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conduta: primária (emocional) e secundária (aprendida

No documento O Poder das Emoções (páginas 55-61)

culturalmente)

Emoção significa, literalmente, “movimento para fora”. Certos movimentos são percebidos por outras pessoas, mas alguns só são notados por seu dono. O termo sentimento é usado para a experiência mental provocada pela emoção, ou seja, a percepção (saber) do que ficou emocionado. Por outro lado, a motivação tem sido definida como o potencial (existente em estado latente; virtual; capacidade de produção; realização) inerente (inseparável, próprio) ao sistema de controle da conduta e a emoção como leitura do potencial motivacional.

Estamos programados para expressar certas emoções pré- organizadas, inatas, quando determinadas características dos

estímulos provenientes do mundo externo ou interno são detectadas (descobertos, revelados, percebidos) em nossos corpos. Entre

exemplos desses possíveis estímulos capazes de modificar nossos organismos está o tamanho do animal de grande porte, uma grande envergadura (águias em vôo), o tipo de movimento, como o dos répteis, determinados sons como os rugidos, certas configurações do estado do corpo, a dor sentida durante uma queimadura ou um ataque cardíaco e milhares de outros, inclusive através de estímulos provocados por nosso pensamento.

Os organismos cujos cérebros incluem apenas estruturas arcaicas, como os répteis, que não possuem estruturas evolutivamente modernas, executam, sem dificuldade, a seleção das respostas

(senhor dele mesmo) que determina as decisões, mas apenas um conjunto de circuitos neurais que comandam a conduta de forma mais ou menos automática ou irreflexiva.

Para que ocorra o processo das emoções primárias (primitivas, pré- organizadas, as que nascemos com elas), como o medo, a raiva, a esperança e a desesperança (o sistema de pânico ou separação) é preciso que existam redes neurais intactas de circuitos do sistema límbico, sendo a amígdala e o cíngulo os personagens principais; a ressecção dessas regiões cria uma indiferença afetiva, além de outros sintomas.

Para provocar a resposta do corpo não é sequer necessário reconhecer o urso, a cobra, a aranha ou o rugido. Basta que os córtices sensoriais iniciais detectem e classifiquem a característica (ou as características) chave de uma determinada entidade (animal, objeto) e que estruturas, como a amígdala, recebam sinais relativos à sua presença. Um

passarinho no alto do ninho não sabe o que é uma águia, mas reage a ela com alarme, escondendo a cabeça. Por si só a reação emocional pode atingir alguns objetivos úteis: esconder-se rapidamente de um predador ou demonstrar raiva em relação ao competidor. Nós, seres humanos, diante da raiva, por exemplo, usamos “fechar a cara”, xingar, levantar a voz, etc.

Mas o processo não termina nesse ponto. Nos seres humanos há um passo seguinte: a sensação da emoção em relação ao objeto que a desencadeou ou a percepção da relação entre o objeto e estado emocional desencadeado no corpo. Essa consciência do processo (o objeto e a reação corporal) irá nos fornecer uma ampliação da proteção; o conhecimento, além do medo ou raiva de X. Através da consciência do processo a pessoa poderá pensar com antecipação (antes de defrontar o perigo) prevendo a probabilidade de sua presença num dado momento e num certo ambiente e, desse modo, terá condições de evitar o encontro que possivelmente tem tudo para ser desagradável.

As estruturas primitivas e inatas constituem processo básico para as emoções secundárias (vergonha, culpa, ciúme, etc.) que ocorrem mal começamos a ter sentimentos (um pouco depois do nascimento). Além disso, as estruturas primitivas têm um papel importante também nas ligações sistemáticas formadas entre as categorias de objetos (nomes aprendidos que damos às emoções) de um lado e as situações reais e emocionais vivenciadas de outro. Nesses casos, além do uso da amígdala e do cíngulo, ocorre, também, o uso do córtex pré-frontal e somatossensorial.

De outro modo: os organismos mais evoluídos e complexos como o homem e outros, diante das emoções, fazem uso, além dos circuitos (existentes nos répteis e em outros animais) que nos fazem agir de forma automática, de outros circuitos, como os córtices cerebrais e os neurônios associativos, o setor mais moderno do cérebro, possibilitando tomadas de decisões mais complexas. Enquanto as emoções primárias ou básicas atuam através da ativação de sistemas neurais do tronco cerebral (regiões mais antigas e que compartilhamos com diversos outros animais), as emoções secundárias utilizam-se, também, do córtex pré-frontal e somatossensorial (regiões corticais e mais modernas). O uso dessa segunda classe de regiões ocorre logo que a criança começa a ter sentimentos e consegue formar ligações entre categorias de objetos e situações, por um lado, e emoções primárias, por outro. Portanto, as estruturas que fazem parte do sistema límbico (adequadas às emoções primárias) não são suficientes para sustentar os processos das emoções secundárias; a rede neural é ampliada através da intervenção dos córtices pré-frontal e somatossensorial.

Vamos a um exemplo de emoção secundária: uma pessoa encontra uma outra que não vê há muito tempo. Fica sabendo que um amigo comum morreu e sente a emoção da perda. O que é isso? Primeiro surgem imagens em sua mente: uma acerca do encontro com o amigo ausente; uma outra do amigo morto (para ficar só nessas). Essas duas imagens criam mudanças no estado do seu corpo em diferentes regiões

(o coração bate mais depressa, a pele pode ficar mais corada, os músculos do rosto podem mudar de cor ao redor da boca e dos olhos formando uma expressão feliz, pelo encontro e, ao mesmo tempo, triste pela morte, a boca fica seca, há mudanças no funcionamento das vísceras, o cérebro libera moduladores peptídeos para a corrente sanguínea, o sistema imunológico transforma-se, muda-se o ritmo da atividade dos músculos lisos das artérias podendo originar uma contração e um aumento da pressão. Mas esse processo não é algo estático; há uma sucessão contínua de alterações do perfil; há ainda liberação de substâncias diferentes no organismo conforme as imagens (agradáveis e desagradáveis) que são formadas).

Na consciência as imagens mentais são organizadas; algumas são não- verbais. Redes são ativadas automática e involuntariamente, num nível mais baixo e não-consciente aos sinais resultantes do processamento das imagens descritas. Essa resposta, ligada às regiões do córtex pré- frontal, provém de representações dispositivas adquiridas (não-inatas), embora as disposições aprendidas sejam obtidas sob a influência das inatas. O que as representações adquiridas incorporam é a experiência única ao longo da vida; daí poder variar muito ou pouco conforme as pessoas (diferente das emoções inatas ou básicas que são muito parecidas para todos nós): há uma personalização para o processo de cada pessoa para o aprendido.

Podemos deduzir que o processamento emocional afetado nos doentes com lesões pré-frontais (córtices cerebrais) é do tipo secundário. Os pacientes não conseguem gerar emoções relativas às imagens evocadas por determinadas categorias de situações e estímulos, não podendo, por isso, ter sentimento. Entretanto eles podem sentir as emoções primárias (as geradas no tronco cerebral caso este esteja íntegro). O paciente poderá reagir com medo de alguém que lhe grite inesperadamente ou se sua casa começar a cair devido a uma ventania, etc.

apresenta um quadro semelhante. Ele é capaz de sentir as emoções primárias (raiva, medo, tristeza), entretanto não sente algumas emoções secundárias, como culpa, vergonha, compaixão e outras. No caso dos indivíduos com esse diagnóstico (Transtorno da Personalidade Anti-Social) seu problema fundamental localiza-se no córtex frontal, mais precisamente córtex orbitofrontal e medial, ou seja, região executiva, necessária para o aparecimento das emoções secundárias. Por outro lado, os pacientes com lesões no sistema límbico (sistemas não-corticais), amígdala, por exemplo, registram geralmente uma diminuição tanto das emoções primárias como das secundárias, ficando mais limitados na sua afetividade (não expressam nem uma nem outra emoção), pois para a expressão da emoção secundária necessitam do funcionamento normal da primária. A natureza faz economia, utiliza-se da já existente; as secundárias se expressam através das estruturas prontas para a expressão das emoções primárias.

Resumindo: as respostas imediatas que damos a certos estímulos externos ou internos são processadas pelo sistema límbico (amígdala e o cíngulo). Essas regiões, uma vez ativadas, desencadeiam estados peculiares no corpo, característicos do que chamamos de emoções; estados corporais, motivacionais, cognitivos e afetivos, como ocorre durante o medo ou raiva. Portanto, este estado ou emoção atua na cognição, alterando o processamento cognitivo anterior (a mente que estava sem medo) para que o organismo possa se adaptar à nova situação encontrada ou imaginada pelo organismo, isto é, a que corresponde ao estado de medo. Por exemplo: uma vez terminado o medo, Maria vai até a janela ver o rapaz bonito que passa; sua emoção agora é paixão.

Fazendo uso das emoções puras, o organismo passa a ter mais uma fonte de orientação para indicar a melhor conduta a ser tomada. O indivíduo emocionado é possuidor de um conhecimento íntimo, só dele, para somar as outras orientações aprendidas através do

aprendizado sócio-cultural, político, religioso, educacional, etc., isto é, noções ou suposições vieram de fora, aprendidas após o nascimento. Essas informações, diferentes das emocionais (evidentes), são

mensagens confusas, pois nasceram de muitas vozes, frequentemente contraditórias. As orientadoras vozes biológicas, ao contrário das informações complexas de origem culturais, são mais puras e simples. De qualquer modo, o nosso assimilador mental construído pelo pluralismo das idéias culturais somadas às informações genéticas ou biológicas organiza e tritura, no seu possante liquidificador, milhares de informações ao mesmo tempo, reduzindo-as a mensagem simples e direta que facilita nossas ações. Lamentavelmente, o produto final, a tomada de decisão, é, muitas vezes, mal construído. Um sistema cognitivo defeituoso implica numa utilização inapropriada de informação ou uma inapropriada armazenagem ou esquematização da tal informação. O esquema mental de um ansioso, por exemplo, é, essencialmente, disfuncional, onde as ameaças e incertezas são hipertrofiadas. Isto, por outro lado, tem suas vantagens: ele toma mais cuidado com os perigos, mas fica vigilante em excesso.

O contato da mente com a segunda fonte de orientação, a aprendida (descrição ou composição de dados), é indireto, depende da “leitura” – nem sempre adequada – que fazemos da linguagem e de suas regras. O contrário resulta da “leitura” das emoções percebidas. Trata-se de uma percepção direta, limpa, que surge da totalidade do organismo e não da orientação verbal memorizada que apareceu aleatoriamente na mente.

Em resumo: Se um indivíduo se sente mal (irritado, tenso, desanimado) ao imaginar-se envolvido futuramente numa determinada ação,

visualizando-a como uma possibilidade, haverá uma grande

possibilidade desta ação não ser a melhor para ele naquela ocasião. Portanto, é aconselhável rever o objetivo ou, se possível, evitar a conduta imaginada.

Funções cerebrais e regiões

No documento O Poder das Emoções (páginas 55-61)