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CONSIDERAÇÕES INTERMÉDIAS

No documento Design inclusivo na cidade (páginas 138-142)

2.4

A evolução contínua da cidade levou, sobretudo a partir do séc. XIX, a várias altera- ções do ambiente público, o qual se passa a enquadrar naquilo que Choay designa “como a era das metrópoles”. Nesse contexto, o equipamento urbano foi crescentemente acentuando a sua relevância no que respeita ao signifi cado percepcionado da urbe. O desenvolvimento de novos métodos produtivos e materiais tem levado, desde então, à criação de objetos inovadores, resultado e consequência das transforma- ção das necessidades sociais e urbanas, as quais geram ciclicamente novas necessi- dades de uso do espaço público.

Em Portugal, apartir do fi nal do século XIX, os modelos de E.U. implantado eram inspirados, ou até mesmo copiados, dos modelos estrangeiros. Situação essa que apenas se altera em meados do século XX, fruto da evolução tardia da indústria portuguesa a qual, apenas nos anos 60 e 70, inicia a ter os modelos próprios. Essa situação é acentuada a partir dos anos 80 e 90, com a formação de novos desig- ners, fruto da criação dos primeiros cursos de design no país. Essa nova geração de designers introduz diversidade à linguagem dos produtos nacionais, nomea- damente pela exploração de novos conceitos e materiais. Já no fi nal dos anos 90, a Expo 98 surge como motor de transformação, na medida em que se torna num exemplo da construção e desenvolvimento da “cidade” de Lisboa. Assim, no inicio do século XXI, tendo como referência o evento de fi nal de século anterior, surgem programas como o POLIS ou PORTO XXI, em que a “cidade” passa a ser pensada e redefi nida quer a nível estrutural quer de E.U. aplicado. No entanto, não obstante

a diversidade de propostas, e como refere Pedro Bebiano Braga,151 assiste-se ain-

da a uma tendência de repetição dos modelos de equipamento, situação essa que permanece até hoje, possivelmente devido à comum aquisição de soluções através de catálogo, a preços mais acessíveis e competitivos. Na atualidade, existem vários fabricantes de E.U. tanto a nível nacional como internacional, que têm em comum a oferta dos seus produtos por catálogo, identifi cando-se que o modelo de apre- sentação geralmente adotado assenta na mostra dos produtos, não por tipologias, mas sim por modelos com características e funções semelhantes, de onde sobressai o facto de maioritariamente, se repetirem quer os materiais quer as tecnologias de fabrico. Soluções essas nem sempre compagináveis com evolução da cidade e da sociedade, se atendermos à complexidade de factores inerentes às sucessivas alte- rações do ambiente público.

Por outro lado, em paralelo, assiste-se ao desenvolvimento de novos métodos pro- dutivos e materiais que, em casos sobretudo relacionados com a promoção de concursos públicos destinados à criação de lugares específi cos, levam à criação de objetos inovadores que pontuam as cidades de onde a onde e, como consequência, levam a uma gradual alteração positiva das oportunidades sociais e urbanas, que por sua vez geraram novas necessidades do uso do espaço público.

Torna-se assim evidente que, o projeto de E.U. obriga à previa compreensão de fatores complexos consigo diretamente relacionados. Para esse processo, é fun- damental a identifi cação de uma metodologia que auxilie o designer a perceber o contexto dos objetos e a sua ligação com os utilizadores. Nesse sentido, o E.U. deve ser avaliado em diferentes parâmetros, sejam eles físicos, simbólicos ou de interação com o utilizador, sendo para esse processo útil a utilização de checklists e de modelos sistematizados de avaliação do contexto de implantação. Sendo já uma realidade a existência de diferentes ferramentas e métodos de apoio para o exercício de um design sustentável, o mesmo não se aplica a soluções que auxiliem a tomada de decisão no que refere à equação sistematizada da relação inclusividade

e identidade, pelo que o suprimento dessa lacuna se assume como centralidade no contexto deste trabalho.

Entende-se que a adoção de ferramentas metodológicas no processo projetual será uma mais-valia para a construção da ponte entre o utilizador e o designer, na me- dida em que a metodologia de design não pode estar presa a parâmetros tradicio- nais baseados no conhecimento intuitivo e nas preferências pessoais do designer ou cliente.152

Em todas as fases do projeto de E.U. dever-se-á ter em conta a integração dos uti- lizadores, existindo uma relação estreita entre designer, utilizador e indústria. A criação de E.U. inclusivo terá de considerar: o contexto histórico, a simbologia e morfologia da urbe, a dinâmica social e funcional, bem como a integração dos utilizadores, interligando estes factores de forma sustentável. A aplicação destes princípios ao projeto das cidades e respetivo E.U. permite que estas sejam (re) pensadas e (re)criadas de forma coerente com desígnios necessários, que almejem contribuir para a real qualidade de vida urbana, tornando as cidades mais acolhe- doras e inclusivas: uma Cidade das Pessoas e para as Pessoas.

Essa noção, está por si relacionada com a ideia de não exclusão, o que leva ao im- perativo de se construirem soluções que não sejam barreiras urbanísticas e que, ao invés, promovam a interação e que estabeleçam uma separação entre espaços de circulação e espaços de lazer e, dessa forma, facilitem a mobilidade de todas as pessoas ao mesmo tempo que valorizam o panorama visual e identitário da cidade.

A urbe assume-se como um espaço que pode ser percepcionado com o decorrer

152 Águas, Sofi a, Do design ao co-design Uma oportunidade de design participativo na transformação do espaço pú- blico, 2012, p. 12.

do tempo, encontrando-se em constante transformação, pelo que é possível que os utilizadores da cidade possuam diversos pontos de referência, podendo construir imagens dos espaços urbanos através de memórias ou simplesmente de impressões

apreendidas no dia-a-dia de contacto com a cidade.153 Ou seja, o espaço urbano

não pode ser observado como um objeto estático,154 visto ser um produto de vá-

rios construtores, em que cada um vais diariamente acrescentando a sua marca. Nesse processo de construção de memória coletiva, podem ser convocados vários sentidos para identifi car e caracterizar um lugar, seja por via da visão (ao nível da percepção de cor, forma, ou movimento), do tato (por via do sentir de texturas ou formas), do odor, etc.. A identidade da urbe é assim composta pela agregação de grupos de mensagens sensitivas e simbólicas que na sua interligação constituem a memória percebida de determinado lugar. Desse modo, o E.U. pode contribuir como indicador favorável ou desfavorável da construção dessa identidade, enquan- to sentido de lugar que promove atividade de socialização, em si determinante para a sustentabilidade do espaço público.

153 Lynch, Kevin, A Imagem da Cidade, 1997. 154 Ibid.

No documento Design inclusivo na cidade (páginas 138-142)