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3. A ESTRUTURAÇÃO TÍPICA DOS DELITOS DE CORRUPÇÃO ATIVA E

3.2. Tomada de posição As consequências do modelo unilateral adotado pelo

3.2.5. Conclusões críticas ao inadequado modelo brasileiro e considerações

3.2.5.1. Conclusões críticas

Verifica-se que as posições acima expostas são, de certa forma, bastante radicais. Há quem afirme e impute à exigência do ato de ofício a responsabilidade pela impunidade da corrupção no direito brasileiro.450 Contudo, se a análise for feita de maneira menos apaixonada e mais racional, os resultados certamente serão mais seguros e corretos.

Trata-se, na verdade, de bem pontuar a realidade típica a partir de critérios dogmáticos confiáveis e seguros na esteira da lição de GIMBERNAT ORDEIG451, pois se não se conhece os limites de determinado tipo penal, a ponto de seu alcance ser dúbio ou inaplicável, a punição ou a impunidade derivam não de uma análise criteriosa, mas sim de uma caótica, quando não anárquica, aplicação do Direito penal.

As críticas devem ser postas a partir de duas constatações construídas sob as bases do relatado no item 3.2.4. supra.

A primeira é a de que, em que pese o esforço doutrinário e jurisprudencial, o direito brasileiro não exige a menção (e muito menos a prática) do ato de ofício para a incriminação da conduta de corrupção

450 Cf., entre outros, SANTOS, Claudia Cruz; BIDINO, Claudio; MELO, Débora Thaís de.

Notas ..., p. 551.

451 GIMBERNAT ORDEIG, Enrique. Tiene futuro la dogmática penal? In: Estudios de

passiva. E a segunda é a de que a legislação brasileira há de ser reformada para que a exigência do ato de ofício seja inserida no tipo penal de corrupção passiva.

A tentativa doutrinária e jurisprudencial de acobertar a deficiência típica incidente sobre o delito de corrupção passiva, muito embora possua ares de quase-unanimidade, não logra atingir o sucesso pretendido, conquanto seus argumentos realmente improcedem.

O fato é que as normas incriminadoras das condutas de corrupção ativa e passiva possuem peculiaridades no mínimo intrigantes. O termo <<ato de ofício>> é compreendido a partir do delito de corrupção ativa e não da vertente passiva do delito. Não obstante a classificação entre corrupção ativa e passiva seja precária nos dias atuais, quiçá indevida, não há como não apontar o delito do funcionário público como sendo o principal e mais grave452 e, assim, deveria ser feita a partir deste a retirada dos elementos típicos principais dos delitos de corrupção, ou, quando muito, o termo <<ato de ofício>> estar presente nas duas figuras típicas.

Mas o principal é reconhecer serem os tipos penais brasileiros assentados sobre bases incriminadoras absolutamente diversas. E tal reconhecimento não redunda em concordância com tal sistemática. Pelo contrário, é uma crítica.

Pode-se afirmar que os tipos penais, em vigor no direito brasileiro, estão permeados por bases estruturais diversas. Aponta Alessandro SPENA que a corrupção, do ponto de vista estritamente jurídico- penal, pode assumir duas concepções: uma <<mercantilista>> e uma de <<patrocínio>>.

A concepção <<mercantilista/contratual>> vem definida por meio da figura de um contrato de compra e venda, ou seja, que a vantagem indevida seja oferecida ou entregue pelo particular em troca de uma conduta funcional por parte do agente público.453 Já a concepção de <<patrocínio>> vem exposta pela suficiência de que a entrega ou oferecimento da vantagem

452 MILITELLO, Vincenzo. Concusión ..., p. 244. 453 SPENA, Alessandro. Il <<turpe mercato>>, p. 20.

não ocorra em troca de uma conduta funcional específica, lícita ou ilícita, mas sim em razão do status e da função exercida pelo agente público corrupto.454

Sob este prisma vê-se, com facilidade, a legislação brasileira estruturada sobre construções doutrinárias diferentes. O delito direcionado ao agente público fundamenta-se sobre a base da ideia do patrocínio mencionada por SPENA. De outro canto, a punição do particular se vê estruturada a partir da noção de um contrato (ainda que hipotético), ou proposta dele, no qual o particular fornece vantagem indevida para que o funcionário público pratique ou deixe de praticar seu ato funcional.

Decorrência lógica da postura adotada pelo legislador brasileiro é a de que desaparece a efetiva exigência de convênio ou acordo entre ambos os sujeitos ativos para que os delitos de corrupção passiva e/ou ativa se concretizem.455

Assiste razão a BECHARA456:

“No ordenamento jurídico brasileiro, o crime de corrupção passiva, tal como o descreve taxativamente o Código Penal, consubstancia-se na solicitação ou recebimento, “para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida”. A expressão “em razão da função” contida na norma penal deve interpretar-se no sentido de que a razão ou motivo da vantagem indevida seja a condição de funcionário público da pessoa corrompida, isto é, que em razão da especial condição e poder que o cargo público desempenhado lhe outorga tenha sido oferecida ao funcionário a vantagem objeto do delito, de tal forma que, se de algum modo tal função não fosse ou viesse a ser desempenhada pelo sujeito, o particular não lhe entregaria ou prometeria tal vantagem.”

O posicionamento de NUCCI também é procedente:

“Ora, se um funcionário público receber, para si, vantagem indevida, em razão de seu cargo, configura-se, com perfeição, o tipo penal do art. 317, caput. A pessoa que fornece a vantagem indevida pode estar preparando o funcionário para que, um dia, dele necessitando, solicite algo, mas nada pretenda no momento da entrega do mimo. Ou, ainda, pode presentear o funcionário, após este ter realizado um ato de ofício. Cuida-se de corrupção passiva do mesmo modo, pois fere a moralidade administrativa, sem que se possa sustentar (por ausência de elementos típicos) a ocorrência da corrupção ativa.”457

454 SPENA, Alessandro. Il <<turpe mercato>>, p. 21. 455 VALEIJE ÁLVAREZ, Inma. El tratamiento … p. 38.

456 BECHARA, Ana Elisa Liberatore S. O ato de ofício como elemento para caracterizar o

crime de corrupção. In: Valor econômico, dia 30 de abril de 2013, disponível em http://www.valor.com.br/politica/3105692/o-ato-de-oficio-como-elemento-para-caracterizar-o- crime-de-corrupcao, acesso em 05.07.2015, às 12h42min.

O que ocorre no direito brasileiro, permissa venia, é uma hipertrofia da discussão em torno do ato de ofício, absolutamente perniciosa, diga-se de passagem, mas nunca para além do ato de ofício, o que daria ensejo à amplitude da discussão. Em outros termos, doutrina e jurisprudência debatem a necessidade ou não do ato de ofício, mas muito pouco, ou quase nada, se menciona acerca de uma reforma legislativa de modo a inserir, a exemplo do que ocorre na legislação estrangeira, novas figuras típicas de corrupção e, com isso, tipos corruptivos em que o ato de ofício não seja exigido e a pena a ser aplicada seja, por óbvio, mais branda.

Nada obstante, ainda que tentadora a tese de eventual bilateralidade obrigatória entre os delitos de corrupção passiva e ativa, mormente entre as figuras típicas de oferecer ou prometer, de um lado, e receber ou aceitar promessa, de outro, nada justifica, para além de um esforço jurisprudencial e doutrinário que busca salvaguardar a aplicação do princípio da proporcionalidade. Este esforço, aliás, está apenas implícito nos argumentos doutrinários e jurisprudenciais acima delineados, pois claramente os argumentos deitam-se em outros aspectos.

Não quer dizer que a lei brasileira não exige, do ponto de vista fático, que os verbos receber ou aceitar promessa não demandem a existência de alguém que ofereça ou prometa, mas sim que o ato de receber ou de aceitar promessa, privilegiando o aspecto unilateral dos crimes de corrupção na forma em que criminalizados, não precisa, normativamente, estar premido pela noção adjacente de ato de ofício.

A pretensa qualidade de delitos de concurso necessário cai por terra ao se analisar a estruturação jurídica de tais delitos. E a interpretação doutrinária e jurisprudencial, por sua vez, não pode ir além dos ditames legais sem ao menos apresentar argumento convincente e apto para tanto.

Aqui se dessume uma questão deveras interessante em matéria penal e retratada na desconfiança lançada na figura do legislador e a exacerbada confiança depositada no intérprete da norma incriminadora458, ainda que se esteja falando de norma que cumpra estritamente o princípio da legalidade, como é o caso do artigo 317, caput, do Código Penal. Neste

sentido nada demonstra, para além de uma extrema confiança no intuito do aplicador do direito em inovar e subverter o teor literal da norma prevista no artigo 317, caput, do Código Penal, que se consiga “criar” ou “introduzir” a exigência do ato de ofício na figura da corrupção passiva. Sim, porque o princípio da legalidade também desenvolve notável função para a interpretação do texto legal, evitando que se aplique a menos ou a mais do que o teor literal da lei.

De acordo com ORTIZ DE URBINA GIMENO:

“(...) ha de darse una prioridad absoluta a la no muy afortunadamente llamada <<interpretación gramatical>>, que bien entendida incluye la sistemática, admitir la teleológica sólo dentro del ámbito de sentidos posibles delimitado por la interpretación gramatical y prescindir por completo de la interpretación histórica: por lo que respeta al objetivo de la interpretación, en coherencia con lo que se acaba de decir, este no puede ser sino la indagación del sentido del texto efectivamente aprobado, y no la del cualesquiera intenciones detrás del mismo.”459

Alerte-se, contudo, que referendar essa interpretação à lei brasileira, ou seja, de que a corrupção passiva presente no caput do artigo 317 do Código Penal está desvinculada da incidência de um ato de ofício em potencial a ser realizado pelo funcionário público, vem obrigatoriamente com o rechaço da legislação. Em termos bem simples e diretos: alertar que a lei brasileira não exige o ato de ofício para a incriminação da corrupção passiva não significa considerar a norma brasileira como correta, justa e proporcional.

A segunda constatação diz respeito à necessidade de reforma da legislação brasileira, no sentido de ser incluído o ato de ofício como requisito do tipo penal do artigo 317, caput, do Código Penal.

À partida pode-se afirmar que a normativa brasileira direcionada à incriminação dos atos de corrupção praticados por funcionários públicos (sejam corruptores ou corrompidos), em que pese sabidamente antiga e atualmente fruto da inércia do legislador, está apenas parcialmente em consonância com as diretrizes internacionais traçadas pela Organização das Nações Unidas, mais precisamente na Convenção de Mérida, ratificada no direito interno brasileiro por meio do Decreto 5.687/2006. Consta no artigo 15 deste decreto:

“Cada Estado Parte adotará as medidas legislativas e de outras índoles que sejam necessárias para qualificar como delito, quando cometidos intencionalmente:

a) A promessa, o oferecimento ou a concessão a um funcionário público, de forma direta ou indireta, de um benefício indevido que redunde em seu próprio proveito ou no de outra pessoa ou entidade com o fim de que tal funcionário atue ou se abstenha de atuar no cumprimento de suas funções oficiais;

b) A solicitação ou aceitação por um funcionário público, de forma direta ou indireta, de um benefício indevido que redunde em seu próprio proveito ou no de outra pessoa ou entidade com o fim de que tal funcionário atue ou se abstenha de atuar no cumprimento de suas funções oficiais.”

A menção precisa do termo <<ato de ofício>> não foi feita pela Convenção de Mérida. Contudo, como visto, a importante norma internacional não deixou de fazer referência à punição dos atos de corrupção desde que relacionados a uma atuação precisa e delimitada do agente público (e da intenção do particular), a partir da referência de que a corrupção ativa e passiva deve ser punida no direito interno de cada país signatário, vinculando à finalidade de que o funcionário público atue ou se abstenha de atuar no cumprimento de suas funções oficiais.

Pode-se, evidentemente, criar certa equiparação entre os termos “ato de ofício” e “atuar no cumprimento de suas funções oficiais”, com o que a lei penal brasileira atualmente em vigor estaria adequada aos parâmetros internacionais, ao menos em relação à corrupção ativa (artigo 333 do Código Penal), à corrupção majorada (artigo 317, §1º, do Código Penal) e à corrupção tomada por privilegiada (artigo 317, §2º, do Código Penal).

Isso, a bem da verdade, nada revela de concreto, pois as normativas internacionais, pelo simples fato de advirem de órgãos como a ONU, não são infalíveis, nem absolutamente corretas ou impassíveis de críticas. A menção aqui é feita apenas e tão-somente para deixar aos críticos de plantão, comumente associados e maravilhados com os parâmetros internacionais, a mensagem de que a própria Organização das Nações Unidas, em seu texto mais específico sobre a matéria de corrupção, acaba por referendar a punição a partir de um contexto de venalidade da função pública, venalidade esta que acaba sendo vinculada à atuação do funcionário público no cumprimento de suas funções oficiais.

Contudo, o posicionamento há de ser tomado em critérios mais seguros, o que se torna viável a partir de critérios dogmáticos e normativos e não simplesmente na esteira da interpretação histórica da lei penal, ou seja, de que teria sido este o intento do legislador à época, objetivo este de separar a realidade normativa do suborno ativo e do suborno passivo.

Se assim é, a solução se encontra na identificação do bem jurídico tutelado. Sem rodeios, há de se indagar se a conduta de solicitação, recebimento ou aceitação de promessa, tão-somente em razão da função exercida pelo servidor público, ofende determinado bem jurídico a ser tutelado pela norma penal. Isso não implica em desconhecer que a exigência do ato de ofício opera como um freio na punição da figura ativa da corrupção, pois retira a possibilidade de punição quando a vantagem indevida está desvinculada do ato de ofício a ser praticado, em tese, pelo funcionário público.

Ora, a essência dos delitos de suborno ativo e passivo são justamente as transações abusivas a partir da função pública desenvolvida pelo servidor460. Por meio de tais tipos almeja-se evitar a interrelação espúria entre o público e o privado461. Assevere-se, contudo, que esta transação precisa estar materializada em algo que não apenas o dinheiro ou a vantagem indevida prometida e/ou entregue. Note-se: oferecer, prometer, receber ou qualquer dos outros verbos coligados ao termo vantagem indevida não se tornam proscritos em razão da imoralidade e dos ganhos ilícitos obtidos a partir da função pública, mas sim porque tal vantagem atinge (ou coloca em perigo) a imparcialidade do servidor público.

Trata-se, a bem da verdade, de uma troca qualificada, para que se atinja ou ao menos se coloque em perigo a imparcialidade do servidor público, e que envolve a estipulação de condições para ambos os lados: vantagem indevida e ato de ofício, respectivamente.

Auxilia, neste sentido, SÁNCHEZ TOMÁS:

“Una vez analizados en los epígrafes anteriores las modalidades típicas de la prestación del particular y la contraprestación del funcionario o autoridad, debe todavía incidirse en que el delito de cohecho no se fundamenta en la mera constatación de la concurrencia de la prestación y la contraprestación.

460 RODRÍGUEZ PUERTA, Maria José. El delito …, p. 202. 461 OLAIZOLA NOGALES, Inés. El delito …, p. 1999.

Es preciso que entre ambas se dé una relación de condicionalidad mutua. En última instancia, la idea que subyace a la tipicidad de esta conducta es la existencia de un acuerdo o propuesta de acuerdo en que el sujeto activo – sea el funcionario, el particular o ambos – pretende obtener de la contraparte una actuación y para su consecución selecciona como medio comisivo el ofrecimiento de una contraprestación.”462

Tal como afirmou MILITELLO, a solução não passaria pela abolição do requisito do ato de ofício, eis que tal abolição acabaria por asimilar “indebidamente hechos y conductas de significado completamente opuesto: de la verdadera y propia corrupción dirigida a un acto indebido, al acto absolutamente inofensivo, y, en general, socialmente adecuado, de mero

reconocimiento.”463

Com isso claramente se conclui que a atual redação do suborno passivo no direito brasileiro comina pena de mesma gravidade que a cominada ao suborno ativo, muito embora se tratem de condutas, se não totalmente diferentes, mas que consagram bases de punição distintas. Pode- se afirmar que a corrupção passiva, ao não dispor sobre um ato determinado a ser feito (ou omitido) pelo servidor público, pune essencialmente a mera falta de decoro e honestidade do servidor464, e desconsidera o principal, qual seja a parcialidade de determinada conduta (concreta ou futura) a ser manifestada por aquele.

O primeiro argumento é associado a questões de legitimidade de intervenção penal. Olhos postos no tipo básico descrito no artigo 317, caput, do Código Penal, tem-se que, para além de não corresponder à figura típica do artigo 333, caput, do Código Penal, o suborno passivo está destituído de legitimidade de intervenção penal. As figuras de suborno possuem como intento evitar a influência do interesse privado sobre o exercício de funções públicas, de maneira a preservar sua imparcialidade.465 Se assim é, verifica- se que da redação do mencionado tipo penal não é possível vincular de nenhuma forma a imparcialidade como bem jurídico.

462 SÁNCHEZ TOMÁS, José Miguel. Cohecho, p. 409. 463 MILITELLO, Vincenzo. Concusión ..., p. 251.

464 Cf. RODRÍGUEZ PUERTA, Maria José. El delito …, p. 203.

465 ORTIZ DE URBINA GIMENO, Íñigo. Delitos contra la administración pública. In:

Lecciones de Derecho Penal. Parte Especial. 3ª ed. Jesús-Maria Silva Sánchez (director) e Ramon Ragués i Vallés (coordinador). Barcelona: Atelier, 2011. p. 335.

Para chegar à conclusão que a conduta de solicitar, receber ou aceitar promessa de vantagem indevida, tão-somente a partir da função exercida pelo servidor público, seria necessária a adoção de uma presunção de perigo geral, pressupondo que todo servidor que receba qualquer espécie de vantagem indevida de um particular seja um corrupto em potencial e já predisposto a auxiliar o particular em futuras situações concretas.466

Assim alude RODRIGUEZ PUERTA:

“No obstante, esta interpretación se corresponde con una lectura voluntarista del precepto, en la que se toman en consideración circunstancias futuribles, que se presumen a raíz de una <<actitud>> de funcionario (aceptación de dádivas, sin estar condicionadas a la adopción de acto alguno), que no tiene necesariamente por qué corresponder al indicado <<juicio de intenciones de futuro>> del empleado público.”467

Realmente não se verifica como a conduta funcional de receber vantagens indevidas, ou apenas aceitar a promessa de recebimento, possa colocar em perigo o bem jurídico imparcialidade sem que o ato de ofício faça parte do acordo corrupto ou ainda da proposta lançada pelo servidor público. Note-se que neste tipo de situação não deixa de existir o contato espúrio entre o poder público e o privado, mas sim deixa de existir a viabilidade fática e concreta de prejudicar a imparcialidade, objeto este a ser tutelado pela figura-base da corrupção.

Ainda que a conduta possa ser alvo de criminalização (vide item 3.2.5.2. infra), ela não se dará sob o arcabouço do bem jurídico <<imparcialidade>>468, sendo necessário encontrar outra razão de punição.

Já do ponto de vista estrutural, igualmente importante, a inserção do <<ato de ofício>> como elemento da figura básica de suborno passivo, conta, como visto, com apoio de convênios internacionais. Ademais, num viés prático-eficiente, o dueto corrupção ativa e passiva ver-se-ia completo, quer dizer, as condutas-base seriam, enfim, complementares, verdadeiro verso-e- reverso uma da outra.

466 VÁSQUEZ-PORTOMEÑE SEIJAS, Fernando. Admisión de regalos y corrupción pública.

Consideraciones político-criminales sobre el llamado <<cohecho de facilitación>> (art. 422 CP). In: Revista de Derecho Penal y Criminología, Madrid, 3ª época, n. 6, 2011. p. 169.

467 RODRÍGUEZ PUERTA, Maria José. El delito …, p. 275.

Nada mais confuso do que a tipificação atual. O fato de os tipos penais de suborno ativo e passivo serem absolutamente unilaterais, não retira a necessidade de que contenham os mesmos elementos típicos. Nada, aliás,