• Nenhum resultado encontrado

Percepções sobre as contradições e dificuldades de inserção e sobrevivência dos empreendimentos de economia solidária no mercado

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Percepções sobre as contradições e dificuldades de inserção e sobrevivência dos empreendimentos de economia solidária no mercado"

Copied!
306
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

EDNALVA FELIX DAS NEVES

Percepções sobre as contradições e dificuldades de

inserção e sobrevivência dos empreendimentos de

economia solidária no mercado

CAMPINAS

2016

(2)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

EDNALVA FELIX DAS NEVES

Percepções sobre as contradições e dificuldades de

inserção e sobrevivência dos empreendimentos de

economia solidária no mercado

Prof. Dr. Miguel Juan Bacic – orientador

Profa. Dra. Isabel Gemma Fajardo Garcia – co-orientadora

Tese apresentada ao Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutora em Desenvolvimento econômico, na área de Economia Social e do Trabalho.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA EDNALVA FELIX DAS NEVES E ORIENTADA PELO PROF. DR. MIGUEL JUAN BACIC.

CAMPINAS 2016

(3)
(4)

TESE DE DOUTORADO

EDNALVA FELIX DAS NEVES

Percepções sobre as contradições e dificuldades de

inserção e sobrevivência dos empreendimentos de

economia solidária no mercado

Defendida em 26/02/2016

(5)

Ao meu pequeno Daniel – para que ele nunca se conforme com um mundo injusto e opressor!

(6)

E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José? e agora, você?

você que é sem nome, que zomba dos outros, você que faz versos, que ama, protesta? e agora, José? Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora, José? E agora, José? Sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro, sua incoerência, seu ódio - e agora?

quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora? Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse... Mas você não morre, você é duro, José! Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, sem teogonia, sem parede nua para se encostar, sem cavalo preto que fuja a galope, você marcha, José! José, para onde?

(7)

AGRADECIMENTOS

O momento de escrever os agradecimentos é, também, de um sentimento de finalização de uma etapa, de dever cumprido! E é neste momento que me ponho a pensar em tudo e todos que, no decorrer destes anos de doutorado cruzaram meu caminho e, de alguma forma, contribuíram para que ele fosse feito.

Primeiramente, quero agradecer a Deus, em quem busco sabedoria e forças para caminhar. Um Deus que vejo sábio, cheio de amor e que cuida e não julga ou pune seus filhos, mas acolhe, ensina e ama! E na figura de seu filho, Jesus, com quem aprendi muito sobre autogestão, solidariedade (do tipo libertadora) e luta contra a opressão.

Aos meus pais Benício (in momorian) e Arlinda, pela vida, pelos cuidados, pelos ensinamentos, por todas as vezes que abdicaram de algo em prol de mim! Pelo amor incondicional!

Aos meus irmãos (biológicos e “adotados”) que me apoiam, me incentivam e acreditam em mim. Por me acolherem nos momentos difíceis, me auxiliarem, me ajudarem a escolher o caminho certo, e por me fazerem sentir segura e protegida. E aos meus cunhados, sobrinhos, e todos os familiares que estiveram presentes neste processo.

Ao meu marido/esposo/companheiro Ramón, que entrou em minha vida para me mostrar que amar pode ser simples, e implica em cuidados, atenção, dedicação e aprendizados. Por todo o carinho dedicado no decorrer da escrita desta tese! E por cuidar de mim e do Daniel enquanto eu mergulhava neste mundo solitário da escrita!

Ao meu pequeno filho Daniel, que chegou de repente, e me fez rever toda minha vida, minha postura diante da vida, minha forma de lidar com as pessoas. Que me ensinou que é possível amar sem medidas, sem limites, incondicionalmente. Por encher meu coração da mais genuína felicidade!

Aos meus amigos e amigas, todos e todas que, de uma maneira ou de outra, estiveram presente em minha vida, muitos, socorrendo-me em momentos difíceis. Outros, apoiando com ideias, conselhos, carinhos, acolhimentos, mensagens...

Aos seres iluminados que me socorreram e ampararam em momentos estratégicos: Dri/Saldanha, Almir/Amandha e Linda/Carlos, Eliane, Carol Bagattolli/Tiago, Carol Pereira, Pati, Analu, Carol Justo, Fer Sabarim, Mari Machitte, sem os quais, a finalização

(8)

deste trabalho teria sido impossível! Estou cada vez mais convencida de que Deus coloca anjos disfarçados de gente na Terra para nos ajudar em momentos difíceis.

Ao professor Miguel Bacic, primeiro, por aceitar me orientar, por acreditar no meu projeto, mesmo sem me conhecer. E também, por acolher minhas dúvidas e angústias, orientar meu trabalho, minhas escolhas, no percurso do doutorado, entender minhas dificuldades e me ajudar a resolvê-las, possibilitar minha participação em eventos importantes, e especialmente, no doutorado sanduiche, e enfim, por ser mais que um simples orientador de tese, por ser um orientador de uma aluna cheia de sonhos, mas também, com dificuldades imensas para concluir o doutorado. Por ser sempre ágil, solícito e presente. E especialmente, por me apoiar e me auxiliar a concluir minha pesquisa durante minha gestação e, depois, com um bebê recém-nascido!

À professora Gemma Fajardo, por me orientar no doutorado sanduíche, pelo acolhimento, pelas deliciosas conversas sobre a história da Espanha, da Economia Social, sobre a vida... Por ter feito parte de uma fase tão importante da minha vida acadêmica e pessoal.

Aos professores que avaliaram meu trabalho, no Exame de Qualificação (Márcia Leite e Márcio Pochmann); e na Defesa do Doutorado (Ana Lúcia, Eliane, Leandro e Proni)!

À todos os professores do Instituto de Economia com quem tive aula ou com quem tive conversas, que me ajudaram a refletir sobre o tema, bem como a todos os colegas com quem pude ter aula, discutir/refletir, aprender...

Aos amigos do Grupo de Análise de Política de Inovação (GAPI), com quem dei passos importantes na construção de parte das reflexões aqui realizadas.

Aos professores Carlos Etulain e Edmundo Jr, e a todos os alunos e alunas da Faculdade de Ciências Aplicadas da UNICAMP, com quem pude conviver e aprender.

Às “meninas” das secretarias do IE (Fátima, Marinete, Andreia, Vania, Geisa...; Cida e Susete), por resolverem as inúmeras burocracias, e facilitarem nossas vidas. Em especial, à Fátima, pelo apoio e incentivo para o doutorado sanduíche.

Ao Pedro Biffi, por abrir as salas de aula todas as manhãs. E, especialmente, pelas lindas rosas que cultiva, e que nos saúdam todas as manhãs no prédio da pós.

Ao “pessoal da biblioteca”, por cuidar com tanto zelo dos acervos, e nos auxiliar nos momentos de desespero (em busca das bibliografias).

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela concessão da bolsa de doutorado e doutorado sanduiche.

(9)

RESUMO

Percepções sobre as contradições e dificuldades de inserção e sobrevivência dos empreendimentos de economia solidária no mercado

O último quarto do século XX no Brasil foi marcado por profundas mudanças do mercado de trabalho, como desemprego e precarização do trabalho, fatores que, somados às questões sociais, historicamente existentes no país (como a pobreza, a má distribuição da renda, e a concentração fundiária), levaram ao surgimento de um contingente de desempregados, pauperizados e socialmente excluídos que tiveram que buscar alternativas de sobrevivência, gerando seu próprio trabalho e renda: as iniciativas que receberam o nome de Economia Solidária surgiram na sociedade brasileira neste período – isto é, apareceram por volta da década de 1980 e se proliferaram na década de 1990. Os Empreendimentos de Economia Solidária têm enfrentado grandes dificuldades para se inserir e sobreviver no mercado (capitalista) – dificuldades estas relacionadas às questões econômicas, sociais, ambientais, educacionais, culturais, tecnológicos, etc. Especialmente no que se refere à questão econômica, estes empreendimentos têm tido dificuldades para enfrentar a concorrência, devido a vários fatores que os fragilizam – dificuldades de reduzir custos, de realizar investimentos, de obter crédito, de comercializar seus produtos, etc.

O objetivo desta pesquisa foi analisar as condições de inserção e sobrevivência dos Empreendimentos de Economia Solidária no mercado capitalista, e discutir sobre a importância do papel das políticas públicas no fomento à Economia Solidária.

A pesquisa confirmou a hipótese de que os EES enfrentam grandes dificuldades para se inserir e se manter no mercado. Ficou claro, ainda, que em países em que há um ativo apoio e fomento às iniciativas de Economia Solidária (ou Social) por meio das políticas públicas, estas experiências têm maiores chances de sobreviver e de se fortalecer – este é o exemplo da Espanha.

Palavras-Chaves: Economia Solidária; Fragilidades dos Empreendimentos de Economia Solidária; Inserção e sobrevivência dos Empreendimentos de Economia Solidária no mercado.

(10)

ABSTRACT

Perceptions about the contradictions and difficulties of insertion and survival of the solidary economy enterprises in the market

The last quarter of the twentieth century in Brazil was marked by profound changes in the labor market, as: unemployment and job insecurity. This factors and also the social issues that, historically, already existing in the country (as poverty and inequality distribution of income, and the land concentration) result in the emergence of a contingent of unemployed, poor people and socially excluded who had to seek alternative means of survival, creating their own employment and income.: the initiatives were named Solidary Economy emerged in Brazilian society during this period, that is, appeared around the 1980s and grew in the 1990s.

The Solidary Economy Enterprises have faced great difficulties to insert and survive in the market (capitalist) – these difficulties are related to economic, social, environmental, educational, cultural, technological issues, etc. Especially with the economic question, these enterprises have had difficulty to compete due to several factors that weaken – difficulties to reduce costs, to invest, to get credit, market their products, etc.

The goal of this research was to analyze the conditions of integration and survival of Solidary Economy Enterprises in the capitalist market, and discuss about the importance of the role of public policy for to promote the solidarity economy.

The research confirmed the hypothesis that the Solidary Economy Enterprises face great difficulties to insert and remain in the market. It was clear also that in countries where there is an active support and promote the Solidarity (or Social) Economy initiatives through public policies, these experiences are stronger and survive longer – this is what happens with Spain, for example.

Keywords: Solidary Economy; Fragilities of Solidary Economy Enterprises; Insertion and survival of the Solidary Economy Enterprises in the market.

(11)

RESUMEN

Las percepciones sobre las contradicciones y dificultades para la inclusión y supervivencia de las empresas de economía solidaria en el mercado

El último cuarto del siglo XX en Brasil fue marcado por profundos cambios en el mercado de trabajo, como el desempleo y la inseguridad laboral, factores que, sumados a los problemas sociales, que históricamente ya existían en el país (como la pobreza, la mala distribución del ingreso, y concentración de la tierra), dio lugar a la aparición de un número de desempleados, pobres y socialmente excluidos, que tuvo que buscar alternativas de supervivencia, y generar de su propio trabajo y ingresos: las iniciativas que recibieron el nombre de Economía Solidaria surgieron en la sociedad brasileña en este período – es decir, ellas aparecieron alrededor de la década de 1980 y se proliferaron en la década de 1990.

Las empresas de Economía Solidaria enfrentan grandes dificultades para se insertar y sobrevivir en el mercado (capitalista) – estas dificultades relacionadas con las cuestiones económicas, sociales, ambientales, educativas, culturales, tecnológicas, etc. Especialmente con respecto a la cuestión económica, estas empresas han tenido dificultades para competir debido a varios factores que las debilitan – las dificultades para reducir costes, para invertir, para obtener crédito, comercializar sus productos, etc.

El objetivo de este trabajo de investigación fue analizar las condiciones de inserción y de supervivencia de las empresas de Economía Solidaria en el mercado capitalista, y discutir acerca de la importancia del papel de las políticas públicas en el fomento de la Economía Solidaria.

La investigación confirmó la hipótesis de que las empresas de Economía Solidaria se enfrentan a grandes dificultades para se insertar y sobrevivir en el mercado. Se quedó claro también que en los países donde hay un apoyo activo y promoción a las iniciativas de Economía Solidaria (o Social) a través de las políticas públicas, estas experiencias tienen más probabilidades de sobrevivir y fortalecerse – este es el ejemplo de España.

Palabras clave: Economía Solidaria; Fragilidades de las empresas de Economía Solidaria; La inserción y la supervivencia de las empresas de Economía Solidaria en el mercado.

(12)

Sumário

RESUMO ... vii

ABSTRACT ...viii

RESUMEN ... ix

INTRODUÇÃO ... 1

APRESENTAÇÃO DO TEMA E HIPÓTESES ... 1

OBJETIVOS ... 6

METODOLOGIA ... 7

DISPOSIÇÃO DOS CAPÍTULOS ... 9

1. A ECONOMIA SOCIAL E SOLIDÁRIA SOB UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA 11 1.1. O HISTÓRICO DO COOPERATIVISMO E DA ECONOMIA SOCIAL ... 11

1.1.1. O cooperativismo sob a perspectiva dos pensadores da economia política clássica ... 12

1.1.2. O cooperativismo sob a perspectiva dos pensadores da escola marginalista . 14 1.1.3. O cooperativismo sob a perspectiva da escola econômica neoclássica ... 16

1.1.4. O cooperativismo sob a perspectiva dos anticapitalistas ricardianos e dos socialistas utópicos ... 21

1.1.5. O cooperativismo sob a perspectiva Karl Marx ... 22

1.1.6. O cooperativismo sob a perspectiva da literatura econômica do Bem Estar Social ... 24

1.2. A ECONOMIA SOCIAL NA EUROPA: PRINCÍPIOS, CONCEITOS E ATORES ... 27

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS ... 44

2. A ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL: HISTÓRICO E ATUALIDADE ... 49

2.1. O SURGIMENTO DAS EMPRESAS RECUPERADAS SOB A INFLUÊNCIA DA CRISE ECONÔMICA E DO DESEMPREGO ... 50

2.1.1. O último quarto de século no Brasil: crise econômica e políticas neoliberais ... 51

2.1.2. Desemprego e desestruturação do mercado de trabalho no Brasil ... 59

(13)

2.2. POBREZA, CONCENTRAÇÃO DE RENDA E ECONOMIA SOLIDÁRIA ... 78

2.2.1. A formação de um "exército" de excluídos para a Economia Solidária ... 78

2.2.2. A proposta de geração de trabalho e renda por meio do cooperativismo popular... 85

2.3. A ECONOMIA SOLIDÁRIA COMO HERANÇA DA CONCENTRAÇÃO FUNDIÁRIA NO BRASIL ... 98

2.3.1. Concentração de terras no Brasil e pobreza no campo ... 98

2.3.2. As cooperativas agrícolas do MST ... 108

2.4. A ECONOMIA SOLIDÁRIA NA ATUALIDADE ... 117

2.4.1. A caracterização da Economia Solidária... 128

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS ... 135

3. A ECONOMIA SOLIDÁRIA E O MERCADO CAPITALISTA ... 137

3.1. O MERCADO CAPITALISTA ... 137

3.2. ECONOMIA SOCIAL E SOLIDÁRIA E O MERCADO CAPITALISTA: A EXPERIÊNCIA DA ESPANHA ... 141

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS ... 153

4. CONDIÇÕES DE ENTRADA E COMPETIÇÃO NO MERCADO CAPITALISTA ... 157

4.1. AS ASSIMETRIAS E A CUMULATIVIDADE COMO IMPEDITIVOS PARA A ENTRADA (E PERMANÊNCIA) DE NOVAS EMPRESAS NO MERCADO ... 158

4.2. AS BARREIRAS À ENTRADA DE NOVAS EMPRESAS NO MERCADO: QUESTÕES ESTRUTURAIS, PREÇOS E MARGEM DE LUCRO ... 162

4.3. A INSTABILIDADE DO PROCESSO DE INOVAÇÃO E O ESPÍRITO EMPREENDEDOR ... 176

4.4. OUTRAS QUESTÕES ESTRUTURAIS: INVESTIMENTO, CRÉDITO E COMERCIALIZAÇÃO ... 191

5. A ATUAÇÃO DOS EES NO MERCADO: SUAS CONTRADIÇÕES E FRAGILIDADES ... 197

5.1. ECONOMIA SOLIDÁRIA E ECONOMIA CAPITALISTA ... 197

5.2. ESTRUTURA, CRÉDITO E FINANCIAMENTO DOS EES ... 203

(14)

5.4. INOVAÇÃO TECNOLÓGICA, EMPREENDEDORISMO E ECONOMIA

SOLIDÁRIA ... 223

5.4.1. Empreendedorismo e Economia Solidária ... 226

5.5. A COMERCIALIZAÇÃO NOS EES ... 237

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS ... 245

6. POLÍTICAS PÚBLICAS E ECONOMIA SOLIDÁRIA ... 251

6.1. AS POLÍTICAS PÚBLICAS E AS MEDIDAS DE APOIO E FOMENTO À ECONOMIA SOCIAL NA ESPANHA ... 251

6.1.1. As políticas de fomento à Economia Social no âmbito da Administração central ... 259

6.1.2. As políticas de fomento à Economia Social no âmbito das comunidades autônomas ... 263

6.1.3. Medidas de apoio e fomento à Economia Social na Espanha ... 267

6.2. APOIO E FOMENTO À ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL ... 271

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 277

(15)

INTRODUÇÃO

APRESENTAÇÃO DO TEMA E HIPÓTESES

As experiências de trabalho baseadas na autogestão, na solidariedade e cooperação não são recentes. Elas sempre existiram na sociedade humana e, enquanto experiências contestatórias, elas surgiram, se desenvolveram e acompanharam o sistema capitalista.

No caso do Brasil, as experiências de Economia Solidária vêm chamando a atenção de estudiosos do mundo do trabalho e das questões sociais nos últimos anos. É importante ressaltar que o movimento que recebeu o nome de Economia Solidária teve origem em um momento histórico próprio, na sociedade brasileira, marcado por um contexto econômico, político e social específicos. Assim, é possível afirmar que a Economia Solidária surgiu no contexto brasileiro, no período compreendido como o último quarto do século XX, marcado pela inflexão das taxas de crescimento econômico, a adesão às políticas neoliberais, bem como pela crise do desemprego, pela existência de um enorme contingente de pobres e por uma gritante desigualdade social.

Por ter surgido neste momento histórico, a maioria dos pensadores da Economia Solidária afirma que a ela é fruto dos problemas econômicos e da opção política deste período (décadas de 1980-90). Contudo, é preciso lembrar que o Brasil já contava com um enorme problema social, marcado pela concentração de renda e de terras, e pela existência um contingente significativo de pessoas vivendo em situação de pobreza e indigência.

Para construir o percurso histórico do surgimento da Economia Solidária no Brasil, Lechat (2005: 06) destaca como aspectos importantes e sinalizadores deste processo, as “condições socioeconômicas e políticas” das décadas que antecederam ao seu aparecimento: os “embates da sociedade civil frente à crise e ao desemprego estrutural”; e mesmo o “terreno onde vão brotar as experiências de Economia Solidária”1. De acordo com a autora:

1 A autora destaca que a análise também pode ser feita a partir do processo contrário ao que foi apresentado, isto

(16)

O que hoje é denominado de Economia Solidária ficou por décadas imerso; e ainda o é, em muitos casos, no que a literatura científica chama de autogestão, cooperativismo, economia informal ou economia popular. Uma prova disto é a polêmica, ainda existente, a respeito do atributo popular acrescido à Economia Solidária ou ao cooperativismo, denominados então de economia popular solidária, ou cooperativismo popular (LECHAT, 2005: 06).

As formas alternativas de produção englobam todas as iniciativas que se diferem das propostas produtivas da sociedade capitalista – marcadas pela concentração dos meios de produção, dos frutos do trabalho e pela gestão centralizada. A Economia Solidária é uma das formas alternativas de produção, pautada nos princípios da cooperação, da solidariedade e autogestão. Por possuir seu próprio contexto histórico, econômico e social, e possuir seus próprios atores e sua própria localização (o Brasil e alguns países latino americanos), a Economia Solidária pode receber sua própria denominação, que a difere das demais formas alternativas de produção.

Esquema 01: Formas alternativas de produção e Economia Solidária.

Fonte: Elaboração própria.

Formas alternativas de produção

Economia Solidária

(17)

Ou seja, a Economia Solidária faz parte das formas alternativas de produção, porém, nem todas as formas alternativas de produção são Economia Solidária. Para que uma experiência seja considerada de Economia Solidária, ela deve apresentar, também, um conjunto de características próprias, conforme especificado acima – e que será melhor detalhado no segundo capítulo desta tese.

As experiências de Economia Solidária têm enfrentado muitas dificuldades para sobrevivência. Estas dificuldades estão relacionadas a aspectos econômicos, políticos, sociais, ambientais, culturais, científicos e tecnológicos, jurídicos, de gestão, dentre outros, conforme discutido em trabalho anterior (NEVES, 2011). No que se refere especialmente ao aspecto econômico, pode-se dizer que os Empreendimentos de Economia Solidária (EES) têm tido dificuldades para se inserir e sobreviver no mercado capitalista. Além das dificuldades relacionadas ao ambiente interno, estes empreendimentos são sufocados pelos processos de concorrência no mercado, sucumbindo, na maioria das vezes (NEVES, 2012).

Além da fragilidade que os EES enfrentam quando se inserem no mercado, o tema suscita ainda uma questão que tem gerado polêmica entre os teóricos: os EES devem se preparar para competir no mercado – aderindo assim, à lógica capitalista da competição – ou devem romper com esta lógica, ainda que isso implique na fragilidade dos EES? Este tema tem gerado debates e discussões, dividindo pensadores, conforme foi discutido em Neves (2012).

Duas hipóteses foram importantes para a realização desta pesquisa. A primeira é que os Empreendimentos de Economia Solidária (EES) enfrentam grandes dificuldades para se inserir no mercado e, portanto, para sobreviver. Devido a isso, muitos deles já faliram e, dentre os que continuam ativos, a dificuldade é gerar um volume de renda suficiente para garantir melhorias nas condições de vida e, portanto, promover a inclusão social dos trabalhadores dos EES (a maioria dos trabalhadores destes empreendimentos tem uma remuneração extremamente baixa, incapaz de suprir suas necessidades básicas, como alimentação, vestuários, medicamentos, dentre outros), além da dificuldade de gerar uma quantidade de postos de trabalho capaz de ocupar os trabalhadores que continuam desempregados e socialmente excluídos.

A inserção e sobrevivência de empresas no mercado tem sido foco de pesquisas de diversos autores que dedicaram seus trabalhos ao estudo da competitividade capitalista, a fim de

(18)

entender o ambiente competitivo e as “regras” do mercado, como é o exemplo do trabalho de Silva (2004), no livro intitulado “Concorrência sob condições oligopolistas” – por meio do qual ela resgata estudos de diversos autores que vêm estudando a questão do ambiente competitivo, isto é, as condições de entrada e sobrevivência de uma empresa no mercado; as barreiras que o mercado impõe à entrada de novas empresas; a influência das condições estruturais para a entrada de empresas no mercado; o preço como um possível mecanismo de barreira à entrada ou mesmo como fator de expulsão de empresas de um mercado já consolidado; a questão do financiamento, como fator essencial para a manutenção das empresas no mercado e mesmo para seu crescimento, etc.

Ao se inserir no Mercado, uma empresa enfrenta duas “frentes de batalhas”: uma interna, no ambiente produtivo, isto é, que diz respeito à relação entre os atores que estão envolvidos no processo produtivo; outra externa, relacionada à inserção dos empreendimentos no mercado, à concorrência entre empresas/empreendimentos (DAGNINO, 2010). Os EES também possuem estas duas “frentes de batalhas” (interna e externa), conforme foi destacado em trabalho anterior (NEVES, 2012b).

Apenas no que se refere à lógica interna, os EES podem decidir sobre sua estratégia de ação, isto é, de acordo com seus princípios. Contudo, a decisão sobre a estratégia de atuação externa ao empreendimento não cabe a eles, isto é, a forma como deverão agir no mercado, com relação aos demais empreendimentos não depende de decisões dos EES, mas sim, da própria dinâmica do mercado. Em suma, os trabalhadores dos EES conseguem agir de forma cooperativa, solidária e autogestinária nas relações entre si, na organização do processo interno de trabalho, na produção e gestão dos EES. Porém, quando se inserem no mercado, estes empreendimentos são obrigados pela própria lógica do mercado a competir, isto porque a “regra básica” do mercado é a competição. Para tal, as empresas (e também os EES inseridos no mercado) precisam adotar estratégias, como: redução de custos, inovações tecnológicas, diferenciação de produtos, etc.

Alguns autores chamam a atenção para a importância do investimento para promover o crescimento e consolidação das empresas no mercado (KALECKI, 1978; KEYNES, 1999). É por meio dele que as novas empresas podem, por exemplo, tentar transpor as barreiras colocadas pelas empresas estabelecidas. Além de ser importante para garantir a sobrevivência

(19)

e o crescimento das empresas, o investimento é fundamental para possibilitar o processo de inovação, que pode garantir ganhos de competitividade no processo de concorrência entre as empresas. As empresas que têm condições de realizar investimentos têm maiores e melhores chances de competir no mercado. No caso dos EES, é visível suas dificuldades em realizar investimentos. Isso explica, em parte, as dificuldades que estes empreendimentos enfrentam para competir, já que a não realização de investimentos pode afetar a entrada, permanência e consolidação dos EES no mercado.

Por outro lado, o crédito tem papel de grande importância para viabilizar os investimentos (SCHUMPETER, 1997). No entanto, os EES têm tido dificuldades para ter acesso a crédito. Estas dificuldades afetam a realização dos investimentos nos EES, o que pode afetar sua inserção e sobrevivência no mercado, bem como, seu crescimento e consolidação.

Outro fator de extrema importância é a questão da comercialização. É por meio dela que é possível a qualquer empreendimento fechar o ciclo “produção-comercialização-geração de renda e/ou riqueza”. Os EES têm tido dificuldades para comercializar seus produtos e, assim, gerar a renda necessária para os trabalhadores. Esta questão também explica, em parte, as dificuldades de inserção, consolidação e sobrevivência os EES no mercado.

A segunda hipótese é de que a Economia Solidária é resultado de: i) um processo histórico de concentração fundiária e de renda, e polarização da riqueza no Brasil, responsáveis por causar pobreza e exclusão social; ii) e também, dos graves problemas econômicos do final do século XX, especialmente, a estagnação do crescimento, a inflação e a adesão às políticas neoliberais no Brasil. A maioria dos estudos sobre Economia Solidária (SINGER, 2000; GAIGER, 2003; e outros) aponta apenas a crise econômica e a adesão às políticas neoliberais como fatores que ocasionaram o surgimento da Economia Solidária no Brasil. Porém, nossa principal hipótese a respeito deste tema é de que a Economia Solidária nasceu não apenas devido a este fator, mas também, da existência de um grande contingente de pobres e socialmente excluídos no Brasil, e que este processo é fruto:

 Da concentração de terras (ainda na gênese da formação da sociedade brasileira);

 Da concentração de renda, justificada pela “teoria do bolo” (primeiro crescer, para depois distribuir);

(20)

 Do desigual processo de industrialização, que provocou desigualdade de crescimento econômico entre os estados e regiões brasileiras;

 Do processo de polarização e fragmentação da classe trabalhadora, ocorrido em virtude das desiguais oportunidades de trabalho entre os trabalhadores, devido às diferenças nas ocupações e nos salários, nas diferenças do processo de desenvolvimento regional, e nas oportunidades de emprego e de qualificação da mão de obra;

 E por fim, da estagnação econômica da década de 1980 e abertura econômica e financeira da década de 1990, que acarretaram mudanças para o mercado de trabalho brasileiro, como o desemprego, a precarização do trabalho, a pauperização e a exclusão social de parcela da classe trabalhadora, e que agravou o problema, já que somou ao (já existente) contingente de pobres, uma quantidade extra de desempregados.

OBJETIVOS

Diante do exposto, o principal objetivo deste trabalho é analisar as condições de inserção e perspectivas de sobrevivência dos Empreendimentos de Economia Solidária no mercado capitalista, frente às fragilidades da Economia Solidária, e discutir sobre a importância do papel das políticas públicas no fomento à Economia Solidária.

Os objetivos específicos deste trabalho são:

 Construir o percurso histórico, econômico e social que deu origem à Economia Solidária no Brasil, por meio do levantamento das causas (históricas) da pobreza, concentração de terras e de renda, e do desemprego e do processo de precarização do trabalho que assomou a sociedade brasileira no final do século XX.

 Investigar as condições de inserção e sobrevivência dos Empreendimentos de Economia Solidária no mercado capitalista, tanto sob a perspectiva das “regras” do mercado, como as ações dos EES neste processo. E, a partir desta análise, caracterizar a Economia Solidária no Brasil.

(21)

 Discutir a importância das políticas públicas para o apoio e fomento da Economia Solidária no Brasil, a partir da experiência das políticas de apoio e fomento à Economia Social na Espanha.

METODOLOGIA

Este trabalho foi feito por meio de revisão bibliográfica, análise de dados secundários, do Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária (SIES-2012)2, e revisão bibliográfica sobre a Economia Social na Espanha (e Europa), por meio de um período de estágio doutoral (Doutorado Sanduíche) no Instituto Universitario de Economía Social y Cooperativa (IUDESCOOP) de la Universidad de Valencia, na Espanha.

Especificando a metodologia, pode-se dizer que:

Foi realizado um levantamento e revisão bibliográfica dos seguintes temas: concentração de renda; concentração fundiária; crise e estagnação econômica, políticas neoliberais e as mudanças no mercado de trabalho no último quarto do século XX; o histórico do surgimento da Economia Solidária no Brasil; mercado concorrencial (capitalista); condições de inserção de empresas no mercado; políticas públicas de Economia Solidária.

É importante salientar que grande parte da bibliografia utilizada no trabalho foi “garimpada” das disciplinas cursadas no Programa de Doutorado em Desenvolvimento Econômico, bem como do curso de Economia Social e Sindicalismo, oferecido pelo Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (CESIT), da UNICAMP – especialmente as bibliografias relacionadas às transformações econômicas e no mundo do trabalho; e as à questão do funcionamento do mercado concorrencial.

2

(22)

Após leitura, reflexão e escrita sobre as bibliografias, foi realizado um levantamento de dados do SIES no site do próprio sistema: foi feita uma triagem dos dados, a fim de separar aqueles que seriam utilizados na análise; os dados selecionados foram tabulados e foram construídos gráficos e tabelas para facilitar a visualização dos mesmos no trabalho; em seguida, foi realizada a análise dos dados, a partir das leituras dos textos que abordam o funcionamento do mercado. Esta análise serviu para mostrar as fragilidades dos Empreendimentos de Economia Solidária, no tocante a vários temas abordados (motivação empreendedora, comercialização, crédito e financiamento, etc.).

No decorrer do trabalho, os constantes diálogos com o orientador, Prof. Dr. Miguel Bacic, suscitou a ideia de que poderia ser interessante buscar experiências de Economia Social e/ou Solidária que apresentassem um histórico diferente da realidade brasileira. A atuação em um congresso realizado na Universidade de Valência, no ano de 2012, possibilitou contato com pesquisadores do tema da Economia Social na Espanha. Assim, foi decidido que seria importante avaliar a experiência espanhola, já que, em princípio, ela parecia sinalizar um contexto diferente de inserção e sobrevivência das empresas da Economia Social no mercado. Como resultado deste contexto foram feitos contatos com a professora Gemma Fajardo, da Universidade de Valência, para que orientasse o trabalho de doutorado sanduiche naquele país. Também foram feitos os trâmites legais para a realização de um período de seis meses de doutorado sanduíche naquele país – que foi possível por meio de uma bolsa concedida pelo Programa de Doutorado-sanduíche no Exterior (PDSE), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

Uma vez na Espanha, foram realizados contatos e diálogos com pesquisadores da Economia Social, além da participação em um evento na área – o Primeiro Encontro da Red de Investigadores en Economia Social (REJIES) e o Seminário em Administración Publica y Economia Social, ambos realizados na cidade de Zaragoza-Espanha.

Assim, foram levantadas bibliografias que permitiram entender a realidade da Economia Social na Espanha (e também na Europa), em especial, no que se refere à inserção e sobrevivência das empresas da Economia Social no mercado, e no apoio e fomento da Economia Social por meio das políticas públicas.

(23)

Após análise deste material bibliográfico, e de volta ao Brasil, foi feita uma comparação entre a realidade espanhola e a brasileira, no tocante aos dois temas mencionados.

DISPOSIÇÃO DOS CAPÍTULOS

O primeiro capítulo está dividido em duas seções: a primeira apresenta um breve histórico do cooperativismo, sob a perspectiva de vários economistas, a fim de mostrar que a abordagem do tema não é recente e que ele pode ser feito sob diversas perspectivas. A segunda seção discute a Economia Social na atualidade, a partir dos princípios, atores e conceitos utilizados na Espanha e demais países da Europa.

O segundo capítulo está dividido em duas seções. A primeira seção tem como foco a discussão sobre os fatores do surgimento da Economia Solidária no Brasil, a partir de três contextos: i) a histórica pobreza e concentração de renda no Brasil e sua influência sobre a existência de um contingente de pobres nas zonas urbanas na década de 1980/90; ii) a histórica questão da concentração fundiária no Brasil, responsável por gerar um contingente de pobres no campo e que, com a questão da modernização do campo, contribuiu, também, para aumentar a pobreza urbana; iii) a crise econômica e social da década de 1980, somada à adesão às políticas neoliberais, a partir do final desta mesma década, responsáveis por gerar desemprego e pobreza nas cidades, além causar a precarização do trabalho.

A segunda seção é dedicada à abordar os princípios da Economia Solidária e, também, o papel que ela desempenha na atualidade. Além disso, nesta seção será apresentada uma pequena caracterização da Economia Solidária no Brasil, por meio da análise dos dados do SIES.

O terceiro capítulo tem por objetivo discutir a questão do mercado, começando pela construção do entendimento do que é o mercado sob a lógica concorrencial/capitalista. Em

(24)

seguida, é feita uma discussão sobre o posicionamento ideológico dos pensadores espanhóis sobre a inserção das empresas de Economia Social no mercado, naquele país.

O objetivo do quarto capítulo é discutir o funcionamento do mercado concorrencial/capitalista, a partir de temas como: a questão do custo de produção, da assimetria entre as empresas, do acúmulo de vantagens; do processo de constante criação e destruição, bases para o processo de inovação tecnológica; as barreiras à entrada no mercado; a questão da comercialização; o investimento e o crédito. Antes. Este capítulo fornece as bases para a análise da Economia Solidária, o que é feito no capítulo seguinte.

O quinto capítulo tem por objetivo, portanto, analisar as condições dos EES perante esta lógica mercadológica. Para fazer esta análise, as condições de funcionamento do mercado, levantadas no capítulo anterior, são confrontadas com a realidade dos EES, por meio dos dados do levantamento realizado pelo SIES3 (2012).

Por fim, após o entendimento de que existem outras experiências de formas alternativas de produção em outros países, o capítulo sexto traz uma análise do papel das políticas públicas de apoio e fomento à Economia Social na Espanha, com o objetivo de trazer a reflexão para a necessidade de se pensar em políticas que possam fomentar a Economia Solidária no Brasil. Por fim, apresentaremos as considerações finais obtidas a partir desta análise. Vale ressaltar que neste capítulo, buscaremos retomar e reforçar algumas das conclusões obtidas, já que em todo o trabalho, elas já vão sendo apresentadas.

3

(25)

1. A ECONOMIA SOCIAL E SOLIDÁRIA SOB UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA

As formas alternativas de produção não são exclusividade do Brasil. Elas têm surgido em vários países, em diferentes momentos históricos, com distintas nomenclaturas (Cooperativismo, Economia Social, Autogestão, etc.). O que faz com que estas experiências se assimilem é a organização da produção com base na cooperação, a justa distribuição dos resultados entre todos os envolvidos (solidária) e a tomada de decisão em ambiente democrático ou autogestionário. A experiência da cooperativa de Rochdale se tornou símbolo da luta contra o sistema capitalista pela construção de uma alternativa com base nos ideias alternativos da autogestão. Assim, as experiências posteriores a Rochdale têm em comum o resgate de seus princípios cooperativistas e a crítica ao capitalismo.

O objetivo deste capítulo é resgatar o histórico do cooperativismo e da Economia Social, a fim de situar a Economia Solidária como uma vertente deste movimento, ainda que, a experiência brasileira apresente suas particularidades, conforme será melhor discutido no segundo capítulo desta tese.

A seção a seguir apresenta um resgate histórico do cooperativismo, sob várias perspectivas do pensamento econômico, assim, é possível perceber que a proposta cooperativista não é exclusividade do pensamento socialista. A segunda seção aborda a perspectiva mais atual da Economia Social, que vem acompanhando a própria evolução do capitalismo, como forma contestatória deste sistema, e também, como proposta alternativa de produção e organização da sociedade.

1.1. O HISTÓRICO DO COOPERATIVISMO E DA ECONOMIA SOCIAL

A maioria dos trabalhos sobre o cooperativismo atrela o tema aos pensadores socialistas, contudo, há intelectuais de diferentes linhas do pensamento dedicando-se a entender/explicar o fenômeno – desde a literatura clássica, passando pela marginalista, neoclássica, socialista e, mais recentemente, literatura do Bem Estar Social. Monzón (2003: 11) afirma que “a literatura econômica tem dedicado uma discreta, porém significativa atenção ao fenômeno

(26)

cooperativo, desde o florescimento da economia clássica liberal até a consolidação dos Estados de Bem-Estar”. Na verdade, a forma cooperativa de organização do processo de trabalho não se difere muito nos diferentes tempos e lugares. O que mudam são as interpretações dos pensadores do tema acerca do papel do cooperativismo. O resgate histórico feito pelo autor (MONZÓN, 1989; 2003)4 mostra a perspectiva cooperativista a partir de seis escolas de pensamento econômico, conforme veremos a seguir.

1.1.1. O cooperativismo sob a perspectiva dos pensadores da economia política clássica

O interesse pelo tema do cooperativismo já está presente mesmo na escola de pensamento da economia política clássica. Sob esta perspectiva, é possível distinguir dois tipos de visões (e literaturas econômicas) sobre o fenômeno. O primeiro surgiu como uma reação à publicação da primeira edição da obra “Ensaio sobre o princípio da população”, de 1798, de Thomas Malthus5. Esta obra coincidia com a ascensão do socialismo associativista e com a utopia owenista que defendia o cooperativismo como a força capaz de eliminar a competição e, assim, destruir o sistema capitalista, criando em seu lugar, um novo sistema: o socialista. Em confronto com Owen, Malthus traçou duras críticas ao sistema proposto por ele, por acreditar que este sistema conduziria à pobreza e à miséria em níveis universais, já que não solucionaria o problema do aumento populacional (MONZÓN, 2003: 13-14).

Esta visão demonstra como pensavam os clássicos daquela época: “frente à proposta de substituição do sistema capitalista por um sistema cooperativo alternativo, os economistas clássicos ortodoxos reagiram com uma desqualificação global de tais propostas”. O confronto

4 Para a elaboração deste trabalho, Monzón menciona ter consultado os seguintes autores: Malthus (1977);

Schumpeter (1971); Mill (1951); Fuentes (1967); Hesselbach (1978); Wagner (1914); Dal Pane (1966); Marshall (1919; 1949); Pigou (1925); Walras (1865; 1898); Lavergne (1955); Pareto (1960); Pantaleoni (1898); Morton (1962); Cole (1964); Viviani (1979); Bravo (1976); Lambert (1959); Lowit (1962); Marx (1973; 1977); Marx e Engels (1848); Hesselbach (1978); Vienney (1980); Horvat (1972); Giannola (1973); Robinson (1967), dentre outros. Todas estas bibliografias se encontram no trabalho de MONZÓN (1980; 2003).

5 Na obra em questão, Malthus propôs uma teoria em que afirmava que a população mundial crescia em progressão geométrica, enquanto a produção de alimentos, em progressão aritmética. Desta forma, chamava a atenção para um possível desequilíbrio e, assim, à miséria.

(27)

entre os socialistas e os clássicos ultrapassou o campo ideológico e alcançou o campo político, um bom exemplo disso foram os debates sobre a Lei dos Pobres, em 1819, envolvendo Robert Owen (defensor da lei) David Ricardo (contrário à lei) (MONZÓN, 2003: 14).

A segunda visão sobre o cooperativismo tem como marco importante a obra de John Stuart Mill, que deu importante contribuição ao estudo do tema, especialmente naquela época, uma vez que os clássicos que o antecederam não trataram do assunto. Embora Mill fosse um pensador liberal, sua obra apresentou importantes diferenças de análises das obras de seus antecessores Smith e Ricardo, no que se refere a discutir a economia sob uma perspectiva social, além de abordar o tema do associativismo dos trabalhadores.

Stuart Mill observou de forma atenta o associativismo empresarial ente os trabalhadores, tanto na forma do cooperativismo, como do mutualismo. Na obra Principles of Political Economy, ele analisou de maneira detalhada as vantagens e desvantagens das cooperativas de trabalhadores, recomendando, ao final, o incentivo a este tipo de empreendimento, por suas vantagens econômicas e morais. Ele entendia que as cooperativas de trabalhadores fariam uma “revolução moral” na sociedade, por promover o apaziguamento do conflito entre capital e trabalho. Sua influencia foi importante, por exemplo, para a aprovação, em 1852, da primeira lei que regulamentava o cooperativismo, a Industrial and Provident Societies Act, na Grã-Bretanha (MONZÓN, 1989).

Mill não partilhava das ideias dos pensadores que o antecederam, no que diz respeito ao estado estacionário da economia. E, ainda que também fosse um liberal, tentava entender o antagonismo existente entre “liberdade política e harmonia social”, o que também o diferia dos seus antecessores (MONZÓN, 2003: 14). Partindo desta forma de análise, ele discutiu, no sétimo capítulo, do quarto livro da obra já mencionada, sobre o papel das cooperativas. Ele sugeria a generalização do cooperativismo como forma de promover a justiça social, por representar uma maneira mais benéfica de ordenar a produção industrial.

Conforme pontua Monzón (2003: 15) muitas das análises deste pensador a respeito das cooperativas dizem muito da realidade atual, especialmente no que se refere aos seus pontos fortes e fracos. O caráter econômico, como o aumento da produtividade do trabalho, e os

(28)

aspectos relacionados à índole moral, por exemplo, são pontos fortes e que, segundo o autor, poderiam contribuir para generalizar uma “revolução moral na sociedade”, isso porque:

O apaziguamento do conflito entre o capital e o trabalho; a transformação da vida humana, convertendo a atual luta de classes que tem interesses opostos em uma rivalidade amistosa na perseguição um bem que é comum a todos, a elevação da dignidade do trabalho; uma nova sensação de seguridade e de independência da classe trabalhadora e o ato de converter as ocupações cotidianas do ser humano em uma escola de simpatias sociais e de compreensão prática (MILL, 1951: 675 apud MONZÓN, 2003: 15).

Contudo, ainda que Mill visse de forma positiva a organização cooperativa da produção, ressaltou também os pontos fracos da forma associativa, relacionados: 1) à problemas com a direção das cooperativas (segundo ele, uma direção individual seria mais eficiente que uma direção coletiva); 2) aos riscos (para ele, as cooperativas estariam menos propensas a realizar poupança e investimentos que as empresas capitalistas); 3) e por fim, à possibilidade de degeneração em organizações não participativas (em que Mill destaca o risco das cooperativas mudarem seu foco inicial, tornando-se organizações não cooperativas, isto é, de haver uma degeneração de seus objetivos e princípios iniciais)6 (MONZÓN, 2003).

1.1.2. O cooperativismo sob a perspectiva dos pensadores da escola marginalista

O período compreendido entre 1843 a 1873 marcou o desenvolvimento da literatura econômica, enquanto que a segunda metade do século XVIII (mais propriamente, a década de 1870) marcou a transição para a análise econômica marginalista, que contou com a expansão da análise econômica para os demais países europeus (MONZÓN, 1989; 2003). Sob influência da escola alemã, o tema do cooperativismo foi abordado apenas de forma indireta, quando o pensador Wilhelm Von Hermann (1795-1868) apresentou o conceito de Gemeinwirtschaft, relacionando-o à economia de interesse geral, “para referir-se à todas as empresas, setores e sistema econômicos baseados no princípio do bem comum, sem se

6 Monzón (2003: 16) destaca que depois de Mill, poucos economistas britânicos clássicos ortodoxos se

(29)

importar que se tratasse de economias familiares, empresas ou verdadeiros sistemas econômicos de caráter geral” (MONZÓN, 2003: 16). Ainda sobre a contribuição dos pensadores alemães, o autor declara que:

Na Velha Escola História alemã, Roscher se volta sobre o tema de interesse geral e na Nova Escola História, Schaffle chega a sugerir uma ideia da [economia cooperativa ou social] Gemeinwirtschaft estendida a todo o sistema econômico, um “estado social e racional” com certificados de dinheiro respaldado pelo trabalho, a propriedade pública e o planejamento (…). Wagner [Adolf Wagner (1835-1917)] também rejeitou o laissez-faire manchesteriano e, aceitando a propriedade privada como base de uma ordem econômica social, atribui ao Estado um papel essencial na direção da economia, conferindo um importante peso à economia de interesse geral o marco de mercado (MONZÓN, 2003: 16-17; grifos nossos).

A Itália também exerceu grande influência na construção do pensamento econômico desta época. Emilio Nazzani (1832-1904) foi o primeiro economista importante a abordar o tema do cooperativismo na Itália. Para ele, “as cooperativas de trabalho poderiam ser um instrumento útil para afrontar os problemas do desemprego”. No entanto, por ser um pensador da teoria clássica, Nazzani não se preocupou em questionar o papel das cooperativas no mercado. Ao contrário, para ele, a liberdade de mercado deveria ser mantida, e a importância do cooperativismo se dava por seu relevante papel nas políticas de emprego. Outro pensador, Luigi Luzzatti (1841-1927), “foi um dos maiores apóstolos e teóricos da cooperação e da legislação social na Itália”. Ele introduziu o cooperativismo de crédito na Itália, “seguindo o modelo de (Herman) Schulze-Delitsch”, um liberal alemão que impulsionou a cooperação de crédito entre as camadas médias urbanas alemãs (MONZÓN, 2003: 17; grifos nossos).

Porém, quem de fato, deu início ao debate sobre o modo próprio de ser das cooperativas na Itália foi Leone Wollemborg, um liberal social que impulsionou o cooperativismo de crédito nos meios rurais, por meio do artigo La teorica della cooperazione. Seu conceito de cooperativas se assemelha ao de empresas de serviços. Ele diferencia a associação cooperativa de uma especulativa e também da caritativa, destacando seu caráter de organização espontânea e coletiva da produção industrial, submetida à necessidade comum (MONZÓN, 2003).

Seguindo a linha de Wollemborg, posteriormente Ugo Rabbeno (1863-1897), aluno de Luigi Cossa, continuou a defender a existência de uma natureza própria das cooperativas, que as

(30)

diferenciava das demais empresas. Ele destacava o fato de as cooperativas produzirem para satisfazer as necessidades dos membros e defendia a expansão das cooperativas nos seguintes casos: em indústrias simples, como no caso dos setores industriais de produtos de baixo consumo, e também nos casos de produção e serviços em que houvesse a possibilidade de o trabalho se sobressair ao capital; nos casos em que não houvesse necessidade de grandes investimentos de capitais, ou de uma rígida divisão do trabalho, ou onde houvesse necessidade de grandes habilidades artesanais; em trabalhos considerados estáveis e constantes; em que a qualidade dos sócios gerasse maior economia; quando houvesse elevadas qualidades econômicas e morais dos sócios; e, de maneira geral, nos casos em que o trabalho associado pudesse melhorar as condições de concorrência frente às grandes empresas, pela comercialização ou pela compra de matéria-prima (MONZÓN, 2003).

Rabbeno não se opunha à atuação do Estado em favor das cooperativas (como no caso de concessão de crédito, dentre outras), uma visão diferente daquela apresentada pelos demais liberais sociais. No entanto, ele defendia que esta atuação poderia se dar em casos em que as cooperativas estivessem bem organizadas e apresentassem boas condições de competir no mercado. Ou seja, para este pensador, as cooperativas deveriam agir de forma parecida às demais empresas no mercado (MONZÓN, 2003).

1.1.3. O cooperativismo sob a perspectiva da escola econômica neoclássica

A Grã-Bretanha foi pioneira no interesse dos pensadores econômicos sobre o tema do cooperativismo: é o caso do britânico Thomas Malthus e John Stuart Mill. A partir da revolução marginalista, pensadores de outros países passaram a se interessar pelo tema, é o caso da Alemanha, Itália e França, entre outros.

Conforme Monzón (1989) houve pouca atenção dos pensadores da economia neoclássica ao tema do cooperativismo na Grã-Bretanha, “ainda que a escola fundada por Alfred Marshall (1842-1924) tenha dedicado certo interesse ao tema da participação dos trabalhadores na empresa e nas cooperativas”. Marshall chegou mesmo a defender que a produção de algumas

(31)

indústrias fosse feita por associações de trabalhadores, tendo como base a igualdade. Ele retomou o tema do cooperativismo, mais tarde, em 1889, ao “reiterar que a entrada dos trabalhadores nos conselhos de administração das empresas [apresentava] vantagens reais de tipo econômico, permitindo uma redução de mão de obra por unidade de produto” (MONZÓN, 2003: 19; grifos nossos).

Neste momento, a intenção deste pensador era abordar o tema sob a perspectiva econômica, o que é comum na visão neoclássica, isto é, sob a perspectiva da melhoria nos custos de produção e não sob uma perspectiva das (possíveis) melhorias para a classe trabalhadora. Apenas posteriormente, ele voltou a abordar o tema sob uma perspectiva de que o trabalho cooperativo poderia acarretar melhorias na poupança das classes trabalhadoras e ser vantajoso para a criação de emprego.

Dois sucessores de Marshall na Cátedra de Cambridge deram sequência ao debate, porém, mostraram mais interesse pela participação dos trabalhadores na empresa, que pelo próprio tema do cooperativismo: Cecil Arthur Pigou que, mesmo não se mostrando um otimista do cooperativismo, acreditava que seria possível que nas associações de trabalhadores, como as cooperativas, o produto marginal líquido social pudesse ser superior ao produto marginal líquido privado, o que ele via como uma vantagem. O outro pensador, Dennis Holme Robertson, demonstrava uma certa precaução com relação à atuação dos sindicatos, porém, acreditava que esta atuação poderia ser utilizada em favor da empresa, desde que se mostrasse, segundo ele, como uma força utilizada com responsabilidade, de maneira moderada e com mais reflexão (MONZÓN, 2003).

Na França, o representante do pensamento neoclássico que mais se dedicou ao tema do cooperativismo foi Leon Walras (1834-1910). A obra walrasiana Études d'économie sociale: théorie de la répartition de la richesse sociale marcou uma importante ruptura com o enfoque original da Economia Social:

Com Walras, a Economia Social passou a formar parte da ciência econômica e se tornou um campo de atividades econômicas que prolifera entre as cooperativas, as mútuas e as associações, da maneira que as conhecemos atualmente. Foi no final do século XIX que tomaram forma as principais características do conceito moderno de Economia Social, inspirada pelos valores de associativismo democrático, o mutualismo e o cooperativismo (MONZÓN e CHAVES, 2012: 17).

(32)

Walras considerava que as cooperativas podiam solucionar os conflitos sociais por desempenhar um importante papel econômico. Porém, não se tratava de suprimir o capital, mas de possibilitar que o mundo se tornasse “menos capitalista”, além de introduzir a democracia no ambiente produtivo, o que conferia um importante papel moral à sociedade (MONZÓN e CHAVES, 2012: 17). O interesse deste pensador pelo cooperativismo “transcendeu o marco exclusivamente teórico e desempenhou um papel no movimento cooperativo”, já que ele fundou, “inclusive, uma revista de economia política, Le Travail, dedicada ao tema do cooperativismo”. Para este pensador, a importância do cooperativismo se devia a sua forma complementar (e não transformador) ao sistema capitalista, isso porque este pensador acreditava que as cooperativas se inseriam melhor na etapa da produção que na distribuição de mercadoria e, com isso, “a ação cooperativa permitia inserir os trabalhadores nas leis de mecanismos do capitalismo liberal”. Em suma, Walras não defendia o cooperativismo como uma possível alternativa ao capitalismo (MONZÓN, 1989; 2003: 20).

Outros dois importantes pensadores neoclássicos franceses foram Charles Gide (1847-1932) que fazia parte da escola solidarista e Bernard Lavergne (1884-1975). Gide foi presidente de honra do II Congresso das Cooperativas da França, no ano de 1886 e, neste mesmo ano fundou, juntamente com Boyve e Fabre, a Escola de Nîmes, que sistematizava o pensamento cooperativista vinculado às ideias de Fourier – dentre as quais, destacam-se: a abolição da luta de classes, por meio da supressão dos salários, a intermediação do comércio e dos “patrões da produção” (PINHO, 1982; AGUIAR e REIS, 2002: 173). Ele também foi responsável por organizar as ideias cooperativistas que estavam dispersas, o que o tornou muito conhecido e foi importante para a repercussão do cooperativismo em todo o mundo. Gide enumerou o que considerou ser as doze virtudes do cooperativismo:

 Viver melhor ou conseguir melhor nível de vida, através do auxílio mútuo;  Pagar em dinheiro, a fim de evitar a dívida, que considera uma das formas de escravidão;

 Poupar sem sofrimento, já que a devolução dos ganhos sob a forma de retorno dos excedentes, proporcionalmente às operações realizadas pelos sócios na cooperativa, lhes permite economizar sem sacrificar a satisfação das necessidades;

 Suprimir os parasitas, ou seja, eliminar os intermediários, de maneira a reduzir ao mínimo os órgãos de transmissão das riquezas do produtor ao consumidor;

 Combater o alcoolismo – finalidade educativa já acentuada pelos Pioneiros de Rochdale;

(33)

 Interessar as mulheres nas questões sociais, pois, sendo elas quem cuida do lar e faz as compras, devem conhecer os problemas do consumo e das cooperativas de consumo;

 Educar economicamente o povo, tornando-o apto para a autogestão econômica e política;

 Facilitar a todos o acesso à propriedade;

 Reconstituir uma propriedade coletiva através da formação de um patrimônio cooperativo, que é coletivo e está a serviço de um interesse geral e permanente, acima de nossas existências efêmeras;

 Estabelecer o justo preço, mas remunerando convenientemente todo trabalho consagrando à produção, inclusive o trabalho de direção e os trabalhos intelectuais preparatórios;

 Eliminar o lucro capitalista, criando a preocupação com a satisfação das necessidades dos homens e não com a obtenção de lucros;

 Abolir os conflitos – na cooperativa de consumo, o consumidor torna-se seu próprio fornecedor; Na cooperativa de produção, o operário torna-se seu próprio patrão, na cooperativa de crédito, o sacado torna-se o seu próprio sacador; na cooperativa de habitação, o locatário torna-se seu próprio locador e assim por diante, de modo que a disputa cessa pela fusão dos inimigos, ou melhor, o combate cessa por falta de combatentes (PINHO, apud AGUIAR e REIS, 2002: 173-174; grifos/marcadores nossos).

Gide acreditava que por meio do “reino do consumidor” seria possível realizar a transformação da sociedade, através de pequenas cooperativas locais, que se relacionassem entre si, conquistando, assim, a “república cooperativa”. Esta conquista se daria em três etapas: pela conquista do comércio que constituiria capitais; com estes, seria possível conquistar a indústria, que seria propriedade do movimento cooperativista, para então, conquistar a agricultura. Gide foi um grande crítico da competição e dos benefícios. Porém, tanto sua metodologia, como grande parte de suas concepções científicas eram inspiradas nos pensadores neoclássicos – ele partilhava, por exemplo, das concepções neoclássicas do valor utilidade, da formação de preços e também do equilíbrio geral. Em virtude disso, para Monzón (1989), ele também pode ser considerado um pensador neoclássico.

A Escola de Nimes representou, em grande parte, a forma de pensar e mesmo a atuação de Gide. Trata-se de uma experiência importante pós Rochdale e fora do território inglês, que teve grande influência sobre o movimento cooperativista, tanto que serviu de inspiração para a Aliança Cooperativa Internacional, fundada em 1895, em Londres (MONZÓN, 2003: 20).

Bernard Lavergne (1884-1975), sucessor de Gide na Escola de Nimes, foi o segundo grande nome francês da época neoclássica a tratar o tema do cooperativismo. Sua contribuição ao tema foi de grande importância por desenvolver um novo conceito de cooperativismo público

(34)

(régie coopérative) e, assim, introduzir o tema da cooperação no direito público. Ele propunha que os poderes públicos criassem cooperativas compostas pelas pessoas que atuavam no direito público. O objetivo desta ação seria garantir o menor preço dos serviços econômico aos quais se dedicavam os profissionais cooperados, ou então, garantir, por meio desta atuação, que estes serviços retornassem aos consumidores. Lavergne estabeleceu as seguintes características para estas cooperativas públicas: que a criação delas se desse pelos poderes públicos; que os únicos acionistas fossem os usuários ou consumidores; que houvesse separação entre suas finanças e as finanças públicas, garantindo assim, sua autonomia administrativa, comercial e financeira; que houvesse o princípio da porta aberta a qualquer pessoa que quisesse fazer parte da sociedade cooperativa; que houvesse o princípio da venda com o mínimo de benefícios e de retorno proporcional às compras (LAVERGNE, 1955; apud MONZÓN, 2003: 21).

Na Itália, dois nomes da economia neoclássica abordaram o tema do cooperativismo: Vilfredo Pareto y Maffeo Pantaleoni, porém, nenhum deles reconheceu a singularidade das cooperativas; ao contrário, para ambos a cooperativa era uma empresa como qualquer outra empresa capitalista. No caso de Pareto, ele entendia que as cooperativas completavam o sistema concorrencial capitalista, especialmente quando havia concorrência imperfeita e falhas de mercado. Ou seja, ele não via o cooperativismo como uma possibilidade de abolir a competição e com isso, o capitalismo. Para justificar seu pensamento, Pareto exemplificou que nas grandes indústrias, a competição não apresentava falhas de mercado e é por isso que nestes ramos o cooperativismo não obteve êxito. Ao contrário, naqueles segmentos onde havia falhas de competição, foi onde o cooperativismo pode atuar e obter êxito. Assim, o papel do cooperativismo era resolver os problemas das falhas de mercado do próprio sistema capitalista, contribuindo assim, para sua existência (MONZÓN, 2003: 21).

A contribuição de Pantaleoni vai na mesma linha de Pareto, e se deu a partir da escrita de um artigo em que ele criticou as posições de Wollemborg y Rabbeno, negando o fato de que as cooperativas se apresentavam com uma natureza própria, diferente das empresas capitalistas. Para Pantaleoni, a atuação das cooperativas se dava a partir dos mesmos objetivos de qualquer outra empresa, isto é, produziam bens econômicos, buscando fins econômicos, objetivando obter benefícios para seus sócios. Para ele, o grande trunfo do cooperativismo estava no

(35)

trabalho associado, que significa a união de forças que, a seu ver, era um fator positivo, se comparado às empresas capitalistas – nestas, os esforços eram individuais ou em menor quantidade de pessoas/sócios. Fora isso, para este pensador, não existia “nenhum princípio autônomo para a repartição do lucro líquido nas cooperativas” (MONZÓN, 2003: 21-22).

1.1.4. O cooperativismo sob a perspectiva dos anticapitalistas ricardianos e dos socialistas utópicos

Na Inglaterra, Robert Owen e os anticapitalistas ricardianos desenvolveram, na primeira metade do século XIX, o pensamento socialista que serviu de base para parte dos pensadores do cooperativismo. Owen foi um dos principais pensadores do cooperativismo na Inglaterra, na primeira metade do século XIX, e por isso, ele é considerado “o máximo representante inglês do socialismo reformista e cooperativista e propôs uma mudança completa da ordem social e econômica existente a partir do cooperativismo” (MONZÓN, 2003: 12). A proposta dele era substituir a competição pela cooperação, de maneira que o ser humano estivesse no centro do processo produtivo.

Antes da formação da Cooperativa de Rochdale, em 1844, as cooperativas promoviam congressos – os, assim chamados, “congressos cooperativos” – para se coordenarem entre si e elaborarem “diretrizes para a unificação de critérios de atuação que permitiram implantar a nova ordem social por meio do acordo pacífico, em se negar a continuar a produção sob o sistema capitalista”. Este período contribuiu para o movimento cooperativismo por três fatos específicos: a utilização do conceito de “movimento cooperativo”, fruto da aliança entre as cooperativas; a tentativa de homogeneização teórica do cooperativismo, e também por haver surgido explicações científicas para o funcionamento das cooperativas; por relacionar as cooperativas a uma dimensão política, buscando, por meio delas, um ideal de transformação social (MONZÓN, 2003: 13).

O principal nome da corrente anticapitalista foi William Thompson que, em seu trabalho Labour Rewarded, de 1827, chamou a atenção para o cooperativismo como alternativa ao

(36)

capitalismo, evidenciando que os sindicatos poderiam ter um papel de destaque no seu fomento (MONZÓN, 1989; 2003). É importante destacar a existência de vários outros pensadores anticapitalistas ricardianos. Um exemplo importante foi George Mudie, responsável pela primeira publicação do periódico oweniano (The Economist, entre 1821 e 1822) e também pela criação da primeira sociedade oweniana, a “Sociedade Econômica e Cooperativa”7

. Outros importantes nomes de anticapitalistas ricardianos que se dedicaram ao tema do cooperativismo foram: Thomas Hodsgkin (1787-1869), John Gray (1799-1883), John Francis Bray (1809-1897).

Entre 1828 e 1830, William King foi responsável pelas publicações mensais do periódico The Co-operator, em Brighton, difundindo as ideias cooperativistas. O cooperativismo apresentou extraordinário crescimento a partir de 1828, tanto que, em 1830, a Inglaterra já contabilizava mais de 300 cooperativas. Em suma, entre 1820 e 1844 as cooperativas tanto foram objeto de interesse dos pensadores anticapitalistas e socialistas, como foram promovidas por eles.

1.1.5. O cooperativismo sob a perspectiva Karl Marx

A partir da década de 1840, o movimento cooperativista foi, progressivamente, ganhando a influência de Karl Marx (1818-1881), que acreditava no papel do cooperativismo enquanto uma força capaz de transformar a sociedade capitalista em uma sociedade socialista, além de que a formação de cooperativas, especialmente as de produção, se configuraria como a melhor forma de organização socialista da sociedade; e que por isso, o Estado deveria, segundo ele, apoiar e fomentar as atividades cooperativistas (MONZÓN, 1989; 2003).

Marx fez referência, pela primeira vez, ao papel transformador que o cooperativismo pode desempenhar, entre 1851 e 1852, ao criticar as propostas de Blanc. Na obra Organisation du travail8, editada em 1839, o socialista francês Louis Blanc (1812-1882), ativista da revolução

7 Sociedad Económica y Cooperativa. 8

Referências

Documentos relacionados

A equipe técnica seleciona os pacientes que estão ausentes das atividades do tratamento há, no mínimo, três semanas e então são feitas três tentativas de contato

Para Tagiuri; Davis (1996), uma empresa familiar se dá quando membros da família controlam a direção do negócio em cargos gerenciais ou direito de propriedade;

Quando Goffman (1985) fala em palco e cenário, atores e platéia, papéis e rotinas de representação, necessidade, habilidades e estratégias dramatúrgicas,

Agentes Médicos e Umbandistas de Ouro Preto 19V.. 6 2.2 Fase Liminar do Processo de

dois gestores, pelo fato deles serem os mais indicados para avaliarem administrativamente a articulação entre o ensino médio e a educação profissional, bem como a estruturação

O presente trabalho foi desenvolvido objetivando inventariar um fragmento florestal e indicar espécies arbóreas para a recuperação das áreas de reserva legal e

Itaguaí Rio de Janeiro Porto do Açu Vitória Salvador Natal Fortaleza São Luís Belém.. Business Management Head Office: Rio de Janeiro

CONCLUSÕES E PROPOSTAS PARA TRABALHOS FUTUROS Nesta dissertação, foi apresentada uma avaliação do desempenho das funções de proteção aplicadas em transformadores de potência,