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CAPÍTULO 3 ASPECTOS DA POLÍTICA DE SAN E A INTERAÇÃO COM O

3.1 SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL (SAN)

A seguir são apresentadas as interfaces do PNAE com a SAN. Muitas das políticas sociais foram reconfiguradas a partir de 2003, pois passaram a integrar um conjunto de estratégias basilares de combate à fome, prioridade de campanha do Presidente Luís Inácio Lula da Silva. Será apresentada a construção do desenho para a promoção da SAN, por meio da integração das políticas públicas, em especial com a alimentação escolar, pois a configuração atual do PNAE carrega, em sua essência, os princípios da SAN.

As primeiras referências à segurança alimentar, em nível documental, surgem no Ministério da Agricultura, no final de 1985. Àquela época foi elaborada uma proposta de “Política Nacional de Segurança Alimentar”, com o objetivo central de atender as necessidades alimentares da população e atingir a autossuficiência nacional na produção de alimentos. A proposta também contemplava a criação de um Conselho Nacional de Segurança Alimentar - CONSEA, presidido pelo Presidente da República e composto por Ministros de Estado e representantes da Sociedade Civil. À época a proposta teve pouca repercussão (VALENTE, 2009).

Maluf (2010) relata que participou da elaboração deste primeiro documento produzido pelo governo brasileiro sobre o tema Segurança Alimentar, em 1985, no início do governo do Presidente José Sarney (1986-1989). Ele foi convidado para escrever um documento sobre política agrícola, agrária e alimentar, propondo uma política de segurança alimentar, reunindo várias dimensões. Quando Luís Inácio Lula da Silva, candidato derrotado em 1989, criou o governo paralelo12, José Gomes da Silva, “ministro paralelo” da agricultura, convidou um grupo para escrever sobre política agrícola, reunindo a temática da reforma agrária e do abastecimento. O documento que reuniu as propostas sobre abastecimento acabou se convertendo na declaração de uma política nacional de segurança alimentar. Este documento, segundo Maluf, já incluía, dentre seus argumentos, a dimensão nutricional. Em audiência com o presidente Itamar Franco, Luís Inácio Lula da Silva

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Com a eleição de Fernando Collor de Mello (1990-1992), foi instalado, em alguns círculos políticos, certo grau de insatisfação, movendo-os a elaborar e anunciar, em 1990, uma iniciativa chamada informalmente de governo paralelo, com a participação de José Gomes da Silva e de membros do Partido dos Trabalhadores . Esta iniciativa levou à fundação do Instituto Cidadania, que a partir de 1992 passou a ter, entre seus conselheiros, Luiz Inácio Lula da Silva (MALUF, 2010).

apresentou o documento como uma proposta ao governo recém-iniciado. O presidente Itamar aceitou e, daí, nasceu o primeiro Consea, presidido pelo bispo Dom Mauro Morelli, tendo funcionado entre 1993 e 1994.

O primeiro CONSEA foi criado como órgão de consulta e assessoria do Presidente da República. Introduziu-se a segurança alimentar na agenda nacional e deu origem a importantes iniciativas relativas aos programas de alimentação e nutrição – como a descentralização da execução do PNAE, ampliação do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) e distribuição de estoques públicos de alimentos a populações carentes, aos assentamentos rurais e à geração de emprego e renda. (VILLA REAL, 2011)

Em 1994 o CONSEA promoveu a I Conferência Nacional de Segurança Alimentar - CNSA. Nesta Conferência foi construída uma proposta para uma Política Nacional de Segurança Alimentar, organizada em três eixos gerais: 1) ampliar as condições de acesso à alimentação e reduzir seu peso no orçamento familiar; 2) assegurar a saúde, nutrição e alimentação a grupos populacionais determinados; e 3) assegurar a qualidade biológica, sanitária, nutricional e tecnológica dos alimentos e seu aproveitamento, estimulando práticas alimentares e estilos de vida saudáveis. O primeiro CONSEA durou até o final de 1994.

Em seu lugar, em 1995, durante a gestão do Presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) foi lançado o Programa Comunidade Solidária, criado para ser a principal ação estratégica no campo do combate à pobreza e à fome.

O Programa Comunidade Solidária consistia em uma estratégia de articulação e coordenação de ações descentralizadas de governo, baseadas no estímulo à participação e ao acompanhamento dos atores locais. Ele foi concebido sob as diretrizes da focalização e da busca pela eficiência da ação do Estado e desoneração do orçamento público, previstas no projeto de reforma institucional sob a responsabilidade do Ministério das Ações de Reforma do Estado. Por isso, além da extinção de órgãos da estrutura de governo, partes dos serviços sociais passaram a ser transferidas para o setor privado por meio de parcerias, operacionalizadas por ONGs e organizadas em torno do terceiro setor. A estratégia operacional do Programa Comunidade Solidária era de criar um ambiente propício para a pactuação de acordos locais, com o estabelecimento de parcerias, cooperação mútua, descentralização, integração e convergência de ações. Porém, as ações desencadeadas mostraram-se basicamente ser de cunho emergencial, sem ações estruturantes. (BRASIL, 2014a).

A estratégia incluía dois segmentos: um conselho composto por quatro Ministros de Estado (Saúde, Educação, Trabalho e Casa Civil) e 27 participantes da sociedade civil, entre

eles empresários, empreendedores sociais, artistas; e um programa governamental – Comunidade Ativa, coordenado por uma secretaria executiva, formalmente ligada à Casa Civil da Presidência da República (VILLA REAL, 2011).

O novo Conselho, aparentemente com a mesma composição, dentro da nova correlação de forças, passa a ser efetivamente um organismo governamental de consulta, e a Presidência exercida por escolha do Presidente da República. O foco no tema da Segurança Alimentar foi diluído entres temas relacionados ao processo de exclusão econômica e social, fragmentando a discussão da questão da segurança alimentar (alimentação e nutrição, questão agrária, geração de emprego e renda, criança, etc.). (VALENTE, 2009).

Uma das principais iniciativas do Conselho se deu com a realização da Cúpula Mundial de Alimentação em 1996. O governo formou uma comissão composta por representantes do governo federal, sociedade civil e iniciativa privada, para a elaboração do Relatório Nacional Brasileiro para a Cúpula. Esse documento propôs uma nova definição de segurança alimentar: que seria a garantia a todos ao acesso a alimentos básicos de qualidade em quantidade suficiente, de modo permanente e sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, com base em práticas alimentares saudáveis para uma existência digna, em um contexto de desenvolvimento integral. Esta definição foi o ponto de partida para aquela que foi aprovada, mais tarde, na II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional - CNSAN, de 2004, e adotada pelo CONSEA. (VILLA REAL, 2011).

O governo de Fernando Henrique Cardoso teve um mérito importante, que foi consolidar o plano de estabilização monetária, embora as políticas específicas tenham sido tímidas. O Plano Real conseguiu frear um longo período de inflação alta. A partir de 1995 observou-se uma estabilidade dos preços dos alimentos, evitando as constantes variações que comprometiam grande parte da renda da parcela mais pobre da população. Além disso, a estabilização monetária forneceu novos elementos que permitiram programar melhor o orçamento público ao longo do ano e com isso propiciar um planejamento mais eficiente. Assim, o novo cenário de estabilização permitiu que o governo federal adotasse a partir da década de 2000, programas de transferência de renda como estratégia para fazer chegar recursos, de forma emergencial, à população extremamente pobre (BRASIL, 2014a).

Em outubro de 2001 é apresentado ao debate público o Projeto Fome Zero. O projeto, elaborado pela ONG Instituto de Cidadania, coordenado por José Graziano da Silva, propunha a conjugação entre as políticas estruturais (distribuição de renda, geração de

empregos, reforma agrária) e as intervenções de ordem emergencial, como a distribuição de cestas básicas (VILLA REAL, 2011).

Em dezembro de 2002 o Comunidade Solidária foi encerrado, sendo substituído pelo Projeto Fome Zero. Em 1/1/2003 o Presidente Luís Inácio Lula da Silva criou o Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome (MESA) que contemplava um tripé estratégico descrito nas atribuições do programa Fome Zero como espaço de articulação das políticas sociais brasileiras: I – Formular e coordenar a implementação da Política Nacional de Segurança Alimentar e Combate à Fome; II – Articular a participação da sociedade civil no estabelecimento de diretrizes para essa política; III – Estabelecer diretrizes, supervisionar e acompanhar a implementação de políticas no âmbito da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional - PNSAN.

Em 2003 o Projeto vira Programa e, a partir de 2004, em Estratégia Fome Zero, englobando um conjunto diverso de ações executadas por vários ministérios. A conformação na construção e operacionalização das políticas proposta pelo Programa Fome Zero forneceu o principal referencial para a institucionalização da SAN na agenda das políticas públicas.

A Estratégia Fome Zero se fez em cima de algumas ideias de Josué de Castro, a começar pela população alvo das políticas de combate à fome que se ampliou para a população indígena e dos quilombolas, mas continuou tendo na população rural nordestina o principal problema, como relatado na obra Geografia da Fome. (NASCIMENTO, 2011).

O combate à fome foi um dos pilares do projeto do governo do ex-presidente Lula. A Estratégia Fome Zero foi a expressão de um conjunto de políticas que visavam quebrar o círculo vicioso que liga a fome à exclusão. A SAN tornou-se o eixo norteador de diversas políticas públicas. Silva (2003) considera que a fome é consequência, mas também causa da pobreza. Ela compromete a construção da cidadania e danifica o futuro – de forma irreparável – pela erosão do desenvolvimento infantil.

As ações da Estratégia Fome Zero pretendiam abranger três dimensões: ações estruturais (voltadas às causas da fome e da pobreza), específicas (atendendo diretamente as famílias que não se alimentam adequadamente), e locais (implantadas pelas prefeituras municipais e pela sociedade civil), apresentadas na Figura 1:

Figura 1- Esquema das propostas do Projeto Fome Zero.

Fonte: (SILVA, DEL GROSSI; FRANÇA, 2010, p. 56)

José Graziano da Silva (2003), que foi à época Ministro Extraordinário de Segurança Alimentar, afirmava que o Programa Fome Zero requeria investimentos para fomentar a produção e o comércio local de alimentos, bem como financiar ações de infraestrutura e apoio à expansão local do emprego e da renda. Incluem-se aí: aquisição de produtos da agricultura familiar, seguro safra, construção de canais de comercialização, rede de cisternas no semi-árido, construção de habitações, microcrédito, cooperativismo, reforma agrária, apoio técnico a assentados, , atenção básica de saúde, frequência escolar e outras contrapartidas previstas em programas já existentes. As exigências eram consideradas relevantes no âmbito da política social para corrigir a dependência do benefício..

Silva (2003) enfatiza que os benefícios oferecidos para atendimento do combate à fome estavam vinculados à aquisição de alimentos no comércio local. Tratava-se de criar uma demanda de curso forçado, cujo alvo era o de movimentar a agricultura local e regional. A forma do Cartão entregue às famílias em situação de vulnerabilidade social para o pagamento do benefício do Programa tinha esse potencial. Ao contrário da cesta básica, que

apenas transfere demanda e renda das comunidades pobres para zonas de produção mais competitivas, perpetuando a relação de dependência, o Cartão gera efeitos multiplicadores na economia porque as famílias consomem no comércio local. E evitava o efeito das políticas de “ajuda humanitária”, que implodem a agricultura local com alimentos importados. Em resumo, o Cartão aciona uma alavanca de duplo efeito: reforça o poder aquisitivo dos pobres urbanos e ocupava a capacidade ociosa da agricultura familiar. Para o autor, o desenvolvimento local ou nacional não é uma derivação automática da dinâmica econômica.

Junto ao lançamento oficial do Fome Zero, em março de 2003, o Governo Lula retoma a experiência do CONSEA, instituindo maior abrangência interministerial, tendo participação majoritária da sociedade civil e sendo presidido por um de seus representantes. Josué de Castro foi escolhido patrono do CONSEA. A meta principal foi propor as diretrizes da Política Nacional de SAN, assim como monitorar os programas e projetos que integram o Programa Fome Zero e outros afetos ao seu campo de abrangência.

Em 2004 foi realizada a II Conferência Nacional de SAN, quando foi elaborado o conceito atual de Segurança Alimentar e Nutricional. Foram aprovados também os princípios e a abrangência da PNSAN que em 2006 foram regulamentadas pela Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN), Lei nº 11.346 (BRASIL, 2006c). Como demanda da sociedade civil, é instituído, por meio da LOSAN, o Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) com o objetivo primordial de garantir, por meio de ações intersetoriais, o DHAA, através da PNSAN, cujo instrumento é o Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – PLANSAN.

A SAN é objetivo das políticas públicas na área social e, para ser efetiva, tem como estratégia de ação de desenvolvimento, a articulação com o setor produtivo, de abastecimento, garantindo o acesso e o consumo, considerando as quatro dimensões da SAN: disponibilidade, acesso, consumo de alimentos e utilização biológica de nutrientes. Neste sentido, a construção de uma política de estado que supere a situação de insegurança alimentar e que integre a agricultura, a saúde, o meio ambiente, a educação, a assistência social, entre outras, de forma que não seja um somatório de ações para a superação de problemas estruturais relacionados à pobreza e à fome é o desafio da PNSAN. (SHOTTZ et

al., 2014).

Dois importantes princípios do SISAN e da PNSAN são: a participação social e a intersetorialidade. O SISAN abriga institucionalidades que visam garantir esses princípios. Assim, a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CNSAN) e o

Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) são institucionalidades para garantia da participação social na Política Nacional de SAN e a Câmara Interministerial de SAN (CAISAN) e suas congêneres visam garantir o princípio da intersetorialidade. Essas instituições devem ser reproduzidas nos estados e municípios como forma de dar concretude a estes princípios do SISAN. Passados sete anos da promulgação da LOSAN, o SISAN está em processo de implementação nos estados e municípios. (BRASIL, 2014).

O SISAN conta com mais de 50 indicadores, divididos entre seis dimensões: produção de alimentos; disponibilidade de alimentos; renda/acesso e despesas com alimentação; acesso à alimentação adequada; saúde e acesso a serviços relacionados; e educação. Esse sistema converge com o consenso internacional sobre a necessidade de consolidação de um conjunto de indicadores para monitorar a complexidade da SAN (FAO, 2014).

A CAISAN, constituída por 20 ministérios, assume no SISAN os papéis de articular, monitorar e coordenar a PNSAN, no âmbito nacional, coordenando as ações com impacto para a agenda de SAN. O PLANSAN incorpora hoje mais de 40 programas e ações. O MDS preside e é responsável pela Secretaria Executiva da CAISAN.

A intersetorialidade é uma das principais características do SISAN. O desafio que se coloca na implantação de políticas públicas dessa natureza é a superação da lógica setorial com vistas a um equacionamento mais abrangente das questões, envolvendo o trabalho conjunto e complementar de diferentes profissionais, órgãos e setores públicos, em diferentes esferas (federal, estadual e municipal) e com a participação efetiva da sociedade civil.

Para Niederle, Almeida e Vezzani (2013), o CONSEA constitui-se como um espaço de encontro e articulação de grupos de atores e, também, de construção de políticas públicas. Representantes governamentais, movimentos sociais, organizações vinculadas à segurança alimentar e à agroecologia, fazem-se presentes neste espaço, onde apresentam, disputam e constroem concepções sobre segurança alimentar e o papel da agricultura familiar e da agroecologia neste processo. Quando o CONSEA foi restabelecido em 2003, se iniciou a discussão das diretrizes para as ações nas áreas de alimentação, nutrição e agricultura familiar, tendo sido vital na criação do PAA, na articulação da alimentação escolar com a agricultura familiar e no monitoramento e aperfeiçoamento destes Programas. Foram as ideias desses diferentes grupos de atores, favorecidas por um contexto político de maior participação social na construção das políticas públicas e pela emergência de determinadas

agendas de políticas, que desencadearam a estruturação das compras públicas de alimentos orientadas para a agricultura familiar e para a construção da SAN.

A amplitude atribuída à Política Nacional de SAN se expressa nas áreas: produção de alimentos, acesso, ações em alimentação e nutrição, trabalho e renda, modelos de produção, recursos naturais, abastecimento e regulação de mercados, alimentação saudável, cultura alimentar, ações emergenciais, alimentação escolar, monitoramento e avaliação, bem como em questões institucionais e na participação social. E, nos últimos 10 anos, o Brasil tem procurado direcionar a implantação de políticas sociais pautadas nos conceitos de SAN, como eixo estratégico na formulação dessas políticas.

Os avanços no combate à fome e pobreza decorrem, na análise apresentada no Relatório da FAO de 2014, da priorização da agenda de SAN, a partir de 2003, com destaque ao lançamento da Estratégia Fome Zero, à recriação do CONSEA, à institucionalização da política de SAN e à implementação, de forma articulada, de políticas de proteção social e de fomento à produção agrícola. Ao longo da década passada, a Política de SAN ganhou impulso no Brasil, por meio do reforço de marcos legais; da criação de um ambiente institucional que facilitou a cooperação e a coordenação entre os ministérios e as diferentes esferas de governo, com responsabilidades definidas; de maiores investimentos em áreas como agricultura familiar; e do forte envolvimento da sociedade civil no processo político. Um dos marcos foi a promulgação da LOSAN em 2006.

Villa Real e Schneider (2011) sublinham a associação entre o objetivo da segurança alimentar às estratégias permanentes de desenvolvimento econômico e social, com crescente equidade e inclusão social. Na proposta da SAN, as políticas de estímulo ao crescimento da produção agroalimentar devem estar associadas à promoção de formas socialmente equitativas e ambientalmente sustentáveis de ocupação do espaço agrário, à valorização das culturas alimentares, ao enfrentamento da pobreza rural e ao estímulo ao desenvolvimento local e regional. Desse modo, programas públicos alimentares, em especial o PNAE, surgem como potenciais reintegradores desses componentes, considerando as suas condições de auxiliar no enfrentamento das problemáticas referentes ao consumo e a produção de alimentos.

Entre as iniciativas do conjunto de políticas públicas de SAN, o documento que faz o balanço do PLANSAN 2014 evidencia que uma das principais conquistas da PNSAN no Brasil foi a criação e consolidação de uma política de aquisição de alimentos da agricultura familiar para suprir os mercados institucionais. Tanto o PAA quanto a compra dos 30% da agricultura familiar para o abastecimento da alimentação escolar, no âmbito do PNAE, têm

demonstrado o quanto foi acertada a criação de uma política de comercialização para a agricultura familiar no Brasil (BRASIL, 2014b).

Silva, Del Grossi e França (2010) salientam que uma das mais importantes expressões do enfoque intersetorial da SAN, orientado pelos princípios do DHAA e da soberania alimentar, está na articulação entre as ações que promovem o acesso aos alimentos e aquelas voltadas para o fortalecimento da agricultura familiar.

Para Villa Real (2011) a política de SAN no Brasil tem como uma das estratégias o comprometimento com a inclusão de pequenos produtores, bem como a revisão dos hábitos alimentares e das condições nutricionais da população. A concretização destas proposições aconteceu com o avanço de programas públicos alimentares, como é o caso do PNAE. Os programas públicos de aquisição de alimentos, como o PNAE, surgiram como potenciais reintegradores da cadeia de abastecimento alimentar, tendo condições de auxiliar no enfrentamento das problemáticas referentes ao consumo e à produção.

Villa Real e Schneider (2011) avaliam que o Estado brasileiro passou a dispensar maior atenção para as questões de SAN e sua relação com a produção agroalimentar. As políticas públicas que surgiram desse interesse apoiaram-se em duas questões básicas: o alimentar, associado à produção, disponibilidade, comercialização e acesso ao alimento; e o nutricional, relacionado às práticas alimentares e à funcionalidade dos alimentos, estando assim voltado ao estado de nutrição da população. Esses dois componentes propõem um modelo de produção e consumo de alimentos mais sustentável, e que permita que a produção obtida pelos pequenos agricultores familiares se aproxime dos consumidores de alimentos, favorecendo uma reconexão da cadeia alimentar, bem como o estreitamento da relação campo-cidade.

As políticas pautadas na SAN estimulam o desenvolvimento econômico e social associado à promoção de formas mais justas e ambientalmente equilibradas de produção, com valorização da cultura alimentar e estímulo ao desenvolvimento local, além de promover o consumo alimentar saudável.

Os componentes alimentar e nutricional das políticas de SAN propõem um modelo de produção e consumo de alimentos mais sustentável, que aproxime a produção de pequenos agricultores familiares e o consumo de alimentos. O PNAE aparece como potencial reintegrador dos componentes. Pode reintegrar políticas relacionadas à saúde e pode criar mercados para os agricultores familiares, mediados pela ação permanente que as práticas educativas podem trazer ao contribuir para formar hábitos alimentares saudáveis em