• Nenhum resultado encontrado

EYE TRACKING E OS ESTUDOS SOBRE NOTICIÁRIOS

4.3. CONTEXTOS DE USO

Como referido anteriormente, o eye tracking caracteriza-se por permitir detetar e gravar o percurso dos movimentos oculares de um determinado utilizador, tendo também a capacidade de poder avaliar o tempo que este demora a realizar uma determinada tarefa. Graças a estas características, nestes últimos anos tem existido um claro e evidente crescimento no uso do eye tracking como suporte para estudos tanto ao nível de plataformas web, como em conteúdos televisivos (anúncios televisivos, programas informativos, entre outros). Um dos trabalhos que evidencia essa variedade de estudos foi apresentado por Mealha et al. (2011), onde foi efetuado uma compilação de estudos utilizando o eye tracking como técnica de avaliação. Assim, tendo em conta a pluralidade de áreas em que o eye tracking se desdobra, esta secção tem o intuito de realizar um pequeno levantamento de estudos realizados em algumas dessas áreas.

W

EB

Uma das áreas onde existe uma crescente utilização do eye tracking é no domínio web. Um dos trabalhos pioneiros foi levado a cabo em 1999 pelo Poynter Institute e a universidade de Stanford. Este projeto, designado por Stanford Poynter50, tinha o intuito de perceber, em sites de notícias, quais as

notícias mais visualizadas e com que frequência eram lidas. Era também objetivo deste projeto perceber a importância das fotografias, gráficos e títulos. Através deste projeto, os autores do estudo, Andrew DeVigal e Lewenstein, concluíram que os leitores viam em primeiro lugar os conteúdos textuais e só depois as fotografias e os gráficos. Quanto à comparação entre fotografias e gráficos, as fotografias atraíam mais a atenção dos leitores quando comparadas com os gráficos.

Pan et al. (2004), também com o uso do eye tracking, analisaram 22 páginas de 11 sites. Este estudo tinha o propósito de avaliar a tipologia dos sites, a ordem com que os sites eram visualizados e as diferenças existentes entre o género dos participantes. Estes autores concluíram que a visualização e o respetivo comportamento dos indivíduos, como também a ordem como os conteúdos eram visualizados, é diferente no género masculino e no género feminino.

Outro estudo, mas focado em sistemas de pesquisa web, foi efetuado por Rele & Duchowski (2005). Recorrendo ao eye tracking, os autores avaliaram dois tipos de interface de sistemas de pesquisa na internet, um por listas e outro por tabelas, concluindo que, no que diz respeito ao tempo de execução da tarefa e à sua precisão, não existem diferenças entre estes dois tipos de interface. Ainda neste âmbito foi realizada uma experiência por Joachims e Radlinski (2007), que pretendia perceber a forma com que os utilizadores interagiam com os sistemas de pesquisa, e como estes contribuíam para a aprendizagem dos utilizadores. Como resultados, os autores concluíram que o uso de feedback por parte do sistema de pesquisa facilita a pesquisa por parte dos utilizadores. No entanto, existem elementos que devem ser aprimorados, como as questões de privacidade e os efeitos que o spam pode ter na navegação por parte dos utilizadores.

Outro trabalho foi conduzido por Cutrell e Guan (2007), com o propósito de apurar as diferenças na forma como são apresentados os resultados de pesquisa, mais concretamente no que diz respeito ao comprimento dos snippets. Os autores concluíram que o comprimento melhora o desempenho para consultas informativas mas deteriora o desempenho para consultas de navegação.

Já em 2009, foi conduzido um outro estudo para compreender a atenção visual por parte dos participantes aquando da visualização de 361 páginas web. Para tal os autores introduziram um novo conceito designado de “fixation impact”, que corresponde à área de fixação do campo visual do indivíduo, ou seja, avalia tanto o ponto exato que este está a fixar como também a informação da área que envolve esse ponto (Buscher et al., 2009).

Num contexto português, nesse mesmo ano foram apresentados os resultados de um estudo de eye tracking à homepage do portal SAPO51. Este estudo teve como intuito analisar a atenção visual e a interação dos utilizadores com a área de destaque de notícias na homepage do SAPO, evidenciando assim as áreas em que os participantes do estudo mais se focaram e os paradigmas de interação mais eficientes (Mealha et al., 2009).

Por fim, é importante realçar o estudo levado a cabo por Djamasbi, Siegel & Tullis (2010). Este trabalho teve como principal foco a realização de um estudo que compreenda a relação entre as páginas web e a Geração Y52. Para tal, foram realizadas duas experiências com o objetivo de perceber a tipologia de páginas web mais visitadas, e quais as áreas em que esta geração despendia mais atenção. A primeira experiência foi realizada através de um inquérito por questionário online com o intuito de perceber se a pontuação dada às páginas web correspondia ao rating dado pelos participantes. Tendo em conta os resultados obtidos com a primeira experiência, os autores realizaram uma segunda experiência apenas com as páginas web mais e menos apelativas. Para esta segunda experiência foi utilizada o eye tracking com o propósito de identificar as zonas mais visualizadas e que mais atraíam os participantes. Como resultados finais, Djamasbi, et al. (2010) concluíram que a Geração Y prefere páginas web que contenham uma imagem principal de grandes dimensões, bem como imagens de celebridades, textos curtos e um motor de pesquisa. É na área da web em que o uso do eye tracking se torna mais frequente. Esse facto torna-se mais evidente devido ao número de estudos que existem nesta área, comparativamente a outras áreas que serão abordadas a seguir. Devido aos inúmeros estudos existentes nesta área, esta secção focou- se nos trabalhos realizados em duas das principais áreas de estudo: as páginas/sites web (Buscher et al., 2009; Djamasbi et al., 2010; Mealha et al., 2009; Pan et al., 2004) e os sistemas de pesquisa web (Cutrell & Guan, 2007; Joachims & Radlinski, 2007; Rele & Duchowski, 2005).

51 http://www.sapo.pt, 28/7/2014.

52 A Geração Y representa uma geração com idades compreendidas entre os 18 e os 31 anos e que cresceu com os

grandes avanços económicos e tecnológicos. Esta geração representa também um público-alvo bastante aliciante para diversas empresas ligadas ao ramo das tecnologias, uma vez que é um público-alvo receptivo e exigente no que diz respeito a inovações tecnológicas (Djamasbi et al., 2010).

T

ELEVISÃO

No contexto televisivo são vários os estudos realizados até à data. Muitos desses estudos estão relacionados, essencialmente, com anúncios publicitários e comerciais. Um desses casos ocorreu no Mundial de 2006 de futebol na Alemanha e no campeonato americano de baseball, onde foram estudados e analisados (através do eye tracking), a influência e o efeito dos anúncios comerciais que apareciam durante essas transmissões televisivas, dando a conhecer a estas entidades a eficácia destes anúncios publicitários (Duchowski, 2007). Ainda neste domínio, Brasel & Gips (2008) publicaram um estudo onde analisaram 24 minutos televisivos (13 minutos de conteúdos de programas televisivos e 11 minutos de anúncios comerciais), concluindo que a dispersão existente em conteúdos de programas é menor do que em conteúdos publicitários, como também a dispersão aumenta cada vez que um anúncio publicitário é repetido. No entanto, este estudo apresentou apenas alguns indicadores, uma vez que o número de participantes era reduzido (9 participantes). Com o evoluir das infraestruturas de comunicação, como dos próprios aspetos técnicos das televisões, surgiu o conceito de Televisão Interativa (iTV)53, emergindo assim a necessidade de avaliar o impacto desta. Deste modo, existem já alguns estudos utilizando o eye tracking, como é o caso do estudo feito por Obrist, Bernhaupt, Beck & Tscheligi (2007) com o objetivo de elaborar uma análise de usabilidade a uma aplicação de iTV, mais especificamente para um público idoso, que tem maior dificuldade na utilização deste tipo de aplicações.

Num outro contexto, foi efetuado um estudo onde foram visualizados 6 pequenos trechos de filmes presentes num DVD (R. Goldstein, Woods, & Peli, 2007). O propósito deste estudo era perceber se as pessoas olhavam para o mesmo local aquando da visualização de um filme, e se este variava com a idade e o género. Tendo em conta estes princípios, os autores queriam perceber se o COI (Center of Interest) correspondia ao centro do ecrã. Os autores concluíram que nos seis trechos o COI correspondia normalmente ao centro do ecrã, e que de forma geral as pessoas (tendo em conta o seu género e idade) olhavam para o mesmo local (R. Goldstein et al., 2007).

Para além destes estudos, encontram-se outros exemplos em vídeos presentes na internet, como são os casos das publicidades da Nívea e Heinz54 realizados pela empresa User Vision55, ou também alguns

exemplos por parte da Visual Cognition Lab56, da Universidade de Edimburgo, como é o caso do

videoclip de Red Hot Chili Peppers57. Isto demonstra que existem algumas empresas especializadas no

estudo de conteúdos audiovisuais, evidenciando assim o crescente uso do eye tracking nestes conteúdos.

53O conceito de televisão interativa surge da relação da televisão, enquanto media tradicional, com as novas tecnologias e

novas formas de interação, que abriu espaço para um novo paradigma de consumo televisivo por parte do telespetador.

54 http://vimeo.com/4960678, 28/7/2014. 55 http://www.uservision.co.uk/, 28/7/2014. 56 http://www.psy.ed.ac.uk/, 28/7/2014. 57 http://vimeo.com/6628473, 28/7/2014.

O

UTROS

C

ONTEXTOS

O eye tracking é utilizado também noutros contextos, como são os casos dos videojogos e dos dispositivos móveis.

Relativamente aos videojogos, para as empresas que os concebem é importante perceber a experiência por parte do jogador e a forma como este interage com o jogo. El-Nasr e Yan (2006) partiram da análise de dois jogos 3D de diferentes tipologias para avaliarem a atenção visual dos jogadores neste tipo de cenários, tendo em conta aspetos como o design e os gráficos. Outro exemplo é o de Alkan e Cagiltay (2007), que realizaram um estudo com o propósito de perceber a experiência, estratégias e respetiva atenção de 15 estudantes universitários nos diferentes níveis e zonas da demo do jogo Return of the Incredible Machine: Contraptions.

Ainda no contexto de videojogos, Almeida (2009) desenvolveu um estudo utilizando também o eye tracking para avaliar, visualmente, a forma como os jogadores interagiam com os diferentes cenários do jogo Call of Duty 4. Assim, este trabalho de investigação pretendia desenvolver um conjunto de recomendações que contribuíssem para o desenvolvimento futuro de cenários de videojogos, como também desenvolver um método que ajudasse a compreender melhor as zonas mais e menos visualizadas num cenário de jogo. Como evolução deste trabalho, este autor desenvolveu em 2013 outro estudo, que colmatou com a apresentação de um modelo da experiência de jogo. Neste estudo o autor, ao contrário de outros trabalhos, procurou estabelecer um equilíbrio entre os dois principais intervenientes na experiência de um videojogo – o jogador e o videojogo (Almeida, 2013). De modo a estudar e a caracterizar a experiência do jogo, e consequentemente avaliar num determinado contexto a aplicabilidade do modelo proposto, Almeida (2013) elaborou um estudo multicaso com 2 videojogos, tendo utilizado o eye tracking como técnica de avaliação em determinados aspetos da experiência de jogo.

Já no âmbito dos dispositivos móveis, apesar de ser uma área menos explorada, existem alguns estudos, como é o exemplo do estudo levado a cabo por Drewes, Luca & Schmidt (2007), que aplicaram o uso do eye tracking de uma forma diferente, investigando a forma como se podia utilizar o olhar dos utilizadores para interagir com aplicações de dispositivos móveis. Em 2006, foi também realizado um estudo com o fundamento de perceber o porquê de existirem tantos acidentes na estrada que têm como causa o uso de dispositivos móveis. Para compreender esta situação os autores utilizaram o eye tracking para perceber a atenção dada pelos utilizadores a estes dispositivos móveis (Balk, Moore, Steele, Spearman, & Duchowski, 2006).

Outros contextos de aplicação do eye tracking podiam ser aqui descritos (medicina, aviação, marketing, neurociências, entre outros.). No entanto, os estudos evidenciados nesta secção permitiram constatar a importância do uso desta tecnologia nas mais diversas áreas científicas. O eye tracking demonstra assim poder ser uma técnica de avaliação bastante influente na avaliação do comportamento e interação do utilizador com um dado serviço e/ou produto, possibilitando assim às entidades e investigadores desenvolverem serviços e produtos mais eficazes e eficientes para o consumidor final.