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3 OS DIREITOS DAS MULHERES SÃO DIREITOS HUMANOS

3.3 O sistema normativo global de proteção aos Direitos Humanos e as

3.3.3 Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher

Em 1995, em Pequim, realizou-se a IV Conferência Mundial da Mulher, na qual foram aprovadas uma Declaração e uma Plataforma de Ação, ambas voltadas para fazer avançar os objetivos de igualdade, desenvolvimento e paz para todas as mulheres. Elas incorporaram as agendas das Conferências de Direitos Humanos (Viena, 1993), de População e Desenvolvimento (Cairo, 1994) e da Cúpula de Desenvolvimento Social (Copenhagen, 1995), avançando e firmando, de modo definitivo, a noção de que os direitos das mulheres são direitos humanos.

Tal como em situações anteriores, o movimento internacional de mulheres, dando novas mostras de sua formidável capacidade de mobilização e articulação, conseguiu que as Nações Unidas ratificassem as conquistas das Conferências pregressas e avançassem ainda mais em direção à definição de direitos e estratégias necessárias para a concretização da cidadania feminina.

Na Declaração de Pequim, a Organização das Nações Unidas reconhece que, embora a situação das mulheres tenha progredido na década de 1990, esse progresso foi irregular, pois as desigualdades entre homens e mulheres persistem, remanescendo grandes obstáculos, cujas implicações têm sérias conseqüências sobre o bem-estar social de todos, sendo importante que se incremente ainda mais o avanço e a promoção das mulheres em todo o mundo. A Plataforma de Ação complementa insistindo que as mulheres compartilham problemas semelhantes, que só podem ser resolvidos trabalhando em comum acordo e em associação com os homens, para alcançar o objetivo da igualdade de gênero no mundo todo.

Por essa razão, deve ser assegurada a implementação integral dos direitos humanos das mulheres e das crianças de sexo feminino como parte inalienável e indivisível de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. A promoção e o progresso das mulheres, incluindo o direito à liberdade de pensamento, consciência, religião e credo, contribuirá, destarte, para as necessidades morais, éticas, espirituais e intelectuais de homens e mulheres, individualmente ou em associação com outros, garantindo-lhes, desse modo, a possibilidade de realizarem suas potencialidades na sociedade, e a construírem suas vidas de acordo com suas próprias aspirações.

Nos termos da mencionada declaração, a capacitação da mulher e sua participação em todos os âmbitos sociais, em base igualitária, incluindo a participação no processo decisório e o acesso ao poder, são fundamentais para a realização da igualdade, do desenvolvimento e da paz. A igualdade de direitos, oportunidades e acesso aos recursos, a divisão eqüitativa das responsabilidades familiares entre homens e mulheres e uma parceria harmoniosa são fundamentais ao seu bem-estar e ao de suas famílias, bem como para a consolidação da democracia. É, em decorrência disso, essencial traçar, implementar e monitorar políticas e programas políticos de reforço mútuo e eficientes, com a perspectiva de gênero e que tenham a participação da mulher, incluindo políticas e programas de desenvolvimento em todos os níveis, que poderão fomentar a promoção e o progresso da mulher.

A declaração insta os Estados a assegurarem a satisfação completa dos direitos humanos e das liberdades essenciais às mulheres e meninas, agindo de modo eficaz contra as violações desses direitos e liberdades, bem como a tomarem todas as medidas necessárias para a eliminação das diversas formas de discriminação contra as mesmas, removendo as barreiras à igualdade entre os sexos e ao progresso e à capacitação das mulheres e prevenindo e eliminando todas as formas de violência contra as mesmas. Encoraja os homens a participarem plenamente de todos os atos favoráveis à igualdade.

Devem ser intensificados os esforços para que seja assegurado o gozo de todos os direitos humanos e liberdades essenciais de todas as mulheres e meninas que encontraram os mais variados obstáculos às suas capacidades e progresso devido a motivos tais como: raça, idade, idioma, etnia, cultura, religião, etc. E, também, deve-se assegurar igual acesso das mulheres aos recursos econômicos, incluindo terras, crédito, ciência e tecnologia, treinamento vocacional, informação, comunicação e mercados, como meio de ampliar o progresso e a capacitação das mulheres e meninas, incluindo o melhoramento de sua capacidade de usufruir dos benefícios desses recursos através de um acesso igualitário, inter alia por meio da cooperação internacional.

Na Plataforma de Ação, é consignado que, desde 1995, tem sido gerado um notável volume de conhecimento e informações sobre a situação da mulher e das condições em que vive, os quais demonstram que, durante o transcorrer da sua vida, a existência diária da mulher e suas aspirações a longo prazo são restringidas por atitudes discriminatórias, estruturas sociais e econômicas injustas, e falta de recursos na maioria dos países que impedem sua participação plena e eqüitativa. A prática da seleção pré-natal do sexo, as taxas de mortalidade mais altas entre as garotas muito jovens e as baixas taxas de matrícula escolar

para meninas, em comparação com os meninos, em vários países, sugerem que a preferência pelo filho esteja limitando o acesso das meninas à alimentação, à educação e à assistência para a saúde, inclusive à própria vida, começando nas primeiras fases da vida a discriminação contra a mulher. As meninas são alvos de diversas formas de exploração sexual e econômica, pedofilia, prostituição forçada, venda de órgãos e tecidos, violência e práticas nocivas como o infanticídio feminino e a seleção pré-natal de sexo, o incesto, a mutilação genital, o casamento prematuro, inclusive na infância.

No que concerne à violência contra a mulher, é reafirmado que a mesma constitui ao mesmo tempo uma violação de direitos humanos e liberdades fundamentais e um óbice a que a mulher desfrute desses direitos. A violência baseada no gênero, tais como as sevícias e outras violências domésticas, abuso sexual, escravidão e exploração sexuais, e tráfico internacional de mulheres e meninas, a prostituição imposta e o assédio sexual, assim como a violência contra a mulher derivada dos preceitos culturais, o racismo e a discriminação racial, a xenofobia, a pornografia, a depuração étnica, o conflito armado, a ocupação estrangeira, o extremismo religioso e anti-religioso, o terrorismo, são incompatíveis com a dignidade e o valor da pessoa humana e devem ser combatidos e eliminados, sendo preciso proibir e eliminar os aspectos nocivos de certas práticas tradicionais, habituais ou modernas, que violam os direitos da mulher. Para tanto, os governos devem adotar medidas urgentes para combater e eliminar as diferentes formas de violência contra a mulher na vida privada e pública, quer perpetradas e/ou toleradas pelo Estado, quer por sujeitos privados.

A Plataforma de Ação dessa Conferência recomenda, em seu parágrafo 124 (2), a implementação pelos governos de medidas para o combate à violência contra a mulher, tais como: a elaboração, revisão e/ou aplicação das leis pertinentes, a fim de assegurar a eliminação da violência de gênero, com ênfase na prevenção e na repressão dos atos violentos e na proteção das mulheres em situação de violência (mediante o acesso a remédios administrativos e judiciais justos e eficazes, inclusive a reparação dos danos causados, a indenização e a cura das vítimas, e a reabilitação dos agressores); a adoção das medidas necessárias, especialmente na área da educação, para modificar os hábitos de condutas sociais e culturais da mulher e do homem, e eliminar os preconceitos e as práticas consuetudinárias e de outro tipo baseadas na idéia da inferioridade ou da superioridade de qualquer dos sexos e em funções estereotipadas atribuídas ao homem e à mulher; a criação e/ou reforço dos mecanismos institucionais, a fim de que as mulheres e as meninas possam denunciar os atos de violência cometidos contra elas, em condições de segurança e sem temor de castigos ou represálias; a melhoria da formação de pessoal judicial, legal, médico, social, educacional, de

polícia e serviços de imigração, com o fim de evitar os abusos de poder conducentes à violência contra a mulher, e sensibilizar tais pessoas quanto à natureza dos atos e ameaças de violência baseados na diferença de gênero, de forma a assegurar tratamento justo às vítimas de violência (BARSTED; HERMANN, 2001). Por tudo isso, reconhece-se essa Plataforma de ação como o mais completo diagnóstico internacional sobre o tema “mulher” (FROSSARD, 2006).

3.4 O sistema normativo regional de proteção aos Direitos Humanos e as mulheres em