• Nenhum resultado encontrado

1.2. O Ministério Público e as atuais Constituições

1.2.2. De Portugal

No período imediatamente anterior ao 25 de abril de 1974, as polêmicas começavam a sentir-se na área da justiça, à imagem do que acontecia noutros setores da sociedade portuguesa. As primeiras mudanças ocorreram no contexto da revolução de 25/04/1974. A deposição do Governo de Marcello Caetano, pelo Movimento das Forças Armadas (MFA), originou a adoção de políticas de justiça que iam ao encontro das expectativas democráticas da população. Após esta revolução e a instauração do regime democrático, partiu-se para uma organização judiciária na qual a capacidade de interferência por parte do poder político diminuiu consideravelmente, de tal forma que as sucessivas revisões da Lei Orgânica dos Tribunais, do Estatuto do Ministério Público e do Estatuto dos Magistrados Judiciais erradicaram os poderes interventivos e diretivos do Ministério da Justiça que ainda persistiam

45 ALVES, Leonardo Barreto Moreira e BERCLAZ, Márcio Soares. Ministério Público em Ação. Atuação

do regime anterior mantendo-se apenas o poder de emitir instruções em ações cíveis em que o Estado é defendido pelo Ministério Público46.

A Constituição da República do novo regime democrático só foi aprovada quase dois anos após o 25 de abril de 1974, a 2 de abril de 1976, pela então Assembleia Constituinte. Desse modo, foi após a publicação da Constituição de 1976, que consagrou os tribunais como órgão de soberania, no art. 113º, atual art. 110º, após a revisão de 1997, que se estipulou a independência do seu funcionamento como um dos princípios básicos do sistema judicial português e se passaram a definir suas competências47.

Eis o que diz o art. 110º da CRP: Órgãos de soberania. 1. São órgãos de soberania o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais. 2. A formação, a composição, a competência e o funcionamento dos órgãos de soberania são os definidos na Constituição48.

A Constituição da República Portuguesa de 1976 (CRP) “é a actual constituição portuguesa. Foi redigida pela Assembleia Constituinte eleita na sequência das primeiras eleições gerais livres no país em 25 de Abril de 1975, 1.º aniversário da Revolução dos Cravos. Os seus deputados deram os trabalhos por concluídos em 2 de Abril de 1976, tendo a Constituição entrado em vigor a 25 de Abril de 1976. Sofreu sucessivas revisões constitucionais em 1982, 1989, 1992, 1997, 2001, 2004 e 200549”.

Adverte João Paulo Dias que anteriormente a 1976, a referência ao Ministério Público aparecia para lhe conferir o estatuto de representante do Estado junto aos tribunais, a Constituição de 1976 veio atribuir-lhe um Capítulo do Título respeitante aos Tribunais. Neste, a definição das funções, a hierarquização da magistratura e a garantia de inamovibilidade, bem como a atribuição conferida, como órgão superior do Ministério Público, à Procuradoria

46 DIAS, João Paulo; FERNANDO, Paula; LIMA, Teresa. O Ministério Público em Portugal: Que papel, que

lugar? Acesso em: 14/03/2010. Disponível em:

http://estudogeral.sib.uc.pt/dspace/bitstream/10316/11096/1/O%20Minist%C3%A9rio%20P%C3%BAblico%20 em%20Portugal%20Que%20papel,%20que%20lugar.pdf.

47

DIAS, João Paulo, op. cit., p.35.

48 Constituição da República Portuguesa. (Texto de 1976 e revisões até 2005). Disponível em: http://www.laicidade.org/wp-content/uploads/2007/04/constituicao-1976-2005.pdf. Acesso em: 15/03/2010. 49 Constituição Portuguesa de 1976. Disponível em:

Geral da República tem um especial destaque50. O modelo normativo do Ministério Público, no entendimento de Gomes Canotilho e Vital Moreira, assenta em três princípios: da autonomia, da hierarquia e da responsabilidade51.

A referida Constituição trata do Ministério Público de maneira particular e é necessário se compreender, antes de tudo, o sistema de governo implantado, qual seja o parlamentarismo, no qual se vê, dentre outras peculiaridades, a escolha de representantes do Executivo pelo parlamento. Essa Instituição tem por fonte inspiradora a figura do

Ombudsman, nascida na Suécia, introduzida em Portugal por Decreto em 1975 e,

posteriormente, constitucionalizada no art. 23. Seus objetivos são basicamente a efetivação de direitos dos cidadãos através de meios informais (ou menos formais que os tribunais) e a atuação a margem dos mecanismos tradicionais de controle administrativo. É possível observar que a Instituição Ministério Público e a Instituição Provedor de Justiça são completamente distintas, possuindo o Ministério Público atribuições mais conservadoras no que tange a atuação do órgão, condizente com a persecução penal e a defesa dos interesses do Estado. Já o provedor de justiça atua na defesa dos interesses da sociedade, sendo digno de nota por sua atuação até na defesa dos contribuintes52.

A Constituição da República Portuguesa de 1976 (CRP) possui um capítulo específico para definir as funções e estatuto do Ministério Público, que estão descritas nos artigos 219º e 220º53.

50 Ibid, Ibidem.

51 CANOTILHO apud João Paulo Dias, Op.cit., p. 36.

52 SACCO, Ricardo Ferreira. O Ministério Público no Direito Constitucional Comparado. De jure: revista jurídica do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 8 jan./jun. 2007. Disponível em: http://bdjur.stj.gov.br/jspui/bitstream/2011/26797/1/ministerio_publico_direito_constitucional.pdf

53 Constituição da República Portuguesa. (Texto de 1976 e revisões até 2005). Disponível em:

http://www.laicidade.org/wp-content/uploads/2007/04/constituicao-1976-2005.pdf. Acesso em 15/03/2010.

Artigo 219. º Funções e estatuto: 1. Ao Ministério Público compete representar o Estado e defender os interesses

que a lei determinar, bem como, com observância do disposto no número seguinte e nos termos da lei, participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania, exercer a acção penal orientada pelo princípio da legalidade e defender a legalidade democrática. 2. O Ministério Público goza de estatuto próprio e de autonomia, nos termos da lei. 3. A lei estabelece formas especiais de assessoria junto do Ministério Público nos casos dos crimes estritamente militares. 4. Os agentes do Ministério Público são magistrados responsáveis, hierarquicamente subordinados, e não podem ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei. 5. A nomeação, colocação, transferência e promoção dos agentes do Ministério Público e o exercício da acção disciplinar competem à Procuradoria-Geral da República.

Artigo 220. º Procuradoria-Geral da República: 1. A Procuradoria-Geral da República é o órgão superior do Ministério Público, com a composição e a competência definidas na lei. 2. A Procuradoria-Geral da República é presidida pelo Procurador-Geral da República e compreende o Conselho Superior do Ministério Público, que inclui membros eleitos pela Assembleia da República e membros de entre si eleitos pelos magistrados do