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CAPÍTULO II: DIREITOS FUNDAMENTAIS VERSUS DIREITOS HUMANOS

2.4. Direitos e garantias fundamentais

Aprendemos desde cedo nos bancos escolares que “Democracia”, palavra de origem grega, é o governo do povo, tendo as pessoas liberdade de expressão, de manifestarem suas opiniões, de contribuírem com a melhoria do sistema, de terem o mesmo tratamento, as mesmas oportunidades, os mesmos direitos.

Nesta ordem de pensamento, Paulo Bonavides é enfático, ao asseverar:

“Uma democracia não se constrói com fome, miséria, ignorância, analfabetismo e exclusão. A democracia só é um processo ou procedimento justo de participação política se existir uma justiça distributiva no plano dos bens sociais. A juridicidade, a sociabilidade e a democracia pressupõem, assim, uma base jusfundamental incontornável, que começa nos direitos fundamentais da pessoa e acaba nos direitos sociais207”.

O art. 5º da atual Constituição Federal Brasileira, também denominada de “Constituição Cidadã” estabelece a igualdade de todos perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, e garante a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos estipulados nos seus inúmeros incisos. Todavia, não é o que vimos na prática. Como afirma Paulo Bonavides:

“somos uma democracia bloqueada, uma democracia mutilada, uma democracia sem povo; o que, aliás, é singular contradição de forma e substância, porquanto se suprime aí o passivo das liberdades e dos direitos humanos208”.

Enquanto os direitos asseguram os bens da vida (liberdade, segurança, propriedade, igualdade), as chamadas garantias (mandado de segurança, habeas corpus, habeas data, mandado de injunção) são meios judiciais que a Lei Maior assegura ao indivíduo e a

206 Ibid, Ibidem. 207

CANOTILHO, J.J. Gomes .. et al. Direitos Fundamentais Sociais. Coordenadores: J.J.Gomes Canotilho, Marcus Orione Gonçalves Correia e Érica Paula Barcha Correia. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 19.

208 BONAVIDES, Paulo. Teoria Constitucional da Democracia Participativa. Por um Direito Constitucional de

luta e resistência. Por uma Nova Hermenêutica. Por uma Repolitização da legitimidade. 3ª ed. São Paulo:

coletividade para defender seus interesses contra os atos arbitrários do Poder Público209. De forma bastante simples, Pedro Lenza demonstra a presente diferenciação:

“direitos são bens e vantagens prescritos na norma constitucional, enquanto as garantias são os instrumentos através dos quais se assegura o exercício dos aludidos direitos (preventivamente) ou prontamente os repara, caso violados. Já os remédios constitucionais são espécie do gênero garantia; isso porque, uma vez consagrado o direito, a sua garantia nem sempre estará nas regras definidas constitucionalmente como remédios constitucionais (ex: habeas corpus, habeas data etc.)210”.

Por sua vez, lembra o referido doutrinador que, em determinadas situações, a garantia poderá estar na própria norma que assegura o direito e exemplifica da seguinte forma:

“é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos - art. 5º. VI (direito) - garantindo-se na forma da lei a proteção aos locais de culto e suas liturgias) (garantia); direito ao juízo natural (direito) - o art. 5º , XXXVII, veda a instituição de juízo ou tribunal de exceção (garantia)211.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, foi o primeiro documento a estabelecer internacionalmente os direitos inerentes a todos os seres humanos, em situação de igualdade; não fazendo assim, nenhuma distinção entre homens e mulheres.

Consoante Rodrigo César Rebello,

“a Constituição de 1988 inovou em diversos aspectos em relação às anteriores: foi a primeira a fixar os direitos fundamentais antes da organização do próprio Estado, realçando a importância deles na nova ordem democrática estabelecida no País após longos anos de autoritarismo; tutelou novas formas de interesses, os denominados coletivos e difusos e impôs deveres ao lado de direitos individuais e coletivos212”.

Com relação à mencionada Constituição, pondera Canotilho:

“De todas as Constituições brasileiras, foi a Carta de 1988 a que mais assegurou a participação popular em seu processo de elaboração, a partir do recebimento de elevado número de emendas populares. É, assim, a Constituição que apresenta o maior grau de legitimidade popular213”.

209 LIMA, Francisco Meton Marques de. Manual de direito constitucional. São Paulo: LTr., 2005, p.84. 210 LENZA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. 16 ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012, p.961. 211

Ibidem, p. 962.

212 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria geral da constituição e direitos políticos, vol.17 4ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2003. (coleção sinopses jurídicas), p.65/66.

213 CANOTILHO, J.J. Gomes et al. Direitos Fundamentais Sociais. Coordenadores: J.J.Gomes Canotilho, Marcus Orione Gonçalves Correia e Érica Paula Barcha Correia. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 54.

Nesta ordem de pensamento, esclarece ainda que:

“A Constituição de 1988 acolhe a ideia da universalidade dos direitos humanos, na medida em que consagra o valor da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental do constitucionalismo inaugurado em 1988. O texto constitucional ainda realça que os direitos humanos são tema de legítimo interesse da comunidade internacional, ao prever, pela primeira vez, dentre os princípios a reger o Brasil nas relações internacionais, o da prevalência dos direitos humanos. Trata-se, ademais, da primeira Constituição brasileira a incluir os direitos internacionais no elenco dos direitos constitucionalmente garantidos214”.

Dentre os artigos que tratam dos direitos e garantias fundamentais, sob a nossa ótica, o de maior importância é o 5º, que afirma no seu caput o seguinte: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade215”.

Muitos ingressam na Justiça de forma individual ou coletiva cobrando do Estado a implementação dos direitos sociais e econômicos, o cumprimento, a efetivação, o reconhecimento dos direitos sociais, alguns deles relacionados à saúde, a educação, a moradia. A maior parte não tem plano de saúde, não tem condições de custear suas educações em escolas e universidades particulares, direitos esses, contemplados nas Convenções, Constituições e demais leis que regem às matérias nas Nações. Há ainda os que não sabem nem mesmo como requerer, como lutarem pela conquista de tais direitos.

Devemos sempre lembrar que o Estado social é um Estado democrático, que procura atender os anseios da sociedade, atentando para os princípios universais da liberdade, igualdade e fraternidade, proclamados pela Revolução Francesa de 1789. A democracia, portanto, requer participação de todos. “Sem Estado social não há democracia, sem

democracia não há legitimidade216. Bonavides adverte ainda que:

O Estado social é na substância a democracia participativa que sobe ao poder para executar um programa de justiça, liberdade e segurança. O Estado social nasceu de uma inspiração de justiça, igualdade e liberdade: é criação mais

214Ibid, ibidem.

215 ANGHER. Op. cit., p.24.

216 BONAVIDES, Paulo. Teoria Constitucional da Democracia Participativa. Por um Direito Constitucional de

luta e resistência. Por uma Nova Hermenêutica. Por uma Repolitização da legitimidade. 3ª ed. São Paulo:

sugestiva do século constitucional, o princípio governataivo mais rico em gestação no universo politico do Ocidente217.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é clara ao enfatizar os direitos fundamentais, disciplinados no art. 5º, com as respectivas garantias constitucionais. Deve, por meio do seu cumprimento, servir de mecanismo de afirmação dos Direitos Humanos, assegurando a inviolabilidade dos mesmos. Para Paulo Saraiva “a garantia constitucional é um mecanismo jurídico para a concretização dos direitos constitucionais218”.

A Emenda Constitucional nº 45, de 08/12/2004, como lembra Fernando Horta Tavares219, acrescentou ao rol dos Direitos e Garantias Fundamentais, pelo inciso LXXVIII ao art. 5º, o princípio da duração razoável do processo e celeridade de tramitação, que parte da doutrina vem denominando de “princípio da efetividade do processo”.

Para ele “trata-se da materialização da ideia de que, normatizando-se uma situação do mundo da vida, a juridicização por si só bastaria para resolver o problema da denominada “lentidão do processo220”. Aduz ainda que este princípio já havia sido introduzido no

ordenamento jurídico brasileiro desde 1992, pelo caput do art. 8º da Convenção Americana de Direitos Humanos, o conhecido Pacto São José da Costa Rica221.

Observamos no Estatuto da Criança e do Adolescente que todas as ações menoristas, ou seja, de interesses de crianças, adolescentes e jovens, são isentas de custas e emolumentos, ressalvada a hipótese de litigância de má fé, os recursos terão preferência de julgamento e dispensarão revisor; e as normas são autoaplicáveis porque não dependem de complementações de leis posteriores. Vimos também que os direitos e garantias fundamentais possuem aplicação imediata, nos termos do art. 5º § 1º da Constituição Federal de 1988.

Neste contexto pertinente, as considerações apresentadas por Zamira de Assis, quando ressalta o princípio do devido processo legal assegurado na Constituição Federal Brasileira no

217 BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 10ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2011, p. 12/13.

218

SARAIVA, Paulo Lopo. Manual de Direito Constitucional. São Paulo: Acadêmica, 1995, p.48.

219 TAVARES, Fernando Horta. (Coord.). Urgências de tutela. 1ª ed. (ano 2007), 4ª reimpr. Curitiba: Juruá, 2012, p. 113.

220 TAVARES, Fernando Horta; Op. cit. p. 114. 221

art. 5º inciso LIV, que diz: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” Segundo ela, este princípio

“é o pilar de sustentação do Estado Democrático de Direito cuja vulneração, sob qualquer justificativa, não encontra fundamentação que respeite sua integralidade; ou seja, não é possível excepcionar do “devido processo” situações de urgência ou de perigo sem destruí-lo222”.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ao emitir relatório sobre a situação dos direitos humanos no Brasil, mencionou que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte e que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.