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MASSIFICAÇÃO COMO BARREIRA PARA A VISUALIZAÇÃO E CONTEMPLAÇÃO DOS ESPAÇOS

No documento Design inclusivo na cidade (páginas 133-137)

2.3.4.2

Encontramos, com Ignasi de Lecea, a resposta de que na nova cultura do espaço público, a arte e a memória terão de estar presentes como elementos que satisfa- zem as necessidades de identifi cação e de imagem que outrora os monumentos históricos sempre ofereceram. Segundo a autora, nos dias de hoje, não é possível dissociar a imagem da cidade da publicidade e da utilização promíscua de elemen- tos de E.U., “cuja necessidade nem sempre é clara, se bem que é certo que aumenta com os maiores requerimentos de conforto que se requerem do espaço público”.142

Se tornarmos como exemplo o modelo de Barcelona utilizado na reconstrução da cidade, apercebemo-nos do valor conferido, no espaço público, ao controlo da aplicação de E.U., com a ideia sempre presente de que a rua não deverá ser um armazém de equipamento. Ao mesmo tempo, é notório que os elementos de equipamento utilizado pretendem ser esculturas, pelo que quanto menos equipa- mento for aplicado melhor será nesta ótica a sua leitura. Porém, quando se recorre a elementos historicistas que, segundo Lecea…

“Em pormenor reproduzem em plástico velhos modelos de fundição do séc.

XIX, esquece-se que frente a uma catedral gótica, tão moderna é tanto um

elemento do séc. XIX como um do século XXI, com uma diferença impor-

tante, o primeiro funcionará sempre pior.”

143

142 Lecea, Ignasi de, Arte pública,cidade e memória, 2004, p. 128. 143 Ibid, p. 129

Segundo Remessar,144 a designação de arte pública remete para uma prática social

cuja diversidade tem sempre um registo comunicacional em contexto, o que pres- supõe uma responsabilidade no que respeita à relação entre a criatividade artísti-

ca145 e os vários objetivos e interesses que formam o espaço público.

A cidade, como produto, é uma característica da cidade pós-medieval, onde foram impostas a abertura do espaço público, a acessibilidade, a segurança, a atração e a

sociabilidade. Segundo Pedro Brandão,146 a cidade é formada por imagens de uma

narrativa histórica, sejam elas acontecimentos, pessoas, artefactos, peças de arte, paisagens, monumentos ou até o próprio estilo de vida. Desta forma, a marca ci- dade terá de ser capaz de relacionar o equipamento público com o equipamento artístico e histórico existente. Se os destinos turísticos são marcados pelos equipa- mentos históricos, os novos deverão estar ligados ao novo design urbano.

Ainda nesta perspetiva, Currid diz-nos que não é só o produto que marca o lugar, mas também o sítio que marca o produto. A memória dos locais, dos lugares, do que existiu, assume-se como um papel primordial na memória coletiva, como referência cultural da sociedade. O conhecimento profundo não só da realidade física como também da realidade social e sociológica é essencial para que uma in- tervenção na cidade resulte de uma forma efi ciente, criando afi nidades e relações com aqueles que nela habitam, contribuindo para uma responsabilidade coletiva do meio.

Deve-se, assim, preservar o património quer como herança quer como fonte de conhecimento que alicerça o progresso, procurando encontrar o equilíbrio entre

144 Remessar, Antoni, Arte e o espaço público. Singularidades e incapacidades da linguagem escultórica para o projec- to urbano, 2000.

145 Currid, Elizabeth, How art and culture happen in New York, 2007, p. 157. 146 Brandão, Pedro, Waterfonts, Arte pública e cidadania, 2004, p. 19.

a tradição e a inovação, através da revitalização ou da intervenção ativa no produto patrimonial. Segundo Helder Pacheco,

“o desafio do nosso tempo é, no plano dos conceitos, conciliar a memória

com a inovação e, no plano prático, reconciliar as comunidades com a sua

cultura do passado e do presente…”

147

É então necessário que haja, por parte dos designers, uma preocupação com a ela- boração de projetos que promovam o aumento da qualidade de vida da sociedade, com o menor custo material, social e ambiental possível. Dever-se-á explorar, esté- tica, cultural e urbanisticamente, o caráter físico dos locais, especifi camente a sua relação com o ambiente natural e a paisagem circundante, de maneira a valorizar ao máximo a fi sionomia que melhor caracteriza a sua identidade.

A identidade signifi ca a igualdade no seu todo, sendo que a palavra cultural é um adjetivo, desta maneira a defi nição de identidade cultural relaciona-se com ques- tões de identidade ao mesmo tempo que esta acaba por ser infl uenciada pelo lugar,

género, raça, história, crenças religiosas e etnia.148

A cultura exerce um papel fundamental na compreensão quer individual quer coletiva da identidade, como delineadora das variadas personalidades, padrões de conduta e características próprias de cada ser humano. O facto de o meio estar em constante mutação, com inovações e particularidades temporárias, exerce regu- larmente infl uência nas mudanças signifi cativas. A identidade no passado era mais preservada por haver um escasso contacto entre as várias culturas. Porém, com a globalização, verifi cou-se uma alteração desta realidade, o que levou a que as pes-

147 Pacheco, Hélder, Portugal Património Cultural Popular, O ambiente dos homens, 1994. 148 Hall, Stuart; Gay, Paul du, Questions of Cultural Identity, 2005.

soas interagissem mais e de uma forma muito mais rápida.

Hoje em dia, o que existe é uma ausência de referências permanentes para a iden- tidade, incluindo as que se baseiam na ideia de nacionalidade. Françoise Choay, na obra Alegoria do Património, mostra-nos que o nascimento da ideia de património enquanto elemento representativo da identidade, e a importância que adquiriu ao longo do tempo, surge após uma época (a Revolução Francesa) em que o desprezo pelo mesmo levou à sua deterioração.

Para Choay, o regresso à ideia de património aparece com a Revolução Industrial. É nesta fase que o património deixa de ser visto como um conjunto de posses de uma determinada elite e passa a ser visto como propriedade de todos, ou seja, do Estado. O património passa a ser interpretado, em primeiro lugar, como valor nacional o que, por si só, já representa a identidade cultural. Em segundo lugar, reconhece-se o seu valor cognitivo e, em terceiro, o seu valor económico, ligado, obviamente, ao turismo, que começa a ser entendido como potencial gerador de capital para o próprio Estado. Embora a política de turismo só nasça um século após a Revolução Industrial, já se percebia na altura o potencial do património, como atração. O valor económico levanta, porém, algum desconforto no que res- peita à dicotomia conservação versus destruição, do património face ao turismo, como nos diz Choay:

“São obras que dispensam saber e prazer, colocadas à disposição de todos,

mas também produtos culturais, fabricados, embalados e difundidos tendo

em vista o seu consumo. A metamorfose do seu valor de utilização em valor

económico é realizada graças à ‘engenharia cultural [...] [,cuja] [...] ta-

refa consiste em explorar os monumentos por todos os meios possíveis, a fim

No documento Design inclusivo na cidade (páginas 133-137)