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A consideração das consequências práticas nas decisões dos órgãos de controle e a

4. Considerações finais

Observa-se uma convergência de iniciativas para incorporar avaliações de impacto aos processos decisórios da administração pública, bem como aos processos decisórios dos órgãos que exer- cem o controle sobre essas ações (tribunais de conta, Judiciário, controladoria, etc.).

A incorporação das orientações contidas nos documentos Di- retrizes Gerais e Guia Orientativo para Elaboração de Análise de Impacto Regulatório, elaborado pela Casa Civil, aos processos in- ternos das Agências, conjugada com outras medidas tais como: (i) o aperfeiçoamento dos bancos de dados dos setores regula- dos; (ii) a capacitação das equipes para elaboração das AIRs; (iii) a formalização e aprovação interna de procedimentos, premissas e outras variáveis para uso nas análises de acordo com as especifici- dades de cada setor; e, (iv) a formalização de instâncias revisoras internas para revisão das análises, podem aumentar significativa- mente o grau de confiabilidade das avaliações. Ainda que não haja precisão nos cálculos em função de dificuldades inerentes a elabo- ração de prognoses, a reflexão sobre os problemas e a concepção de alternativas para lidar com eles, juntamente com a avaliação dos respectivos impactos, trazem benefícios para as práticas regu- latórias, conforme constatação de Cass Sunstein, que coordenou o Office of Information and Regulatory Affairs (Oira) dos Estados Unidos da América por cerca de três anos.

Um aspecto importante destacado no Guia Orientativo e que vem ao encontro da crítica efetuada pelo TCU ao processo de de- finição do reajuste dos planos de saúde, refere-se à recomendação de envolvimento do público afetado pelo problema desde o início do processo de avaliação de soluções. A possível falha metodológi- ca no cálculo dos índices de reajuste dos planos de saúde, indicada pelo TCU, poderia ter sido evitada ou até mesmo esclarecida, caso tal falha não exista, com base em discussão externa com organiza- ções que representam a sociedade civil e com os atores envolvidos.

A exigência legal de que órgãos de controle considerem as consequências práticas de suas decisões, com as devidas explica- ções acerca da necessidade e adequação das medidas impostas, irá

requerer, na prática, que os administradores aperfeiçoem seus pro- cessos decisórios de forma a sustentar suas escolhas regulatórias.

No processo decisório do julgador ou do controlador, o ór- gão regulador exercerá papel fundamental uma vez que, de fato, ele é o que dispõe de ferramental para melhor poder analisar as circunstâncias fáticas, elencar alternativas coerentes, mensurar de forma mais adequada as respectivas consequências com base no conhecimento técnico do funcionamento do setor regulado, e ava- liar impactos prospectivos, inclusive sobre outros setores, e para a sociedade em geral. O caso do reajuste dos planos de saúde exem- plifica bem a complexidade e o significativo impacto das questões regulatórias sobre a sociedade, uma vez que cerca de 25% da po- pulação é usuária de planos de saúde.

Considerando que o Juiz, para poder motivar adequadamen- te sua decisão, irá precisar expor as consequências práticas, e, diante da tecnicidade das matérias regulatórias e da assimetria natural de informação sobre o setor regulado entre regulador e controlador, a certificação da qualidade do processo decisório do regulador, no qual se inserem as AIRs, além da coerência e ra- zoabilidade dos resultados das AIRs, servirão de base para a to- mada de decisão do controlador. Neste sentido, Guerra defende que “o controle judicial deve estar presente sempre que houver dúvida acerca da observância do due process of law, notadamen- te na apreciação da vinculação da decisão regulatória aos dados empíricos e demais fatos do caso real” e que o juiz deve aceitar a avaliação feita pelo agente, uma vez que esta função é prerroga-

tiva da Administração54.

Por fim, convém destacar ponderação feita por Baldwin55 de

que a questão da efetiva contribuição para a melhoria da atividade regulatória, do controle judicial sobre decisões regulatórias, con- tinua em aberto e o desenvolvimento de controles (checks) sobre a discricionariedade do processo decisório tem sido uma preocu- pação central uma vez que há uma clara tensão entre os princípios de autonomia dos órgãos reguladores e dos órgãos de controle.

54 GUERRA, Sérgio. Op. cit. p. 263-264.

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Eficiência administrativa e o