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Contratos atípicos voltados para grupos vulneráveis no mercado de trabalho

As formas de contratação flexível no Brasil

2. As formas atípicas de contratação vigentes no Brasil

2.5. Contratos atípicos voltados para grupos vulneráveis no mercado de trabalho

2.5.1. O primeiro emprego

O Programa Nacional de Primeiro Emprego (PNPE), na sua origem em 2003,249 limitava-se a dar incentivos financeiros às empresas que contratassem jovens,250 que eram pagos pelo Governo Federal com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Inicialmente só poderiam fazer jus ao recebimento dos benefícios aqueles empregadores que contratassem, por tempo indeterminado, os jovens inscritos no programa, sendo que, concomitantemente a essa exigência, as contratações no âmbito do PNPE poderiam ser apenas para novas admissões de maneira a se impedir a substituição de empregados ativos por jovens do programa.

Em 2004, as mudanças explicitaram as características flexibilizadoras do Programa ao permitirem a possibilidade de contratação por prazo determinado, desde que por um período mínimo de 12 meses. A segunda mudança foi no sentido de afrouxar a exigência de o empregador ter o mesmo número de empregados depois de 12 meses de adesão ao programa.

249

Lei 10.748/03 e MP 186/04, convertidas na lei 10.940/04, regulamentada pelo Decreto 5.199/04. 250

Jovens com idade entre 16 e 24 anos, que estejam matriculados e freqüentando regularmente estabelecimento de ensino fundamental ou médio, cursos de educação de jovens e adultos, ou que tenham concluído o ensino médio e que sejam membros de famílias com renda mensal per capita de até 1/2 (meio) salário mínimo, incluídas nesta média eventuais subvenções econômicas de programas congêneres e similares.

Agora, limita-se a fazer uma recomendação de que as empresas devem evitar a substituição de trabalhadores. Em terceiro lugar,

[...] acabou com a distinção do valor do benefício em função do faturamento da empresa, igualando, para fins de recebimento do benefício, micro, pequenas, médias e grandes empresas (que de acordo com a redação atual devem receber 6 parcelas bimestrais de R$ 250,00 por emprego gerado no âmbito do programa251). A nova redação manteve a exigência segundo a qual os contratados pelo programa podem chegar a, no máximo, 20% do seu quadro de pessoal atual (CESIT/SEBRAE, 2005, p.16).

Nesse sentido, apesar de a motivação do programa ser o estímulo à contratação de jovens, pois este é o segmento que apresenta maior nível de desemprego, ele pode ser classificado como parte da concepção de regulação do mercado de trabalho a partir dos anos 90 no Brasil, uma vez que utiliza a redução de custos e os incentivos fiscais como motivadores para a contratação.

Mesmo com as vantagens, entretanto, o PNPE tem pouca expressão no mercado de trabalho. Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego,252 foram criados somente 15.778 empregos a partir dos incentivos desencadeados pelo programa até julho de 2005. Destes, 92% são por tempo indeterminado. É evidente que o programa tem incidência praticamente nula no mercado de trabalho, pois só consegue alocar 6% dos inscritos e as vagas criadas representam somente 0,4% do total dos jovens desempregados na faixa entre 16 e 24 anos, que, segundo a PNAD (2003), seriam 3,9 milhões. Atualmente, considerando a relação de contratados inserida no site do MTE, há 8.393 jovens no programa do Primeiro Emprego, concentrados nos Estados do SP, RS e SC, principalmente na área de serviços (tele- atendimento) e do comércio (em geral e supermercado). Somente a rede McDonald de São Paulo tem 640 jovens contratados, correspondendo a 7,6% do total. Apenas 5 empresas são responsáveis por 39% dos admitidos a partir dessa modalidade de contratação,253 que tende a gerar emprego em setores que exigem baixa qualificação profissional, sendo que em alguns, como o telemarketing, são extremamente precários.

251

Se, entretanto, o jovem for contratado em regime de tempo parcial, o valor da subvenção será proporcional à jornada contratada.

252

Conferir site www.mte.gov.br 253

São Paulo Alpargatas, CIA Zaffari Comércio e Indústria, Softway Contact Center Serviços de Teleatendimento, Teleperformance Crm e McDonald.

Como um programa nacional, ele praticamente está ausente dos instrumentos normativos analisados. Há uma exceção que inclui a disposição dos sindicatos patronal e obreiro de incentivar a propagação do programa.254

2.5.2 Contrato aprendizagem

O contrato de aprendizagem tem a finalidade de propiciar ao trabalhador entre 14255 e 24 anos256 a possibilidade de combinar trabalho e formação técnico-profissional. Na sua nova regulamentação,257 em 2000, prevalece a lógica de caracterizar o trabalho de jovens/adolescentes não como atividade assistencial, mas garantindo-lhes alguma proteção trabalhista, tais como jornada, salário mínimo hora, conciliação com estudo, proibição de atividades insalubres e perigosas e proibição da prorrogação para compensação da jornada. Ao mesmo tempo, porém, a forma escolhida foi caracterizar o trabalho do jovem aprendiz como contrato por tempo determinado, portanto como contrato atípico, em que nem todos os direitos estão assegurados, como já destacado acima. Além disso, como fator de atração do empregador, o valor do depósito do FGTS é de 2%.

Apesar de conter alguns aspectos que podem ser considerados flexibilizadores, na sua essência, ele não pode ser classificado como tal, pois coloca limites que tiraram a possibilidade de o empregador contratar livremente sua força de trabalho. O limite diz respeito à obrigatoriedade de o empregador ter uma proporção entre 5% e 15% dos empregados, dependendo do tamanho da empresa, como jovens aprendizes. As micros e pequenas, depois do Super-simples, estão excluídas dessa regra. A mudança legal veio como forma de ajustar, no campo do trabalho, o Estatuto da Criança e Adolescente e a Emenda Constitucional nº 20, que elevou a idade mínima para o trabalho de 14 para 16 anos, com exceção do aprendiz, que pode começar aos 14. Também veio em um contexto de pressão da

254

Setoreletro-eletrônico, ar e refrigeração de Curitiba. Cf. Pesquisa CESIT/MTE, 2006. 255

A constituição Federal elevou a idade mínima para o trabalho de 14 para 16 anos (EC nº 20/98), abrindo-se uma exceção para os jovens aprendizes.

256

A ampliação de 18 para 24 para utilização do contrato de experiência foi feita no governo Lula, através da lei 11.180/05.

257

O contrato aprendizagem é basicamente regulamentado pela lei 10.097/2000, que traz para a CLT os preceitos constitucionais concernentes à doutrina da proteção integral e as determinações do Estatuto da Criança e do Adolescente (artigos 62, 65 e 68), da Lei 9.394/96 (artigo 40) e do Decreto 2.208/97 (artigo 4º) (FONSECA, 2001).

OIT para o país ter políticas de erradicação do trabalho infantil. O segundo limite refere-se ao condicionamento da contratação como jovem aprendiz à matrícula em uma escola profissionalizante, preferencialmente do sistema S. A luta dos auditores fiscais é viabilizar a implantação da quota, pois a resistência empresarial é grande ao cumprimento da lei.

Alguns aspectos podem até indicar certa flexibilização, tais como: 1) a permissão da intermediação da mão-de-obra aprendiz pelas entidades sem fins lucrativos que tenham por objetivo a assistência ao adolescente e a educação profissional, registradas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, de maneira que a contratação não gere vínculo de emprego entre o aprendiz e a empresa tomadora de serviços,258 sendo, inclusive, vetado o artigo que previa a responsabilidade subsidiária da empresa contratante; 2) caso haja o rompimento do contrato anteriormente ao seu vencimento, não está garantido qualquer tipo de indenização ou aviso prévio;259 e 3) admite-se a continuidade do contrato mesmo que o jovem já tenha concluído o ensino fundamental, abrindo a possibilidade de este exercer uma jornada de 8 horas.260 Além disso, acabou-se com a obrigatoriedade da freqüência do aprendiz ao curso profissionalizante a que está matriculado.261

A RAIS começa a registrar a contratação do aprendiz somente a partir de 1998. Até 2005, o crescimento é vertiginoso, chegando a 735,6%. Em 2004, entre os jovens empregados com até 17 anos, 14,1% eram aprendizes; em 2003 este percentual era de 9,7%, passando a 4,7% em 2002 (gráfico 11). Em contrapartida, a contratação por prazo indeterminado caiu de 86,2%, em 2002, para 77,5%, em 2004, na mesma faixa. Tais dados demonstram o crescimento dessa modalidade de contratação de jovens em relação às demais. O crescimento está vinculado à pressão da sociedade e do Estado para que essa lei venha a ser efetivada.

Apesar do crescimento vertiginoso, o contrato aprendizagem ainda é pouco expressivo no Brasil, com a admissão de 59.374 jovens, em 2005, segundo a RAIS, perfazendo somente

258

Vide nova redação do artigo 431 da CLT. 259

O artigo 433 deve ser interpretado ampliativamente quanto à indenização pela rescisão antecipada do contrato de aprendizagem, para que se aplique, por analogia, o artigo 481 da CLT, fazendo incidir o aviso prévio e a indenização de 40% do FGTS, nos casos de despedida sem justa causa (Fonseca, 2001).

260

A prorrogação da jornada para 8 horas (alteração pela lei 10.097/00 do parágrafo 1º do artigo 432 da CLT) é considerada inconstitucional na visão de Fonseca (2001).

261

0,18% do total dos assalariados formais ativos, mas significando 14% dos jovens contratados com até 17 anos.

Gráfico 2.11 - Evolução do contrato aprendiz, 1999, 2002 e 2005- Brasil 6157 40791 59374 4558 7429 13709 1999 2002 2005

Fonte: RAIS/MTE não ativo ativo

Observando os números, torna-se óbvia a constatação de que essa é mais uma lei que não está sendo respeitada. O crescimento dos dados da RAIS mostra que, aos poucos, ela vai atingindo um contingente mais expressivo de empresas. Além disso, há também uma ação na perspectiva de regulamentar o trabalho dos jovens. O crescimento dessa modalidade de contratação no registro da RAIS tem evidenciado mais uma vez que a dinâmica do emprego depende especificamente da ativação da demanda, não sendo criados empregos apenas por facilidades contratuais. Por outro lado, não deixa de ser preocupante o vertiginoso e constante crescimento dessa modalidade de contratação.

O contrato de aprendizagem está concentrado nas empresas com mais de 100 empregados, na Região Sudeste, sendo crescente no setor de serviços e “outras atividades sociais” e chegando a 60% em 2004. Nesse caso, “é provável que a mudança operada na Lei em 2000 explique (em parte ou totalmente) a mudança setorial observada. O que não é possível aferir é a forma como tais ramos estão utilizando o trabalho de menores”. (CESIT/MTE, 2006, p. 105).

A remuneração média estipulada, tendo como referência um piso no valor do salário mínimo hora, ficou em 70% do SM prevalecente em 2004, abaixo do valor hora de uma jornada de 6 horas. O rendimento médio do aprendiz corresponde a 21% da remuneração média dos trabalhadores assalariados formais.

Tabela 2.3 - Renda média dos contratados para aprendizagem e todos os vínculos, Brasil – 1999- 2003 (em R$) Tipo de vínculo 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Aprendiz 103,8 117,29 158,36 162,45 193,11 210,27 Todos 686,98 730,52 792,37 846,95 925,09 1.004,51

Elaboração: Projeto CESIT/MTE, 2006. Fonte: RAIS/MTE.

Aqui, diferentemente das outras formas atípicas de contratação, a nova regulamentação não foi só no sentido da flexibilização, buscou também ajustar a CLT aos preceitos definidos na Constituição de 88 e no ECA de proteger os adolescentes e jovens na sua relação de emprego e de forçar as empresas a contratarem jovens.