• Nenhum resultado encontrado

3 DESENVOLVIMENTO COMO DIREITO HUMANO: CONSENSOS E DISSENSOS

5 O DIREITO (HUMANO) FUNDAMENTAL AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE ANGOLA DE 2010 À

5.2 OS DIREITOS (HUMANOS) FUNDAMENTAIS NA CRA

Como toda constituição de um Estado democrático de direito (ou que se pretenda democrático de direito democrático), a Constituição angolana de 2010, possui um catálogo dos direitos e liberdades fundamentais.

Ao olhar para o direito comparado, precisamente o Direito Constitucional Brasileiro, de acordo com José Afonso da Silva (2012a, p. 182), na CFB, os direitos fundamentais são classificados com base em três fontes dos direitos e garantias, a saber: a) os direitos fundamentais expressos na Constituição; b) os direitos fundamentais decorrentes dos princípios e regime adotados pela Constituição; c) e os direitos fundamentais decorrentes de tratados e convenções internacionais adotados pelo Brasil.

Por seu lado, Flávia Piovesan (2012, p. 114) propõe a seguinte classificação dos direitos previstos na Constituição de 1988, organizados em três grupos distintos: 1) o do grupo dos direitos expressos na Constituição; 2) o grupo dos direitos expressos em tratados internacionais de que o Brasil seja parte; 3) o grupo dos direitos implícitos, aqueles que estão subentendidos nas regras de garantias e aqueles direitos que decorrem do regime e dos princípios adotados na Constituição.

Sobre os direitos fundamentais implícitos, Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2012a, p. 123) observa que “a previsão de direitos fundamentais implícitos leva necessariamente à ideia de que há direitos que, por sua essência [matéria], seriam fundamentais, já que sua fundamentalidade independe de positivação numa Declaração, Constituição, Tratado ou Lei”. Assim, observando os pressupostos teóricos citados, identifica-se que a CRA estabeleceu um catálogo que inclui os direitos, liberdades e garantias fundamentais, os direitos econômicos, sociais e culturais e a cláusula de abertura para os direitos fundamentais não enumerados na Constituição conforme o artigo 26 n. 1.

Nesse sentido, na Constituição angolana de 2010 podem-se identificar três fontes jurídicas dos direitos e garantias fundamentais, que podem ser classificadas do seguinte modo:

Primeiro: Conjunto de direitos, liberdades e suas garantias e direitos econômicos, sociais e culturais expressamente previstos na Constituição (são os direitos elencados no Título II, dos artigos 30 a 88 da CRA).

Segundo: Os direitos fundamentais expressos constantes em leis e regras aplicáveis de

direito internacional (os direitos previstos em leis ordinárias e/ou em tratados ou convenções

internacionais de Direitos Humanos de que o Estado angolano tenha aderido ou ratificado e o costume internacional) de acordo com o previsto no artigo 26, n. 1.

Terceiro: os direitos fundamentais de natureza análoga [que podem ser encontrados entre os direitos fundamentais dispersos na Constituição e aos quais se aplica o regime jurídico dos direitos, liberdades e garantias, conforme preceituado no artigo 27]. São deles exemplos, o direito à igualdade (artigo 23), o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (artigos 29), o direito dos trabalhadores à formação profissional, justa remuneração, descanso, férias, proteção, higiene e segurança no trabalho (artigo 76, n. 2) e direitos das pessoas com deficiência (artigo 83, n. 1).

Quarto: os direitos fundamentais implícitos (aqueles que decorrem da interpretação e integração das regras, princípios e garantias estabelecidas na Constituição, designadamente, do princípio da dignidade da pessoa humana e do Estado de direito democrático na sua dimensão de limitação do poder).

De recordar que a LCRA de 1992 no artigo 21 também já previa que “os direitos fundamentais expressos na presente Lei não excluem outros decorrentes das leis e regras aplicáveis do direito internacional”.

Assim, para além dos direitos fundamentais previstos no catálogo dos direitos, liberdades e garantias e dos direitos econômicos, sociais e culturais, a CRA admite expressamente a existência de direitos fora do catálogo e recepciona outros direitos fundamentais constantes nas leis e regras aplicáveis de direito internacional, concretamente em Tratados ou Convenções internacionais de Direitos Humanos que passam a integrar e ampliar o catálogo dos direitos já estabelecidos na Constituição. Além do mais, os mesmos tratados ou convenções internacionais são partes integrantes da ordem jurídica angolana (artigo 13 da CRA).

Nessa conformidade, a título meramente exemplificativo, os direitos fundamentais na CRA podem ser classificados em quatro grupos:

1) Direitos e liberdades individuais (artigos 23; 30 a 44; 46; 47; 63; 68; 69; 70 a 73). 2) Direitos políticos (artigos 45; 52 a 55 conjugados com os artigos 3.º e 17, 73 e 74). 3) Direitos sociais e econômicos (artigos 76 a 84 e 85).

4) Direitos coletivos (39 n. 3; 49 n. 2; 51 n.1; 74).

5) Direitos de solidariedade (39, 87 e implícitos no artigo 11 e 12).

A CRA possui um catálogo dos direitos fundamentais divididos em duas categorias: os direitos, liberdades e garantias (direitos de primeira dimensão) e os direitos econômicos, sociais e culturais (direitos de segunda dimensão).

Para além destes direitos, pode-se identificar ao longo do texto constitucional, os direitos de terceira dimensão, designadamente, o direito ao meio ambiente (artigo 39), o direito ao patrimônio histórico, cultural e artístico (artigo 87) e o direito à paz que implicitamente se pode deduzir dos princípios fundamentais acima previstos conjugados com o disposto nos artigos 11 e 12 nos quais de entende que “a República de Angola é uma Nação de vocação para paz [...]” e estabelece relações internacionais na base dos princípios “ do direito dos povos à autodeterminação e à independência”, “a solução pacífica dos conflitos”, “cooperação com todos os povos para a paz, justiça e progresso da humanidade”.

Os direitos, liberdades e garantias fundamentais e os direitos de natureza análoga estão sujeitos a uma disciplina jurídica específica (regime jurídico) segundo o qual são diretamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas [poderes legislativo, judicial e executivo] e entidades privadas (artigos 27 e 28 n. 1).

Por sua vez, os direitos econômicos, sociais e culturais estão sujeitos ao regime da implementação progressiva, o princípio do não retrocesso social, dos recursos disponíveis e demandam do Estado prestações fáticas e normativas em razão dos efeitos financeiros que os mesmos podem acarretar (artigo 28 n. 2).

No entanto, nunca é demais esclarecer que, no caso de não satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais, o Estado é sempre responsável por garantir as condições existenciais mínimas para as pessoas, uma vez que a possibilidade de judicialização dos direitos econômicos, sociais e culturais ainda é discutível no âmbito da doutrina.

Nesse sentido, Flávia Piovesan (2012, p. 245 et seq.) defende que a progressividade dos direitos econômicos, sociais e culturais proíbe o retrocesso ou a redução das políticas públicas voltadas à garantia de tais direitos, cabendo ao Estado o ônus de provar ou comprovar que tomou todas as medidas necessárias e possíveis, isto é, que utilizou o máximo dos recursos disponíveis, no sentido de progressivamente concretizar e efetivar tais direitos.

Existem razões para se acolher o pensamento de Flávia Piovesan porquanto a CRA reconhece os direitos econômicos, sociais e culturais como sendo direitos fundamentais. E, na vida prática, verifica-se que não deixa margem para dúvida, o fato de que a não satisfação de alguns desses direitos pode fazer com que determinada pessoa não tenha o mínimo existencial para uma vida digna, como, por exemplo, uma habitação condigna, educação básica ou profissional e a assistência médica e medicamentosa.

Por esse motivo, é importante lembrar que o princípio da concretização progressiva e efetiva de acordo com recursos financeiros disponíveis – reserva do possível- não pode se traduzir no esvaziamento dos direitos sociais, econômicos e culturais nem tão pouco constituir

justificativa para que os governos não executem eficazmente os direitos econômicos, sociais e culturais.

5.3 O DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL AO DESENVOLVIMENTO

Documentos relacionados