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CONSIDERAÇÕES FINAIS: TENDÊNCIAS ATUAIS DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL

Conclui-se a ausência de concepção universal de proteção social no Brasil; o país não viveu a concepção de seguridade social como sistema universal e integrado. O que se percebe, de fato, é a expansão da assistência social em diminuição das propostas de direito social e bem-estar; a questão social é tomada apenas como pobreza, sendo a expansão da assistência feita de forma cada vez mais focalizada, residual, emergencial, com políticas compensatórias, deslocada do campo estatal para o filantrópico.

Os rumos tomados pelo governo comprometeram ainda mais parcelas enormes da população, que passou a vivenciar situações de empobrecimento sem nenhuma contrapartida de proteção social. É “a instituição do mínimo numa perversa lógica de ‘fazer o mínimo com um mínimo’” (Carneiro, Araújo & Araújo, 2019. p. 41). Num momento de aumento do desemprego e desfinanciamento da política estatal de assistência social, num claro movimento de substituição da assistência pelo assistencialismo, é possível perceber o avanço do voluntariado em substituição às políticas sociais quando elas mais se fazem necessárias.

A assistência social passou a absorver as demandas derivadas do agravamento das condições de vida e de trabalho através de políticas compensatórias. Para uma boa parcela da população, a assistência social passa a assumir a tarefa de ser política de proteção e não parte da política de proteção social; torna-se central no enfrentamento da questão social, passando a um papel de estruturadora de outras políticas sociais como emprego e renda (Mota, Maranhão & Sitcovski, 2009).

[...] se antes a centralidade da seguridade girava em torno da previdência, ela agora gira em torno da assistência, que assume a condição de uma política estruturadora e não mediadora do acesso a outras políticas e a outros direitos, como é o caso do trabalho (Mota, 2009, p. 138).

As políticas compensatórias, de transferência de renda, têm sido o carro-chefe da política de assistência social brasileira desde a década de 1990. De acordo com Sitcovsky (2009) e Santos (2012), os programas de transferência de renda melhoram a qualidade de vida das famílias, estimulam as economias locais dos municípios e garantem altos índices de aprovação governamental por ser uma medida popular que tem se constituído no elemento que dá acesso a bens e produtos.

Entretanto, podemos perceber, a partir da exposição realizada, que o foco nestes programas é feito em detrimento da ampliação de serviço socioassistenciais, o que leva a um comprometimento na proposta de ação integrada do SUAS, na tentativa de garantia de acesso a todos àqueles que necessitarem dessa política, para além de sua condição de pobreza extrema (Silva, 2013).

Segundo Boschetti (2016), os programas de transferência de renda são destinados a sujeito específicos, determinados pela pobreza absoluta ou indigência. Dessa forma, não possuem um caráter de prevenção ou superação das situações vivenciadas, mas sim de minimização.

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São concedidos mediante diversas condicionalidades e seus valores, normalmente, são muito abaixo daqueles estabelecidos para o valor do salário mínimo, não assegurando a satisfação das necessidades básicas, forçando os trabalhadores à venda da sua mão de obra independente da atividade ou condição. “Alguns são incorporados à renda familiar, criando um efeito perverso: se a soma da prestação social e de outras formas de benefícios sociais ultrapassarem a renda per capita exigida, o beneficiário é excluído do programa” (Boschetti, 2016, p. 164). São independentes de contribuição previdenciária, talvez, por esse motivo, ainda sejam vistos como benefícios facilmente capturados pelos clientelismos políticos e não como direitos a serem assegurados.

Todas essas mudanças têm como principal objetivo a continuidade e aprofundamento da adequação do fundo público à lógica do capital financeiro, num processo cada vez maior de submissão aos ditames do capital internacional e dos organismos internacionais, levando a um grau cada vez mais acentuado de desresponsabilização estatal com a área social.

O cenário apresentado não é, portanto, favorável à massa da população brasileira;

há necessidade de pensarmos em propostas para a assistência social que esteja relacionada à consolidação e universalização do SUAS no sentido de fortalecer os seus equipamentos sociais, principalmente os CRAS e CREAS, no intuito de transformá-los em espaços de atendimento das demandas dos/as trabalhadores/as e de representação, educação popular e mobilização. Faz-se necessário enfrentar o debate sobre os conselhos e as conferências pensando em possibilidades que ultrapassem o que tem sido efetivado, pensando em ampliar o poder de participação popular. Além disso, torna-se premente redefinir o tipo e o alcance dos benefícios socioassistenciais existentes:

os benefícios e serviços devem estar projetados para o atendimento das reais necessidades da população e não na lógica inversa. O conhecimento da realidade torna-se subsídio para lutas e para embasar reivindicações que tratam das condições de vida e dos direitos da classe trabalhadora que, a cada dia, necessita mais de políticas sociais públicas integradas que garantam não só parcos benefícios assistenciais, mas tenham como horizonte políticas emancipatórias.

REFERÊNCIAS

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CAPÍTULO 4

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