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2. A ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL: HISTÓRICO E ATUALIDADE

2.3. A ECONOMIA SOLIDÁRIA COMO HERANÇA DA CONCENTRAÇÃO

2.3.2. As cooperativas agrícolas do MST

Conforme Ferreira (2000) a luta pela terra já é, por si mesma, uma experiência de cooperação, uma vez que foi necessário que os sem terra se juntassem e se organizassem a fim de lutar pela terra. Ou seja, a união entre eles, para a luta pela terra já exigia que agissem de forma cooperada, buscando os mesmos objetivos.

No entanto, no que se refere à cooperação nas unidades produtivas, ela demorou um pouco mais para ocorrer no MST, que só a aceitou diante do desafio de viabilizar a produção nos primeiros acampamentos (FERREIRA, 2000). E isso se deve ao fato de que a ideia inicial do movimento era criar unidades individuais de terras, administradas por seus proprietários individuais que produziriam para o autossustento. No entanto, a produção para a subsistência não foi capaz de melhorar o padrão de vida dos trabalhadores, obrigando alguns deles a

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entregar a terra. Assim, “a partir de 1986, começa a discussão de como organizar os assentados, com o I Encontro Nacional de Assentados, em que estiveram representados 76 assentamentos de 11 estados” (SINGER, 2002b: 13).

A cronologia de como o MST foi gestando a ideia da cooperação é narrada pela Confederação das Cooperativas da Reforma Agrária do Brasil (CONCRAB), que relata que a não alteração na concentração fundiária levou o meio rural a ser marcado pelo desenvolvimento desigual e por um processo excludente, em favor de uma minoria.

O “Plano Nacional do MST” de 1989 a 1993 ao analisar o desenvolvimento do capitalismo no campo brasileiro constata que a estrutura fundiária em sua essência pouco se alterou desde sua formação. O processo de “industrialização” da agricultura a partir dos anos sessenta, não alterou essa realidade do campo dominado econômica e politicamente pelos latifundiários, agora mais integrados aos capitais urbanos industriais, financeiros e comerciais, bem como ao capital internacional que reforçou seu domínio sobre a economia brasileira (CONCRAB, 1999: 05)31.

Entendendo que a luta pela reforma agrária não é tema importante para a “burguesia nacional e ao sistema econômico vigente”, o Plano estava pautado no entendimento de que a reforma agrária deveria estar atrelada à mudança do sistema econômico, em favor de um sistema socialista. Para a CONCRAB (1999: 05), “a resistência dos assentamentos deveria vir na forma de avanço das forças produtivas, no avanço da cooperação produtiva em todas as formas possíveis e viáveis na conjuntura atual”.

Os assentamentos enfrentavam problemas com relação à obtenção de crédito para custeio e investimentos, compras, formas de organização econômica e social, e o MST buscava respostas para estes problemas (CONCRAB, 1999: 06). No entanto, conforme relato da CONCRAB, no início, o MST resistiu à ideia de cooperativismo, uma vez que a experiência que conheciam, era do modelo tradicional, em que haviam grandes empresas agroindustriais que exploravam os agricultores. Porém, “a discussão evoluiu a favor do cooperativismo, em termos que hoje diríamos serem os da Economia Solidária”, segundo Singer (2002b: 13), sendo que sua aceitação ocorreu de forma gradual, conforme relata o trecho abaixo:

Pelo fato de muitas lideranças de base ter sua militância na igreja católica e evangélica de confissão luterana do Brasil, que implementaram a teologia da libertação como instrumento de leitura da realidade brasileira, houve um período

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entre 1979 e 1985 em que a orientação política do MST era a de constituir grupos coletivos, mutirões e associações. No caso das associações houve grande estímulo pelos órgãos governamentais de extensão rural, especialmente a Emater, de constituir associações dos pequenos agricultores. No período de 1985 a 1989 durante a “nova república”, multiplicaram-se as associações também nos assentamentos. No início de 1989 percebeu-se que essa forma de organização tinha limites políticos e legais para responder às necessidades dos assentamentos como forma de organização econômica dos mesmos. A constatação destes limites levou a direção do MST à discussão e estudo de outras formas de organização para dar organicidade aos assentamentos em todo o Brasil. A direção do MST deu dois encaminhamentos políticos para buscar solução do problema: o primeiro foi de fazer um estudo sobre o pensamento clássico do associativismo, como também encaminhou outro estudo sobre a legislação cooperativista. O segundo encaminhamento foi conhecer várias experiências nos diversos países sobre o associativismo (CONCRAB, 1999: 06)32. Com a eleição de Fernando Collor de Melo, em 1989, desencadeou-se um processo de repressão e violência do Estado contra o MST, com a nomeação de um delegado da polícia federal, resultando na perseguição, prisões e instauração de processos contra as lideranças do movimento. O MST buscou, no entanto, fortalecer sua organização interna a fim de enfrentar tal conjuntura, e foi em virtude disso que nasceram os núcleos de base e a ideia de cooperação: “Portanto, a discussão sobre a organização dos núcleos de base e sobre as Cooperativas de Produção Agropecuária (CPA) foi em função do período de repressão intensa que o MST foi submetido. Os núcleos e as CPAs tinham a função de ser a retaguarda de organização política, resistindo política e economicamente” (CONCRAB, 1999: 07)33

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Para Benini e Benini (2008: 13), somente o fato de haver uma inclinação no sentido da formação de cooperativas e associações já era um indicativo de que o movimento dos camponeses dava os “primeiros passos na direção da proposta de Economia Solidária”. Porém, a formação de cooperativas pode ser visto, também, como um facilitador para os trabalhadores camponeses, uma vez que, somente agindo como um “conjunto orgânico e articulado”, eles poderiam obter vantagens nos processos de barganha, obter ganhos de escala, obter melhores preços de venda, planejar melhor a produção, a partir da demanda, etc., podendo enfrentar a figura do “atravessador”.

32 O trecho em questão está citado conforme o original. 33

Contudo, diante da resistência à ideia de cooperação pelo movimento, pelos fatores já mencionados, “o desenvolvimento de formas de cooperação foi um processo gradual, tendo como princípio a multiplicação de associações”. Este processo se deu principalmente em duas direções: “os pequenos grupos e associações coletivas, que estavam mais vinculados à produção; e as grandes associações, que estavam voltadas à prestação de serviços”. A partir destas experiências, somadas às discussões e debates realizadas nos seminários voltados a discutir a organização econômica dos assentamentos, entre 1989 e 1990, foi criado o Sistema Cooperativista dos Assentados (SCA) que conta com Cooperativas de Produção Agrária (CPA), Cooperativas de Prestação de Serviços (CPS) e Cooperativas de Crédito. Além das cooperativas, foram criadas também, associações, grupos semicoletivos e grupos coletivos. Estas instituições estavam associadas, em segundo nível, à Central de Cooperativas de Assentados (CCA), e em terceiro nível, à Confederação das Cooperativas da Reforma Agrária do Brasil (CONCRAB) (FERREIRA, 2000).

As Cooperativas de Produção Agropecuária (CPA) foram implantadas a partir de 1989, de forma experimental, com a finalidade de organizar a produção nos assentamentos. De acordo com Ferreira (2000: 83), elas representam “uma forma superior de organização da produção”, e “possuem personalidade jurídica, são registradas como empresas cooperativas e regidas pela legislação cooperativa brasileira”.

As Cooperativas de Prestação de Serviços (CPS) eram dedicadas à comercialização – à “organização da compra e venda de insumos, e da produção, de bens de consumo para os associados”. Eram responsáveis ainda, pela assistência técnica, pelo serviço com as máquinas, com a formação política e a capacitação técnica, pela organização da produção (neste caso, no sentido de definir a estratégia de desenvolvimento da região, definir as linhas de produção, etc.), pela implantação de unidades de processamento (como moinhos de milhos, descascadores de arroz, despolpadeira, etc.). Geralmente, atendiam a um assentamento, ou a um conjunto de assentamentos de um município (FERREIRA, 2000: 83-84).

As Cooperativas de Crédito vinculavam-se à estratégia política do MST, bem como ao Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), e tinha como finalidade facilitar o acesso ao crédito, como forma de elevar a renda familiar dos associados, a fim de garantir sua permanência no campo. Elas apresentam os seguintes objetivos: “estimular a cooperação no

crédito; construir um sistema de crédito cooperativo próprio do MST; possibilitar acesso a crédito a todos os trabalhadores rurais; estimular a produção agropecuária, diversificando as linhas de financiamento; qualificar e potencializar o uso dos recursos conquistados; reter e aplicar a renda agrícola em poupança interna, no meio rural; capacitar e qualificar os agricultores na gestão financeira creditícia; promover articulação com outros setores da sociedade” (FERREIRA, 2000: 84-85).

De acordo com a CONCRAB treze linhas políticas orientaram a organização do SCA:

Desenvolver e estimular as formas de cooperação agrícola nos assentamentos, como única forma de aumentar as potencialidades de produção e produtividade, como: compra de máquinas e meios de produção; trabalho coletivo, com maior divisão do trabalho; moinhos comunitários e outras agroindústrias; armazéns e todo tipo de benfeitorias.

Avançar ao máximo para desenvolver a cooperação agrícola dos níveis mais complexos, socializando a terra e todos os meios de produção.

Desenvolver, através da cooperação agrícola, a apropriação da tecnologia disponível, estimulando a mecanização de todas as atividades possíveis e aumentando a escala de produção, de forma adequada a realidade socioeconômica e de recursos naturais do assentamento.

Garantir que o processo de desenvolvimento da cooperação agrícola não represente apenas avanços econômicos, mas que seja acompanhado por um processo de discussão político e de integração de companheiros cooperantes nas demais organizações sociais.

Estimular a implantação de associações de cooperação agrícola em dois níveis: a) pequenas associações em grupos coletivos, buscando o máximo de coletivização da terra e de meios de produção; b) grandes associações, que possam envolver o número máximo de companheiros dos assentamentos em grandes atividades produtivas, com grandes insumos indivisíveis, como por exemplo: exploração de madeira, olaria, moinhos, máquinas de beneficiamento de produtos agrícolas, agroindustriais, etc.

Estimular o desenvolvimento das centrais de comercialização reunindo muitos assentamentos ou grupos coletivos que sejam a nível estadual ainda que, inicialmente, aglutinem apenas uma região prioritária.

Garantir que as centrais de comercialização para compra e venda de produtos de necessidade dos assentamentos, sejam implantadas em maior escala possível, para poder competir no mercado.

Estimular a possibilidade de participação de outros grupos de cooperação agrícola de pequenos agricultores, não assentados nas centrais de comercialização.

Trabalhar na perspectiva de, nos próximos anos, ter uma empresa nacional para as atividades de comercialização.

Estimular, através de cooperação agrícola, a implantação de agroindústrias nos assentamentos para aproveitar nossos produtos e matérias-primas ou recursos naturais disponíveis.

Estudar a possibilidade de implantação nos assentamentos, com maior número de pessoas, indústrias que absorvam muita mão de obra.

Buscar, através da cooperação agrícola, outras alternativas de produção agropecuária nos assentamentos, viáveis economicamente como por exemplo: criação de animais confinados, criação de rãs, criação de aves, etc.

Estimular o intercâmbio nacional no campo da cooperação agrícola e troca de experiências (CONCRAB, 1999: 08-09)34.

A implantação do SCA enfrentou dificuldades, tais como: existência de associações incipientes e informais, com dificuldades para gerar “compromissos e obrigações formais entre os associados”; a permanência de vícios de comportamento dentro das associações, tais como: individualismo, oportunismo, autossuficiência, etc.; “falta de capacidade administrativa na gestão das associações”; desconhecimento das leis e princípios da cooperação; dificuldade para implantar normas de trabalho e regras sociais para pautar as ações dos grupos coletivos de produção e comercialização; dificuldades para planejar, coordenar e ampliar as escalas de produção e comercialização; “existência de problemas e conflitos com assentamentos individuais; falta de realização de planejamento das atividades de produção e comercialização”; “dispersão de esforço e utilização inadequada da mão de obra, com baixa produtividade do trabalho; os problemas administrativos ou de relacionamento pessoais facilmente provocam a dissolução e/ou divisão dos grupos; dificuldade de acesso ao crédito rural, de maneira coletiva” (CONCRAB, 1999: 07).

A implantação de um Sistema Cooperativista dos Assentados foi importante para viabilizar a produção e comercialização e mesmo o crédito nos assentamentos. Dentre as metas que nortearam a construção do SCA, estão:

 Construir referências política, econômica e ideológica da organização de assentamentos, nas diferentes regiões do país, criando orientação para a organização de novos assentamentos, bem como para a agricultura familiar;

 Construir “um novo tipo de camponês”, por meio de uma qualificação de sua consciência social, sendo necessário, para tal: repensar a convivência social, evitando o isolamento das famílias em seus lotes; rever a organização das cooperativas, a fim de criar uma dimensão mais de comunidade que de empresa econômica; estimular valores como a solidariedade, o voluntariado, o trabalho e respeito à vida; elevar o nível cultural das famílias; gerar a resistência econômica dos assentados, em um contexto de

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globalização; definir estratégias de preservação ambientar para as áreas da reforma agrária (FERREIRA, 2000: 90-91).

No início a SCA se voltou apenas às questões econômicas, ignorando as questões políticas e sociais. Contudo, por força das próprias circunstâncias, isto é, após uma crise das CPAs, ela entendeu a importância de se voltar também para as questões políticas e sociais.

Para Ferreira (2000) os resultados deste processo se encontram tanto no âmbito da organização política, quanto nos resultados econômicos dos assentamentos, refletindo em melhor qualidade de vida para os assentados. Sob a perspectiva dos aspectos políticos e organizativos, a autora menciona que o fato de ter sido criado de maneira independente à Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), que é representante do cooperativismo tradicional, confere autonomia às cooperativas do MST em relação ao governo e às grandes corporações, o que lhes garantiu independência com relação a sua atuação política (e isso tem sido de suma importância na história do MST, uma vez que assim, ele consegue manter seu discurso em prol dos seus princípios), como liberdade de expressão, de maneira que, diferentemente do que ocorre com as cooperativas da OCB, o cooperativismo do MST representa “um instrumento de luta e de classe”. Com isso, pode-se dizer que a importância política das ações cooperativas foi tamanha que “em alguns casos, as CPS assumiram o papel do 'Estado planejador', centralizador e estimulador da produção” (FERREIRA, 2000: 87). Ainda que reconheça a inserção no mercado como necessário para garantir a sobrevivência das cooperativas do SCA, Ferreira destaca que os coletivos buscaram se diferenciar por meio dos coletivos de direção, priorizando a “organicidade, ligada a algum organismo de base”. Assim, a autora reconhece que, para além de serem empresas econômicas, as cooperativas do SCA devem ser vistas também, como empresas de caráter político. Outra importante conquista foi no que se refere à implementação da democracia nos assentamentos. Ela se dá tanto no sentido ascendente – isto é, em que as discussões sobre os problemas enfrentados pelas cooperativas, os planos de trabalho parte do núcleo de base para a coordenação dos núcleos e para a Assembleia geral –, como descendente – em que ocorre o movimento oposto, isto é, as decisões tomadas nos núcleos são aplicadas. Com isso, as SCAs garantiram conquistas tanto no sentido político, como em termos organizativos para os assentamentos e os assentados.

No que se refere aos resultados econômicos e à qualidade de vida, Ferreira (2000) destaca o acesso ao capital, ao conhecimento e à qualificação do processo agroindustrial como conquistas de algumas cooperativas, ainda que isso tenha se dado a partir da integração destas com as grandes indústrias. A organização cooperativa possibilitou aos assentamentos a comercialização com os mercados locais, o que possibilita fugir da “supremacia da grande empresa capitalista”; além de oferecer vantagens com relação a custos de transporte e uso de uma estratégia de “apelo ao consumo do produto regional”; as cooperativas puderam ainda, utilizarem os próprios equipamentos nas comercializações e realizar as vendas diretamente ao consumidores, o que é importante por aumentar o poder de inserção.

A atuação das CPSs foi importante por livrar os assentados das ações dos atravessadores. Já as CPAs romperam com a monocultura, possibilitando a implantação da diversificação, que foi importante para aumentar o nível de renda dos mesmos. Prova disso, segundo Ferreira (2000) é que o nível de renda dos cooperados é maior que dos assentados individuais e também dos pequenos agricultores de uma mesma região.

Dentre as conquistas obtidas estão ainda: o planejamento da produção, que foi possibilitado por meio das cooperativas – assim, organizou-se a produção, tanto para o autoconsumo, quanto para o mercado (local e regional e o grande mercado); a organização dos processos produtivos levou as cooperativas a perceberem a necessidade de melhorar a “formação técnica dos dirigentes, aperfeiçoamento de professores, agentes de saúde, comunicadores e programas de enfrentamento do analfabetismo”; já a implantação das Cooperativas de Crédito garantiu o acesso ao crédito para uma parcela maior dos pequenos agricultores, assegurando a circulação de renda dentro do SCA.

Algumas cooperativas criaram os serviços, como: educação, saúde, embelezamento dos assentamentos, organização das sedes e trabalhos artesanais, como forma de promover a ocupação do máximo possível da mão-de-obra disponível. A criação de creches e refeitórios coletivos possibilitou a atuação das mulheres na produção, o que criou mais postos, já que demandou mais mão de obra para estas funções.

Em suma, “a cooperação possibilitou maior convívio social, melhorando a infraestrutura básica, a educação, o transporte coletivo, a saúde e o lazer. Surgiram creches e refeitórios”.

Acarretou, também, melhorias para a qualidade de vida dos assentados, por meio da distribuição de alimentos, e de recursos destinados a serviços de saúde e educação. Assim:

O padrão de vida das pessoas engajadas nas CPA é superior ao daquelas que vivem e trabalham nas cidades da mesma região, considerando-se carga de trabalho e a renda obtida. É em média também superior ao dos posseiros, meeiros e até grande parcela de pequenos agricultores que ainda resistem no campo (FERREIRA, 2000: 88).

Por fim, Ferreira menciona uma questão de suma importância para o processo de mudança, presente tanto nas propostas do MST, como da Economia Solidária: “o ato cooperativo muda o pensamento das pessoas envolvidas”, isso porque as cooperativas, as associações, os grupos coletivos e as agrovilas possibilitaram maior convívio social que, por sua vez, acarreta a troca de ideias e de informações. Estas, somadas aos processos de experimentação contribuem para a tomada de consciência – seja em relação às questões ambientais, buscando preservar a natureza; seja em relação à distribuição da renda; seja em relação a sua própria produção, já que eles utilizam os gêneros alimentícios que produzem; seja para a adoção dos valores essenciais para a criação de uma nova sociedade35. Assim, “a consciência das tarefas do SCA foi incorporada, não apenas na produção, mas como forma de propaganda da reforma agrária. É um fator motivador deste movimento de massa que é o MST” (FERREIRA, 2000: 90).

Diante do legado de atuação e dos feitos do MST é que Benini e Benini (2008) destacam que o objetivo do MST estava além da conquista de lotes de terras:

Mais que um conjunto de lotes para os agricultores familiares, dotados de algumas infraestruturas básicas, na lógica do desenvolvimento solidário a meta seria a constituição de verdadeiras comunidades rurais, nas quais o ponto de referência seria a constituição de uma identidade coletiva, com seus próprios ritos e atividades culturais, um verdadeiro núcleo irradiador de todo um processo amplo de mudança. Mudança no sentido de outras formas de convivência social, outros tipos de arranjos produtivos, formas de organização política organicamente articuladas, enfim, mudança na relação propriedade/comunidade e na própria relação básica homem/natureza (BENINI e BENINI, 2008: 12).

Ferreira (2000: 81) vai além, ao destacar que “a luta pela terra é, antes de tudo, uma luta contra a essência do capital: a expropriação e a exploração”. Sendo assim, “cada assentamento conquistado pelo MST passa a ser um espaço dos sem terra, que vislumbram sempre uma

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nova conquista. Por essa razão, o MST leva a luta pela terra a uma territorialização, ao mesmo tempo em que o torna um movimento social”.