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SUMÁRIO

1. MICROCRÉDITO E DESENVOLVIMENTO: A EVOLUÇÃO DOS CONCEITOS DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO.

1.10 O desenvolvimento como modernização

Na década de 60, o desenvolvimento econômico era visto como o motor da transformação institucional, em uma abordagem com base na Teoria da Modernização (PRADO e TREBILCOCK, 2009, p. 341-379), desenvolvida por Talcott Parsons. Nesta teoria, o desenvolvimento é um processo de diferenciação social inevitável e evolutivo, que produz, em última instância, instituições econômicas, políticas e sociais semelhantes àquelas no ocidente: um sistema de mercado livre, de instituições políticas democráticas e liberais, e do império do direito (TAMANAHA, 2009, p.189).

A elaboração teórica mais influente do período, com base na Teoria da Modernização, é a ideia das fases de desenvolvimento econômico proposta por Walt Whitman Rostow. Rostow, economista e assessor dos presidentes Eisenhower, Kennedy e Johnson, defendia que era necessário demonstrar ao Terceiro Mundo que o comunismo não era “a única forma de

organização efetiva do Estado que poderia promover o crescimento econômico acelerado”, e propunha que as nações ocidentais financiassem às nações do terceiro mundo o déficit de capital entre o investimento necessário para o desenvolvimento econômico acelerado e a poupança interna (ROSTOW, 1960, p.39 apud EASTERLY, 2002, p.33). Em 1959, Rostow (1978, p.16) defendeu a ideia de que havia cinco etapas de desenvolvimento bem definidas – a sociedade tradicional, as sociedades em construção das pré-condições para a arrancada (take- off), a arrancada, as sociedades em marcha para a maturidade e a sociedade de consumo de massa.

Para Rostow (1978, p.16-17), as sociedades tradicionais correspondem àquelas em que há uma estrutura de produção limitada, com base em ciência e tecnologia desenvolvidas antes de Newton, com dedicação de uma proporção elevada de seus recursos à agricultura.

O economista relaciona à construção das pré-condições para a arrancada a ampliação da educação, orientada à inserção nas atividades econômicas, ao surgimento dos empreendedores, à consolidação do sistema financeiro e bancário, aos investimentos em infraestrutura e na exportação de matérias-primas, e ao aparecimento de indústrias modernas. (ROSTOW, 1978, p.16-17). Nesta forma de organização econômica, as instituições políticas de base regional, a estrutura social e antigos valores limitam o dinamismo econômico. O autor destaca o aspecto político necessário à essa transição:

Embora o período de transição – entre a sociedade tradicional e [a arrancada] – assistisse a mudanças de vulto, tanto na própria economia quanto no equilíbrio dos valores sociais, o aspecto decisivo era amiúde político. Politicamente, a formação de um Estado nacional eficaz – baseada em coligações matizadas pelo novo nacionalismo, em oposição aos tradicionais interesses regionais agrários, à potência colonialista ou à ambos – foi um aspecto decisivo do período das pré-condições. Isso também foi, quase universalmente, uma condição necessária para [a arrancada]. (ROSTOW, 1978, p.18-20).

Rostow (1978) associa o período de arrancada à superação das instituições tradicionais, o que inclui uma ampla industrialização e a consolidação do mercado de capitais. Para o autor, o período de arrancada (take-off) é

o intervalo em que as antigas obstruções e resistências ao desenvolvimento regular são afinal superadas. As forças que contribuem para o progresso econômico, e que já haviam dado lugar a surtos e ilhotas de atividade moderna, dilatam-se e conseguem dominar a sociedade. [...] Durante o período de [arrancada], a taxa real de investimentos e poupança pode subir, digamos, de 5% da renda nacional para 10% ou mais [...]. No decurso [da arrancada], novas indústrias se expandem rapidamente, dando lucros dos

quais grande parte é reinvestida em novas instalações, e estas novas indústrias, por sua vez, estimulam, graças à necessidade aceleradamente crescente de operários, de serviços para apoiá-las e de outros bens manufaturados, uma ulterior expansão de áreas urbanas e de outras instalações industriais modernas. Todo o processo de expansão no setor moderno produz um aumento de renda nas mãos daqueles que não só economizam a taxas mais elevadas, mas também colocam suas economias à disposição dos que se acham empenhados em atividades no setor moderno. A nova classe empresarial se amplia e dirige fluxos aumentados ao investimento no setor privado. (ROSTOW, 1978, p.20-21)

A maturidade é associada por Rostow (1978) ao domínio de tecnologias e à expansão de seu emprego. Para o autor,

a maturidade [é] a etapa em que a economia demonstra capacidade de avançar para além das indústrias que inicialmente lhe impediram [a arrancada] para absorver e aplicar eficazmente num campo bem amplo de seus recursos – se não a todos eles – os frutos mais adiantados da tecnologia (então) moderna. Esta é a etapa em que a economia demonstra que possui as aptidões técnicas e organizacionais para produzir não tudo, mas qualquer coisa que decida produzir. Pode carecer [...] das matérias-primas ou de outros fatores de suprimento necessários para produzir economicamente um determinado tipo de produção; sua dependência, todavia, é antes uma questão de opção econômica ou de prioridade política do que uma carência tecnológica ou institucional (ROSTOW, 1978, p.22-23).

Rostow (1978, p.23) associava o período de maturidade a um investimento de 10% a 20% da renda nacional.

Para Rostow (1978, p.22-23), a sociedade de consumo de massa é associada à produção de bens de consumo em grande quantidade, para uma sociedade que superou as questões de renda mínima. A prevalência do trabalho especializado seria uma de suas características. O Estado de bem-estar social é associado por Rostow (1978, p.23) a esta fase.

A taxonomia das etapas de desenvolvimento de Rostow (1978) é de base institucional, e não rompe com a visão do desenvolvimento econômico como formação de capital, nem ignora a necessidade de transformações estruturais para o desenvolvimento. Observa-se, todavia – em que pese o forte viés de uma visão de desenvolvimento como industrialização, típico dos conceitos de desenvolvimento dos anos 50, o autor reconhece que o desenvolvimento econômico vai além dos fatores exclusivamente econômicos.

Na introdução de sua obra, Rostow (1978) afirma que:

[e]mbora seja verdade que a mudança econômica tem consequências políticas e sociais, a mudança econômica propriamente dita é aqui olhada como a consequência de forças políticas e sociais, tanto quanto de forças

estritamente econômicas. E, em termos de motivação humana, muitas das mais profundas mudanças econômicas são encaradas como decorrentes de motivos e aspirações humanos que nada têm de econômicos. (ROSTOW, 1978, p.14-15).

Em outro trecho, o autor assinala que as motivações humanas não são apenas econômicas, destacando o balanceamento dos objetivos nas sociedades:

Na sequencia das etapas do desenvolvimento, o homem é encarado como uma unidade mais complexa. Ele procura, não apenas a vantagem econômica, mas também o poder, o lazer, a aventura, a continuidade da experiência e a segurança; preocupa-se com a família, com os valores familiares de sua cultura regional e nacional, e mesmo com um pouco de divertimento lá onde vive. E, além dessas diversas vinculações domésticas, o homem é capaz de ser impelido por um sentimento de união com todos os seres humanos, os quais, ele reconhece, compartilham sua situação essencialmente paradoxal. Em suma, a resultante do comportamento humano é vista não como uma atividade de maximização, mas como um balanceamento de objetivos humanos alternativos, e muitas vezes contraditórios, em face da variedade de opções que os homens percebem ter diante de si. [...] [C] oclui-se diretamente desse modo de ver como os indivíduos agem que o comportamento das sociedades não é determinado exclusivamente por considerações econômicas. Os setores de uma sociedade interagem: forças sociais, culturais, sociais e políticas, refletindo facetas diversas dos seres humanos, têm seu próprio impacto, autêntico e independente, na atuação das sociedades, inclusive em sua atuação econômica. Assim, a orientação das nações e atuação total das sociedades – como o comportamento dos indivíduos – representam atos de balanceamento mais exatamente do que um simples procedimento visando aos lucros máximos possíveis. (ROSTOW, 1978, p.178-179)

A década de 60 veria também uma grande mudança na ideia de desenvolvimento, na qual o homem passaria a integrar o conceito - inicialmente como meio, e depois como fim do desenvolvimento econômico. A ideia do desenvolvimento como formação de capital humano foi um dos primeiros movimentos nesse sentido, e é apresentada a seguir.

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