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CAPÍTULO 4 PARTICIPAÇÃO NA AQUISIÇÃO DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS

4.2 ANÁLISE E RESULTADOS

4.2.2 Categoria 2 – O agricultor e o mercado

4.2.2.3 Cooperativismo

O cooperativismo é um significativo instrumento mobilizador de capital social. Para Abramovay (2007), o capital social corresponde a recursos cujo uso abre caminho para o estabelecimento de novas relações ente os habitantes de uma determinada região. Serve como uma espécie de garantia, onde os participantes empenham suas relações sociais. O autor explica que a base do raciocínio está na constatação de que as soluções privadas nem sempre

funcionam e que, por interesses imediatos, os agentes sociais teriam na cooperação uma conduta que oportunizaria o ganho para todos, com o trabalho de todos. Mas só funciona se os atores interiorizarem os elementos morais na colaboração entre todos. No entanto, o autor coloca como um dos principais desafios a falta de confiança na própria capacidade.

Os depoimentos revelaram que os agricultores familiares possuem vínculo com associações e muitos relatam receio de organizarem cooperativas para comercializarem seus produtos. Alguns relataram experiências anteriores de insucesso com a organização de cooperativas.

Cooperativa eu tenho até medo de cooperativa. Nós temos uma associação (T1). O povo aqui é... Porque essa cooperativa que fizeram, deu um erro muito grande... Foi bem antes de 2010, foi muito antes disso. Então, o povo não soube abrir a cooperativa, não aceitaram o agrônomo, as dicas do agrônomo para levantar a cooperativa, levantaram por conta própria, e o trem não deu certo e tem pessoas que, hoje, que está vendendo tudo que tem para pagar dívida de cooperativa. Então, quando fala em cooperativa na região, todo mundo espirra, ficou traumatizado. (G1).

T2 informou que entre as famílias de assentados havia uma associação, antes da participação nos programas públicos de compra direta da agricultura familiar, mas a associação se desfez.

Nesse enfrentamento a minha força era a associação também, eu tenho vontade aqui, inclusive tem duas ou três que têm essa força de vontade, mas as outras não ajudam, não tem aquele investimento, aquele desenvolvimento de crescer. Aí não tem como só nós três (T2).

G2 informou que há uma associação local, da qual é associado, que fornece leite para uma cooperativa não local. Quando perguntado sobre o porquê não organizam a sua própria cooperativa, respondeu:

Eu acho que o problema... são pessoas que têm coragem de enfrentar. O pessoal parece que não quer responsabilidade. Todo mundo tem medo (G2).

Uma das vantagens da formação de organizações locais, socialmente diversificadas, é o fato de provocarem o fortalecimento dos sujeitos, pois são obrigados a atuar em contexto diferente daquele ao qual estão habituados, o que os obriga a colocar suas visões permanentemente em questão. Possibilita, assim, um exercício de pensar no coletivo e amplia o círculo de relações entre atores sociais pertencentes a universos diferentes, aumentando as iniciativas inovadoras. Abramovay (2007) analisa que uma das funções do setor público é promover a convergência destes interesses em bens públicos que promovam a valorização de

suas capacidades, suas tradições, seus recursos naturais, as habilidades sociais de suas lideranças e as instituições que conseguem construir.

Quando perguntado se há interesse, ou sente necessidade, de organizar grupos de agricultores e formar cooperativas, G1 acredita que este seja o melhor caminho. No entanto, G1 informou que os agricultores locais tiveram uma experiência ruim com a criação de uma cooperativa. Antes da possibilidade de vender para o PNAE, os agricultores locais tentaram formar cooperativa para entrar no mercado, mas não deu certo. Por isso todos os agricultores da região estão muito receosos de se organizarem novamente.

Eu acho assim, se o povo da região se interessasse mais, igual ao (nome do presidente do sindicato) está lutando, o presidente do Sindicato, para formar um grupo de pessoas, entrar em uma cooperativa, as coisas poderiam melhorar, porque isso um agrônomo pode acompanhar, mas ele não nunca acompanha uma pessoa individual, tem que ser uma cooperativa (G1).

No entanto, G1 avalia que o momento é outro, com mais apoio de políticas públicas para os empreendimentos da agricultura familiar obterem sucesso:

Mas acontece que a mente do povo não se abre, eu falei (nome do marido), hoje eu assisto muito na televisão, só está indo quem formou uma cooperativa, está tendo todo o apoio do Governo. Então, as coisas estão caminhando. Igual (nome do município vizinho), está muito bem a cooperativa. Ou seja, eles começaram engatinhando (G1).

O associativismo e o cooperativismo rural são instrumentos que promovem o fortalecimento dos agricultores familiares. A organização para produção proporciona aumento do nível de renda e possibilita melhorias na produção e troca de experiências bem sucedidas. A ajuda mútua, a participação e responsabilização do coletivo também é um exercício de cidadania. A mobilização contribui para elevar o grau de conhecimento dos direitos e deveres e dos meios de acessar as políticas públicas.

B3 informou que os associados não compram do CEASA da capital para vender à prefeitura. No entanto, acontece de precisarem acionar outros produtores para cumprir o contrato firmado, quando não possuem o produto pedido para pronta entrega:

Uso o termo de parceria com outras comunidades. Tipo, não chegar na CEASA, tipo assim "olha, faltou cebola aqui", aí, eu conheço agricultor de outra cidade, - você tem como conseguir cebola para atender sem contrato para não ficar sem mercadoria (B3).

S3 não participa de associação. No entanto, informa que, para cumprir contratos de fornecimento, compra alguns gêneros alimentícios de outro agricultor.

B1, representante da associação visitada, informa como fazem para entregar os gêneros para a prefeitura:

Nós compramos dos associados e compramos, também, quando os associados não têm, dos vizinhos.” - Eles têm a DAP deles. Porque faz parte da outra associação (B1).

No Quadro 8 são apresentadas as informações sobre o vínculo cooperativo ou associativo dos entrevistados:

Quadro 8 - Participação em organizações formais

Entrevistado Membro de associação/cooperativa

G1 Associação G2 Associação G3 Associação S1 Cooperativa S2 Associação B1 Associação B2 Associação B3 Associação T1 Associação

T2 Era membro de uma associação que se desfez S3 Não participa de associação ou cooperativa S4 Não informou

S5 Associação Fonte: Pesquisa de campo, (2014).

Quando comentado sobre a importância de se organizarem para criar cooperativa e se fortalecerem para participar de outros programas de governo, G2 declarou:

Mas eu acho que aqui vai ser meio difícil montar essa cooperativa, porque eu até impus que eu não queria pertencer à cooperativa, porque todos os produtores daqui pertencem a de lá, eu falei que todo mundo vai para lá agora, nós montamos uma associação para ser mais um grupo para pertencer lá, aí eu falei nunca que vai montar isso aqui, porque todo mundo pertence a de lá, fortalece a de lá e aqui fica lisa.. - E nós temos que aproveitar essa oportunidade porque nunca teve (G2).

G3 informou que a equipe da gestão da alimentação escolar da Secretaria de Educação do Município incentiva os agricultores familiares a montar cooperativas. Por outro lado, S1 informou que os agricultores do município não têm interesse de formar cooperativa.

Um ambiente favorável ao desenvolvimento depende da existência de uma cultura de cooperatividade sistêmica, democratizante e empreendedora. Costa (2004) afirma que a sociedade deve se organizar de forma que haja um empoderamento capaz de romper o status

quo de subordinação atual e que o fortalecimento do capital humano e do capital social devem

Abramovay (2007) salienta que a ênfase dos processos cooperativos está no estímulo a organizações de aprendizagem, isto é, de grupos de profissionais e de agricultores capazes de mobilizar um conjunto variado de conhecimentos para enfrentar os problemas existentes. Reafirma, assim, o sentido durkheimiano23de educação, como sinônimo de socialização, especialmente quando se refere à educação familiar, quando refletem sobre a prática pedagógica da formação em serviço. Neste contexto, incentivar o cooperativismo promove uma ação educativa para a comunidade local.

Entretanto, os custos para a criação e manutenção de cooperativas, principalmente com o apoio insuficiente de ATER, ainda assusta os agricultores familiares. Neste sentido, o PNAE exerce uma importante função pedagógica ao valorizar os agricultores familiares organizados em associações e cooperativas, dando-lhes prioridade nos processos seletivos dos projetos de venda das chamadas públicas, entendendo que os processos cooperativos fortalecem o grupo, diminuem os custos agregados à produção e os deixam mais preparados para entrar nos mercados privados.

Assim, o PNAE exerce uma função indutora do fortalecimento da categoria agricultura familiar e pode contribuir para o desenvolvimento territorial rural ao incentivar o fortalecimento do capital social. Tão relevante quanto promover uma atividade econômica, é incentivar o fortalecimento dos grupos sociais que mobilizam instituições locais para o fortalecimento do território rural.