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Trinta anos de controle da Administração Pública: À espera de um giro de eficiência

4. Em busca do aprimoramento do modelo vigente

No presente artigo, são abordadas três destas falhas no atual sistema de controle da Administração Pública brasileira: (i) a aber- tura dos tipos sancionadores; (ii) a ênfase na punição de ilícitos em detrimento de sua prevenção e do aprimoramento da atividade administrativo; e (iii) a sobreposição e a ausência de coordenação e definição clara de competências entre os órgãos de controle.

A abertura dos tipos sancionadores causa insegurança jurídica e dificulta a adequação da conduta de gestores públicos e colabo- radores da Administração (serviços públicos, prestadores de servi- ços, pessoas jurídicas contratadas e afins), na medida em que não se pode definir exatamente quais comportamentos enquadram-se nos tipos sancionadores. A situação é agravada pelo fato de cada norma sancionadora trazer os seus próprios tipos, como já pontua- do anteriormente.

A fim de trazer maior coesão ao sistema de controle brasileiro propõe-se a unificação legislativa do sistema de controle, por meio da consolidação de uma única que lei trate, com maior densidade normativa, dos conceitos de corrupção e de improbidade adminis- trativa. A fim de promover maior segurança jurídica, esta lei única deverá definir de forma mais clara quais condutas caracterizam-se como cada uma e, portanto, ensejam a aplicação das respectivas

sanções legais44. A definição mais precisa dos tipos sancionadores

44 Reconhece-se, aqui, a impossibilidade real do ideal de completude do direito. A proposta ora apresentada possui natureza mais singela, defendendo-se a existência de espaço para uma unificação e clarificação do sistema de controle da Administração Pública brasileira – sem, de forma alguma, considerar-se que esta seria uma panaceia definitiva para os defeitos

e unificada em um único ato normativo reduz o espaço de decisio-

nismo dos controladores e do “controle de opinião”45 (isto é, ba-

seado em divergências de interpretação) e, com isso, pode trazer maior segurança jurídica à atuação administrativa.

Por outro lado, é igualmente necessário que a nova norma, oriunda da simplificação legislativa aqui proposta, deixe espaço para a punição de condutas que, em sua essência, pretendam frau- dar o espírito das normas anticorruptivas, ainda que, do ponto de vista formal, pretendam atendê-las, como pontua a autora italiana

Maria de Benedetto46. A simplificação da ação de improbidade é,

inclusive, medida proposta pela Transparência Internacional, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), para o aperfeiçoa-

mento do combate à corrupção no Brasil47.

que esta atividade apresenta. Como aponta Eduardo Jordão, “Para os gestores públicos e as instituições administrativas, esta cultura idealizada e irrealista consiste num grande problema. Encarregadas de interpretar o direito para aplicá-lo ao caso concreto, veem-se posteriormente submetidos ao controle realizado por outras instituições. Como, a despeito da teoria em contrário, o direito é frequentemente indeterminado, não é raro que os órgãos de controle possuam interpretações diferentes da do administrador a propósito de qual seria a solução específica a ser adotada em determinado caso. E, com base nesta teoria idealizada e irrealista, mesmo que a interpretação da administração tenha sido razoável, acham que há espaço para anulações, suspensões, punições e repressões”. (JORDÃO, Eduardo. Art. 22 da LINDB. Acabou o romance: reforço do pragmatismo no direito público brasileiro. RDA –

Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas. Edição Especial:

Direito Público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, nov. 2018, p. 67).

45 Como pontua José Vicente Santos de Mendonça: “É plausível supor que, com base em categorias tão amplas, parte do exercício do controle público esconda simples discordâncias de opiniões entre controladores e controlados – um (ii) controle de opinião sobre a interpretação jurídica de normas ou de práticas”. (MENDONÇA, José Vicente Santos de. Art. 21 da LINDB. Indicando consequências e regularizando atos e negócios. RDA – Revista

de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas. Edição Especial: Direito

Público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, nov. 2018, p. 45).

46 “De um lado, a inflação legislativa amplia a burocracia, a discricionariedade administrativa e os monopólios, criando condições mais favoráveis para a corrupção. Por outro lado, super- regulação aumenta as oportunidades para a ‘compliance criativa’, tornando possível atender à literalidade da lei, mas fraudando seu espírito”. Tradução livre de: BENEDETTO, Maria De.

Understanding and preventing corruption: a regulatory approach. In: Preventing corruption and promoting good government and public integrity (Org.: Augutí Cerrillo-I-Martiniz e Juli

Ponce), Bruxelas: 2017, p. 55-68.

47 “É melhorada também a resposta à corrupção no âmbito da improbidade administrativa. Dá- se um tratamento mais adequado para casos de ausência de prestação de contas, ampliando a possibilidade de ressarcimento do Erário. Para agilizar ações de improbidade, propõe-se a extinção da fase duplicada de defesa prévia e a especialização de varas, aproveitando- se a experiência de sucesso que foram as varas especializadas em lavagem de dinheiro. Num paralelo ao acordo penal, é previsto o procedimento abreviado na Lei de Improbidade, existente em outros países, o qual permite a redução da pena do réu que confessar os fatos e entrar em acordo sobre suas consequências jurídicas. Sugere-se também a simplificação do sistema de prescrição da improbidade, que hoje faz remissão a centenas de leis estaduais e municipais, o que gera um tratamento díspar conforme a carreira a que pertence o servidor público.” Novas Medidas Contra a Corrupção: Apresentação. Disponível em: <http:// bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/18167>. Acesso em: 30 set. 2018.

Já em relação à ênfase no punitivismo, destacou-se a necessi- dade de uma mudança de cultura nos órgãos de controle brasileiro, hoje muito mais preocupados em “vigiar e punir” do que em pro- mover medidas de aprimoramento institucional da Administração. O TCU, por exemplo, possui em diversos acórdãos em que impõe sanções a gestores públicos que teriam agido em desconformida- de com o que considera que deveria ser o “administrador médio” – em verdade, algo muito mais próximo de um “administrador Hér-

cules”48 do que, de fato, com a média dos gestores brasileiros49.

Deve-se, pois, em sintonia com as disposições da nova Lei de Introdução ao Direito Brasileiro, buscar uma nova perspectiva de maior aproximação da Administração, preocupada em entender o contexto em que ela se encontra e as limitações que enfrenta e, ainda, em contribuir para o seu aprimoramento, por meio de três frentes de atuação: investimento dos órgãos de controle em ca- pacitação de agentes públicos, preferência a medidas de caráter pedagógico e adoção de posturas mais consequencialistas.

A primeira delas refere-se a investimentos dos órgãos de controle na capacitação de servidores do Executivo, sobretu- do aqueles que lidem diretamente com licitações, contratos administrativos e parcerias da Administração, principais garga- los de dispêndio público para além das despesas de pessoal e de custeio – e, consequentemente, de corrupção. Os órgãos de controle, em especial o TCU, possuem em seus quadros servi- dores altamente especializados em auditoria pública, que po- dem contribuir para a capacitação de agentes do Executivo que lidam diariamente com contratações públicas, muitas vezes sem

48 Referência ao conceito de juiz Hércules de Ronald Dworkin: “Em seu papel, Hércules deverá não só desenvolver as possíveis teorias capazes de justificar os diferentes aspectos do sistema, mas também testá-las, contrastando-as com a estrutura institucional mais ampla, sendo que, ‘quando o poder de discriminação desse teste estiver exaurido, ele deverá elaborar os conceitos contestados que a teoria exitosa utiliza’”. (DWORKIN, Ronald. Levando

os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 168).

49 No mesmo sentido: “Dentre as várias métricas que o TCU se vale para responsabilizar, a do administrador médio é a mais pitoresca. Nada menos de 133 acórdãos se referem a ela. O teste consiste em comparar o comportamento avaliado com o esperado do administrador médio, tomado como razoável (“razoabilidade da conduta”); se a carapuça do administrador médio não servir, responsabiliza-se”. PALMA, Juliana Bonacorsi de. Quem é o administrador

médio do TCU? Disponível em: <https://www.jota.info/?pagename=paywall&redirect_to=//

www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/controle-publico/quem-e-o-administrador-medio- do-tcu-22082018>. Acesso em: 30 set. 2018.

a devida formação profissional para tanto, em especial em entes

federativos menores50. Ao encontro desta ideia, o estudo da

Transparência Internacional sugere a edição de lei que crie o Programa de Prevenção da Corrupção na Gestão Municipal, de adesão voluntária, o qual concederia benefícios para transferên- cias voluntárias da União a Municípios que se comprometessem com a adoção de medidas anticorruptivas, dentre as quais a ca- pacitação de seus servidores.

A segunda relaciona-se com a preferência pela expedição de recomendações de caráter não sancionador, tratando-se as medi- das punitivas como ultima ratio, nos casos em que as indicações não sejam atendidas nem devidamente justificada pela Adminis- tração a impossibilidade de cumprimento. A abertura para o diá- logo com o poder público é fundamental para que este possa, a partir das dificuldades fáticas enfrentadas pela Administração, na

linha do novo art. 22 da LINDB51, apresentar os motivos pelos quais

não é possível atender a determinadas recomendações dos órgãos de controle e, assim, buscar construir, em conjunto, alternativas viáveis para o aprimoramento da gestão pública.

Ainda na vertente da preferência por medidas de caráter pedagógico, vale destacar que a introdução do art. 28 à LINDB

50 Essa realidade é apontada com perfeita acuidade por Eduardo Jordão ao comentar a aplicação do art. 22 da LINDB, introduzido pela Lei nº 13.655/2018: “A respeito da natureza das dificuldades que poderão ser referidas, a maior parte dos comentaristas têm citado dificuldades e obstáculos materiais, temporários, orçamentários e de pessoal. Estas são, afinal, as mais óbvias circunstâncias que podem impedir a implementação de uma dada política pública. Além disso, são as dificuldades mais frequentemente reportadas pela imprensa em relação à administração pública em todo o país: falta de verbas, tempo escasso para planejar e executar a ação, déficit de pessoal, baixa qualidade dos recursos humanos disponíveis, deficiências de material de escritório, de infraestrutura mínima de trabalho, entre outras. Esta contextualização exigida pelo projeto visaria, ainda, a dar conta da heterogeneidade da administração pública brasileira. As normas nacionais parecem pressupor que os diferentes níveis da administração pública, em diferentes localizações geográficas, teriam as mesmas condições para implantação do direito. Mas a verdade é que as condições orçamentárias, materiais e de pessoal variam grandemente dentro do país. A atenção a estas disparidades é relevante para interpretar adequadamente a legislação administrativa no tocante a pequenos municípios do interior do país. E não faz sentido aplicar e interpretar a legislação relevante aos seus gestores da mesma forma que a um gestor de uma grande e rica capital brasileira”. (JORDÃO, Eduardo. Art. 22 da LINDB. Acabou o romance: reforço do pragmatismo no direito público brasileiro. RDA – Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas. Edição Especial: Direito Público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, nov. 2018, p. 76).

51 Art. 22. Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.

significou o reconhecimento, no direito brasileiro, de uma “cláu-

sula geral do erro administrativo”52, ao prever que “o agente

público somente responderá por suas decisões e opiniões téc- nicas no caso de dolo ou erro grosseiro”. Nesse sentido, o orde- namento pátrio atualmente vigente considera que somente há responsabilidade de agentes públicos quando atuam de forma deliberada (dolo) ou por erro grosseiro. A culpa leve está, assim, fora do alcance da responsabilização do gestor.

A alteração legislativa evidencia a intenção do legislador de superar o afã punitivista do sistema brasileiro de controle e de re- direcionamento do eixo de atuação dos órgãos de controle para ações de natureza recomendatória, que busquem aprimorar e di- fundir melhores práticas administrativas, em vez de simplesmen- te punir agentes públicos que, dentro das limitações de pessoal, estrutura, recursos e tempo que enfrentam diariamente, even- tualmente cometem deslizes de menor lesividade ou interpretam a norma jurídica de maneira diversa do controlador.

Por fim, a terceira frente para a superação do fetiche punitivista dos órgãos de controle volta-se para a adoção de uma postura mais consequencialista quando da análise de ações do Executivo e da determinação de sua suspensão ou cessão, nos moldes do art. 20

da nova LINDB53. Nesses casos, deve-se perquirir a gravosidade da

medida que o próprio controlador pretende adotar, entendendo-se que a intervenção do controlador do sentido de suspender a atua- ção administrativa pode produzir resultados ainda mais gravosos

52 Expressão que dá título ao comentário de Gustavo Binenbojm e André Cyrino ao art. 28 da LINDB em volume especial da Revista de Direito Administrativo. Vejamos: “Nessa toada, é impacto imediato do art. 28 da LINDB a reconfiguração da noção de administrador médio. Longe de ser um médium, capaz de antecipar juízos dos órgãos de controle e avaliar todas as consequências, ele deve ser tomado como um sujeito que erra, como qualquer pessoa. Erros que não forem grosseiros deverão ser permitidos. Ainda que esse ponto demande avanço da jurisprudência e da doutrina na definição dos contornos desse administrador médio, fato é que já se tem, com o art. 28, um avanço. O administrador médio jamais pode ser alguém irreal. É gente de carne e osso que erra. Principalmente quando tenta fazer diferente” (BINENBOJM, Gustavo; CYRINO, André. O art. 28 da LINDB – A cláusula geral do erro administrativo. RDA –

Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas. Edição Especial:

Direito Público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, nov. 2018, p. 215).

53 “Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas.”

do que a sua continuidade54. Deve-se buscar, assim, soluções mais

ponderadas, que evitem o desvio público, mas não comprometam a continuidade de serviços essenciais. No caso de licitações e con- tratos administrativos, por exemplo, em vez de determinar a sua suspensão ou a sua rescisão, é possível cogitar de uma solução de transição, em que o órgão de controle adote prazos razoáveis para a re-licitação, a partir da oitiva da Administração e da fixação de parâmetros para a nova contratação.

Não se trata de uma visão romantizada sobre as possibilidades jurídicas da indicação de consequências. Nem sempre é possível pre- ver todos os desdobramentos de uma determinada ação – seja da Administração, seja do controlador. O papel do art. 21 da LINDB pa- rece ser mais de transformação do discurso e da ratio decidendi dos controladores; de superação uma mera retórica principiológica carre- gada de conceitos jurídicos indeterminados (e, pois, de insegurança jurídica) e adoção de análises mais conectadas com a realidade e os

impactos que nela poderão advir das decisões controladoras55.

É certo que também há riscos na postura consequencialista, para além da impossibilidade de previsão de todos os impactos que uma decisão pode gerar.

54 Não se trata, aqui, do “consequencialismo” criticado por Conrado Hübner Mendes (Disponível em: <https://epoca.globo.com/conrado-hubner-mendes/jurisprudencia-impressionista-23066592>). Afinal, considerar que a suspensão de um certame, licitações ou da execução de um contrato administrativo pode ocasionar a descontinuidade do serviço público objeto daquele certame/ contrato parece uma consequência bastante lógica e direta da medida, não sendo necessários profundos conhecimentos econométricos para se chegar a esse risco.

55 Antecipando possíveis críticas à adoção da postura consequencialista pelo legislador ao promover alterações na LINDB, José Vicente Santos de Mendonça traz as seguintes ponderações: “Comecemos com a mais imediata, e que justificou críticas desde quando a alteração na LINDB era projeto de lei: (será que a exigência do caput do art. 21 é suprarrogatória?

A resposta depende do quão exatas se espera que sejam as consequências indicadas. Se

se espera que as consequências devam ser indicadas em nível ótimo de ocorrência e de exatidão, então a norma é impossível. Nenhum julgador possui bola de cristal. [...] O que torna isso possível é admitir que as autoridades julgadoras possam indicar consequências relativamente imprecisas. Os estados adiantados devem ser certos ou prováveis, o que significa dizer que, no segundo caso, “as consequências indicadas na decisão podem não ocorrer”. O que se requer é que se indique tanto elas quanto sua evidenciação empírica, e que a probabilidade de sua ocorrência seja significativa. Daí a segunda pergunta: (ii) se não se exige que as consequências sejam precisas – pois seria impossível –, então a norma se cumpre de modo retórico? Basta abrir capítulo na decisão, copiar-e-colar parágrafos sobre “indicação das consequências”, e a exigência teria sido cumprida? Neste caso, o art. 21, caput, não traria ganho na racionalidade da invalidação, mas levaria a que o estilo da decisão fosse alterado”. (MENDONÇA, José Vicente Santos de. Art. 21 da LINDB. Indicando consequências e regularizando atos e negócios. RDA – Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas. Edição Especial: Direito Público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, nov. 2018, p. 54-55).

A uma, porque o operador do direito não é treinado para fun- cionar a partir dessa linguagem mais pragmática – toda a forma- ção jurídica brasileira nos últimos trinta anos pautou-se na cons- trução de teorias de efetividade constitucional e força normativa

dos princípios56. Operar numa lógica de consequências exigiria

uma reconfiguração do código a que o jurista se habituou desde a vigência da “Carta Cidadã”.

A duas, porque dificilmente uma decisão terá possíveis con- sequências positivas ou negativas. É comum que uma mesma decisão possa ter efeitos louváveis e outros nem tanto. Assim, é possível que o controlador, ao proferir uma determinada decisão, foque apenas nas externalidades positivas de sua atuação, deixan- do – propositalmente – de abordar as consequências negativas. O

cherry picking57 de consequências poderia levar a um desvirtua-

mento da postura consequencialista58.

Não obstante os riscos e dificuldades inerentes à adoção de uma postura mais consequencialista, esta nova linguagem imposta pelo art. 21 da LINDB traz um saldo positivo, uma vez que assegura maior objetividade à argumentação de controladores e decisores. Afinal, apontar consequências – ainda que de forma imprecisa e/ ou incompleta – parece mais objetivo (e, portanto, mais transpa- rente e passível de argumentação dialética pelos controlados) do

56 Conforme importação das lições de: HESSE, Konrad. La fuerza normativa de la Constitución. In: Konrad Hesse. Escritos de Derecho Constitucional. Trad. Pedro Cruz Villalón. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1983. No Brasil, vide: BARROSO, Luís Roberto. O

direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição

Brasileira. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

57 Expressão em inglês que faz referência a uma escolha pensada dentre opções disponíveis.

58 Problema similar é apontado por Fernando Leal e Diego Werneck Arguelhes em relação à operacionalização da teoria das capacidades institucionais: “Considerar aspectos empíricos e comparar as habilidades e limites concretos de diferentes instituições são, portanto, os principais méritos anunciados pelo argumento das capacidades institucionais. É o que torna o recurso à expressão CIs diferente de apelar para a separação de poderes ou outro critério jurídico-formal de alocação de competências (um uso redundante), de enfatizar a possibilidade de erros na aplicação da teoria (um uso banal), ou de fazer um raciocínio puramente legislativo de alocação ideal de competências (um uso absurdo, nos nossos termos). É também o que determina esse caráter mais ou menos vantajoso de um modelo de decisão, dadas as capacidades reais de uma instituição relativamente a outra. Além disso, como vimos, o argumento só se completa se também são considerados os efeitos dinâmicos relacionados à adoção de uma certa estratégia de decisão”. (ARGUELHES, Diego Werneck; LEAL, Fernando. Dois problemas de operacionalização o argumento de “capacidades institucionais”. Revista de Estudos Institucionais – REI. Vol. 2. 1. Jan/jul 2016. p. 201). O argumento, no entanto, começou