ao partícipe, pois incompatível com a posição de autor. Quem realiza o tipo obviamente não pode agir com pequena parcela para o crime.

b) Por “menor importância” (somenos) deve ser entendida a de leve eficiência causal.

c) A participação de menor importância é incompatível com as agravantes contidas no art. 62, todas elas referentes ao concurso de pessoas. Isto

233 DELMANTO, Celso; DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto; DELMANTO, Fabio Machado de Almeida. Código Penal Comentado, 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 62.

234 NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal, Introdução e Parte Geral. V.1, 37.ed. São Paulo: Saraiva. p.218.

porque ninguém pode ter uma participação de somenos e ao mesmo tempo promover, coagir, organizar o crime ou dirigir a atividade criminosa, etc. d) A redução da reprimenda é facultativa e não obrigatória.

Esta última observação será analisada no próximo tópico desta monografia. O entendimento do que seja a leve eficiência causal para o referido autor ficará por conta de uma jurisprudência ainda a ser construída, porém devem ser observados os seguintes requisitos na sua apreciação: o momento da participação no iter criminis, a intensidade do elemento subjetivo, a natureza da cooperação diante do resultado final e, por fim, o grau de reprovabilidade da ação. 235

FRAGOSO observa que a antiga doutrina ao tratar das formas de participação, distinguia a cumplicidade primária (se o auxílio é indispensável) da secundária (se o auxílio, sem ser indispensável, facilita a ação delituosa). A distinção é irrelevante, mas pode ser considerada para a aplicação da pena, verifica-se que a doutrina moderna trouxe este entendimento para a participação de menor importância. 236

Em face do §1º do art. 29, para José Henrique PIERANGELLI uma pergunta se impõe:

“Quais são os casos de participação com maior e com menor importância?” Na maneira de ver do consagrado autor, a resposta se extrai das regras orientadoras da autoria, consubstanciadas naquilo que se convencionou chamar de princípio do domínio do fato, mas que para o autor não é princípio, extraído do ôntico, onde se podem estabelecer, com clareza, os casos mais importantes pela via da exclusão, e, a partir desta, estabelecer-se os casos que merecem a atenuação da pena. Portanto, para este doutrinador para que seja determinada no caso concreto se o julgador está ou não diante de uma conduta que pode ser tipificada como participação de menor importância devem ser analisadas as condutas importantes para o crime e por exclusão aquelas que não o forem poderão ser consideradas como merecedoras da causa geral de diminuição de pena. 237

Para Ney Mora TELES, a participação de cada um dos agentes deve ser analisada e graduada conforme a sua importância para a realização do delito, pois

235 Id.

236 FRAGOSO, op. cit., p.319.

existirão participações de grande e de pequena importância, de maior e de menor eficiência causal. Continua o autor dizendo que caberá ao juiz no caso concreto, analisar o grau de eficiência causal, para concluir pela maior ou menor importância da participação.238

Esclarece o autor tal tese com o seguinte exemplo: “aquele que informa o agente sobre a ausência dos donos da casa, para que ele nela entre e subtraia à vontade, está participando de um fato típico de furto” e comenta que esta participação é de