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OUTRAS CONVENÇÕES REGIONAIS DE DIREITOS HUMANOS: A CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS E A CONVENÇÃO EUROPEIA DOS

2 O RECONHECIMENTO JURÍDICO DO DIREITO AO DESENVOLVIMENTO NO DIREITO INTERNACIONAL

2.6 OUTRAS CONVENÇÕES REGIONAIS DE DIREITOS HUMANOS: A CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS E A CONVENÇÃO EUROPEIA DOS

DIREITOS DO HOMEM

Além da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, concordamos com certo setor da doutrina59 quando sustenta que, apesar de não ser expressamente reconhecido em outras convenções de direitos humanos, o direito ao desenvolvimento pode ser deduzido também de diferentes instrumentos internacionais de direitos humanos de caráter regional, como a e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969 e a Convenção Europeia de Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais.

A OEA aprovou em S. José-Costa Rica, no dia 22 de novembro de 1969, a Convenção

Americana sobre Direitos Humanos (CADH) que entrou em vigor em 197860.

Com base nos princípios previstos na Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA), na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, CADH também reconhece direitos constitutivos do conteúdo do direito ao desenvolvimento. A título de exemplo, foram identificados os seguintes direitos: direito à vida e a integridade pessoal e proibição da pena de morte (artigos 4.º e 5.º), direitos às liberdades fundamentais como liberdades de consciência e de religião, de pensamento e de expressão, de reunião, de associação e suas garantias judiciais (artigos 7.º, 8.º, 12, 13, 15, 16), direito à propriedade privada (artigo 21), à igualdade perante a lei (artigo 24).

59 Para mais aprofundamento vide: Felipe Isa, op. cit.

60 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana dos Direitos Humanos. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/Basicos/Portugues/c.Convencao_Americana.htm>.Acesso em: 23 maio 2013.

É patente na Convenção o reconhecimento e asseguramento exaustivos dos direitos civis e políticos e não dos direitos econômicos, sociais e culturais. O artigo 26 da referida Convenção sob epígrafe “Desenvolvimento Progressivo” impõe aos Estados-partes a obrigação de adotarem medidas administrativas e legislativas ao nível interno e através da cooperação internacional para tornar efetivos progressivamente os direitos econômicos, sociais e culturais previstas na Carta da OEA.

Sobre este particular, Luís Flávio Gomes e Valério de Oliveira Mazzuoli (2010, p. 195) observam: “Não obstante ter um capítulo único [...] intitulado Direitos Econômicos,

Sociais e Culturais, é fácil perceber que em todo o texto da Convenção Americana não existe

a previsão de sequer um desses direitos econômicos, sociais e culturais [...]” (Grifos do autor). Assim, com base no disposto nos artigos 26 e 77 n. 1, para suprir a referida incompletude, foi aprovado o Protocolo Adicional à Convenção de San. José, também chamado Protocolo de San Salvador de 1999, no qual se reconhecem os direitos econômicos, sociais e culturais que a título de exemplo identifica-se: direito ao trabalho e à segurança e higiene no trabalho, direitos sindicais e à greve, direito à previdência social, direito à saúde, direito a um meio ambiente sadio, direito à alimentação, direito à educação, direito aos benefícios da cultura, direito à constituição e proteção da família, direitos da criança, direito à proteção especial das pessoas idosas, direitos das pessoas portadoras de deficiências (artigos 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18). Os Estados-partes são obrigados a apresentar relatórios periódicos sobre as medidas administrativas, legislativas e outras que adotarem para progressivamente tornarem efetivos os referidos direitos ao Secretário-Geral da OEA nos termos do artigo 19 do Protocolo.

Quanto aos meios de proteção e monitoramento do respeito dos direitos civis e políticos, a Convenção de San José de Costa Rica atribui a competência para reconhecer assuntos a eles relacionados a dois órgãos de proteção dos direitos humanos nomeadamente: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, isto nos termos dos artigos 33 da referida Convenção.

Desse modo, é importante referir ainda que a CADH também prevê a correlação entre direitos e deveres. O artigo 32 estipula que “toda a pessoa tem deveres para com a família, a comunidade e a humanidade. Os direitos de cada pessoa são limitados pelos direitos dos demais, pela segurança de todos, e pelas justas exigências do bem comum, em uma sociedade democrática”.

Assim, “a enunciação de deveres individuais na Convenção Americana é bem mais tímida que a da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, contudo mais avançada

que a Convenção Europeia de Direitos Humanos, na qual não se encontra disposições semelhantes” (GOMES; MAZZUOLI, 2010, p. 215).

Por sua vez, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH)61 aprovada em Roma em 1950 pelo Conselho da Europa e entrou em vigor 1953, hoje designada Convenção da Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais.

A referida Convenção reconhece e protege direitos que integram o conteúdo do direito do direito ao desenvolvimento: direito à vida (artigo 1.º), proibição da tortura (artigo 3.º), proibição da escravatura e do trabalho forçado (4.º), direito à liberdade e à segurança (artigo 5.º); direito a um processo equitativo (artigo 6.º), direito ao respeito à vida privada e familiar (artigo 8.º), direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião (artigo 9.º), liberdade de expressão (artigo 10), liberdade de associação e reunião (artigo 11), proibição da discriminação baseada no sexo, raça, cor, língua, religião, opiniões politicas, origem, riqueza ou nascimento (artigo 14).

Quanto aos meios de proteção e monitoramento dos direitos previstos na Convenção, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem é competente para o efeito nos termos do artigo 19 da CEDH. Nesse âmbito, as pessoas singulares, organização não governamental ou grupo de particular que se considere vítima de violação dos seus direitos podem, nos termos dos artigos 34 e seguintes, recorrer através de petição ou queixa para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

Quanto à proteção dos direitos econômicos, sociais e culturais, no âmbito da União Europeia, foi aprovada a Carta Social Europeia em 1961 e revista em 199662, na qual os Estados-parte comprometeram-se a garantir e promover os direitos econômicos, sociais e culturais. A título de exemplo, citam-se certos direitos: direito ao trabalho (artigo 1.º), direito a condições de trabalho justas (artigo 2.º), direito à segurança e à higiene no trabalho (artigo 3.º), direito do trabalhador a uma remuneração justa capaz de lhe assegurar, assim como sua família, nível de vida decente (artigo 4.º), direito de constituir organização sindical (artigo 5.º), direito das mulheres trabalhadoras à proteção na maternidade (artigo 8.º), direito à igualdade de oportunidade e tratamento em matéria de emprego e profissão sem discriminação baseada no sexo (artigo 20), direito das crianças e adolescentes à proteção (artigo 8.º), direito à proteção da saúde (artigo 11), direito à segurança social (artigo 12),

61 UNIÃO EUROPEIA. Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH). Disponível em: <http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhregionais/conv-tratados-04-11-950-ets- 5.html>. Acesso em: 11 ago. 2013.

62 UNIÃO EUROPEIA. Carta Social Europeia (revista em 1996). Disponível em:

<http://www.fd.uc.pt/CI/CEE/pm/Tratados/Nice/Carta_Social_Europeia_(Revista)%201996.htm >. Acesso em: 11 ago. 2013.

direito à assistência social e médica (artigo 13), direito ao beneficio dos serviços sociais (artigo 14), direito das pessoas com deficiência à autonomia, à integração social e à participação na vida da comunidade (artigo 15), direito da família, das crianças e adolescentes à proteção social, jurídica e econômica (artigos 16 e 17), direito das pessoas idosas a uma proteção social (artigo 23), o direito à proteção contra a pobreza e a exclusão social (artigo 30) e o direito à habitação (artigo 31).

Também merece destaque aqui a Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia de 200063 que contém direitos que integram o objeto do direito ao desenvolvimento entre os quais, o direito a proteção da vida, da dignidade e integridade física da pessoa humana (artigos 1.º-5.º), as liberdades fundamentais e respeito pela vida privada (artigos 6-13, 15, 16), direito à educação (artigo 14), o direito de propriedade (artigo 17), direito à igualdade e não discriminação, igualdade entre homens e mulheres (artigos 20 e 23), direitos e proteção das crianças, das pessoas idosas e das pessoas com deficiência (artigos 24, 25 e 26), direito ao emprego e condições de trabalho justas equitativas (artigos 29 e 31), direitos de acesso a prestações dos serviços sociais e aos serviços sociais (artigo 34), proteção da saúde (artigo 35) e direitos políticos ligados a cidadania (Título V). A Carta também reconhece o papel da União na proteção do meio ambiente e do nível de qualidade de vida de acordo com o princípio do desenvolvimento sustentável bem como o dever de assegurar um elevado nível de defesa dos direitos dos consumidores.

Assim, à guisa de síntese conclusiva, pode-se sustentar que vários autores defendem que o direito ao desenvolvimento encontra fundamento no direito internacional. Para além de Kéba M’Baye e Felipe Gomes Isa, existem outros autores, como Zalmai Haquani, Antônio Augusto Cançado Trindade e Robério Nunes dos Anjos Filho.

Para Zalmai Haquani (1979, p. 22 et seq.) o direito ao desenvolvimento se funda em preceitos morais, em doutrinas e convicções religiosas; e no direito internacional. Haquani cita, por exemplo, documentos da Igreja Católica Romana no qual se podem sustentar a existência e origem do direito ao desenvolvimento, como as encíclicas papais Rerum

Novarum, Mater et Magistra, Gaudium et Spes e Populorum Progressio.

Zalmai Haquani (1978, p. 29-32), defende ainda que o direito ao desenvolvimento funda-se nas constituições das Organizações Internacionais, na Carta das Nações Unidas, no Ato de Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Convenção

63 UNIÃO EUROPEIA. Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia de 2000. Jornal Oficial da União Europeia, C83/389, 30.03.2010. Disponível em:

<http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2010:083:0389:0403:pt:PDF>. Acesso em: 11 ago. 2013.

constitutiva da UNESCO, os Atos constitutivos da FAO e da Organização Mundial da Saúde, a Organização dos Estados Americanos, no Pacto sobre os Direitos Civis e Políticos, o Pacto sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais ambos de 1966, a Convenção relativa à Eliminação e Repressão do Crime de Apartheid, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e Carta Social Europeia; a Convenção Europeia sobre os Direitos Humanos e algumas resoluções e declarações que compõem o costume internacional.

Desse modo, por exemplo, não é outro o entendimento de Antônio A. Cançado Trindade (1993a, p. 175 et seq.), para quem o direito ao desenvolvimento reforça os direitos já existentes e o seu conteúdo já se encontra reconhecidos nos instrumentos de direitos humanos tais como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), os dois Pactos das Nações Unidas de 1966 e a Carta dos Direitos e Deveres Econômicos dos Estados de 1974.

Por outras palavras, mas não em sentido contrário ao exposto até agora, Robério Nunes dos Anjos Filho (2013), por sua vez, defende que, no âmbito jurídico, o direito ao desenvolvimento pode ser extraído dos textos de tratados constitutivos de organizações internacionais ou convenções de proteção dos direitos humanos de âmbito global ou regionais.

Desse modo, para Robério Nunes dos Anjos Filho (2013, p. 151et seq.) podem ser consideradas fontes do direito ao desenvolvimento no plano do direito internacional as seguintes:

a) as Convenções constitutivas de organizações internacionais globais, nomeadamente, o Ato Constitutivo da Organização Internacional do Trabalho (1919), a Carta das Nações Unidas (1945), o Ato de Constituição da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) de 1945, a Convenção constitutiva da UNESCO (1945) e o texto constitutivo da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 1946;

b) as Convenções constitutivas de organizações internacionais regionais, como sejam, a Carta da Organização da Unidade Africana (1963) substituído pelo Ato Constitutivo da União Africana (2000), o Tratado Constitutivo da União Europeia com as devidas inovações até o Tratado de Lisboa (2007), a Carta Constitutiva da Organização dos Estados Americanos (1948) e o ato constitutivo da Associação de Nações dos Estados Asiáticos (1967).

c) as Convenções globais de direitos humanos: Dentre outras, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e o Pato sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial (artigo 2.º), a Convenção sobre a Eliminação contra a Mulher (1979), a Convenção sobre o Direito da Criança (1989), a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais (2005), a Convenção sobre a

Proteção dos Direitos dos Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias (2003) e a Convenção sobre a Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino da UNESCO (1960).

d) as Convenções Regionais de Direitos Humanos: A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (1981), que é o único tratado internacional que consagra expressamente o direito humano ao desenvolvimento, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e a Convenção Europeia para proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais.

Mais adiante, Robério Filho (2013, p. 183, 193 et seq.) sustenta ainda que o Costume Internacional, o Princípio Geral do Direito, a Doutrina e a Jurisprudência também podem constituir verdadeiras fontes do direito humano ao desenvolvimento (sustentável).

Diante das análises feitas, a conclusão, neste capítulo, é de que o desenvolvimento é um direito humano cuja fonte de reconhecimento pode ser identificada nos instrumentos jurídicos internacionais aceites consensualmente (ou não) pelos Estados, como a Carta das Nações Unidas, os documentos internacionais de proteção de direitos humanos, entre os quais a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o PIDCP e PIDESC de 1966 e as Convenções regionais de direitos humanos.

Portanto, como já ficou claro, através da análise destes documentos é possível identificar princípios e direitos que integram o conteúdo do direito ao desenvolvimento, bem como estabelecem a sua titularidade ativa e passiva.

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